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Combinações fazem com que o chá seja tão complexo quanto o vinho

Histórias e receitas de especialistas incrementam a experiência de beber chá. Uma vez que se toma gosto pela bebida, tudo é pretexto para apreciá-la

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Gláucia Chaves - Revista do CB Publicação:17/08/2013 15:00Atualização:17/08/2013 10:16
Assim como o vinho, há chás que, em cada parte da língua que toca, tem um sabor diferente (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Assim como o vinho, há chás que, em cada parte da língua que toca, tem um sabor diferente
Você lembra todas as vezes que tomou chá de camomila para ficar mais tranquilo, ou chá de boldo quando estava se sentindo enjoado? Na verdade, o que você tomou não pode ser chamado de “chá”, mas “infusão”. “O chá propriamente dito é a variação da flor chinesa Camellia sinensis”, explica Ina Gracindo, chef formada pela escola inglesa Cordon Vert Vegetarian Cookery School. Há 39 anos trabalhando como comissária da companhia aérea British Airways, ela resolveu aproveitar suas idas e vindas constantes à Inglaterra para pesquisar sobre o chá. A pesquisa rendeu o livro Viagem ao mundo do chá (Casa da Palavra), em que ela esmiuça a bebida, do contexto histórico ao modo de preparo.

“Além de ser considerado ritualístico em algumas culturas, o chá teve uma força política que mudou mapas inteiros do mundo”, reforça. No contexto da cozinha, ela explica que a planta tem cinco tamanhos e estruturas de folhas diferentes. Somado a isso, há a capacidade natural de ela assimilar sabores e aromas, o que dá origem aos chamados blends — mistura da planta ressecada com essências ou ingredientes adicionais.

As combinações fazem com que o chá seja seja tão complexo quanto o vinho, analisa Ines. “Assim como o vinho, há chás que, em cada parte da língua que toca, tem um sabor diferente”, completa a chef. “A classificação é muito parecida. O chá de Darjeeling (cidade ao norte da Índia) é como se fosse champagne. Uma das coisas que fazemos para testá-lo é ver se acontece uma ligeira dormência na língua, como se fosse um frisante.” Sabores fortes ou fracos são resultados do processamento do chá e do modo de preparo. Para cada tipo, inclusive, há um procedimento mais adequado. Por exemplo: os chás-verdes devem descansar em água quente por dois ou três minutos, no máximo, sob pena de ficarem amargos demais. Chás fermentados precisam de um pouco mais de tempo, enquanto as versões mais delicadas não podem ficar mais de alguns segundos em infusão, para não “cozinharem”.

O modo de preparo também varia. Os chineses, por exemplo, acreditam que o processo equivale a uma meditação. Não se pode sair de perto da chaleira, pois até mesmo o tamanho da bolha da fervura interferirá no sabor final. “Eles têm uma superstição de que a borbulha não pode ser maior que o olho de um camarão”, completa Ina. Ela conta ainda que, na China, há versões tão fermentadas que, quando fervidas, têm cheiro (e gosto) de bacon. Os orientais aproveitam a água da infusão para preparar macarrão, omeletes e refogados.

Acrescentar leite, hábito tão incomum por aqui, não é exclusividade dos ingleses. Na Índia, há uma versão do chá com leite e açúcar, por exemplo. Os franceses também são adeptos da prática. “Há uma lenda que diz que as pessoas passavam leite na porcelana para que ela não manchasse, já que era um tesouro ter louças tão caras”, explica a chef e pesquisadora. Outro motivo é que o chá que vinha para o Ocidente, por questões de fermentação, era o preto, pois o verde estragava rapidamente. “Apesar de se comportar melhor em viagens longas, o chá preto era muito forte, então, as pessoas começaram a acrescentar leite para torná-lo mais palatável.”

O modo de preparo também varia. Os chineses, por exemplo, acreditam que o processo equivale a uma meditação. Não se pode sair de perto da chaleira, pois até mesmo o tamanho da bolha da fervura interferirá no sabor final (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
O modo de preparo também varia. Os chineses, por exemplo, acreditam que o processo equivale a uma meditação. Não se pode sair de perto da chaleira, pois até mesmo o tamanho da bolha da fervura interferirá no sabor final
Sônia Zaghetto também é fã da bebida. Tão fã que resolveu largar o jornalismo para abrir uma casa especializada. Dona do Vincent Casa de Chá, ela diz que a ideia surgiu da vontade de tomar chá do jeito que é servido lá fora. “O chá sempre é meio que uma coisa secundária. Ele como estrela da festa é algo difícil de encontrar, principalmente aqui.” As condições brasileiras de relevo e geografia não permitem que a planta do chá cresça no país, ela explica. Porém, algumas empresas brasileiras passaram, recentemente, a importar matéria-prima para produzir os blends de sabores, como chá preto com baunilha ou com bergamota. “Antes, isso não existia no Brasil. Por isso, casas especializadas eram tão raras”, resume.

