Dia Mundial da Trombose lembra o perigo de uma doença que mata 1 milhão de pessoas por ano

Despreparo de profissionais de saúde no diagnóstico e tratamento também dificultam diagnóstico

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Augusto Pio - Estado de Minas Maryna Lacerda - Enviada Especial - CB Publicação:13/10/2014 10:00Atualização:13/10/2014 11:09
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Em todo o mundo, milhões de vidas são perdidas e bilhões de dólares gastos para tratar e cuidar dos indivíduos acometidos pela trombose. E ainda é expressiva a desinformação sobre a doença, por incrível que pareça, até entre os profissionais de saúde. Segunda-feira é celebrado o Dia Mundial da Trombose, que pretende conscientizar o público principalmente sobre a trombose venosa profunda (TVP), que acomete as veias dos membros inferiores e é causa da embolia pulmonar, potencialmente fatal se não diagnosticada em tempo. A data foi definida pela Sociedade Internacional de Hemostasia e Trombose e é a primeira vez que se promove o evento no mundo, que prevê várias ações informativas e educativas.

“A incidência da TVP é de um caso para cada mil pessoas e a frequência de embolia pulmonar de 60 a 70 casos para cada 100 mil habitantes. De acordo com estudos científicos, a TVP é responsável pela morte de 1 milhão de pessoas todos os anos, sendo cerca de 300 mil nos Estados Unidos e 544 mil na Europa. Estes dados podem ser ainda maiores nos casos dos pacientes idosos submetidos à cirurgia ortopédica de grande porte, como de quadril e joelho, não submetidos à prevenção adequada. Nestes casos, a trombose chega a atingir de 40% a 60% dos pacientes, ou seja, metade dos pacientes pode desenvolver TVP e 1% pode ter embolia pulmonar”, alerta o presidente da regional mineira da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular, Francesco Evangelista Botelho.

A trombose é a presença de coágulos nos vasos (artérias ou veias) e o tromboembolismo uma das três principais causas de morte no mundo, depois do infarto do miocárdio e do acidente vascular encefálico (derrame). Bruno Naves, diretor de publicações da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV) salienta que existem três fatores principais da TVP: estase venosa, que é a diminuição do fluxo venoso, lesão da parede da veia, normalmente devido a traumas, e alterações da coagulação do sangue. “As tromboses acontecem em sua grande maioria nos membros inferiores. Dependendo do tamanho da veia acometida, a circulação venosa do membro acometido fica obstruída, causando tanto maior desconforto quanto maior for a veia. Este trombo dentro da veia pode aumentar e migrar para cima em direção ao pulmão, levando a um quadro de embolia pulmonar, que se não tratado, pode ser fatal. Além disso, depois da trombose, a parede da veia acometida fica lesada causando um mal funcionamento desta veia e, após um período de até dois anos pode levar ao aparecimento de varizes, edema crônico, úlceras venosas, eczema varicoso e pigmentação de cor ocre na perna.

Cristiana Lacerda, que sobreviveu a uma embolia pulmonar, pede mais conscientização sobre o problema  (Cristiana Lacerda/Arquivo Pessoal )
Cristiana Lacerda, que sobreviveu a uma embolia pulmonar, pede mais conscientização sobre o problema


Botelho esclarece que a embolia é consequência da TVP e ocorre, principalmente, quando a trombose acomete os grandes vasos dos membros inferiores. Já a trombofilia, é uma condição genética ou adquirida, que determina alterações na composição que favorecem a formação de coágulos. É uma causa importante de trombose arterial e venosa. Botelho detalha que a detecção precoce, a administração de medicamentos e a realização de procedimentos cirúrgicos apresentam bons resultados na prevenção da embolia pulmonar e na preservação da integridade funcional do membro acometido.

Sim, diagnosticada e tratada com rapidez (o tratamento é de no mínimo três meses), a TVP pode ter cura, mas se demorar pode evoluir para várias complicações, esclarece a hematologista e professora do departamento de clínica médica do departamento de Medicina da UFMG, Suely Meireles Rezende (leia mais sobre ela na retranca). Um dos problemas reside neste diagnóstico, que tem que ser muito específico, e nem sempre é de fácil acesso, ressalta. Para diagnosticar a embolia pulmonar, o exame mais recomendado é a angiotomografia computadorizada do pulmão. No caso da trombose profunda (os sintomas são inchação da batata da perna, endurecimento e esquentamento do local), é necessário um exame chamado dímero D e o duplex scan (ultrassom capaz de visualizar a trombose na veia).

Se há problemas na detecção e diagnóstico, o tratamento hoje é facilitado por medicamentos via oral, com substâncias recentemente aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Bruno Naves, diretor de publicações da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV) cita a rivaroxabana, que facilita muito o tratamento da trombose (há ainda a apixabana e dabigatrana). “Na grande maioria dos casos podemos fazer o tratamento domiciliar, com controles de sangue menos frequentes e com dieta livre, diferente dos tratamentos anteriores, que ainda hoje utilizamos, mas que necessitam de medicação injetável e depois de acompanhamento com exames de sangue muito frequentes, restrições alimentares muito limitantes e interações medicamentosas importantes. Enfim, um grande avanço neste tratamento.”

