Preparar para envelhecer »

Medicina preventiva é fundamental para garantir qualidade de vida aos idosos

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Publicação:07/09/2014 09:25Atualização:07/09/2014 09:39

Aos 87 anos, Júlia Maria Lisboa é cheia de vitalidade e conta que não depende de ninguém para fazer as coisas em casa
 (Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Aos 87 anos, Júlia Maria Lisboa é cheia de vitalidade e conta que não depende de ninguém para fazer as coisas em casa


Envelhecimento ativo: processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança de forma a melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas. O conceito proposto pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é condição para um envelhecimento positivo, pois permite que as pessoas percebam o seu potencial para o bem-estar físico, social e mental ao longo da vida, permitindo que participem da sociedade de acordo com suas necessidades, desejos e capacidades, ao mesmo tempo em que propicia proteção, segurança e cuidados adequados, quando necessários.

Para a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), ativo refere-se à participação contínua nas questões sociais, econômicas, culturais, espirituais e civis, e não somente à capacidade de estar fisicamente ativo ou de fazer parte da força de trabalho. As pessoas mais velhas que se aposentam e aquelas que apresentam alguma doença ou vivem com alguma necessidade especial podem continuar a contribuir ativamente para seus familiares, companheiros, comunidades e países. Há muitos idosos não só à frente da casa, mas responsáveis por algo ainda maior.

Uma inversão de papéis marca o envelhecimento de Augusta de Souza, de 84 anos. Numa idade em que os filhos começam a cuidar dos pais, é ela a segurança de Antônio Augusto, de 51, o filho único que por uma deficiência é considerado incapaz. “Minha vida é cuidar do Antônio”, conta a aposentada, que teve uma vida privada de recursos. Viúva desde 1975, depois de um casamento que durou apenas 15 anos, ela diz nunca ter tido medo de envelhecer. “Não tive infância e aprendi cedo que temos que saber envelhecer. Acho que isso me ajudou nesse sentido, de aceitar a velhice”, conta.
Augusta de Souza, de 84 anos, cuida do filho único, que tem deficiência, e diz que nunca teve medo de envelhecer  (Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Augusta de Souza, de 84 anos, cuida do filho único, que tem deficiência, e diz que nunca teve medo de envelhecer

Ela também não esperava chegar à idade que tem hoje. Sonhou, sim, em fazer 15 anos. “Vivia esperando esse aniversário, mas quando chegou eu estava colhendo arroz na roça e minha mãe fez um almoço especial: frango com quiabo”, relembra. A vida sempre difícil ameniza os problemas de envelhecer em um país que pouco olha para seu idoso. Mas responsável pelas compras e pelos afazeres de casa, ela teme o dia em que não puder cuidar do filho. “Não tenho a opção de desanimar”, desabafa a aposentada, que quer cuidar, mas não ser cuidada. “O dia EM que precisar de banho quero que me coloquem no asilo.”

PROJETO

O objetivo do envelhecimento ativo é aumentar a expectativa de uma vida saudável e a qualidade de vida para todas as pessoas que estão envelhecendo, inclusive as que são frágeis, fisicamente incapacitadas e que requerem cuidados. Por isso, em um projeto de envelhecimento ativo, as políticas e programas que promovem saúde mental e relações sociais são tão importantes quanto aquelas que melhoram as condições físicas de saúde. Manter a autonomia e A independência durante o processo de envelhecimento, portanto, é uma meta fundamental para indivíduos e governantes.

Mas estamos muito distantes do envelhecimento ideal. Segundo Ana Cristina Nogueira Borges, presidente da seção Minas Gerais da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, os países desenvolvidos têm medicina preventiva e conseguem fazer um melhor controle de doenças crônico-degenerativas. Mas por aqui a medicina ainda é muito curativa e só se procura um geriatra quando já se está doente. “Essa visão, contudo, parece que começa a mudar. As pessoas estão se conscientizando para a importância de se preparar para o envelhecimento”, comemora.

O problema é que o Brasil, na opinião da geriatra, ainda não tem uma modalidade de assistência para o idoso.  “Ou ele vai para uma unidade onde passa o dia, ou para uma instituição de longa permanência. Precisamos melhorar o suporte ao idoso que se mantém em sua moradia”, defende a especialista. Para ela, não é a idade que determina a capacidade ou não de esse idoso permanecer em casa, e sim seu contexto de saúde. “É muito difícil achar idoso com mais de 80 anos sem problema de saúde, mas uma pessoa pode ser hipertensa, cuidar-se ao longo da vida e ter um envelhecimento ativo”, explica.

Eles querem liberdade

Não há como generalizar, mas o idoso que preocupa por morar sozinho é aquele que tem dificuldade de andar, depressão e comprometimento da memória. “Se ele mantém a funcionalidade não tem problema, mas é preciso ter um suporte da família se tiver uma idade mais avançada”, defende Ana Cristina. Hoje, é mais comum que o próprio idoso tome consciência de que é possível viver só. “Existia um preconceito. Pensava-se que quem envelhece tem que ficar dentro de casa, com os filhos tomando as decisões. Mas isso está mudando”, completa Maria Alice de Vilhena Toledo, vice-presidente da SBGG.

Alguns querem simplesmente permanecer na casa em que criaram os filhos. Outros fogem da ideia de depender de outros para viver. Mas não é porque são idosos em idade avançada que eles deixaram de querer algo que é valor desde a juventude: liberdade. “Liberdade para acordar e tomar banho na hora que eu quiser, sem ter que me preocupar se estou acordando alguém. Liberdade de ir aonde quero e na hora em que quero. Liberdade também de não precisar dizer onde estou”, defende Júlia Maria Lisboa, com 87 anos difíceis de acreditar.

Desde que ficou viúva, há 26 anos, Júlia já morou sozinha, com os filhos e até na casa dos filhos, mas, para ela, nada se compara à experiência de ser dona do próprio canto. “Gosto de morar na minha casa porque quero liberdade. Minha família não tem que gostar do mesmo que eu, nem tem que fazer as coisas para mim. Lavo, passo e cozinho. Se estou com preguiça faço um mexido e vou levando a vida, bacana. Vou à igreja todo dia e visito minhas amigas. Nunca na vida tive quem me ajudasse. Então, se preciso de alguma coisa saio e compro. Deus me deu pernas e sabedoria para isso”, defende.

 

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