Pesquisa ajuda a entender por que algumas pessoas não sentem dor
Mutações em segmento de DNA fazem com que alguns humanos não sintam o desconforto físico. A descoberta poderá ajudar no desenvolvimento de novas formas de alívio
Correio Braziliense
Publicação:09/06/2015 11:00Atualização: 09/06/2015 11:56
A percepção da dor é um mecanismo de alerta evolutivo, que avisa sobre os perigos no ambiente e sobre os potenciais danos a tecidos do corpo. Alguns indivíduos nascem, contudo, com uma rara condição: são incapazes de senti-la. Essas pessoas acumulam diversas lesões justamente por não perceberem os incômodos. Isso faz com que, geralmente, tenham uma expectativa de vida mais curta.
Usando um mapeamento genético detalhado, os cientistas, divididos em dois grupos, analisaram o perfil de DNA de 11 famílias europeias e asiáticas afetadas com a condição hereditária conhecida como insensibilidade congênita à dor. Isso permitiu a eles encontrarem a causa dessa característica nas variantes do gene PRDM12. Membros das famílias que tinham o problema carregavam duas cópias da mutação. Contudo, se herdavam apenas uma cópia, não eram afetados.
As equipes, então, analisaram biópsias de nervos retirados dos pacientes incapazes de sentir dor e descobriram que, neles, faltava um grupo particular de neurônios. Os cientistas imaginaram que deveria haver um bloqueador da produção desses neurônios durante o desenvolvimento do embrião — eles confirmaram a hipótese usando uma combinação de estudos em modelos de ratos e sapos, e em células-tronco humanas pluripotentes (estruturas da pele que são tratadas para voltar ao estágio de indiferenciação e, em seguida, se transformarem em quase todos os tipos celulares do corpo).
Epigenética
O gene PRDM12 havia sido previamente associado à modificação da cromatina, uma pequena molécula que se une ao DNA e age como interruptor para ligar e desligar a atividade dos genes — um efeito conhecido como epigenética. Os pesquisadores mostraram que todas as variantes genéticas do PRDM12 nos pacientes de insensibilidade congênita à dor bloqueiam a função do gene. Como a cromatina é particularmente importante durante a formação de células especializadas, isso fornece uma possível explicação para o fato de os neurônios sensíveis à dor não se formarem normalmente em pessoas que nascem com essa rara condição.
“A habilidade de sentir dor é essencial para nossa autopreservação, embora nossa compreensão sobre isso seja bem maior quanto ao excesso de dor do que quanto à ausência”, diz Geoff Woods, professor do Instituto de Pesquisa Médica da Universidade de Cambridge. “Ambas são importantes para o desenvolvimento de novos tratamentos de dor — se soubermos os mecanismos que estão por trás da sensação, poderemos controlar e reduzir a dor desnecessária”, observa.
O PRDM12 é apenas o quinto gene relacionado à falta de percepção de dor a ter sido identificado até agora. Contudo, dois dos anteriormente já levaram ao desenvolvimento de novos medicamentos antidor que estão sob teste clínico (com pacientes humanos). “Estamos muito esperançosos de que esse novo gene seja um excelente candidato para o desenvolvimento de remédios, particularmente dado o sucesso recente de drogas que têm como alvo os reguladores de cromatina em doenças humanas”, acrescentou Ya-Chun Chen, principal autor do estudo. “Isso poderá beneficiar tanto aqueles que estão em perigo devido à falta da percepção da dor, quanto ajudar no desenvolvimento de novos tratamentos”, afirmou.
Câncer agressivo
Um outro avanço recente nessa área ocorreu no mês passado. Estudiosos da Universidade de Toronto descobriram o gatilho genético por trás da mais severa forma de dor em pacientes oncológicos. Em um artigo publicado na revista Pain, David Lam apontou o gene TMPRSS2 como culpado. Esse gene também está por trás do câncer de cabeça e pescoço, que afeta mais de 550 mil pessoas por ano e, de acordo com estudos, está entre os tipos mais dolorosos. Em seu estudo, Lam identificou que a mesma variante está fortemente associada às formas agressivas dos tumores na próstata. Segundo o pesquisador, esse gene, visível na superfície das células cancerosas, entra em contato com os receptores de dor do corpo humano, o que desencadeia o desconforto. Quanto maior a quantidade de TMPRSS2 nos receptores de dor, mais forte é a sensação provocada.
Sinal de autopreservação, a dor tem cinco genes identificados
Saiba mais...
Um gene essencial para a produção de neurônios sensíveis à dor em humanos foi identificado por uma equipe internacional de pesquisadores liderados pela Universidade de Cambridge, no Reino Unido. A descoberta, relatada no jornal Nature Genetics, pode ter implicações para o desenvolvimento de novos métodos de alívio da dor, disseram os autores do estudo. A dor crônica é um problema que acomete 20% da população mundial. No Brasil, estudos identificaram prevalências ainda maiores: de 30% a 50%.A percepção da dor é um mecanismo de alerta evolutivo, que avisa sobre os perigos no ambiente e sobre os potenciais danos a tecidos do corpo. Alguns indivíduos nascem, contudo, com uma rara condição: são incapazes de senti-la. Essas pessoas acumulam diversas lesões justamente por não perceberem os incômodos. Isso faz com que, geralmente, tenham uma expectativa de vida mais curta.
Usando um mapeamento genético detalhado, os cientistas, divididos em dois grupos, analisaram o perfil de DNA de 11 famílias europeias e asiáticas afetadas com a condição hereditária conhecida como insensibilidade congênita à dor. Isso permitiu a eles encontrarem a causa dessa característica nas variantes do gene PRDM12. Membros das famílias que tinham o problema carregavam duas cópias da mutação. Contudo, se herdavam apenas uma cópia, não eram afetados.
As equipes, então, analisaram biópsias de nervos retirados dos pacientes incapazes de sentir dor e descobriram que, neles, faltava um grupo particular de neurônios. Os cientistas imaginaram que deveria haver um bloqueador da produção desses neurônios durante o desenvolvimento do embrião — eles confirmaram a hipótese usando uma combinação de estudos em modelos de ratos e sapos, e em células-tronco humanas pluripotentes (estruturas da pele que são tratadas para voltar ao estágio de indiferenciação e, em seguida, se transformarem em quase todos os tipos celulares do corpo).
Epigenética
O gene PRDM12 havia sido previamente associado à modificação da cromatina, uma pequena molécula que se une ao DNA e age como interruptor para ligar e desligar a atividade dos genes — um efeito conhecido como epigenética. Os pesquisadores mostraram que todas as variantes genéticas do PRDM12 nos pacientes de insensibilidade congênita à dor bloqueiam a função do gene. Como a cromatina é particularmente importante durante a formação de células especializadas, isso fornece uma possível explicação para o fato de os neurônios sensíveis à dor não se formarem normalmente em pessoas que nascem com essa rara condição.
“A habilidade de sentir dor é essencial para nossa autopreservação, embora nossa compreensão sobre isso seja bem maior quanto ao excesso de dor do que quanto à ausência”, diz Geoff Woods, professor do Instituto de Pesquisa Médica da Universidade de Cambridge. “Ambas são importantes para o desenvolvimento de novos tratamentos de dor — se soubermos os mecanismos que estão por trás da sensação, poderemos controlar e reduzir a dor desnecessária”, observa.
O PRDM12 é apenas o quinto gene relacionado à falta de percepção de dor a ter sido identificado até agora. Contudo, dois dos anteriormente já levaram ao desenvolvimento de novos medicamentos antidor que estão sob teste clínico (com pacientes humanos). “Estamos muito esperançosos de que esse novo gene seja um excelente candidato para o desenvolvimento de remédios, particularmente dado o sucesso recente de drogas que têm como alvo os reguladores de cromatina em doenças humanas”, acrescentou Ya-Chun Chen, principal autor do estudo. “Isso poderá beneficiar tanto aqueles que estão em perigo devido à falta da percepção da dor, quanto ajudar no desenvolvimento de novos tratamentos”, afirmou.
Câncer agressivo
Um outro avanço recente nessa área ocorreu no mês passado. Estudiosos da Universidade de Toronto descobriram o gatilho genético por trás da mais severa forma de dor em pacientes oncológicos. Em um artigo publicado na revista Pain, David Lam apontou o gene TMPRSS2 como culpado. Esse gene também está por trás do câncer de cabeça e pescoço, que afeta mais de 550 mil pessoas por ano e, de acordo com estudos, está entre os tipos mais dolorosos. Em seu estudo, Lam identificou que a mesma variante está fortemente associada às formas agressivas dos tumores na próstata. Segundo o pesquisador, esse gene, visível na superfície das células cancerosas, entra em contato com os receptores de dor do corpo humano, o que desencadeia o desconforto. Quanto maior a quantidade de TMPRSS2 nos receptores de dor, mais forte é a sensação provocada.