Colesterol alto é um dos fatores que dificulta a gravidez
A conclusão é de cientistas dos Estados Unidos após acompanharem, durante quatro anos, 500 casais que tentavam ter um filho. Especialistas ponderam que os problemas de fertilidade costumam ter origem multifatorial
Bruna Sensêve - Correio Braziliense
Publicação:26/05/2014 14:00Atualização: 21/05/2014 10:17
Para muitos casais, o desejo de ter um bebê pode significar uma angustiante e longa espera entre inúmeras tentativas, até laboratoriais, nem sempre com resultado positivo. O encontro entre óvulo e espermatozoide, nesses casos, pode não ser tão direto e simples. A estrada abriga uma gama praticamente infinita de fatores capazes de dificultar a fecundação. Nessa conta, uma substância mais famosa em outras especialidades médicas começa a ganhar a atenção especial: o colesterol. Um estudo feito por pesquisadores do National Institutes of Health, da Universidade de Buffalo, e da Universidade de Emory, ambas nos Estados Unidos, mostra que casais com níveis mais elevados de colesterol levaram mais tempo para conseguir engravidar que aqueles com taxas normais da substância.
No trabalho, publicado hoje na versão on-line do Jornal de Endocrinologia e Metabologia Clínica, pouco mais de 500 casais com o desejo de engravidar foram acompanhados de 2005 a 2009. Eles faziam parte do Estudo Longitudinal de Investigação da Fertilidade (Life), criado para investigar a relação entre fertilidade e exposição a substâncias químicas ambientais e o estilo de vida. As voluntárias tinham entre 18 e 44 anos, e os homens mais de 18. Nenhum deles estava sob tratamento para infertilidade. Tinham em comum apenas o desejo de ter um bebê. O acompanhamento durou até a gravidez ou por um ano de tentativas. Foram fornecidas amostras de sangue regularmente para a medição do colesterol livre circulante.
Diferentemente do que é feito em outros exames de colesterol, no caso da busca pela interferência da quantidade dele na fertilidade de indivíduos, não é necessário diferenciá-lo entre os seus tipos: o HDL (conhecido como colesterol bom), o LDL (o colesterol ruim) e os triglicerídios. Segundo os pesquisadores, o colesterol no sangue pode estar relacionado com a fertilidade devido à maneira que o corpo o utiliza para fabricar os hormônios sexuais, como a testosterona e o estrogênio. Por esse motivo, saber a função de cada partícula não faz diferença — quesito essencial na busca por fatores de risco para doenças cardiovasculares, por exemplo.
Os cientistas calcularam a probabilidade de um casal conseguir engravidar levando em consideração uma estimativa entre a probabilidade da gestação a cada cinco ciclos e as concentrações de colesterol na corrente sanguínea. Entre os pares, 347 ficaram grávidos ao longo de 12 meses. Em média, os casais que não conseguiram iniciar a gestação também tinham as maiores taxas de colesterol livre. Quando apenas um dos membros do casal apresentava o colesterol alto, os maiores impactos estavam entre as mulheres. “Os nossos resultados sugerem que os casais que desejam alcançar a gravidez podem melhorar suas chances garantindo, primeiro, que seus níveis de colesterol estejam em uma faixa aceitável”, explica o principal autor do estudo, Enrique Schisterman, chefe de epidemiologia no Eunice’s Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development (NICHD).
Conclusão prematura
O colesterol é uma substância cerosa, semelhante à gordura encontrado em todas as células do corpo. É usado para fazer, por exemplo, hormônios e vitaminas. Altos níveis de colesterol arterial geralmente não causam quaisquer sinais ou sintomas, mas podem aumentar as chances de doenças cardíacas. Testes-padrão de colesterol solicitados pelos médicos normalmente avaliam a substância em termos de equilíbrio de HDL e LDL, sendo que uma baixa quantidade de HDL e uma alta de LDL significam um aumento do risco de males do coração. Embora os pesquisadores americanos não tenham avaliado a relação entre esses dois subtipos de colesterol, Schisterman ressalta que os altos níveis de colesterol livre são suscetíveis a indicar uma razão desfavorável entre HDL e LDL.
Clapauch explica que um aumento da circunferência abdominal feminina, uma característica da síndrome metabólica, pode estar associada à síndrome do ovário policístico. Isso porque a gordura do abdômen causa o aumento da insulina, que, por sua vez, aumenta os hormônios masculinos que causam o distúrbio. Por consequência, ela pode deixar de ovular. “No homem, a gordura aumenta a insulina que vai agir nos testículos, diminuindo os níveis de testosterona e a quantidade e a qualidade dos espermatozoides”, complementa.
De acordo com o especialista em reprodução humana e diretor médico da clínica Primordia Medicina Reprodutiva, Isaac Yadid, ultimamente, a busca por fatores que possam interferir na fertilidade é muito intensa. “Sem dúvida nenhuma, o colesterol é um substrato para a produção dos hormônios e existe uma influência nos níveis de estrogênio e no perfil lipídico. Consequentemente, a produção desses hormônios pode ficar alterada, uma vez que o colesterol está alterado. Com isso, temos uma menor utilização do colesterol na produção deficitária dessas pacientes que estão tentando produzir hormônios”, descreve Yadid, integrante da equipe responsável pelo primeiro bebê de proveta brasileiro e membro da American Fertility Society.
