Testes mostram que 'gás do riso' reduz sintomas da depressão em pacientes
A inalação de óxido nitroso, substância usada em consultórios odontológicos, é esperança para o tratamento da doença psiquiátrica
Vilhena Soares - Correio Braziliense
Publicação:19/12/2014 11:27Atualização: 19/12/2014 11:42
Para testar os efeitos do gás do riso, os cientistas selecionaram 20 pacientes com depressão e que não apresentavam melhora com tratamentos tradicionais. Os voluntários se submeteram a um teste em duas fases. Em uma, receberam mistura de gás composto por metade de oxigênio e metade de óxido nitroso. Em outra, um placebo. Após duas horas de cada sessão e também no dia seguinte, os participantes foram questionados sobre a intensidade dos sintomas. Dezessete relataram melhora. Três não sentiram qualquer efeito. “Embora alguns pacientes também tenham declarado se sentir melhor depois de respirar o gás placebo, ficou claro que o padrão geral observado foi de que o óxido nitroso melhorou a depressão além do placebo”, disse Charles Conway, professor associado de psiquiatria da Universidade de Washington e um dos autores do trabalho
Para Conway, o grande ganho do experimento foi a melhora apresentada em pouco tempo após o uso do gás. “A maioria dos pacientes relatou se sentir melhor duas horas depois do tratamento com óxido nitroso. Um efeito muito adiantado se compararmos com o de antidepressivos orais, que, em média, demoram duas semanas para exercer os efeitos benéficos.”
A observação é a mesma feita por Thiago Blanco, psiquiatra do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), que não participou do estudo. “A pesquisa mostra dados interessantes para a área psiquiátrica. O efeito rápido de euforia abre caminho para novas oportunidades terapêuticas, já que um dos problemas no tratamento de casos graves de depressão é a demora para que os remédios façam efeito.”
Blanco acredita que se o gás do riso passar a ser usado clinicamente contra a depressão, ele funcionará como uma ferramenta auxiliar. “Ao tratar rapidamente, evitamos que a pessoa sofra com sintomas mais graves, como pensamentos suicidas, trazendo, assim, mais segurança. Os remédios usados para combater a depressão já são muito eficazes. Essa possível nova estratégia pode funcionar como um complemento”, acredita. Segundo ele, a quetamina e, possivelmente, o gás nitroso agem em um receptor do cérebro chamado NMDA, ligado a neurotransmissores importantes para o equilíbrio do corpo, como a serotonina. “Ambos têm um grande potencial, mas é necessário analisar mais cuidadosamente em trabalhos com número maior de pacientes.”
Rafael Boechat, psiquiatra do Hospital Universitário da Universidade de Brasília (UnB), alerta que algumas dessas substâncias causam efeitos semelhantes ao de ácidos ingeridos de forma recreativa, e estão envolvidas em problemas psiquiátricos, como psicoses, quando usadas em excesso. “Por muito tempo, temos visto esses testes com cautela, tomando o cuidado para que, em vez de tratar, não agravemos a situação do paciente”, explica.
Os autores do trabalho, publicado na Biological Psychiatry, concordam com a ideia de experimentos mais abrangentes com óxido nitroso. Eles planejam testar diferentes concentrações do gás do riso para avaliar como cada uma influencia os sintomas da depressão. “Pretendemos encontrar o melhor regime de dosagem olhando para um grupo maior de pacientes. É uma surpresa que ninguém nunca pensou em usar uma droga que faz as pessoas rirem como tratamento de pacientes cujo principal sintoma é a tristeza em excesso”, destaca Peter Nagele.
Tatiana Mourão: psiquiatra e professora da UFMG
Um desafio médico
“A pesquisa envolvendo novas moléculas para o tratamento da depressão ainda é um desafio para os pesquisadores da área farmacológica. O óxido nitroso pode ajudar em tratamentos, mas ainda não existem dados suficientes, com estudos bem fundamentados, que indiquem que ele é eficaz. Sempre é importante pesquisar moléculas para o tratamento farmacológico dos transtornos mentais, mas cabe ressaltar que estudos com metodologias adequadas e número adequado de pacientes devem ser feitos antes de a substância ser autorizada para o uso clínica.”
Pesquisadores dos EUA testaram a inalação de óxido nitroso em 20 pacientes. Duas horas depois, 85% relataram melhoras nos sintomas da doença. Especialistas ressaltam que a técnica precisa ser mais estudada. Clique na imagem para ampliá-la e saiba mais.
Saiba mais...
