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Açúcar das frutas pode causar intolerância e afetar pessoas com doença rara; entenda

Intolerância à frutose causa problemas intestinais, dores abdominais e até aumento de peso

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Luciane Evans Publicação:11/06/2014 16:00Atualização:11/06/2014 15:59
Depois de 20 anos em busca de explicações para seu mal-estar, Ricardo Leão descobriu a intolerância a frutas (Jair Amaral/EM/D.A Press)
Depois de 20 anos em busca de explicações para seu mal-estar, Ricardo Leão descobriu a intolerância a frutas
Sempre apontadas como grandes aliadas para uma alimentação saudável e defendidas como supra-sumo para uma dieta equilibrada, as frutas começam a ser questionadas pela medicina e já são vistas como vilãs para muitos casos. Isso porque, em algumas pessoas, elas podem acarretar problemas para o intestino e atrapalhar, inclusive, processos de emagrecimento. A raiz do problema está na intolerância do organismo à frutose, mal que nem sempre é detectado com facilidade, e o paciente, que dificilmente vai suspeitar dos riscos que uma fruta pode oferecer, passa a conviver com dores abdominais, diarreias e tantos outros sintomas característicos da intolerância alimentar.

O dentista Ricardo Leão, de 58 anos, levou duas décadas para encontrar esse diagnóstico. Sempre atento com a própria a alimentação, ele consumia frutas e legumes certo de que estava fazendo o melhor para a saúde. Mas, há 20 anos, passou a se sentir muito mal, com cólicas e diarreias. “Fiz exames para intolerância a glúten e lactose, passei por colonoscopia e até tive um diagnóstico para síndrome do intestino irritado. Mas isso era subjetivo demais e nada resolvia. Foi quando uma homeopata desconfiou da frutose”, conta. A frutose é um monossacarídeo (açúcar simples), que o corpo pode usar para produzir energia. Ela está presente em muitos alimentos, mas o principal sãos as frutas e o mel.

Segundo explica a gastroenterologista especialista em doenças funcionais Vera Lúcia Ângelo Andrade, há no organismo um receptor para a frutose, que se chama Glut -5, responsável por fazer com que o intestino absorva esse açúcar que recebe. “É como se fosse uma porta de entrada para ele, porém, com o passar dos anos, esse receptor pode ser perdido e não funcionar 100%”, afirma. Foi o que ocorreu com Ricardo, ele já não tinha mais o Glut-5 e, por isso, seu organismo não absorvia a frutose que consumia. De acordo com Vera Lúcia, quando o intestino não faz essa absorção, o que permanece é atacado por bactérias. Ela explica que a frutose é absorvida pelo intestino e transportada pelo Glut-5 até cair na circulação sanguínea, quando segue para ser metabolizada no fígado, mas, quando Glut-5 não funciona, ela permanece no órgão intestinal. “Temos cerca de 1,5 quilo de bactérias em nosso intestino. Quando a frutose não é processada, essa flora bacteriana se alimenta dela e libera hidrogênio, que vai sendo absorvido pelo organismo e chegando aos pulmões.”

Por isso, uma das maneiras de diagnosticar a intolerância é por meio do sopro do paciente. Trata-se de um aparelho que mede a quantidade de hidrogênio no ar expelido pela boca. “Geralmente, damos frutose ao paciente e, em seguida, ele sopra o cano do aparelho e detectamos a quantidade de hidrogênio nos pulmões”, explica Vera. Foi assim que Ricardo descobriu que tinha a intolerância. “Nunca imaginei que as frutas me fariam mal. Elas foram proibidas na minha dieta e, atualmente, só posso consumir limão. Como tive dificuldades de encontrar um nutricionista que trabalhasse esse assunto, foi preciso sair de Belo Horizonte e me tratar em São Paulo, por médicos da Universidade de São Paulo (USP). Lá, eles retiraram toda a fruta da minha alimentação e, hoje, estou bem melhor, cheguei a perder 12 quilos”, conta.