No entanto, o especialista também observa que, para provar que esse é um dos fatores que causam alterações deficitárias na ovulação, ainda é preciso de mais estudos. “O que a gente sabe é que as pacientes muito obesas ou sedentárias apresentam uma chance de desenvolver uma síndrome metabólica, mas porque sabemos que elas têm índice de massa corpórea extremamente elevado. Agora, existem outras condições que também alteram o perfil lipídico. No entanto, ele (o estudo americano) não fez essa avaliação.” Segundo Yadid, existem muitos fatores para essa confusão, mas o colesterol não é um dos exames usados para o diagnóstico rotineiro. “É uma luz que se acende, mas precisamos de um conhecimento mais largo disso. É preciso pesquisar nas pacientes na prática diária para saber se comprova ou não.”
Junção de riscos
Chamada anteriormente de síndrome X, é caracterizada pela associação de fatores de risco para as doenças cardiovasculares (ataques cardíacos e derrames cerebrais), vasculares periféricos e diabetes. Ela tem como base a resistência à ação da insulina, o que obriga o pâncreas a produzir mais esse hormônio. A síndrome metabólica é uma doença da civilização moderna, associada à obesidade, como resultado da alimentação inadequada e do sedentarismo.
Influência do sobrepeso
“Existe um número de variáveis que confundem bastante uma conclusão como a do estudo americano, por exemplo o aumento de mulheres acima do peso ideal. Temos dados de 2011 em que quase metade está em sobrepeso e, evidentemente, entre essas, também as que querem engravidar. Além do critério intrínseco a cada pessoa, temos a obesidade ou o tipo de dieta. Estamos lidando com uma população que, de antemão, sabemos que pode ter uma dificuldade para engravidar por causa do sobrepeso, que influencia em várias situações, também no colesterol. Por isso que o dado isolado do colesterol precisa ser visto com reserva. É possível que eles estejam estudando uma população já com sobrepeso. Sem dúvidas, é algo multifatorial. Não posso associar apenas o colesterol à dificuldade de engravidar. Dele saem os hormônios. Se há alguma alteração nessa oferta aos hormônios, a mulher passa a ovular de maneira menos adequada.”
Newton Eduardo Busso, presidente da Comissão de Reprodução Humana da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo)
No trabalho, publicado hoje na versão on-line do Jornal de Endocrinologia e Metabologia Clínica, pouco mais de 500 casais com o desejo de engravidar foram acompanhados de 2005 a 2009. Eles faziam parte do Estudo Longitudinal de Investigação da Fertilidade (Life), criado para investigar a relação entre fertilidade e exposição a substâncias químicas ambientais e o estilo de vida. As voluntárias tinham entre 18 e 44 anos, e os homens mais de 18. Nenhum deles estava sob tratamento para infertilidade. Tinham em comum apenas o desejo de ter um bebê. O acompanhamento durou até a gravidez ou por um ano de tentativas. Foram fornecidas amostras de sangue regularmente para a medição do colesterol livre circulante.
Diferentemente do que é feito em outros exames de colesterol, no caso da busca pela interferência da quantidade dele na fertilidade de indivíduos, não é necessário diferenciá-lo entre os seus tipos: o HDL (conhecido como colesterol bom), o LDL (o colesterol ruim) e os triglicerídios. Segundo os pesquisadores, o colesterol no sangue pode estar relacionado com a fertilidade devido à maneira que o corpo o utiliza para fabricar os hormônios sexuais, como a testosterona e o estrogênio. Por esse motivo, saber a função de cada partícula não faz diferença — quesito essencial na busca por fatores de risco para doenças cardiovasculares, por exemplo.
Os cientistas calcularam a probabilidade de um casal conseguir engravidar levando em consideração uma estimativa entre a probabilidade da gestação a cada cinco ciclos e as concentrações de colesterol na corrente sanguínea. Entre os pares, 347 ficaram grávidos ao longo de 12 meses. Em média, os casais que não conseguiram iniciar a gestação também tinham as maiores taxas de colesterol livre. Quando apenas um dos membros do casal apresentava o colesterol alto, os maiores impactos estavam entre as mulheres. “Os nossos resultados sugerem que os casais que desejam alcançar a gravidez podem melhorar suas chances garantindo, primeiro, que seus níveis de colesterol estejam em uma faixa aceitável”, explica o principal autor do estudo, Enrique Schisterman, chefe de epidemiologia no Eunice’s Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development (NICHD).
