Famílias cobram da Anvisa promessa sobre informações de alergênicos nos rótulos dos produtos
Prazo para regulamentação venceu em 2014
Fernanda Penna Borges - Estado de Minas
Publicação:02/03/2015 12:02Atualização: 02/03/2015 13:05
A repercussão da iniciativa surpreendeu, ante mais de 3.500 comentários feitos pelos internautas, a maioria pessoas físicas. No entanto, passados oito meses, representantes do movimento reclamam que a regulamentação ainda não foi aprovada pelo órgão. A insistência na importância da rotulagem aumenta, tendo em vista o fato de que muitos rótulos trazem nomenclatura técnica, dificultando a leitura: caseinatos, albumina e lecitina, por exemplo, indicam a presença de leite, ovo e soja, respectivamente.
“Se esse dado estivesse no rótulo, muitos acidentes poderiam ser evitados”, diz a advogada e doutora em direito constitucional pela PUC/SP Maria Cecilia Cury Chaddad. Ela coordena a campanha, que já conta com quase 80 mil seguidores no Facebook, entre eles personalidades como Zico, Gusttavo Lima, Tony Belotto, Adriana Esteves, Reynaldo Gianecchini, entre outros. Em recente post, Bela Gil, apresentadora e chefe especializada em alimentação natural, também ratificou sua posição e apoio. “Alergia é grave e deve ser respeitada e tratada como um assunto sério e de urgência! #Repost @poenorotulo”, disse.
Segundo Cecília Chaddad, a ideia surgiu a partir da troca de informações on-line de mais de 700 famílias cujos filhos têm alergia alimentar. O grupo resolveu criar o movimento com o objetivo de conscientizar a sociedade sobre os riscos que a falta de informações nos rótulos pode trazer. Dependendo do grau de sensibilidade, o alérgico pode ter choque anafilático, fechamento da glote, além de outras reações graves que podem levar à morte.
Segundo a agência, assim que a proposta fosse apresentada, as contribuições da sociedade seriam avaliadas e a expectativa era de que a norma fosse publicada ainda em 2014, o que não ocorreu. A Anvisa informou a Cecília que os comentários do debate público já foram analisados e o tema será levado à diretoria para avaliação.
Ela é mãe de Rafael, de 3 anos, que tem alergia a leite e a soja e nunca consumiu amendoim, oleaginosas e crustáceos por serem altamente alergênicos. Enquanto o assunto não é decidido, os brasileiros que convivem com alergia alimentar precisam lidar com a pouca informação na hora das compras. É o caso da gestora de turismo Ana Paula de Melo Couto, mãe de Rafael Couto Lobo Leite, de 9 anos, alérgico a clara do ovo. São rotineiras as dificuldades que ela e o pai de Rafael, Arnaldo Lobo Leite, encontram para decifrar as substâncias contidas nos produtos em geral. “Os nomes são difíceis de ser compreendidos e eu já deixei de comprar por receio”, disse.
Segundo Ana Paula Couto, a alergia de Rafael foi descoberta aos nove meses, quando ele tocou um suspiro com as mãos. Desde então, a mãe passou a tomar mais cuidados, como substituir o produto por outros itens que não contêm clara de ovo. “Quando ele era pequeno eu avisava às pessoas e às escolas. Hoje, ele mesmo já faz o alerta”, explica. A advogada mineira Carla Maia, mãe de Mila, de seis meses, que tem alergia a proteína do leite, ovo e soja, conta que os serviços de atendimento ao consumidor (SAC) da indústria alimentícia estão despreparados para lidar com a alergia alimentar. “Queremos a alteração da lei no sentido de tornar mais clara, sem nomes técnicos, a informação”, disse.
Atraso no Brasil
Pesquisa realizada pela Unidade de Alergia e Imunologia do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) mostrou que 39,5% reações alérgicas estavam relacionadas a erros na leitura de rótulos dos produtos. Além disso, cerca de 10% da população brasileira tem alergia a algum tipo de alimento, segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai). No Brasil, cerca de 8% das crianças (aproximadamente 5 milhões) e 3% dos adultos têm esse problema alimentar e vivem reféns de rótulos com pouca ou nenhuma informação.
Procurada pelo Estado de Minas, a Anvisa informou que o regulamento encontra-se em fase de análise jurídica da proposta final para posterior aprovação pela Diretoria Colegiada da Anvisa – Dicol. Os fabricantes terão prazo para adequar os rótulos às determinações.
De acordo com a proposta, os rótulos dos produtos deverão apresentar as informações “Alérgicos: Contém (nomes das fontes)” ou “Alérgicos: Contém derivados de (nomes das fontes)”, conforme o caso. A presença ou ausência de glúten também deverá ser indicada. Nos Estados Unidos, as indústrias são obrigadas a prestar esse tipo de informação desde 2000; na União Europeia, Austrália e Nova Zelândia, desde 2003, e no Canadá, desde 2011.
FIQUE POR DENTRO
Problemas indicados pelas famílias envolvidas na campanha
» Decifrar os ingredientes em meio às letras minúsculas para buscar identificar se há algum alérgeno
» Conhecer as diversas nomenclaturas (caseina/caseinato significam presença de leite,
por exemplo)
» Não há informações nos rótulos dos produtos sobre riscos
de traços de alérgenos
Tipos de alergia alimentar
» Algumas pessoas alérgicos, cujas reações são rápidas e severas, correm riscos de morrer, de
sofrer choque anafilático e fechamento de glote, entre
outras reações graves
» Há um grupo que manifesta reações tardias, que ocorrem dias depois da ingestão do alimento. Apesar de não ser fatal, como no caso acima, é igualmente preocupante, porque o diagnóstico correto depende da observância da dieta prescrita. Os sintomas vão de vômitos, refluxo e sangue nas fezes a cólicas, intestino preso ou diarreia, baixo ganho de peso, entre outros
O dia a dia
» A alergia não é bem entendida e aceita por muitas pessoas, que consideram as reações fruto de exagero ou não se preocupam com elas. Mas, para um alérgico, não importa se é uma migalha ou uma porção, o resultado pode ser catastrófico, levando, inclusive, em vários casos, à morte em decorrência de choque anafilático. Apesar da gravidade, diferentemente do que tem sido veiculado, não há necessidade de que a pessoa com alergia, seja alimentar ou outro tipo, fique reclusa e não conviva em sociedade.
Serviços de atendimento das indústrias estão despreparados, para a advogada Carla Maia, mãe de Mila
Saiba mais...
A mobilização de um grupo de mães para tornar obrigatória a inclusão de informações claras sobre a presença de alimentos alergênicos, que têm substâncias capazes de provocar alergia, ou de traços deles nos rótulos dos produtos vem chamando a atenção para um problema grave de saúde. O movimento já pressiona as autoridades. A indústria, hoje, só é obrigada a anunciar a presença de glúten, conforme a Lei 10.674/2003. No entanto, atenta à campanha lançada nas redes sociais Põe no Rótulo, com a hashtag #poenorotulo, criada no ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) promoveu debate público sobre a rotulagem desses produtos e publicou uma proposta de regulamentação do assunto.A repercussão da iniciativa surpreendeu, ante mais de 3.500 comentários feitos pelos internautas, a maioria pessoas físicas. No entanto, passados oito meses, representantes do movimento reclamam que a regulamentação ainda não foi aprovada pelo órgão. A insistência na importância da rotulagem aumenta, tendo em vista o fato de que muitos rótulos trazem nomenclatura técnica, dificultando a leitura: caseinatos, albumina e lecitina, por exemplo, indicam a presença de leite, ovo e soja, respectivamente.
“Se esse dado estivesse no rótulo, muitos acidentes poderiam ser evitados”, diz a advogada e doutora em direito constitucional pela PUC/SP Maria Cecilia Cury Chaddad. Ela coordena a campanha, que já conta com quase 80 mil seguidores no Facebook, entre eles personalidades como Zico, Gusttavo Lima, Tony Belotto, Adriana Esteves, Reynaldo Gianecchini, entre outros. Em recente post, Bela Gil, apresentadora e chefe especializada em alimentação natural, também ratificou sua posição e apoio. “Alergia é grave e deve ser respeitada e tratada como um assunto sério e de urgência! #Repost @poenorotulo”, disse.
Segundo Cecília Chaddad, a ideia surgiu a partir da troca de informações on-line de mais de 700 famílias cujos filhos têm alergia alimentar. O grupo resolveu criar o movimento com o objetivo de conscientizar a sociedade sobre os riscos que a falta de informações nos rótulos pode trazer. Dependendo do grau de sensibilidade, o alérgico pode ter choque anafilático, fechamento da glote, além de outras reações graves que podem levar à morte.
Segundo a agência, assim que a proposta fosse apresentada, as contribuições da sociedade seriam avaliadas e a expectativa era de que a norma fosse publicada ainda em 2014, o que não ocorreu. A Anvisa informou a Cecília que os comentários do debate público já foram analisados e o tema será levado à diretoria para avaliação.
Ana Paula e o pai de Rafael, Arnaldo Leite, já deixaram, por receio, de comprar produtos para o filho, alérgico a clara de ovo
Segundo Ana Paula Couto, a alergia de Rafael foi descoberta aos nove meses, quando ele tocou um suspiro com as mãos. Desde então, a mãe passou a tomar mais cuidados, como substituir o produto por outros itens que não contêm clara de ovo. “Quando ele era pequeno eu avisava às pessoas e às escolas. Hoje, ele mesmo já faz o alerta”, explica. A advogada mineira Carla Maia, mãe de Mila, de seis meses, que tem alergia a proteína do leite, ovo e soja, conta que os serviços de atendimento ao consumidor (SAC) da indústria alimentícia estão despreparados para lidar com a alergia alimentar. “Queremos a alteração da lei no sentido de tornar mais clara, sem nomes técnicos, a informação”, disse.
Atraso no Brasil
Pesquisa realizada pela Unidade de Alergia e Imunologia do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) mostrou que 39,5% reações alérgicas estavam relacionadas a erros na leitura de rótulos dos produtos. Além disso, cerca de 10% da população brasileira tem alergia a algum tipo de alimento, segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai). No Brasil, cerca de 8% das crianças (aproximadamente 5 milhões) e 3% dos adultos têm esse problema alimentar e vivem reféns de rótulos com pouca ou nenhuma informação.
Procurada pelo Estado de Minas, a Anvisa informou que o regulamento encontra-se em fase de análise jurídica da proposta final para posterior aprovação pela Diretoria Colegiada da Anvisa – Dicol. Os fabricantes terão prazo para adequar os rótulos às determinações.
De acordo com a proposta, os rótulos dos produtos deverão apresentar as informações “Alérgicos: Contém (nomes das fontes)” ou “Alérgicos: Contém derivados de (nomes das fontes)”, conforme o caso. A presença ou ausência de glúten também deverá ser indicada. Nos Estados Unidos, as indústrias são obrigadas a prestar esse tipo de informação desde 2000; na União Europeia, Austrália e Nova Zelândia, desde 2003, e no Canadá, desde 2011.
FIQUE POR DENTRO
Problemas indicados pelas famílias envolvidas na campanha
» Decifrar os ingredientes em meio às letras minúsculas para buscar identificar se há algum alérgeno
» Conhecer as diversas nomenclaturas (caseina/caseinato significam presença de leite,
por exemplo)
» Não há informações nos rótulos dos produtos sobre riscos
de traços de alérgenos
Tipos de alergia alimentar
» Algumas pessoas alérgicos, cujas reações são rápidas e severas, correm riscos de morrer, de
sofrer choque anafilático e fechamento de glote, entre
outras reações graves
» Há um grupo que manifesta reações tardias, que ocorrem dias depois da ingestão do alimento. Apesar de não ser fatal, como no caso acima, é igualmente preocupante, porque o diagnóstico correto depende da observância da dieta prescrita. Os sintomas vão de vômitos, refluxo e sangue nas fezes a cólicas, intestino preso ou diarreia, baixo ganho de peso, entre outros
O dia a dia
» A alergia não é bem entendida e aceita por muitas pessoas, que consideram as reações fruto de exagero ou não se preocupam com elas. Mas, para um alérgico, não importa se é uma migalha ou uma porção, o resultado pode ser catastrófico, levando, inclusive, em vários casos, à morte em decorrência de choque anafilático. Apesar da gravidade, diferentemente do que tem sido veiculado, não há necessidade de que a pessoa com alergia, seja alimentar ou outro tipo, fique reclusa e não conviva em sociedade.