As frutas com mais frutose são a maçã, a pera e o caqui (veja quadro), além disso, alimentos industrializados também a contêm. “A frutose é 30% mais doce do que o açúcar normal. Por isso, é usada pela indústria em muitos produtos”, afirma Vera. Para a médica, as pessoas que correm mais riscos com a intolerância são os vegetarianos e veganos, que “acabam retirando de suas dietas alimentos muito importantes e consumindo mais frutas”. “Além disso, eles usam o sorbitol (adoçante), o que aumenta ainda mais a frutose no organismo. E se você tem um excesso de frutose no intestino, há mais gases e um supercrescimento bacteriano do intestino delgado, um mal que é tratado somente com antibióticos”, esclarece a gastroenterologista. Vera Lúcia tem percebido, por estudos de fora do Brasil e também por sua experiência em consultório que a intolerância a frutose ocorre, geralmente, próximo aos 40 anos, quando o Glut-5 começa “a envelhecer”. “Adolescentes não comem frutas, a gente começa a comê-las depois dos 30. Essa pode ser uma explicação”, sugere.
Clique para ampliar e entender o problema (Arte: EM / DA Press)
Clique para ampliar e entender o problema

EMAGRECIMENTO
Doutor em medicina bioquímica pela Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e nutricionista, Lupércio Cançado Farah costuma definir a frutose como “doce vilão”, e diz que a substância, além das frutas, está também nos legumes. “Esse açúcar, quando não absorvido, provoca uma inflamação nas células e aumenta a produção de radicais livres, o que pode causar câncer”, alerta, comentando que muitas pessoas retiram alimentos da dieta, apostando que comer só frutas pode ser benéfico para a saúde e isso não adianta para o emagrecimento, podendo até comprometê-lo. “Sabe quando você malha e aquela barriga não desaparece? Pode ser que haja aí uma intolerância a frutose”, avisa. O único fruto apontado pelos especialistas como permitido para uma alimentação saudável é o abacate, que já foi tido como vilão para o colesterol, mas hoje é apontado como ideal em uma dieta balanceada. Lupércio diz que o melhor, no caso da intolerância, é diminuir aos poucos a quantidade de frutas na alimentação.

CRIANÇAS
Outra má fama para as frutas está em uma doença rara ligada à intolerância a frutose. Trata-se da frutosemia, uma enfermidade hereditária, que geralmente ocorre nos primeiros anos de vida. Foi assim com Davi Melo, filho da pediatra baiana Andréa Melo. “Até os três meses e meio, ele só se alimentava de leite materno. Quando dei a ele o primeiro suco, que foi de melancia, ele passou mal: vomitou, ficou muito ‘molinho’. Tentei o suco de carambola, e ele apresentou uma crise convulsiva, provavelmente por hipoglicemia. Na época, nem imaginávamos que seria por causa da ingestão de frutas. Ele apresentava vômitos, dor abdominal, diarreia, assaduras e havia estacionado o seu crescimento”, conta Andréa.

Davi desenvolveu um aumento do fígado, e foi aí que passou por uma bateria de exames, incluindo biópsia hepática. “Ele estava com um acúmulo de gordura no fígado e teve alterações das enzimas hepáticas e triglicerídeos elevadíssimos. A frutosemia foi revelada por meio do exame genético.” No caso dessa doença, a enzima que metaboliza a frutose no fígado, a aldolase B, está ausente ou diminuída. “É uma doença genética”, afirma Andréa, dizendo que o tratamento é dietético e consiste em uma dieta sem frutose, sacarose e sorbitol, que será adotada por toda a vida.

“Ainda há dificuldade em acharmos informações em tabelas sobre a quantidade de frutose nos alimentos, o que é de grande importância para calcular a quantidade mínima que o paciente pode ingerir em alimentos, como arroz e macarrão. Leite, queijo, ovos, carnes são completamente livres de frutose. A maioria das referências usadas é de outros países, e fatores como clima e solo podem interferir na quantidade de frutose encontrada nos alimentos”, acrescenta a pediatra.

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