Sob pressão social, tunisianas recorrem à segunda virgindade
Mulheres recorrem à cirurgia de reconstrução do hímen para se encaixarem em uma sociedade que continua conservadora por trás da fachada moderna. Muitos homens afirmam, sem rodeios, que nunca se casariam com mulheres 'já usadas'
AFP - Agence France-Presse
Publicação:10/04/2014 11:04Atualização: 10/04/2014 11:33
Salima está convencida de que "algumas gotas de sangue não representam a honra de uma mulher"; no entanto, esta tunisiana de 32 anos se submeteu à reconstrução do hímen para chegar na condição de virgem à noite de núpcias.
Assim como ela, muitas tunisianas recorrem à cirurgia para se amoldar a uma sociedade que continua conservadora por trás da fachada moderna e evitar ser rejeitadas por certos homens que afirmam, sem rodeios, que nunca se casariam com mulheres "já usadas".
A operação de reconstrução do hímen, uma pequena membrana situada na entrada da vagina, dura apenas meia hora e custa entre 800 e 1.400 dinares (400 a 700 euros), caso a mulher queira reconstituir a "virgindade" por alguns dias (himenorrafia) ou de forma duradoura (himenoplastia).
"O número de mulheres que recorre à himenoplastia ou à himenorrafia aumentou muito nos últimos anos", disse à AFP Moncef Kamel, médico que trabalha em Djerba, no sul da Tunísia. O doutor Kamel opera a cada ano uma centena de mulheres, de 18 a 45 anos, que chegam ao consultório "com o rosto tapado por um véu ou lenço e com grandes óculos (escuros)".
Costuma se tratar de mulheres que "têm uma atividade sexual normal" e que, no geral, provêm de meios sociais desfavorecidos. Mas faltam dados precisos sobre a proporção exata do fenômeno. "É um tema tabu, o que explica a falta de estatísticas oficiais", explicou o ginecologista Fauzi Hajri, que trabalha na capital, Túnis.
Hipocrisia social
Para o doutor Hajri, este fenômeno se explica, sobretudo, pelo aumento da idade média do casamento. Muitos jovens tunisianos de ambos os sexos mantêm relações pré-nupciais e ao se aproximar o dia do casamento, as mulheres recorrem à reconstrução do hímen.
Esta prática revela, segundo o sociólogo Tarek Belhadj Mohamed, a hipocrisia da sociedade, que se nega a admitir a mudança de hábitos de grande parte da população.
Em seu livro, "Virges? La Nouvelle Sexualité des Tunisiennes" (Virgens, a Nova Sexualidade das Tunisianas, em uma tradução livre), a psicanalista Nedra ben Smail afirma que "os médicos calculam que apenas 5% das jovens não se preocupam com a virgindade antes do casamento. Vinte por cento seriam constituídos por 'verdadeiras virgens' e três quartos são 'virgens medicamente assistidas'".
"O estilo de vida na Tunísia parece moderno e aberto, mas a realidade reflete o contrário: nossa sociedade e inclusive as elites se mostram tolerantes com relação à virgindade na teoria; mas quando o assunto lhes diz respeito, vira uma condição primordial para o casamento", afirma Tarek Belhadj Mohamed.
"A virgindade é um certificado de validade para a mulher, que na nossa sociedade só tem uma função sexual e reprodutiva, enquanto o homem deve 'treinar' para se mostrar sexualmente maduro ao se casar", acrescentou. A reconstrução do hímen, afirma, é um ato de "hipocrisia social e uma discriminação com as mulheres".
Sob pressão, é melhor mentir
Salima não diz nada diferente, mesmo a Tunísia sendo desde os anos 1950 o país árabe onde as mulheres têm mais direitos. A Constituição adotada em janeiro reconhece inclusiva a igualdade entre os sexos.
"A hipocrisia dos homens e da nossa sociedade me empurra para fazer a operação. Mas para mim, umas gotas de sangue não representam a honra de uma mulher", diz Salima. A jovem, que obviamente preferiu omitir seu sobrenome, também explicou que uma vez quis "jogar limpo" com um homem.
"Mas assim que soube, recusou o casamento e fez tudo o possível para me levar para a cama. Esta é a mentalidade dos homens: uma mulher que teve relações sexuais antes do casamento é apenas uma prostituta e não pode ser boa mãe!", lamenta. Sabra, de 27 anos, não pensa que "a virgindade seja garantia de fidelidade" e reivindica "o direito da mulher a uma vida sexual". No entanto, também prefere mentir e ceder à pressão social a ficar sozinha.