Conclusão prematura
O colesterol é uma substância cerosa, semelhante à gordura encontrado em todas as células do corpo. É usado para fazer, por exemplo, hormônios e vitaminas. Altos níveis de colesterol arterial geralmente não causam quaisquer sinais ou sintomas, mas podem aumentar as chances de doenças cardíacas. Testes-padrão de colesterol solicitados pelos médicos normalmente avaliam a substância em termos de equilíbrio de HDL e LDL, sendo que uma baixa quantidade de HDL e uma alta de LDL significam um aumento do risco de males do coração. Embora os pesquisadores americanos não tenham avaliado a relação entre esses dois subtipos de colesterol, Schisterman ressalta que os altos níveis de colesterol livre são suscetíveis a indicar uma razão desfavorável entre HDL e LDL.
Saiba mais...
Segundo a vice-presidente do Departamento de Endocrinologia feminina e Andrologia da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Ruth Clapauch, a associação direta entre colesterol e fertilidade pode ser prematura, pois outros fatores devem ter influência nessa contagem. “Esse estudo analisou somente os dados do colesterol, mas não foi a fundo no motivo de essa taxa estar elevada”, pondera. Condições como a síndrome metabólica e os ovários policísticos apresentam alteração do colesterol e triglicerídios com a dificuldade em engravidar. “A relação de causa e efeito não pode ser estabelecida no estudo. Não é por causa do colesterol que ela vai deixar de engravidar, pode ser reflexo de uma outra condição hormonal que tenha dificultado a gravidez. Também não vai ser suficiente resolver o colesterol para poder sanar o problema hormonal.”- Colesterol: é ou não é vilão?
- O bom colesterol também pode entupir artérias
- EUA questionam prescrição preventiva de remédios anticolesterol
- Como manter o colesterol sob controle?
- Mudanças na dieta tradicional do brasileiro favorecem colesterol alto
- Mulheres obesas recorrem à cirurgia bariátrica para engravidar
- Vitamina B3, usada para controlar colesterol, traz risco de morte
Clapauch explica que um aumento da circunferência abdominal feminina, uma característica da síndrome metabólica, pode estar associada à síndrome do ovário policístico. Isso porque a gordura do abdômen causa o aumento da insulina, que, por sua vez, aumenta os hormônios masculinos que causam o distúrbio. Por consequência, ela pode deixar de ovular. “No homem, a gordura aumenta a insulina que vai agir nos testículos, diminuindo os níveis de testosterona e a quantidade e a qualidade dos espermatozoides”, complementa.
De acordo com o especialista em reprodução humana e diretor médico da clínica Primordia Medicina Reprodutiva, Isaac Yadid, ultimamente, a busca por fatores que possam interferir na fertilidade é muito intensa. “Sem dúvida nenhuma, o colesterol é um substrato para a produção dos hormônios e existe uma influência nos níveis de estrogênio e no perfil lipídico. Consequentemente, a produção desses hormônios pode ficar alterada, uma vez que o colesterol está alterado. Com isso, temos uma menor utilização do colesterol na produção deficitária dessas pacientes que estão tentando produzir hormônios”, descreve Yadid, integrante da equipe responsável pelo primeiro bebê de proveta brasileiro e membro da American Fertility Society.
No entanto, o especialista também observa que, para provar que esse é um dos fatores que causam alterações deficitárias na ovulação, ainda é preciso de mais estudos. “O que a gente sabe é que as pacientes muito obesas ou sedentárias apresentam uma chance de desenvolver uma síndrome metabólica, mas porque sabemos que elas têm índice de massa corpórea extremamente elevado. Agora, existem outras condições que também alteram o perfil lipídico. No entanto, ele (o estudo americano) não fez essa avaliação.” Segundo Yadid, existem muitos fatores para essa confusão, mas o colesterol não é um dos exames usados para o diagnóstico rotineiro. “É uma luz que se acende, mas precisamos de um conhecimento mais largo disso. É preciso pesquisar nas pacientes na prática diária para saber se comprova ou não.”
Junção de riscos
Chamada anteriormente de síndrome X, é caracterizada pela associação de fatores de risco para as doenças cardiovasculares (ataques cardíacos e derrames cerebrais), vasculares periféricos e diabetes. Ela tem como base a resistência à ação da insulina, o que obriga o pâncreas a produzir mais esse hormônio. A síndrome metabólica é uma doença da civilização moderna, associada à obesidade, como resultado da alimentação inadequada e do sedentarismo.
“Existe um número de variáveis que confundem bastante uma conclusão como a do estudo americano, por exemplo o aumento de mulheres acima do peso ideal. Temos dados de 2011 em que quase metade está em sobrepeso e, evidentemente, entre essas, também as que querem engravidar. Além do critério intrínseco a cada pessoa, temos a obesidade ou o tipo de dieta. Estamos lidando com uma população que, de antemão, sabemos que pode ter uma dificuldade para engravidar por causa do sobrepeso, que influencia em várias situações, também no colesterol. Por isso que o dado isolado do colesterol precisa ser visto com reserva. É possível que eles estejam estudando uma população já com sobrepeso. Sem dúvidas, é algo multifatorial. Não posso associar apenas o colesterol à dificuldade de engravidar. Dele saem os hormônios. Se há alguma alteração nessa oferta aos hormônios, a mulher passa a ovular de maneira menos adequada.”
Newton Eduardo Busso, presidente da Comissão de Reprodução Humana da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo)