Equipamento utiliza ultrassom para recarregar implantes médicos como o marca-passo
A novidade pode eliminar a necessidade de troca das próteses por falta de bateria
Roberta Machado - Correio Braziliense
Publicação:23/12/2013 13:00Atualização: 22/12/2013 09:33
A ideia, apresentada no 166º Encontro da Sociedade Acústica da América, em San Francisco, lança mão das mesmas ondas de alta frequência usadas em exames de imagem para levar eletricidade para dentro do corpo do paciente, sem cortes nem furos. Com uma simples fonte de ultrassom portátil, a pessoa poderia, por exemplo, recarregar seu marca-passo em poucas horas.
Bastaria prender o acessório junto ao corpo, e as ondas atravessariam a pele em direção a um aparelho capaz de transformar a frequência em eletricidade. Esse conversor, instalado no corpo durante o mesmo procedimento de colocação do equipamento que mantém o ritmo cardíaco, enviaria a energia para a peça médica. Outra função do “carregador” seria avisar quando o procedimento estivesse completo. O paciente poderia controlar o transmissor manualmente ou até mesmo usá-lo como um cinto até que a recarga terminasse.
“O dispositivo poderia ser usado em vários implantes, em várias regiões do corpo”, diz Inder Makin, pesquisador da empresa Piezo Energy Technologies, responsável pelo desenvolvimento do aparelho. As possibilidades, ressalta Makin, são grandes. E para que tudo se torne realidade, falta apenas adaptar a peça aos diferentes tipos de implantes já existentes. “As recargas dependem da natureza da aplicação e dos requisitos de energia”, acrescenta o médico.
Testes
O sistema foi testado em animais com resultados positivos. De dentro dos corpos de porcos, esses geradores de energia implantados (IPGs, em inglês) foram capazes de produzir eletricidade suficiente para alimentar baterias de lítio de 4,1 volts (v), usadas em implantes médicos atualmente. “A tecnologia é viável e bastante interessante, sendo possível fonte para recarga de baterias em dispositivos implantados”, avalia Eduardo Tavares Costa, especialista em ultrassom do Centro de Engenharia Biomédica (CEB) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Por meio de 1,5m de tecido, o equipamento foi capaz de produzir correntes de 300 milimamperes (mA), a mesma de um carregador comum de dispositivos portáteis. Quando a espessura foi aumentada para 5cm, o equipamento ainda mantinha uma corrente de 20mA.
A conversão das ondas de ultrassom em eletricidade ocorre graças a um fenômeno chamado piezoeletricidade. A palavra, formada pela expressão de origem grega piezo (espremer ou comprimir), é usada para definir a capacidade que alguns materiais têm de gerar eletricidade sob pressão. Essas estruturas, que podem ser cristais ou cerâmicas, são usadas para geração de eletricidade há tempos, em modelos como o da pista de dança que se ilumina graças à energia dos pés das pessoas.
“Quando você deforma esse material você está mudando a dimensão dele. A densidade dos dipolos elétricos muda, e, para compensar, ele libera uma corrente elétrica”, resume Walter Sakamoto, pesquisador da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e especialista nesse tipo de tecnologia. De acordo com o cientista, que trabalha com a piezoeletricidade no desenvolvimento de modelos de produção de energia renovável, o ultrassom pode ser uma boa fonte de energia para o material sensível à pressão, assim como o movimento de carros e o vento. “O ultrassom também é uma onda, que bate no material e o deforma”, explica.
Nova abordagem A recarga sem fios de implantes já foi tentada há alguns anos, por meio da tecnologia eletromagnética, que não vingou. “O método eletromagnético indutivo é atualmente usado na recarga de baterias implantadas, mas tem suas limitações na profundidade de carga e na eficiência”, lembra Inder Makin.
Já a ideia piezoelétrica deve levar entre dois e cinco anos para chegar ao mercado, caso os testes de segurança e de eficiência do equipamento sejam bem-sucedidos. O modelo, espera Makin, deve diminuir o custo dos tratamentos de pacientes implantados e reduzir também os riscos causados por procedimentos cirúrgicos.
A médica Stela Maria Vitorino Sampaio, diretora da Sociedade Brasileira de Cardiologia, lembra, contudo, que a troca de bateria também significa a atualização do próprio dispositivo. Passados os anos de garantia do fabricante ou surgidos os primeiros sinais de falha, o modelo eletrônico dá lugar a outro, geralmente mais eficiente, leve e seguro.
Para a médica, o uso de um marca-passo recarregável representaria vantagem somente para pacientes de idade avançada, que sofrem mais riscos durante a cirurgia. “Se um paciente de 90 ou 100 anos pudesse ter recarga, seria uma boa ideia. Ele evitaria riscos”, pondera a cardiologista. No Brasil, são implantados 190 marca-passos por milhão de habitantes, e a maioria deles é em pessoas com idade entre 70 e 79 anos. O país já contabiliza mais de uma centena de procedimentos como esse em pacientes com mais de 100 anos.
Saiba mais...
