Passado de mãe para filha, consumo de chá também ser feito com cuidado

Passado de geração para geração ou descoberto a partir da curiosidade, o consumo do chá faz bem, mas, como tudo na vida, os exageros podem provocar o efeito contrário

Diminuir Fonte Aumentar Fonte Imprimir Corrigir Notícia Enviar
Lilian Monteiro - Estado de Minas Publicação:29/06/2014 08:01Atualização:28/06/2014 18:35
A fotógrafa Sandra Arruda toma chá diariamente há 15 anos. Além de ter horta em casa, ela sempre recorre ao Mercado Central para comprar erva (Jair Amaral / EM / DA Press)
A fotógrafa Sandra Arruda toma chá diariamente há 15 anos. Além de ter horta em casa, ela sempre recorre ao Mercado Central para comprar erva
De gerações distintas, mas com sabedoria para escolher o chá como a bebida que vai auxiliá-las na busca do bem-estar, numa vida mais saudável, na atenção com a saúde e numa forma de aquecer a alma, a fotógrafa Sandra Arruda e a dona de casa Maria Aparecida Baião, de 84 anos, têm nessa mistura de água, frutas, hortaliças e ervas a combinação perfeita para momentos de prazer e relaxamento.

Maria Aparecida conta que cresceu vendo a mãe preparando chás. “Aprendi desde criança que ele faz bem à saúde. Na minha casa tinha horta com variedade de ervas. São tantos os benefícios que o chá faz parte do meu dia a dia.” Ela conta que gosta tanto, que fica até complicado dizer qual não pode faltar. “São muitos, mas os que mais bebo são os de hortelã, que é antibiótico; o de erva-cidreira, para acalmar; o de boldo, quando como algo que não me faz bem; e o de alecrim, quando sinto um aperto no coração e me sinto angustiada.”

Como o chá se tornou um hábito, introduzido de forma natural na sua vida, Maria Aparecida explica que tomá-lo a faz sentir bem. “Sei que as plantas ajudam muito em nossa saúde. Como minha mãe me ensinou, na minha casa sempre tenho plantado no quintal hortelã, boldo, capim-cidreira, alecrim e salsa.” Conhecedora de ervas, ela faz questão de destacar as folhas de uma planta chamada viuvinha. “Dissolve os cálculos renais. Acaba com todas as pedras.”

Mãe de oito filhos, com 17 netos e três bisnetos, o hábito de oferecer um chá quentinho é conhecido por todos da família. Sempre que alguém está indisposto ou com algum mal-estar, lá está “dona Aparecida” levando uma xícara com algum chá. E talvez o uso dos chás seja um dos colaboradores para ela ter uma vida tão ativa. “Sou independente e tenho iniciativa.” Ela não é de esperar ninguém para fazer as coisas. “Quando vemos, ela já pegou e fez”, revela a filha Stela.

Aos 84 anos, Maria Aparecida Baião assistiu à mãe ensinando que chá faz bem à saúde e hoje aquece o coração de toda a família com a bebida (Jair Amaral / EM / DA Press)
Aos 84 anos, Maria Aparecida Baião assistiu à mãe ensinando que chá faz bem à saúde e hoje aquece o coração de toda a família com a bebida
Maria Aparecida é o exemplo de senhora que, em meio à vida corrida, à modernidade e a tanto desenvolvimento, cultua a tradição do velho e conhecido chazinho da vovó, que cura não só pelo poder contido nas ervas, mas também pelo carinho e cuidado que aquela xícara de chá representa.

Já Sandra Arruda conta que há 15 anos passou a tomar chá diariamente. Não se lembra ao certo como começou, mas que o primeiro passo foi a curiosidade pelos chás medicinais. Ela tinha um livro, gostava de pesquisar e, se sentia algum mal-estar, recorria a ele. Sandra tem horta em casa e o hábito de comprar ervas no Mercado Central .

A fotógrafa revela que viveu alguns estágios na introdução do chá na sua alimentação. “Adoro cozinhar e comecei a fazer chá com mistura de ervas. Ficava gostoso e ia buscando cada vez mais sabores. Essa foi a primeira etapa. Na segunda, depois de estudar mais, descobri que não era boa essa mistura, que uma erva pode tirar o efeito da outra. Chá não é leve, faz efeito no corpo. Então, passei a usar uma de cada vez. Antes, fazia uma alquimia de coisas, sem muita consciência. Agora, tomo o cuidado para escolher uma erva só para ter o efeito que desejo.” Sandra lembra que se tornou “uma aventureira do chá”, já que curte acampar e tem sempre na mochila uma chaleira acompanhando-a. Não pode faltar.

