Emagrecer alivia os sintomas da psoríase
Estudo da Dinamarca indica que, ao perder peso, pacientes conseguem diminuir a quantidade de surtos da doença autoimune. A redução das inflamações no corpo provocadas pela obesidade pode ser a razão da melhora
Isabela de Oliveira - Correio Braziliense
Publicação:02/07/2013 13:00Atualização: 02/07/2013 13:55
Dor, coceira e vergonha. Quem convive com os sintomas da psoríase sabe o que é ser refém da própria pele. Socialmente constrangedora, a doença obriga o paciente a se esconder por trás de mangas e calças compridas, independentemente da estação do ano. Estudos indicam uma relação com outro mal crônico que pode comprometer a vida social: a obesidade. O mais recente deles, realizado pela Universidade de Copenhagen, na Dinamarca, sugere que perder peso ameniza os sintomas da doença autoimune que atinge 3% dos brasileiros.
A relação da obesidade com a psoríase acontece além da derme, está no interior do organismo. É lá que o sistema imunológico reage ao excesso de gordura aumentando substâncias que contribuem para o desenvolvimento ou o agravamento da psoríase. “Tudo tem a ver com a inflamação. Ela circula pelo corpo inteiro, ampliando o risco de dano dentro das artérias e, por consequência, de entupimento de veias e de doenças cardíacas”, explica André Carvalho, médico responsável pelo Ambulatório de Psoríase da Santa Casa de Porto Alegre.
Segundo Carvalho, uma das substâncias pró-inflamatórias mais relacionada ao aparecimento das lesões características da psoríase chama-se fator de necrose tumoral alfa (TNF- alfa). Ela é produzida pelo tecido adiposo (gordura), em que há aumento dos níveis de leptina e redução dos níveis de adiponectina, duas substâncias que, em desequilíbrio, levam ao aumento de peso e estimulam a inflamação. “Dessa forma, como a psoríase grave pode levar ao aumento de peso e o peso excessivo pode aumentar a chance de lesões ou dificultar a resposta ao tratamento, é aconselhado o acompanhamento com um endocrinologista para a adequação do peso”, explica o médico.
Para saber até que ponto as duas doenças se relacionam, o dermatologista Peter Jensen conduziu, durante quatro meses, um estudo no Hospital Universitário Gentofte com 60 pacientes de psoríase, todos obesos. Eles foram divididos em dois grupos — um seguiu uma rígida dieta de baixo consumo calórico (de 800 a mil calorias por dia); o outro foi instruído a consumir alimentos saudáveis, mas sem seguir um plano alimentar. Após 16 semanas de acompanhamento, os voluntários responderam a um questionário sobre qualidade de vida dermatológica.
Os resultados indicaram que, além de emagrecerem em média 15kg, os pacientes submetidos à dieta perceberam uma trégua significativa nos sintomas da psoríase. “Aqueles que perderam peso tiveram resultados melhores no questionário, que consegue medir o impacto da psoríase na vida de quem sofre com ela. Em outras palavras, a vida deles melhorou porque eles conseguiram sentir os efeitos combinados da perda de peso”, acredita Jensen. Segundo ele, os resultados da pesquisa, publicados no Jama Dermatology, revelam que “a gravidade da doença autoimune parece diminuir com o peso, e o problema da obesidade deve fazer parte do tratamento em alguns pacientes”.
Cautela
Embora concorde que há relação entre a obesidade e a psoríase, Carvalho destaca que é preciso precaução ao avaliar os resultados descritos por Jensen. “(O estudo) foi feito com poucos pacientes, e seria interessante outras tentativas com maior número de pessoas para estatísticas mais confiáveis. Ele não consegue afirmar uma relação específica para perda de peso e diminuição das lesões de psoríase, apenas sugere isso.” O médico, no entanto, ressalta que perder peso é um indicação frequente para os pacientes obesos. “A gordura corporal também é um órgão imunologicamente ativo e produz, se em excesso, substâncias pró-inflamatórias. É um ciclo de retroalimentação em que mesmo um pequeno nível de inflamação produzido pelo tecido adiposo induz a inflamação na pele e nas artérias e vice-versa.”
Marcelo Arnone, dermatologista e coordenador da campanha de psoríase da Sociedade Brasileira de Dermatologia, também destaca que a associação da perda de peso com a melhora nos sintomas já era percebida pelos médicos. “Mas ainda não está claro se a psoríase engorda ou se os obesos têm mais chances de desenvolvê-la, pois os resultados da literatura médica são controversos.” Ele sugere duas interpretações para o alívio da doença quando os quilos a mais são eliminados. “Nesse estudo dinamarquês, uma das possibilidades é que, além de emagrecer, os pacientes estavam recebendo medicação sistêmica. Então, como eles reduziram o peso, passaram a consumir uma dose maior de remédio por quilo.”
A outra possibilidade envolve os efeitos da mudança física no psicológico dos pacientes. “Quem tem psoríase vive desmotivado e deprimido. Quando existe essa mudança, há uma automática melhora na qualidade de vida. O paciente sente-se mais disposto, dorme melhor e se relaciona mais. É uma melhora global, interfere no físico, no emocional e no psicológico”, conclui Arnone.
Limitações desgastantes
“Esses pacientes parecem depositar todos os problemas deles nos sintomas que se apresentam na pele. Em vez de falar sobre eles, falam sobre os exames. Isso não acontece com pacientes com outras doenças psicossomáticas, que preferem relatar o sofrimento provocado pelo problema. É um desafio enorme para quem sofre com psoríase entender que o corpo é uma vivência psíquica e que não pode estar isolado do mundo. Ás vezes, essas pessoas sentem culpa por precisarem explicar que a doença não é contagiosa. Isso é desgastante. Então, a estratégia é a invisibilidade. Muitas usam a comida ou o álcool para compensar as limitações impostas pela doença. É preciso entender que os sintomas psicossomáticos não são aleatórios. É pelo corpo que recebemos e damos afeto e amor. A pele é a superfície de contato. Então, o paciente possivelmente sofre com questões ligadas a isso. Eles organizam a vida em função da doença e chegam a trabalhar à noite para não encontrar outras pessoas.”
Kátia Cristina Brasil, doutora em psicologia pela Universidade de Brasília e professora da Universidade Católica de Brasília
A relação da obesidade com a psoríase acontece além da derme, está no interior do organismo. É lá que o sistema imunológico reage ao excesso de gordura aumentando substâncias que contribuem para o desenvolvimento ou o agravamento da psoríase. “Tudo tem a ver com a inflamação. Ela circula pelo corpo inteiro, ampliando o risco de dano dentro das artérias e, por consequência, de entupimento de veias e de doenças cardíacas”, explica André Carvalho, médico responsável pelo Ambulatório de Psoríase da Santa Casa de Porto Alegre.
Segundo Carvalho, uma das substâncias pró-inflamatórias mais relacionada ao aparecimento das lesões características da psoríase chama-se fator de necrose tumoral alfa (TNF- alfa). Ela é produzida pelo tecido adiposo (gordura), em que há aumento dos níveis de leptina e redução dos níveis de adiponectina, duas substâncias que, em desequilíbrio, levam ao aumento de peso e estimulam a inflamação. “Dessa forma, como a psoríase grave pode levar ao aumento de peso e o peso excessivo pode aumentar a chance de lesões ou dificultar a resposta ao tratamento, é aconselhado o acompanhamento com um endocrinologista para a adequação do peso”, explica o médico.
Para saber até que ponto as duas doenças se relacionam, o dermatologista Peter Jensen conduziu, durante quatro meses, um estudo no Hospital Universitário Gentofte com 60 pacientes de psoríase, todos obesos. Eles foram divididos em dois grupos — um seguiu uma rígida dieta de baixo consumo calórico (de 800 a mil calorias por dia); o outro foi instruído a consumir alimentos saudáveis, mas sem seguir um plano alimentar. Após 16 semanas de acompanhamento, os voluntários responderam a um questionário sobre qualidade de vida dermatológica.
Os resultados indicaram que, além de emagrecerem em média 15kg, os pacientes submetidos à dieta perceberam uma trégua significativa nos sintomas da psoríase. “Aqueles que perderam peso tiveram resultados melhores no questionário, que consegue medir o impacto da psoríase na vida de quem sofre com ela. Em outras palavras, a vida deles melhorou porque eles conseguiram sentir os efeitos combinados da perda de peso”, acredita Jensen. Segundo ele, os resultados da pesquisa, publicados no Jama Dermatology, revelam que “a gravidade da doença autoimune parece diminuir com o peso, e o problema da obesidade deve fazer parte do tratamento em alguns pacientes”.