"Se eu tivesse dito ao meu marido que não era virgem, não teria aceitado se casar comigo e este é o caso de muitas mulheres na Tunísia", afirma.
Registro capturado em Túnis: número de mulheres que recorre à himenoplastia ou à himenorrafia aumentou muito nos últimos anos
Assim como ela, muitas tunisianas recorrem à cirurgia para se amoldar a uma sociedade que continua conservadora por trás da fachada moderna e evitar ser rejeitadas por certos homens que afirmam, sem rodeios, que nunca se casariam com mulheres "já usadas".
A operação de reconstrução do hímen, uma pequena membrana situada na entrada da vagina, dura apenas meia hora e custa entre 800 e 1.400 dinares (400 a 700 euros), caso a mulher queira reconstituir a "virgindade" por alguns dias (himenorrafia) ou de forma duradoura (himenoplastia).
"O número de mulheres que recorre à himenoplastia ou à himenorrafia aumentou muito nos últimos anos", disse à AFP Moncef Kamel, médico que trabalha em Djerba, no sul da Tunísia. O doutor Kamel opera a cada ano uma centena de mulheres, de 18 a 45 anos, que chegam ao consultório "com o rosto tapado por um véu ou lenço e com grandes óculos (escuros)".
Costuma se tratar de mulheres que "têm uma atividade sexual normal" e que, no geral, provêm de meios sociais desfavorecidos. Mas faltam dados precisos sobre a proporção exata do fenômeno. "É um tema tabu, o que explica a falta de estatísticas oficiais", explicou o ginecologista Fauzi Hajri, que trabalha na capital, Túnis.
Saiba mais...
Hajri também opera uma centena de mulheres por ano e entre suas pacientes há argelinas e líbias. Ele constatou que sua atividade está submetida a variações sazonais, com um aumento considerável a partir do início da primavera, em abril, que também é a época dos casamentos.Hipocrisia social
Para o doutor Hajri, este fenômeno se explica, sobretudo, pelo aumento da idade média do casamento. Muitos jovens tunisianos de ambos os sexos mantêm relações pré-nupciais e ao se aproximar o dia do casamento, as mulheres recorrem à reconstrução do hímen.
Esta prática revela, segundo o sociólogo Tarek Belhadj Mohamed, a hipocrisia da sociedade, que se nega a admitir a mudança de hábitos de grande parte da população.
Em seu livro, "Virges? La Nouvelle Sexualité des Tunisiennes" (Virgens, a Nova Sexualidade das Tunisianas, em uma tradução livre), a psicanalista Nedra ben Smail afirma que "os médicos calculam que apenas 5% das jovens não se preocupam com a virgindade antes do casamento. Vinte por cento seriam constituídos por 'verdadeiras virgens' e três quartos são 'virgens medicamente assistidas'".
"O estilo de vida na Tunísia parece moderno e aberto, mas a realidade reflete o contrário: nossa sociedade e inclusive as elites se mostram tolerantes com relação à virgindade na teoria; mas quando o assunto lhes diz respeito, vira uma condição primordial para o casamento", afirma Tarek Belhadj Mohamed.
"A virgindade é um certificado de validade para a mulher, que na nossa sociedade só tem uma função sexual e reprodutiva, enquanto o homem deve 'treinar' para se mostrar sexualmente maduro ao se casar", acrescentou. A reconstrução do hímen, afirma, é um ato de "hipocrisia social e uma discriminação com as mulheres".
Sob pressão, é melhor mentir
Salima não diz nada diferente, mesmo a Tunísia sendo desde os anos 1950 o país árabe onde as mulheres têm mais direitos. A Constituição adotada em janeiro reconhece inclusiva a igualdade entre os sexos.
"A hipocrisia dos homens e da nossa sociedade me empurra para fazer a operação. Mas para mim, umas gotas de sangue não representam a honra de uma mulher", diz Salima. A jovem, que obviamente preferiu omitir seu sobrenome, também explicou que uma vez quis "jogar limpo" com um homem.
"Mas assim que soube, recusou o casamento e fez tudo o possível para me levar para a cama. Esta é a mentalidade dos homens: uma mulher que teve relações sexuais antes do casamento é apenas uma prostituta e não pode ser boa mãe!", lamenta. Sabra, de 27 anos, não pensa que "a virgindade seja garantia de fidelidade" e reivindica "o direito da mulher a uma vida sexual". No entanto, também prefere mentir e ceder à pressão social a ficar sozinha.
"Se eu tivesse dito ao meu marido que não era virgem, não teria aceitado se casar comigo e este é o caso de muitas mulheres na Tunísia", afirma.