Homens se separam mais das mulheres quando elas adoecem, diz pesquisa
Estudo analisou 2.717 casais de idosos. Segundo especialistas, o abandono pode agravar o estado físico e psicológico delas
Correio Braziliense
Publicação:29/05/2014 11:40Atualização: 29/05/2014 10:51
Os laços construídos ao longo da vida parecem afrouxar justamente quando o corpo passa a sofrer mais com as complicações da idade. E geralmente são os homens que decidem cortar esses vínculos. A constatação é de um estudo feito na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos. Ao analisar 2.717 casais, cientistas concluíram que o risco de divórcio entre os mais velhos aumenta quando a esposa — e não o marido — fica doente. “As mulheres casadas com estado de saúde bem debilitado podem, ao mesmo tempo em que sofrem com o impacto da doença, experimentar o estresse do divórcio”, comenta Amelia Karraker, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Social da universidade e responsável pela investigação.
Karraker e o coautor do estudo, Kenzie Latham, da Universidade de Indiana, analisaram dados sobre as milhares de uniões copilados pelo Instituto de Pesquisa Social Americano desde 1992. O instituto começou a coletar informações sobre a saúde de cada casal quando pelo menos um dos parceiros tinha mais de 50 anos. A partir dos relatórios, os pesquisadores começaram a relacionar o aparecimento de quatro enfermidades consideradas graves e que tinham um alto grau de incidência dentro do grupo de pesquisa: câncer, problemas cardíacos, doenças pulmonares e acidente vascular cerebral (AVC). Os males foram relacionados com adversidades nos relacionamentos daqueles que haviam ficado doentes.
Os resultados mostraram que, de um modo geral, 31% das uniões terminaram em divórcio no período analisado, sendo que em 15% dos casos, a mulher ficou doente. Além disso, a incidência de novas enfermidades crônicas foi aumentando com o tempo, com mais maridos do que mulheres desenvolvendo problemas de saúde. A pesquisadora explica que as mulheres acabam sendo, diante dessa situação, duplamente vulneráveis à dissolução conjugal em face das complicações na saúde. “Elas são mais propensas a ficar viúvas a partir do fato de que são os maridos que ficam doentes com maior frequência. Agora, se quem ficar doente for a mulher, aumenta-se muito a possibilidade de que o relacionamento acabe em divórcio”, explica.
Influência social
Embora o estudo não tenha avaliado o porquê de o divórcio ser mais provável quando as mulheres ficam gravemente doentes, Karraker oferece algumas possíveis explicações ao fato. “As normas de gênero e as expectativas sociais sobre o que demanda o cuidado com o outro podem tornar mais difícil, para o homem, prestar cuidados ao cônjuge doente”, sugere.
Segundo Freitas, para o idoso, cujas preocupações muitas vezes giram em torno do provimento da família, essa situação pode ser desesperadora. “Além disso, a diferença de como a sociedade enxerga uma idosa separada e o ex-marido dela acaba fazendo com que os homens divorciados tenham mais escolhas, tanto de novas atividades quanto de potenciais parceiras.”
Ainda assim, a decisão de terminar a relação costuma partir delas, segundo as análises lideradas por Karraker. “A justificativa para isso pode ser o fato de que, quando as mulheres ficam doentes, os maridos não fazem um bom trabalho para cuidar delas, que acabam preferindo o apoio de amigos e familiares”, esclarece a pesquisadora.
Feliz contramão
Nair e José Santos Golvea, 71 e 68 anos, respectivamente, trilham um caminho distinto da estatística. A aposentada sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) há cinco anos, e o susto acabou por unir o casal, que, à época, passava por dificuldades no relacionamento. “Depois de 38 anos de casados, a gente estava meio distante um do outro. Quando eu tive o AVC, o José parece que se assustou com a possibilidade de ficar sem mim e não quis me largar mais”, conta Nair, que, em decorrência do derrame, teve o lado esquerdo do corpo parcialmente paralisado e perdeu parte da audição.
Os sintomas do problema vascular começaram a aparecer ainda em casa, com Nair sentindo náuseas e dores de cabeça. José, que estava na rua, foi encontrá-la no hospital e “desde então, não saiu do lado” da mulher. “A ideia de que um problema como esse tenha nos unido novamente pode parecer estranha, mas chega a me fazer agradecer por ter passado por isso. Não imagino como seria ficar a velhice distante do companheiro da minha vida”, declara-se a aposentada.