Cautela
Embora concorde que há relação entre a obesidade e a psoríase, Carvalho destaca que é preciso precaução ao avaliar os resultados descritos por Jensen. “(O estudo) foi feito com poucos pacientes, e seria interessante outras tentativas com maior número de pessoas para estatísticas mais confiáveis. Ele não consegue afirmar uma relação específica para perda de peso e diminuição das lesões de psoríase, apenas sugere isso.” O médico, no entanto, ressalta que perder peso é um indicação frequente para os pacientes obesos. “A gordura corporal também é um órgão imunologicamente ativo e produz, se em excesso, substâncias pró-inflamatórias. É um ciclo de retroalimentação em que mesmo um pequeno nível de inflamação produzido pelo tecido adiposo induz a inflamação na pele e nas artérias e vice-versa.”
Saiba mais...
Segundo Gladys Aires Martins, dermatologista e coordenadora do Ambulatório de Psoríase do Hospital Universitário de Brasília (HUB), a lista de comorbidades da doença é longa, principalmente em pacientes que sofrem com ela há muito tempo. “A causa exata da associação da psoríase com a obesidade e a síndrome metabólica ainda não está totalmente esclarecida, mas a explicação pode estar no processo inflamatório mediado por linfócitos T, encontrado tanto na psoríase quanto na obesidade. Trabalhos como esse recém-publicado comprovam melhora da psoríase apenas com o tratamento das comorbidades, com correção da dieta, perda de peso e diminuição da massa corpórea. Na nossa prática clínica, já pudemos constatar a melhora de pacientes portadores de formas graves da doença após a cirurgia para a redução de estômago.”- Cientistas espanhóis concluem que emoções negativas agravam psoríase
- Humilhação e discriminação fazem parte da vida de 96% dos brasileiros com psoríase
- Estudo feito com mil pacientes mostra como eles lidam com a psoríase
- Cerca de 70% das pessoas com psoríase sofrem de outros males, como depressão e diabetes
- SUS terá mais um medicamento para tratamento da psoríase
Marcelo Arnone, dermatologista e coordenador da campanha de psoríase da Sociedade Brasileira de Dermatologia, também destaca que a associação da perda de peso com a melhora nos sintomas já era percebida pelos médicos. “Mas ainda não está claro se a psoríase engorda ou se os obesos têm mais chances de desenvolvê-la, pois os resultados da literatura médica são controversos.” Ele sugere duas interpretações para o alívio da doença quando os quilos a mais são eliminados. “Nesse estudo dinamarquês, uma das possibilidades é que, além de emagrecer, os pacientes estavam recebendo medicação sistêmica. Então, como eles reduziram o peso, passaram a consumir uma dose maior de remédio por quilo.”
A outra possibilidade envolve os efeitos da mudança física no psicológico dos pacientes. “Quem tem psoríase vive desmotivado e deprimido. Quando existe essa mudança, há uma automática melhora na qualidade de vida. O paciente sente-se mais disposto, dorme melhor e se relaciona mais. É uma melhora global, interfere no físico, no emocional e no psicológico”, conclui Arnone.
“Esses pacientes parecem depositar todos os problemas deles nos sintomas que se apresentam na pele. Em vez de falar sobre eles, falam sobre os exames. Isso não acontece com pacientes com outras doenças psicossomáticas, que preferem relatar o sofrimento provocado pelo problema. É um desafio enorme para quem sofre com psoríase entender que o corpo é uma vivência psíquica e que não pode estar isolado do mundo. Ás vezes, essas pessoas sentem culpa por precisarem explicar que a doença não é contagiosa. Isso é desgastante. Então, a estratégia é a invisibilidade. Muitas usam a comida ou o álcool para compensar as limitações impostas pela doença. É preciso entender que os sintomas psicossomáticos não são aleatórios. É pelo corpo que recebemos e damos afeto e amor. A pele é a superfície de contato. Então, o paciente possivelmente sofre com questões ligadas a isso. Eles organizam a vida em função da doença e chegam a trabalhar à noite para não encontrar outras pessoas.”
Kátia Cristina Brasil, doutora em psicologia pela Universidade de Brasília e professora da Universidade Católica de Brasília