Ela explica que o objetivo da casa é servir todos os tipos de chá: preto, branco, verde e infusões, além do clássico brasileiro, o mate. Na carta, há opções para todos os gostos: puros ou não, quentes ou gelados. “O brasileiro não está muito habituado ao chá verde gelado puro”, analisa. “Então, oferecemos infusões geladas, que são perfumadas e coloridas, em que você abre o bule e sobe um cheiro de flor.” E o perfil da clientela? Majoritariamente, pessoas entre 25 a 30 anos. “Os estudantes da UnB aparecem sempre e tomam chá por horas”, diverte-se.

Para acompanhar o chá, não há limites: doces ou salgados, tudo é permitido. “Temos que desmistificar a ideia de que, para tomar chá, é preciso muita frescura”, diz Sônia. O sanduíche de pepino, por exemplo, é uma opção apreciadíssima pelos ingleses. Já os brasileiros não gostam muito da ideia, segundo Sônia. Entre os fiéis escudeiros do chá estão o muffin e o scone, tipo de bolinho servido quente, cortado pela metade e com manteiga de um lado e geleia do outro. “Ele é o par perfeito do chá. É o acompanhamento por excelência.”

VEJA ALGUMAS RECEITAS:

Para acompanhar o chá, não há limites: doces ou salgados, tudo é permitido (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Para acompanhar o chá, não há limites: doces ou salgados, tudo é permitido
Scones simples

:: Ingredientes ::

  • 250g de farinha com fermento
  • 1 pitada de sal
  • 50g de manteiga
  • 30g de açúcar
  • 150ml de leite

:: Modo de preparo ::

Misture a farinha, o sal e a manteiga, acrescente o açúcar e o leite até obter uma massa de boa consistência para uma ligeira sova em superfície enfarinhada. Abra em formato de esfera com aproximadamente 2cm de altura e corte com aro ou cortador de biscoitos de 5cm. Disponha os pãezinhos em forma untada, pincele um pouco de leite sobre cada um e leve para assar em forno quente preaquecido, por 10 a 15 minutos ou até que estejam crescidos e dourados. Deixe esfriar em uma grade de inox antes de servir. Se quiser, a essa receita podem ser acrescidas frutas vermelhas desidratadas ou passas. No Brasil, é improvável encontrar um creme que seja comercializado sem pasteurização e com o teor de gordura necessário para se preparar o clotted cream, segue a receita abaixo que se aproxima da original.

Clotted cream

:: Ingredientes ::

  • 1/2 colher (chá) de extrato de baunilha
  • 1/2 xícara de creme de leite gelado e dessorado
  • 2 colheres (sopa) de açúcar de confeiteiro
  • 1/2 xícara de iogurte grego bem espesso

:: Modo de preparo ::

Coloque uma vasilha de inox na geladeira por 1 hora e misture nela, com uma batedeira, a baunilha e o creme de leite, acrescentando o açúcar aos poucos até formar um creme bem consistente. Com a ajuda de uma colher, misture delicadamente o iogurte e sirva com os scones ainda quentes.

Entre os fiéis escudeiros do chá estão o muffin e o scone, tipo de bolinho servido quente, cortado pela metade e com manteiga de um lado e geleia do outro (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Entre os fiéis escudeiros do chá estão o muffin e o scone, tipo de bolinho servido quente, cortado pela metade e com manteiga de um lado e geleia do outro
Muffins

:: Ingredientes ::

  • 1 pacotinho de fermento granulado para pão
  • 1 colher (chá) de açúcar
  • 400g de farinha de trigo
  • 1 pitada de sal
  • 220ml de leite
  • 50ml de azeite

:: Modo de preparo ::

Misture bem todos os ingredientes secos e, aos poucos, acrescente o leite; junte apenas 200ml e acrescente o azeite. Amasse com as mãos. Se a massa estiver seca e difícil de manipular, acrescente, mexendo sempre, o restante do leite. Amasse ligeiramente e coloque a massa em saco plástico, deixando espaço para que dobre de tamanho. Feche e deixe descansar por meia hora. Retire a massa do saco e forme com ela um rolo de uns 7cm, corte cilindros como pães de hambúrguer. Unte uma grelha, deixe que aqueça bastante e vá dourando os muffins. Eles podem ser guardados em potes hermeticamente fechados ou congelados. Nesse último caso, partidos ao meio para que possam ser levados diretamente ao forno ou grelha quente antes de servir.
Tags: chá bebida vinho

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