Dada a crescente preocupação com os custos de saúde resultantes do envelhecimento populacional, Cláudio Freitas acredita que é de vital importância que os legisladores estejam cientes dessa relação entre o agravamento da saúde e o risco de divórcio. “A oferta de serviços de apoio e especialização de cuidadores conjugais pode reduzir a tensão e evitar as separações em idades avançadas”, sugere o psicólogo.
Freitas alerta ainda que o impulso para encerrar a relação pode se dar por conta dos problemas de saúde, mas, na grande maioria das vezes, ficar sozinho não é uma boa opção para quem está doente. “Pode-se passar décadas e o relacionamento vai ter fases boas e ruins. Por isso, é importante avaliar bem a situação e não generalizar os casos. Continuar o casamento, contanto que a união seja saudável, é sempre a melhor opção”, afirma.
Em alta
No Brasil, o divórcio na terceira idade tem crescido mais do que a média em outras faixas etárias. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em quase 10 anos, houve um aumento de 9,1% no número de separações e divórcios no país: cerca de 441 mil em 1999 e 482 mil em 2008. Desse total, a quantidade de pessoas que decidiram encerrar o relacionamento quando tinham mais de 60 anos de idade passou de 14,3 mil para 25,5 mil — um aumento de 79%.
Sem solidão
Confira as dicas do geriatra José Luiz Santos para que o divórcio na terceira idade não o transforme em uma pessoa solitária ou infeliz
1. Faça a cabeça funcionar a mil: leituras, tapeçaria, palavras cruzadas e quebra-cabeças movimentam os neurônios, estimulam o cérebro e distraem
2. Namore muito: quando a mulher entra na menopausa, às vezes perde a motivação para a vida a dois. Se isso acontecer, procure ajuda para a adaptação a essa fase, que pode ser tão ou mais satisfatória que a juventude. O sexo deve ser cultivado sempre
3. Divirta-se mais: não perca convites para festas, bailes e encontros com amigos para jogar conversa fora. Essa parte social faz um bem enorme e evita que a depressão entre em cena e roube momentos preciosos de felicidade
4. Aceite as mudanças: depois do divórcio, a vida muda drasticamente. Depende de você se vai ser para pior ou melhor. A maneira mais eficiente de e adaptar a essa nova etapa é aceitar que nada vai ser como antes e admitir que haverá transformações
5. Procure ajuda profissional: se está difícil superar o rompimento, tente mudar de vida, de cidade, de endereço, reinvente-se. Quando todo o mais não der resultado, procure ajuda profissional
Segundo o estudo norte-americano, muitas mulheres se separam porque preferem ser cuidadas por amigos e familiares
Karraker e o coautor do estudo, Kenzie Latham, da Universidade de Indiana, analisaram dados sobre as milhares de uniões copilados pelo Instituto de Pesquisa Social Americano desde 1992. O instituto começou a coletar informações sobre a saúde de cada casal quando pelo menos um dos parceiros tinha mais de 50 anos. A partir dos relatórios, os pesquisadores começaram a relacionar o aparecimento de quatro enfermidades consideradas graves e que tinham um alto grau de incidência dentro do grupo de pesquisa: câncer, problemas cardíacos, doenças pulmonares e acidente vascular cerebral (AVC). Os males foram relacionados com adversidades nos relacionamentos daqueles que haviam ficado doentes.
Os resultados mostraram que, de um modo geral, 31% das uniões terminaram em divórcio no período analisado, sendo que em 15% dos casos, a mulher ficou doente. Além disso, a incidência de novas enfermidades crônicas foi aumentando com o tempo, com mais maridos do que mulheres desenvolvendo problemas de saúde. A pesquisadora explica que as mulheres acabam sendo, diante dessa situação, duplamente vulneráveis à dissolução conjugal em face das complicações na saúde. “Elas são mais propensas a ficar viúvas a partir do fato de que são os maridos que ficam doentes com maior frequência. Agora, se quem ficar doente for a mulher, aumenta-se muito a possibilidade de que o relacionamento acabe em divórcio”, explica.
Influência social
Embora o estudo não tenha avaliado o porquê de o divórcio ser mais provável quando as mulheres ficam gravemente doentes, Karraker oferece algumas possíveis explicações ao fato. “As normas de gênero e as expectativas sociais sobre o que demanda o cuidado com o outro podem tornar mais difícil, para o homem, prestar cuidados ao cônjuge doente”, sugere.
Saiba mais...