Uma substância anestésica usada em consultórios odontológicos pode ser a esperança no tratamento da depressão. O óxido nitroso – o gás do riso – foi testado em pessoas que sofrem com o distúrbio psiquiátrico e, segundo cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington, nos EUA, amenizou quase que imediatamente sintomas como tristeza e pensamentos suicidas em 85% deles. Outro anestésico — quetamina — é também estudado com o mesmo objetivo, o que abriu portas para os experimentos com o óxido nitroso. “Presumimos que eles têm algum mecanismo de ação semelhante”, justificou Peter Nagele, professor assistente de anestesiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington e autor principal do novo experimento.- Alterações na voz podem ser indicativo de depressão, diz pesquisa
- Mortes por depressão crescem 705% em 16 anos no Brasil
- Confundida com tristeza, depressão atinge 30% da população brasileira
- Morte de Robin Williams: por que as pessoas criativas são mais propensas à depressão?
- Doenças físicas crônicas podem desencadear depressão
- Anvisa aprova genérico para depressão e dores crônicas
- Pesquisas revelam que o açafrão ajuda no combate à depressão
Para testar os efeitos do gás do riso, os cientistas selecionaram 20 pacientes com depressão e que não apresentavam melhora com tratamentos tradicionais. Os voluntários se submeteram a um teste em duas fases. Em uma, receberam mistura de gás composto por metade de oxigênio e metade de óxido nitroso. Em outra, um placebo. Após duas horas de cada sessão e também no dia seguinte, os participantes foram questionados sobre a intensidade dos sintomas. Dezessete relataram melhora. Três não sentiram qualquer efeito. “Embora alguns pacientes também tenham declarado se sentir melhor depois de respirar o gás placebo, ficou claro que o padrão geral observado foi de que o óxido nitroso melhorou a depressão além do placebo”, disse Charles Conway, professor associado de psiquiatria da Universidade de Washington e um dos autores do trabalho
Para Conway, o grande ganho do experimento foi a melhora apresentada em pouco tempo após o uso do gás. “A maioria dos pacientes relatou se sentir melhor duas horas depois do tratamento com óxido nitroso. Um efeito muito adiantado se compararmos com o de antidepressivos orais, que, em média, demoram duas semanas para exercer os efeitos benéficos.”
A observação é a mesma feita por Thiago Blanco, psiquiatra do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), que não participou do estudo. “A pesquisa mostra dados interessantes para a área psiquiátrica. O efeito rápido de euforia abre caminho para novas oportunidades terapêuticas, já que um dos problemas no tratamento de casos graves de depressão é a demora para que os remédios façam efeito.”
Blanco acredita que se o gás do riso passar a ser usado clinicamente contra a depressão, ele funcionará como uma ferramenta auxiliar. “Ao tratar rapidamente, evitamos que a pessoa sofra com sintomas mais graves, como pensamentos suicidas, trazendo, assim, mais segurança. Os remédios usados para combater a depressão já são muito eficazes. Essa possível nova estratégia pode funcionar como um complemento”, acredita. Segundo ele, a quetamina e, possivelmente, o gás nitroso agem em um receptor do cérebro chamado NMDA, ligado a neurotransmissores importantes para o equilíbrio do corpo, como a serotonina. “Ambos têm um grande potencial, mas é necessário analisar mais cuidadosamente em trabalhos com número maior de pacientes.”
Rafael Boechat, psiquiatra do Hospital Universitário da Universidade de Brasília (UnB), alerta que algumas dessas substâncias causam efeitos semelhantes ao de ácidos ingeridos de forma recreativa, e estão envolvidas em problemas psiquiátricos, como psicoses, quando usadas em excesso. “Por muito tempo, temos visto esses testes com cautela, tomando o cuidado para que, em vez de tratar, não agravemos a situação do paciente”, explica.
Os autores do trabalho, publicado na Biological Psychiatry, concordam com a ideia de experimentos mais abrangentes com óxido nitroso. Eles planejam testar diferentes concentrações do gás do riso para avaliar como cada uma influencia os sintomas da depressão. “Pretendemos encontrar o melhor regime de dosagem olhando para um grupo maior de pacientes. É uma surpresa que ninguém nunca pensou em usar uma droga que faz as pessoas rirem como tratamento de pacientes cujo principal sintoma é a tristeza em excesso”, destaca Peter Nagele.
Tatiana Mourão: psiquiatra e professora da UFMG
Um desafio médico
“A pesquisa envolvendo novas moléculas para o tratamento da depressão ainda é um desafio para os pesquisadores da área farmacológica. O óxido nitroso pode ajudar em tratamentos, mas ainda não existem dados suficientes, com estudos bem fundamentados, que indiquem que ele é eficaz. Sempre é importante pesquisar moléculas para o tratamento farmacológico dos transtornos mentais, mas cabe ressaltar que estudos com metodologias adequadas e número adequado de pacientes devem ser feitos antes de a substância ser autorizada para o uso clínica.”