Equipamento substitui a massagem manual durante o atendimento a vítimas de parada cardíaca
Com ele, australiana voltou à vida depois de 42 minutos clinicamente morta
Bruna Sensêve - Correio Braziliense
Publicação:03/09/2013 10:30Atualização: 02/09/2013 14:56
Após 42 minutos em morte clínica — com a respiração e a circulação sanguínea interrompidas —, a australiana Vanessa Tanasio, 41 anos, voltou à vida. A façanha de uma equipe médica do Centro Médico Monash, na cidade australiana de Melbourne, contou com a ajuda de um aparelho que é novidade na medicina mundial: o compressor cardíaco mecânico. Poucos exemplares podem ser encontrados no Brasil. Especialistas reconhecem a utilidade do equipamento, mas alertam que, sem uma corrente de sobrevivência bem executada, ele pode não surtir o efeito esperado.
“O problema da massagem cardíaca é que, após alguns minutos, até o profissional mais treinado e experiente fica cansado. A compressão automática consegue evitar essa fadiga, a inconsistência da compressão feita por profissionais que precisam se revezar e até mesmo as pausas necessárias para a troca”, analisa Sérgio Timerman, diretor do Laboratório de Treinamento em Emergências Cardiovasculares do Instituto do Coração da Universidade de São Paulo (USP) e um dos diretores do Comitê de Emergências Cardiovasculares da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Ele afirma que o equipamento garante um fluxo mais estável e contínuo ao cérebro e ao coração.
Timerman foi um dos coordenadores do primeiro estudo de compressores cardíacos automáticos feito em seres humanos no mundo, publicado em 2003. Segundo o trabalho, a qualidade da compressão automática é 33% melhor se comparada à forma manual tradicional. Para a paciente australiana Vanessa Tanasio, o equipamento foi crucial. Ela sofreu um ataque cardíaco devido ao entupimento de uma artéria e, minutos após ter chegado ao centro médico, foi declarada clinicamente morta. No entanto, a equipe de profissionais insistiu no procedimento e, usando o compressor automático, foi capaz de normalizar o fluxo de sangue nos órgãos mais vitais da paciente. Enquanto isso, um foi implantado na artéria bloqueada, como é feito normalmente em procedimentos padrão para infartos e acidentes vasculares cerebrais (AVC).
Quando a artéria foi desbloqueada, o coração de Vanessa voltou a bater e irrigar todos outros órgãos do corpo. A paciente foi liberada do hospital dias depois sem qualquer sequela. O desfecho surpreendeu o cardiologista responsável pela cirurgia, Wally Ahmar, que, em um comunicado à imprensa, disse não esperar que a paciente fosse ficar tão bem. “O tempo em que ela esteve clinicamente morta é muito extenso, não é o normal, mas (o episódio) mostra a importância da compressão automática”, avaliou Timerman.
No Brasil
Novas diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia incluem o equipamento como um importante auxiliar de resgate de pessoas que sofrem uma parada cardíaca. O equipamento é utilizado, por exemplo, pelo Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, pelo Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) e pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) do DF.
Segundo o coordenador geral do Samu no DF, Rodrigo Caselli, a diminuição do débito cardíaco de 30% para 100% quando o equipamento substitui o socorrista é uma das principais vantagens. “Para uma situação em que o coração está parado, 30% é bom. Por distribuir a compressão por todo o tórax, o equipamento porém chega a 100%. Ele praticamente bombeia o coração normalmente”, compara. Evitar a exaustão do socorrista, possibilitando que ele faça outra atividade, também é vital na situação de emergência, uma vez que a manobra busca manter o sangue circulando no cérebro e não pode reverter a parada.
“É essencial que a massagem seja feita em um ambiente plano e parado. Não pode ser feita dentro de uma ambulância. Então, se o paciente sofreu uma parada, temos que reanimá-lo no local e perdemos a chance de buscar atendimento mais imediato no hospital. Com o compressor, podemos reanimar e transportar”, avalia Caselli. O coordenador lembra que essas são vantagens observadas com o uso, pois é praticamente impossível comparar os resultados da massagem tradicional e do compressor. “Teríamos que deixar um paciente sem o equipamento para mostrar que ele é melhor. Ninguém vai fazer isso. Uma evidência científica é mais difícil”, pondera.