A vida por um fio
Acometida por embolia pulmonar no mês passado, a bancária Cristiana Rodrigues Lacerda, de 51 anos, casada, três filhos, conta ter sentido sintomas muito parecidos com uma gripe. “É mais comum sentir dores torácicas e muita falta de ar. Eu senti cansaço e tive tosse, mas nunca podia imaginar que estava tendo uma embolia”, conta ela. Cristiana foi ao hospital, mas o profissional que a atendeu não identificou a embolia – achou que era broncossinusite, prescreveu antibiótico e cortizona e a mandou levar vida normal. Cristiana se sentiu melhor, viajou para o Rio de Janeiro, foi a baladas, dançou. Ao voltar, estava ainda mais cansada e com falta de ar. Foi quando, ao voltar ao hospital, submetida a um exame de sangue específico e a à angiotomografia computadorizada, finalmente a embolia foi diagnosticada. “Estamos ainda investigando a razão, mas provavelmente foi uma trombose que eu tive por causa de um repouso prolongado por cólica renal, e o coágulo de sangue subiu ao pulmão”, diz ela, devidamente medicada. A irmã, relata, tem trombofilia, então esta também pode ter sido a causa da embolia. Cristiana se considera uma pessoa de extrema sorte. O que mais a incomoda é a falta de informação sobre o assunto, inclusive sobre a relação entre viagens aéreas e tromboses, principalmente para quem já tem fator de risco.

Membro do conselho-diretor da Sociedade Internacional de Hemostasia e Trombose, entidade que promove mundialmente o evento, a médica Suely Meireles Rezende, de 49 anos, estará com mais uma professora e grupos de alunos fazendo campanha em Belo Horizonte na Feira de Artesanato na Afonso Pena e na Avenida Bandeirantes hoje, das 10 às 12h. Amanhã, haverá aula gratuita na Faculdade de Medicina sobre o tema, das 11h30 às 12h45. Em São Paulo, também haverá mobilização amanhã na Avenida Paulista.

Há mais de 20 anos estudando o tema, Suely foi, ela mesma vítima de uma embolia pulmonar ao voltar de uma viagem de avião. Ela desmaiou por três minutos e sentiu extrema falta de ar. As médicas que a atenderam em Guarulhos disseram que ela estava “nervosa”. Expert que era, Suely foi conduzindo a situação, mas acabou indo parar no CTI com embolia pulmonar bilateral (nos dois pulmões), gravíssima. “Em 4 a 5 mil casos de trombose, 1 caso pode evoluir para embolia depois de viagens aéreas”, explica ela. E ainda ninguém sabe esclarecer muito bem porque isso acontece. O que é absurdo, de acordo com Suely, é a despreocupação das empresas aéreas brasileiras com o tema: “Não há nenhuma orientação, diferentemente do que acontece com várias companhias estrangeiras.”

Confundida com sinusite
Vítima de uma embolia pulmonar no mês passado, Cristiana Rodrigues Lacerda, 51 anos, conta ter sentido sintomas muito parecidos com os de uma gripe. “É mais comum ter dores torácicas e muita falta de ar. Senti cansaço e tive tosse, mas nunca podia imaginar que estava tendo uma embolia”, relata. A bancária foi ao hospital, mas o profissional que a atendeu não identificou a embolia — achou que era sinusite, prescreveu antibiótico e cortizona e a mandou voltar à vida normal.

Cristiana se sentiu melhor, viajou para o Rio de Janeiro, foi a baladas, dançou. Ao voltar, estava ainda mais cansada e com falta de ar. Foi quando, ao retornar ao hospital, submetida a um exame de sangue específico e à angiotomografia computadorizada, teve a embolia diagnosticada. “Estamos ainda investigando a razão, mas provavelmente foi uma trombose que eu tive por causa de um repouso prolongado por cólica renal, o coágulo de sangue subiu ao pulmão”, diz.

Integrante do conselho-diretor da Sociedade Internacional de Hemostasia e Trombose, a médica Suely Meireles Rezende, 49 anos, estuda o tema há mais de 20 anos e foi uma vítima da embolia pulmonar ao voltar de uma viagem de avião. Ela desmaiou por três minutos e sentiu extrema falta de ar. As médicas que a atenderam em Guarulhos (São Paulo) disseram que ela estava “nervosa”.

Suely acabou indo parar na unidade de tratamento intensivo (UTI) de um hospital com embolia pulmonar bilateral (nos dois pulmões) gravíssima. “Em 4 a 5 mil casos de trombose, um pode evoluir para embolia depois de viagens aéreas”, explica. Segundo a especialista, ninguém sabe esclarecer muito bem por que isso acontece. O que é absurdo, de acordo com Suely, é a despreocupação das empresas aéreas brasileiras com o tema. “Não há nenhuma orientação, diferentemente do que acontece com várias companhias estrangeiras”, critica.
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