Órgãos, sangue e tecidos vivem em perfeita harmonia com fios e eletrodos neste tempo de implantes tecnológicos. É possível regular o coração, a audição e até mesmo o cérebro com a ajuda de um equipamento de poucos gramas. O ser humano biônico, contudo, sofre com um grave defeito de engenharia elétrica: quando a bateria acaba, só resta a opção de retirar o dispositivo da frágil estrutura de carne e trocá-lo por um novo em folha, abrindo espaço para os perigos da cirurgia, como complicações com a anestesia e infecções. Mas, e se a pessoa pudesse simplesmente ser plugada na tomada, como um telefone celular, para carregar o equipamento inserido em seu corpo? Pois é esse o conceito de uma nova pesquisa divulgada recentemente por engenheiros norte-americanos.A ideia, apresentada no 166º Encontro da Sociedade Acústica da América, em San Francisco, lança mão das mesmas ondas de alta frequência usadas em exames de imagem para levar eletricidade para dentro do corpo do paciente, sem cortes nem furos. Com uma simples fonte de ultrassom portátil, a pessoa poderia, por exemplo, recarregar seu marca-passo em poucas horas.
Bastaria prender o acessório junto ao corpo, e as ondas atravessariam a pele em direção a um aparelho capaz de transformar a frequência em eletricidade. Esse conversor, instalado no corpo durante o mesmo procedimento de colocação do equipamento que mantém o ritmo cardíaco, enviaria a energia para a peça médica. Outra função do “carregador” seria avisar quando o procedimento estivesse completo. O paciente poderia controlar o transmissor manualmente ou até mesmo usá-lo como um cinto até que a recarga terminasse.
“O dispositivo poderia ser usado em vários implantes, em várias regiões do corpo”, diz Inder Makin, pesquisador da empresa Piezo Energy Technologies, responsável pelo desenvolvimento do aparelho. As possibilidades, ressalta Makin, são grandes. E para que tudo se torne realidade, falta apenas adaptar a peça aos diferentes tipos de implantes já existentes. “As recargas dependem da natureza da aplicação e dos requisitos de energia”, acrescenta o médico.
Testes
O sistema foi testado em animais com resultados positivos. De dentro dos corpos de porcos, esses geradores de energia implantados (IPGs, em inglês) foram capazes de produzir eletricidade suficiente para alimentar baterias de lítio de 4,1 volts (v), usadas em implantes médicos atualmente. “A tecnologia é viável e bastante interessante, sendo possível fonte para recarga de baterias em dispositivos implantados”, avalia Eduardo Tavares Costa, especialista em ultrassom do Centro de Engenharia Biomédica (CEB) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Por meio de 1,5m de tecido, o equipamento foi capaz de produzir correntes de 300 milimamperes (mA), a mesma de um carregador comum de dispositivos portáteis. Quando a espessura foi aumentada para 5cm, o equipamento ainda mantinha uma corrente de 20mA.
A conversão das ondas de ultrassom em eletricidade ocorre graças a um fenômeno chamado piezoeletricidade. A palavra, formada pela expressão de origem grega piezo (espremer ou comprimir), é usada para definir a capacidade que alguns materiais têm de gerar eletricidade sob pressão. Essas estruturas, que podem ser cristais ou cerâmicas, são usadas para geração de eletricidade há tempos, em modelos como o da pista de dança que se ilumina graças à energia dos pés das pessoas.
“Quando você deforma esse material você está mudando a dimensão dele. A densidade dos dipolos elétricos muda, e, para compensar, ele libera uma corrente elétrica”, resume Walter Sakamoto, pesquisador da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e especialista nesse tipo de tecnologia. De acordo com o cientista, que trabalha com a piezoeletricidade no desenvolvimento de modelos de produção de energia renovável, o ultrassom pode ser uma boa fonte de energia para o material sensível à pressão, assim como o movimento de carros e o vento. “O ultrassom também é uma onda, que bate no material e o deforma”, explica.
Nova abordagem A recarga sem fios de implantes já foi tentada há alguns anos, por meio da tecnologia eletromagnética, que não vingou. “O método eletromagnético indutivo é atualmente usado na recarga de baterias implantadas, mas tem suas limitações na profundidade de carga e na eficiência”, lembra Inder Makin.
Já a ideia piezoelétrica deve levar entre dois e cinco anos para chegar ao mercado, caso os testes de segurança e de eficiência do equipamento sejam bem-sucedidos. O modelo, espera Makin, deve diminuir o custo dos tratamentos de pacientes implantados e reduzir também os riscos causados por procedimentos cirúrgicos.
A médica Stela Maria Vitorino Sampaio, diretora da Sociedade Brasileira de Cardiologia, lembra, contudo, que a troca de bateria também significa a atualização do próprio dispositivo. Passados os anos de garantia do fabricante ou surgidos os primeiros sinais de falha, o modelo eletrônico dá lugar a outro, geralmente mais eficiente, leve e seguro.
Para a médica, o uso de um marca-passo recarregável representaria vantagem somente para pacientes de idade avançada, que sofrem mais riscos durante a cirurgia. “Se um paciente de 90 ou 100 anos pudesse ter recarga, seria uma boa ideia. Ele evitaria riscos”, pondera a cardiologista. No Brasil, são implantados 190 marca-passos por milhão de habitantes, e a maioria deles é em pessoas com idade entre 70 e 79 anos. O país já contabiliza mais de uma centena de procedimentos como esse em pacientes com mais de 100 anos.