Manoel Canesin, também diretor do Comitê de Emergências Cardiovasculares da Sociedade Brasileira de Cardiologia, explica que, para salvar uma vida, é necessário uma série de procedimentos. O primeiro deles — e talvez o mais importante — é o diagnóstico. “A testemunha que percebeu o evento cardíaco tem que ver o que aconteceu e pensar rapidamente no que fazer.” Canesin calcula que aconteçam no Brasil cerca de 200 mil paradas cardíacas todos os anos. Delas, talvez 190 mil não sejam reconhecidas.
“As pessoas ainda não têm o mínimo de consciência. Estamos muito distantes de conscientizar a população de que há uma epidemia de doenças cardiovasculares em que a parada cardiorrespiratória é a principal causa de morte”, alerta. O especialista considera que ainda é difícil que reconheçam a parada cardíaca e iniciem a massagem imediatamente. “O primeiro pensamento é ligar para o socorro ou colocar a pessoa no carro e levá-la ao hospital. Só que essa atitude não salva vidas. O que salva vidas é começar a massagem cardíaca.”
Série de cuidados
A Associação Americana do Coração estabelece que é necessário que um conjunto de ações interligadas sejam efetivadas para a recuperação da vítima em parada cardiorrespiratória, denominado corrente da sobrevivência. Se um dos elos dessa corrente se quebrar, a vítima não terá sucesso na recuperação ou terá sequelas irreversíveis. O primeiro cuidado é acionar imediatamente o serviço de emergência médica, o segundo trata de iniciar a ressuscitação cardiorrespiratória imediatamente e mantê-la até a chegada do socorro. O terceiro elo é a desfibrilação precoce, executada por socorrista treinado ou por equipe médica e, por último, o atendimento médico hospitalar precoce.
Vanessa Tanasio ficou sob o efeito do compressor automático enquanto um stent desbloqueava uma artéria entupida
Saiba mais...
A intenção é substituir o trabalho de massagem cardíaca — procedimento padrão em pacientes que sofrem uma parada. O equipamento, que custa aproximadamente R$ 100 mil, realiza de forma automática a compressão do tórax. O uso eleva a 100% a efetividade do “bombeamento cardíaco artificial”, que fica em aproximadamente 30% quando a massagem é feita com perfeição por um profissional treinado. Ao sofrer uma parada cardíaca, a compressão do tórax, normalmente feita empurrando a região do peito entre os mamilos do paciente, ajuda a normalizar a circulação sanguínea. O procedimento também é essencial para manter a irrigação do cérebro, que, em minutos, pode começar a sofrer com a morte de células, o que causa sequelas irreparáveis.“O problema da massagem cardíaca é que, após alguns minutos, até o profissional mais treinado e experiente fica cansado. A compressão automática consegue evitar essa fadiga, a inconsistência da compressão feita por profissionais que precisam se revezar e até mesmo as pausas necessárias para a troca”, analisa Sérgio Timerman, diretor do Laboratório de Treinamento em Emergências Cardiovasculares do Instituto do Coração da Universidade de São Paulo (USP) e um dos diretores do Comitê de Emergências Cardiovasculares da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Ele afirma que o equipamento garante um fluxo mais estável e contínuo ao cérebro e ao coração.
Timerman foi um dos coordenadores do primeiro estudo de compressores cardíacos automáticos feito em seres humanos no mundo, publicado em 2003. Segundo o trabalho, a qualidade da compressão automática é 33% melhor se comparada à forma manual tradicional. Para a paciente australiana Vanessa Tanasio, o equipamento foi crucial. Ela sofreu um ataque cardíaco devido ao entupimento de uma artéria e, minutos após ter chegado ao centro médico, foi declarada clinicamente morta. No entanto, a equipe de profissionais insistiu no procedimento e, usando o compressor automático, foi capaz de normalizar o fluxo de sangue nos órgãos mais vitais da paciente. Enquanto isso, um foi implantado na artéria bloqueada, como é feito normalmente em procedimentos padrão para infartos e acidentes vasculares cerebrais (AVC).
Quando a artéria foi desbloqueada, o coração de Vanessa voltou a bater e irrigar todos outros órgãos do corpo. A paciente foi liberada do hospital dias depois sem qualquer sequela. O desfecho surpreendeu o cardiologista responsável pela cirurgia, Wally Ahmar, que, em um comunicado à imprensa, disse não esperar que a paciente fosse ficar tão bem. “O tempo em que ela esteve clinicamente morta é muito extenso, não é o normal, mas (o episódio) mostra a importância da compressão automática”, avaliou Timerman.
No Brasil
Novas diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia incluem o equipamento como um importante auxiliar de resgate de pessoas que sofrem uma parada cardíaca. O equipamento é utilizado, por exemplo, pelo Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, pelo Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) e pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) do DF.
Segundo o coordenador geral do Samu no DF, Rodrigo Caselli, a diminuição do débito cardíaco de 30% para 100% quando o equipamento substitui o socorrista é uma das principais vantagens. “Para uma situação em que o coração está parado, 30% é bom. Por distribuir a compressão por todo o tórax, o equipamento porém chega a 100%. Ele praticamente bombeia o coração normalmente”, compara. Evitar a exaustão do socorrista, possibilitando que ele faça outra atividade, também é vital na situação de emergência, uma vez que a manobra busca manter o sangue circulando no cérebro e não pode reverter a parada.
“É essencial que a massagem seja feita em um ambiente plano e parado. Não pode ser feita dentro de uma ambulância. Então, se o paciente sofreu uma parada, temos que reanimá-lo no local e perdemos a chance de buscar atendimento mais imediato no hospital. Com o compressor, podemos reanimar e transportar”, avalia Caselli. O coordenador lembra que essas são vantagens observadas com o uso, pois é praticamente impossível comparar os resultados da massagem tradicional e do compressor. “Teríamos que deixar um paciente sem o equipamento para mostrar que ele é melhor. Ninguém vai fazer isso. Uma evidência científica é mais difícil”, pondera.
Manoel Canesin, também diretor do Comitê de Emergências Cardiovasculares da Sociedade Brasileira de Cardiologia, explica que, para salvar uma vida, é necessário uma série de procedimentos. O primeiro deles — e talvez o mais importante — é o diagnóstico. “A testemunha que percebeu o evento cardíaco tem que ver o que aconteceu e pensar rapidamente no que fazer.” Canesin calcula que aconteçam no Brasil cerca de 200 mil paradas cardíacas todos os anos. Delas, talvez 190 mil não sejam reconhecidas.
“As pessoas ainda não têm o mínimo de consciência. Estamos muito distantes de conscientizar a população de que há uma epidemia de doenças cardiovasculares em que a parada cardiorrespiratória é a principal causa de morte”, alerta. O especialista considera que ainda é difícil que reconheçam a parada cardíaca e iniciem a massagem imediatamente. “O primeiro pensamento é ligar para o socorro ou colocar a pessoa no carro e levá-la ao hospital. Só que essa atitude não salva vidas. O que salva vidas é começar a massagem cardíaca.”
Série de cuidados
A Associação Americana do Coração estabelece que é necessário que um conjunto de ações interligadas sejam efetivadas para a recuperação da vítima em parada cardiorrespiratória, denominado corrente da sobrevivência. Se um dos elos dessa corrente se quebrar, a vítima não terá sucesso na recuperação ou terá sequelas irreversíveis. O primeiro cuidado é acionar imediatamente o serviço de emergência médica, o segundo trata de iniciar a ressuscitação cardiorrespiratória imediatamente e mantê-la até a chegada do socorro. O terceiro elo é a desfibrilação precoce, executada por socorrista treinado ou por equipe médica e, por último, o atendimento médico hospitalar precoce.