Ver notícias sobre tragédias é pior do que vivê-las, sugere estudo

Pesquisa levantou questões sobre o impacto psicológico da exposição repetida à violência por meio da mídia digital e tradicional no primeiro grande ataque terrorista em solo americano depois de 11 de setembro de 2001

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AFP - Agence France-Presse Publicação:10/12/2013 10:15Atualização:10/12/2013 10:48
Depois dos atentados na maratona de Boston, pessoas que passaram seis horas ou mais por dia vasculhando a mídia em busca de atualizações sobre o ataque ficaram mais traumatizadas do que aquelas que estavam no local, sugere um estudo publicado nesta segunda-feira nos Estados Unidos.

A pesquisa levantou questões sobre o impacto psicológico da exposição repetida à violência através da mídia digital e tradicional no primeiro grande ataque terrorista em solo americano depois de 11 de setembro de 2001.

As descobertas se basearam em uma consulta com 4.675 adultos americanos, feita logo após os mortais ataques de 15 de abril e à frenética caçada humana de cinco dias que se seguiu e após a qual um suspeito, Tamerlan Tsarnaev, foi morto, e seu irmão, Dzhokhar, foi preso.

As descobertas se basearam em uma consulta com 4.675 adultos americanos, feita logo após os ataques de 15 de abril em Boston e à frenética caçada humana de cinco dias que se seguiu  (Reprodução / CBS News)
As descobertas se basearam em uma consulta com 4.675 adultos americanos, feita logo após os ataques de 15 de abril em Boston e à frenética caçada humana de cinco dias que se seguiu
Dzhokhar Tsarnaev é acusado de plantar bombas caseiras feitas com panelas de pressão na linha de chegada da maratona, matando três pessoas e ferindo 260, algumas das quais tiveram pernas e braços arrancados pelo impacto das explosões.

Muitas das imagens mais sangrentas foram cortadas ou editadas pelos grandes veículos, mas fotos e vídeos sem edição, feitos por testemunhas, circularam amplamente no Twitter, YouTube, Facebook e outras mídias sociais, explicou a co-autora do estudo, Roxane Cohen Silver. "O chocante foi o impacto desta exposição à mídia mesmo até mesmo nas pessoas que não conheciam ninguém e que não estavam lá naquele dia", declarou à AFP Silver, professora de psicologia da Universidade da Califórnia em Irvine.

"A exposição à mídia foi um indício de reação aguda ao estresse mais forte do que ter estado lá", continuou. A reação aguda ao estresse é definida como um conjunto de sintomas, que inclui pensamentos invasivos e repetitivos, flashbacks, sentimento de estar no limite ou hipervigilância e tentativa de evitar a lembrança do evento.

De duas a quatro semanas após os ataques, os estudiosos perguntaram às pessoas que participaram da consulta sobre seu consumo de mídia na semana que se seguiu ao atentado e seus sintomas de estresse psicológico. As pessoas que estiveram no local ou que conheciam alguém que estava eram mais propensas a experimentar sinais de estresse agudo do que as pessoas que não estiveram lá e também mais propensas a assistir mais a notícias sobre os ataques, revelou o estudo publicado no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

Mas um indicador mais forte ainda de estresse psicológico foi se uma pessoa assistiu ou leu mais de seis horas ou mais por dia sobre os ataques, disse Silver. "Não é que a exposição direta não tenha sido importante, mas mais do que ter estado lá, a exposição à mídia foi um indicador até mesmo mais forte de reação aguda ao estresse", afirmou.

Ao comparar as pessoas que viram notícias sobre o atentado durante uma hora e meia e aqueles que consumiram seis horas ou mais, este último grupo demonstrou ser nove vezes mais propenso a apresentar estresse agudo, destacou o estudo.

Silver disse que o consumo midiático médio das pessoas que participaram do estudo foi de 4,7 horas por dia e incluiu, tipicamente, navegar por mídias sociais, assistir a vídeos sobre os ataques, ler novas matérias e assistir a noticiários na televisão. Bruce Shapiro, diretor-executivo do Centro Dart para Jornalismo e Trauma, da Universidade de Columbia, disse que as descobertas do estudo levantam importantes questões éticas para as empresas noticiosas.

No entanto, ele indicou que o estresse agudo visto no curto prazo não é necessariamente um indicador de distúrbio de estresse pós-traumático (PTSD, na sigla em inglês). "É preciso fazer mais estudos antes que saibamos se o aumento de sintomas de estresse agudo nas pessoas se torna ou alimenta o dano psicológico de longo prazo", disse Shapiro à AFP.

"Não vira PTSD até que os problemas característicos permaneçam por mais de seis semanas e interfiram de alguma forma significativa na vida das pessoas", declarou. Silver disse que a mídia moderna tornou mais fácil do que nunca que as pessoas acessem imagens que podem ser perturbadoras, especialmente se vistas repetidamente, e a nova paisagem digital permite com frequência que o indivíduo decida olhar ou não. "As pessoas deveriam se conscientizar de que não há benefício psicológico na exposição repetida a imagens de horror", concluiu.

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