O terceiro estágio de Sandra com o chá, o atual, é ter decidido tomar diariamente o chá verde. “Não uso mais os medicinais. O chá verde é o que traz os melhores benefícios, além de me dar harmonia.” Ela avisa que chá é para ser tomado “quente e sem açúcar. Aliás, adoçá-lo é um sacrilégio. O chá é suave, o açúcar é forte e vai destruir o sabor”.

GRIPE
Sandra até aceita usar mel, mas só em dias de gripe. Nesse caso, ela indica um pouco de mel, limão e gengibre. “Mas, graças a Deus, é raro eu adoecer. Então, meu chá é por puro prazer. Na verdade, gostaria de tomar mais. No entanto, minha vida corrida me impede.”

A fotógrafa enfatiza outro ponto a favor do chá: ele é um meio de consumir mais água. “Tomo café só pela manhã para me despertar. O resto do dia, se me dá vontade de beber algo tem de ser chá. Sem falar que, além de bom para a saúde, passo a ingerir mais água. Com chá, meu corpo realmente funciona melhor, me traz conforto. E posso tomar o quanto quiser. Como o chá verde tem cafeína, tomo mais pela manhã e à tarde. À noite, acho gostoso e saudável investir num mix com camomila.”

Enio Cardillo: 'Os chás verde e preto têm as substâncias mais benéficas' (Beto Novaes/EM/D.A Press)
Enio Cardillo: 'Os chás verde e preto têm as substâncias mais benéficas'
O poder dos antioxidantes

“Chá não é alimento mágico. É preciso cautela”, palavras sábias de quem tem conhecimento de sobra, o nutrólogo Enio Cardillo Vieira, ex-professor de bioquímica da UFMG, com doutorado pela Universidade de Tulane, Nova Orleans, EUA, com tese sobre a utilização de purinas na biossíntese do ácido fólico. Ao mesmo tempo, ele exalta as qualidades da bebida. “As frutas e hortaliças presentes no chá têm fitoquímicos/fitonutrimentos que promovem a saúde e evitam doenças crônicas degenerativas, como câncer, infarto e diabetes. Isso ocorre por causa das substâncias antioxidantes que impedem a formação de radicais livres gerados pelo organismo por causa da ação do oxigênio, que aumenta o risco de outras doenças, como aterosclerose e muitas outras.” Ele explica que o oxigênio é uma molécula agressiva, tanto que uma lata na natureza em pouco tempo está enferrujada. “Não achamos ferro na natureza, mas óxido de ferro. O oxigênio é essencial, mas o efeito é deletério. Temos de nos defender e uma das armas é o consumo de frutas e hortaliças.”

Enio Cardillho avisa que o chá verde e o preto são os melhores “porque têm as substâncias mais benéficas”. Se alguém fica preocupado com a cafeína, ele avisa que ela não faz mal. “A cafeína existe, principalmente no café. Nos chás verde e o preto, a concentração maior é de teobromina e teofilina. O importante é saber que o chá faz bem por causa das substâncias protetoras, principalmente as antioxidantes.”

O médico afirma que não há mal em temperar o chá, com açúcar, mel ou adoçante. “Açúcar é fonte de energia e nenhum desses produtos anular seus benefícios. Agora, não é açúcar com chá. Tomo sem adoçar por questão de paladar, assim como bebo café e limonada sem açúcar.” Apesar de apontar o verde e preto como os principais, ele enfatiza que todas as frutas, hortaliças e ervas estão liberadas. “A literatura já tem isolada, de frutas e hortaliças, mais de 100 mil substâncias químicas diferentes que têm papel fundamental na promoção da saúde.”

IDEAL
O chá natural é sempre apontado como o ideal. No entanto, Enio Cardillo assegura que o chá industrializado, seja o de caixinha (sachê) ou o de garrafa, também vai ter efeito benéfico. “As substâncias não são destruídas, seja no processamento térmico ou nos demais. O problema é que a nutrição é muito sujeita a tabus. Se a vida está corrida, se falta tempo para colher uma erva ou comprá-la fresca no mercado, não precisa abrir mão do chá. Pode pôr o sachê na xícara, adicionar água quente e saboreá-lo com qualidade.”

PELO MUNDO
Na Índia: o chá é popular e servido quente, com leite e açúcar. Quase todo o chá consumido é do tipo preto.
Na China: o chá é objeto de festas de degustação e de grande estudo, comparável ao que se faz hoje com o vinho. Até o cuidado com o recipiente próprio para beber é respeitado (tijelas de cerâmica).
No Japão: no início do século 12, começou a cerimônia do chá japonesa, que tomou sua forma final no século 16. Há um ritual com cerimônia superimportante.
Na Grã-Bretanha: o chá não é só o nome de uma bebida, mas também uma refeição leve no final da tarde. O famoso chá das 17h.
No Sri Lanka: o chá é servido no estilo inglês, com leite e açúcar, mas o leite sempre é aquecido.

COMENTÁRIOS

Os comentários são de responsabilidade exclusiva dos autores.