Psicólogo e professor da Universidade Federal de Goiás, Cláudio Freitas, especialista no acompanhamento de casais idosos, acredita que as diferenças entre os gêneros, os costumes e as aspirações individuais acabam prevalecendo com o passar da idade. “E isso costuma aflorar quando o cônjuge fica doente. Mas, para a mulher, que muitas vezes passou todo o casamento se dedicando ao marido e aos filhos, ter de cuidar do companheiro pode não ser uma mudança tão grande de realidade”, compara.Segundo Freitas, para o idoso, cujas preocupações muitas vezes giram em torno do provimento da família, essa situação pode ser desesperadora. “Além disso, a diferença de como a sociedade enxerga uma idosa separada e o ex-marido dela acaba fazendo com que os homens divorciados tenham mais escolhas, tanto de novas atividades quanto de potenciais parceiras.”
Ainda assim, a decisão de terminar a relação costuma partir delas, segundo as análises lideradas por Karraker. “A justificativa para isso pode ser o fato de que, quando as mulheres ficam doentes, os maridos não fazem um bom trabalho para cuidar delas, que acabam preferindo o apoio de amigos e familiares”, esclarece a pesquisadora.
Feliz contramão
Nair e José Santos Golvea, 71 e 68 anos, respectivamente, trilham um caminho distinto da estatística. A aposentada sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) há cinco anos, e o susto acabou por unir o casal, que, à época, passava por dificuldades no relacionamento. “Depois de 38 anos de casados, a gente estava meio distante um do outro. Quando eu tive o AVC, o José parece que se assustou com a possibilidade de ficar sem mim e não quis me largar mais”, conta Nair, que, em decorrência do derrame, teve o lado esquerdo do corpo parcialmente paralisado e perdeu parte da audição.
Os sintomas do problema vascular começaram a aparecer ainda em casa, com Nair sentindo náuseas e dores de cabeça. José, que estava na rua, foi encontrá-la no hospital e “desde então, não saiu do lado” da mulher. “A ideia de que um problema como esse tenha nos unido novamente pode parecer estranha, mas chega a me fazer agradecer por ter passado por isso. Não imagino como seria ficar a velhice distante do companheiro da minha vida”, declara-se a aposentada.
Dada a crescente preocupação com os custos de saúde resultantes do envelhecimento populacional, Cláudio Freitas acredita que é de vital importância que os legisladores estejam cientes dessa relação entre o agravamento da saúde e o risco de divórcio. “A oferta de serviços de apoio e especialização de cuidadores conjugais pode reduzir a tensão e evitar as separações em idades avançadas”, sugere o psicólogo.
Freitas alerta ainda que o impulso para encerrar a relação pode se dar por conta dos problemas de saúde, mas, na grande maioria das vezes, ficar sozinho não é uma boa opção para quem está doente. “Pode-se passar décadas e o relacionamento vai ter fases boas e ruins. Por isso, é importante avaliar bem a situação e não generalizar os casos. Continuar o casamento, contanto que a união seja saudável, é sempre a melhor opção”, afirma.
Em alta
No Brasil, o divórcio na terceira idade tem crescido mais do que a média em outras faixas etárias. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em quase 10 anos, houve um aumento de 9,1% no número de separações e divórcios no país: cerca de 441 mil em 1999 e 482 mil em 2008. Desse total, a quantidade de pessoas que decidiram encerrar o relacionamento quando tinham mais de 60 anos de idade passou de 14,3 mil para 25,5 mil — um aumento de 79%.
Sem solidão
Confira as dicas do geriatra José Luiz Santos para que o divórcio na terceira idade não o transforme em uma pessoa solitária ou infeliz
1. Faça a cabeça funcionar a mil: leituras, tapeçaria, palavras cruzadas e quebra-cabeças movimentam os neurônios, estimulam o cérebro e distraem
2. Namore muito: quando a mulher entra na menopausa, às vezes perde a motivação para a vida a dois. Se isso acontecer, procure ajuda para a adaptação a essa fase, que pode ser tão ou mais satisfatória que a juventude. O sexo deve ser cultivado sempre
3. Divirta-se mais: não perca convites para festas, bailes e encontros com amigos para jogar conversa fora. Essa parte social faz um bem enorme e evita que a depressão entre em cena e roube momentos preciosos de felicidade
4. Aceite as mudanças: depois do divórcio, a vida muda drasticamente. Depende de você se vai ser para pior ou melhor. A maneira mais eficiente de e adaptar a essa nova etapa é aceitar que nada vai ser como antes e admitir que haverá transformações
5. Procure ajuda profissional: se está difícil superar o rompimento, tente mudar de vida, de cidade, de endereço, reinvente-se. Quando todo o mais não der resultado, procure ajuda profissional