Pesquisa diz que literatura pode ajudar pessoas doentes a enfrentarem melhor o tratamento

A leitura é capaz de elevar a autoestima e o conhecimento sobre si mesmo, dizem estudiosos suecos

Diminuir Fonte Aumentar Fonte Imprimir Corrigir Notícia Enviar
Vilhena Soares - Correio Braziliense Publicação:09/11/2013 11:00Atualização:09/11/2013 10:45
A procura por histórias que refletiam a situação que as pacientes viviam naquele momento, o que permitia uma forte identificação com os textos (SXC.hu/Banco de Imagens)
A procura por histórias que refletiam a situação que as pacientes viviam naquele momento, o que permitia uma forte identificação com os textos
 A leitura proporciona muitos benefícios, como o acesso a novos conhecimentos e o estímulo à criatividade. Agora, além desses ganhos já conhecidos, outra vantagem do hábito acaba de ser constatada por um estudo realizado na Suécia: a literatura tem o poder de ajudar na recuperação de pessoas afastadas do trabalho por problemas físicos. O grupo responsável pelo estudo acredita que o efeito tenha relação com a elevação da autoestima e da confiança em quem lê.

Lena Martensson, terapeuta ocupacional da Universidade de Göteborg e uma das autoras da investigação, explica que o tema a interessava havia alguns anos. “Pesquisas anteriores afirmam que os benefícios da leitura têm relação com o conteúdo dos livros. Do ponto de vista da ciência ocupacional, eu estava interessada nos possíveis ganhos de ler ficção como uma ocupação diária”, conta.

No estudo, Martensson e sua colega Cecilia Pettersson acompanharam oito mulheres que adoeceram e tiraram licença médica por períodos que variaram de quatro a 36 meses. Em entrevistas aprofundadas, todas as participantes apontaram os livros como grandes companheiros que as ajudaram no processo de recuperação e a retomar as atividades cotidianas.

A leitura também contribuiu para uma autoimagem positiva e maior autoconhecimento através da experiência subjetiva, notaram as responsáveis pela investigação (Correio Braziliense / DA Press)
A leitura também contribuiu para uma autoimagem positiva e maior autoconhecimento através da experiência subjetiva, notaram as responsáveis pela investigação
A leitura também contribuiu para uma autoimagem positiva e maior autoconhecimento através da experiência subjetiva, notaram as responsáveis pela investigação. “A leitura de ficção é uma atividade significativa que as mulheres doentes iniciaram por conta própria, o que reforçou sua capacidade de participar em eventos diários”, diz Martensson.

Tema certo
Algo que chamou a atenção das autoras foi a procura por histórias que refletiam a situação que as pacientes viviam naquele momento, o que permitia uma forte identificação com os textos. “A maioria procurou livros que elas acreditavam previamente que lhes faria bem. Elas selecionaram obras que as faziam lembrar da própria situação”, ressalta a cientista. As participantes também disseram buscar obras pelo simples prazer estético e como uma forma de esquecer a doença momentaneamente. Mas elas evitavam textos muito densos. “Era importante que a linguagem não fizesse grandes exigências quanto à capacidade de concentração.”

Todas as voluntárias sempre tiveram interesse pela leitura. No entanto, assim que adoeceram, o hábito foi deixado um pouco de lado. Aos poucos, as letras voltaram a fazer parte da rotina e se tornaram cada vez mais presentes conforme as mulheres se recuperavam. “Além disso, à medida que, gradualmente, se sentiam melhor, elas retornavam para o tipo de literatura que tinham lido no passado”, acrescenta Petterson.

Livros se tornam refúgio necessário Para pesquisadores brasileiros que não participaram da pesquisa sueca, o resultado do trabalho traz informações valiosas sobre o efeito da literatura na vida das pessoas. Diva Maciel, professora do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), acredita que o estudo mostra como a literatura pode preencher a falta de um refúgio, algo necessário em um período de repouso. “É uma forma muito interessante de ocupar o tempo. Com o prazer da leitura, essas mulheres conseguem se identificar e preencher um espaço, algo que ajudará na recuperação. Os livros são um recurso que podem ser comparados a outros, como os filmes ou a música, por exemplo”, aponta.

“O escritor Affonso Romano De Santana já contou ter um amigo médico que lhe pedia livros para levar ao hospital, pois notava que os pacientes se sentiam melhores com a leitura, até mesmo os que não sabiam ler e pediam para ouvir as histórias. Esse experimento mostra esse poder da leitura”, completa Maciel.

Para Roberval de Souza, coordenador e professor do curso de psicologia do Centro Universitário Iesb, seja qual for o tema do livro buscado pelos pacientes, ele pode auxiliar quem está em recuperação. “O estudo se assemelha ao que já ocorre com as crianças hospitalizadas. No momento em que elas têm a oportunidade de dar continuidade aos estudos, concomitantemente ao tratamento, elas desenvolvem melhores habilidades de resiliência à própria doença. Já é sabido que a leitura, seja ficção ou não, nos ajuda a construir um repertório simbólico e imaginário que será fundamental para nossa convivência social”, destaca. “A nossa autoestima é moldada a partir de um somatório de vínculos afetivos que construímos desde o inicio da vida. Sendo assim, a leitura funciona como uma ferramenta para nos ajudar a elaborar novas percepções de como podemos nos portar no mundo e na sociedade”, prossegue o psicólogo.

Souza acredita que a literatura está próxima do refúgio de que o ser humano sente necessidade em situações difíceis, como um problema de saúde. “Quando uma pessoa recebe um diagnóstico médico, logo procura se informar sobre a doença. À medida que o paciente consegue obter mais informações, ele pode ajudar mais no tratamento. Em um segundo momento, de aceitação, o paciente poderá recorrer à leitura de obras de ficção, que ajudam a construir um imaginário e uma melhor percepção e enfrentamento da realidade psíquica”, afirma.

COMENTÁRIOS

Os comentários são de responsabilidade exclusiva dos autores.