Cientistas criam injeção de gene para amenizar cegueira
Duas semanas depois do tratamento, 10 pacientes passaram a realizar atividades cotidianas sem dificuldade
Vilhena Soares - Correio Braziliense
Publicação:17/07/2015 15:30Atualização: 16/07/2015 14:59
Da cegueira total à possibilidade de executar tarefas do dia dia as enxergando. A transição revolucionária para pacientes com amaurose congênita de Leber — uma doença hereditária que vai provocando a degeneração da retina — se deu por meio de terapia genética e foi detalhada por um grupo de cientistas na edição de hoje da revista Science Translational Medicine.
Segundo eles, a técnica poderá ser usada a partir do ano que vem. Especialistas acreditam que ela tem, inclusive, potencial para intervir em outras complicações oftalmológicas.
Os primeiros experimentos foram feitos com ratos. Depois, em 10 pacientes com amaurose congênita de Leber. A doença é provocada por um defeito no gene LCA2. Por isso, os voluntários receberam a injeção de um vírus que inseriu cópias normais do gene em células da retina. Duas semanas após o procedimento genético, deixaram de ser cegos e se tornaram amblíopes — pessoas que têm a visão comprometida, mas conseguem desempenhar atividades rotineiras, como caminhar.
“Os pacientes não recuperaram a ‘visão perfeita’, mas as melhorias foram muito significativas, permitindo a eles andar independentemente, ler, jogar esportes”, exemplifica Jean Bennett, um dos autores da pesquisa e professor de oftalmologia na Universidade da Pensilvânia.
Cérebro ativado
Rubens Belfort Jr., professor titular do Departamento de Oftalmologia da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp), destaca que o trabalho dos cientistas dos EUA chama a atenção por envolver voluntários que estavam no estágio avançado da amaurose congênita de Leber. “Ainda assim, apresentaram uma melhora”, observa. “Vemos o quanto as áreas do cérebro ficam mais ativas com a ajuda da implantação desse vírus embaixo da retina para recuperar o funcionamento dela.”
Segundo o especialista, a retina funciona como uma televisão, sendo as fibras oculares os fios que fazem com que o sistema funcione. “Quando elas se atrofiam, você tem um problema nesse sistema. Na nova pesquisa, vemos que o gene identificado como origem dessa falha, se substituído, pode corrigir o sistema e apresentar uma melhora. Isso traz esperanças de tratamentos semelhantes para outros problemas de saúde que causam a perda da visão”, aposta.
A mesma abrangência de aplicação é cogitada por Luis Fernando Rabelo Barros, oftalmologista do Visão Institutos Oftalmológicos, em Brasília. “Essa estratégia de identificar as variações genéticas responsáveis por uma doença e utilizar um vírus que possa corrigir o problema, como esse injetado na retina dos pacientes, pode ser um caminho apropriado para a busca da cura de outros problemas ligados à cegueira”, diz.
Sinais na infância
Vítimas da doença começam a perder a visão desde os primeiros meses de vida — os primeiros indícios são falta de resposta visual e movimentos oculares incomuns. Durante a juventude, mudanças na retina se tornam visíveis e os vasos sanguíneos também ficam mais estreitos. Na vida adulta, ficam evidentes os problemas para enxergar movimentos mais rápidos, como o mexer das mãos e as luzes brilhantes, além de uma grande sensibilidade à luz.
Nas clínicas, em 2016
Para esclarecer como se deu a recuperação da visão após a terapia genética, os pesquisadores da Universidade da Pensilvânia decidiram comparar as estruturas ocular e cerebral dos pacientes tratados e as de voluntários saudáveis. Na análise, observaram que as vias cerebrais dos primeiros se tornaram tão robustas quanto às de quem não tinha problemas oftalmológicos. O mesmo efeito não ocorreu no olho que não recebeu a terapia.
O próximo passo dos cientistas será testar a técnica em mais pacientes, numa tentativa de validar novamente a eficácia do procedimento. “Os dados desse estudo serão apresentados às autoridades de regulação nos EUA e o órgão decidirá se esse reagente pode ser rotulado como uma droga. Acreditamos que a FDA pode decidir sobre isso em algum momento do próximo ano”, diz Jean Bennett, um dos autores da pesquisa.
Para o oftalmologista Luis Fernando Rabelo Barros, se o procedimento for liberado, tem o potencial de entrar na lista das grandes intervenções em prol de pessoas com deficiência visual. “Já tivemos outras alternativas criadas para essas pessoas viverem melhor, como o braile. Agora, temos uma esperança maior ainda na conquista dessa independência”, completa.
Da cegueira total à possibilidade de executar tarefas do dia dia as enxergando. A transição revolucionária para pacientes com amaurose congênita de Leber — uma doença hereditária que vai provocando a degeneração da retina — se deu por meio de terapia genética e foi detalhada por um grupo de cientistas na edição de hoje da revista Science Translational Medicine.
Segundo eles, a técnica poderá ser usada a partir do ano que vem. Especialistas acreditam que ela tem, inclusive, potencial para intervir em outras complicações oftalmológicas.
Saiba mais...
Os pesquisadores norte-americanos começaram tentando entender como funciona o cérebro de pessoas que não conseguem enxergar. “Tomando como ponto de partida o fato de que a visão se torna possível com o olho e o cérebro, faz sentido examinar o cérebro quando o olho passa por uma mudança dramática, como em uma situação em que não vê para uma em que vê”, justifica ao Correio Manzar Ashtari, principal autora do estudo e pesquisadora do Departamento de Oftalmologia da Universidade da Pensilvânia.- Injeção reverte cegueira causada por diabetes
- Degeneração macular da visão é a principal causa de cegueira na velhice
- Cegueira noturna: entenda o que é a nictalopia
- Exercícios físicos evitam principais causas da cegueira em humanos
- Pesquisa pioneira no Brasil aponta fator genético para doença que leva à cegueira
- Uma das principais causas de cegueira no mundo tem tratamento
Os primeiros experimentos foram feitos com ratos. Depois, em 10 pacientes com amaurose congênita de Leber. A doença é provocada por um defeito no gene LCA2. Por isso, os voluntários receberam a injeção de um vírus que inseriu cópias normais do gene em células da retina. Duas semanas após o procedimento genético, deixaram de ser cegos e se tornaram amblíopes — pessoas que têm a visão comprometida, mas conseguem desempenhar atividades rotineiras, como caminhar.
“Os pacientes não recuperaram a ‘visão perfeita’, mas as melhorias foram muito significativas, permitindo a eles andar independentemente, ler, jogar esportes”, exemplifica Jean Bennett, um dos autores da pesquisa e professor de oftalmologia na Universidade da Pensilvânia.
Cérebro ativado
Rubens Belfort Jr., professor titular do Departamento de Oftalmologia da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp), destaca que o trabalho dos cientistas dos EUA chama a atenção por envolver voluntários que estavam no estágio avançado da amaurose congênita de Leber. “Ainda assim, apresentaram uma melhora”, observa. “Vemos o quanto as áreas do cérebro ficam mais ativas com a ajuda da implantação desse vírus embaixo da retina para recuperar o funcionamento dela.”
Segundo o especialista, a retina funciona como uma televisão, sendo as fibras oculares os fios que fazem com que o sistema funcione. “Quando elas se atrofiam, você tem um problema nesse sistema. Na nova pesquisa, vemos que o gene identificado como origem dessa falha, se substituído, pode corrigir o sistema e apresentar uma melhora. Isso traz esperanças de tratamentos semelhantes para outros problemas de saúde que causam a perda da visão”, aposta.
A mesma abrangência de aplicação é cogitada por Luis Fernando Rabelo Barros, oftalmologista do Visão Institutos Oftalmológicos, em Brasília. “Essa estratégia de identificar as variações genéticas responsáveis por uma doença e utilizar um vírus que possa corrigir o problema, como esse injetado na retina dos pacientes, pode ser um caminho apropriado para a busca da cura de outros problemas ligados à cegueira”, diz.
Sinais na infância
Vítimas da doença começam a perder a visão desde os primeiros meses de vida — os primeiros indícios são falta de resposta visual e movimentos oculares incomuns. Durante a juventude, mudanças na retina se tornam visíveis e os vasos sanguíneos também ficam mais estreitos. Na vida adulta, ficam evidentes os problemas para enxergar movimentos mais rápidos, como o mexer das mãos e as luzes brilhantes, além de uma grande sensibilidade à luz.
Nas clínicas, em 2016
Para esclarecer como se deu a recuperação da visão após a terapia genética, os pesquisadores da Universidade da Pensilvânia decidiram comparar as estruturas ocular e cerebral dos pacientes tratados e as de voluntários saudáveis. Na análise, observaram que as vias cerebrais dos primeiros se tornaram tão robustas quanto às de quem não tinha problemas oftalmológicos. O mesmo efeito não ocorreu no olho que não recebeu a terapia.
O próximo passo dos cientistas será testar a técnica em mais pacientes, numa tentativa de validar novamente a eficácia do procedimento. “Os dados desse estudo serão apresentados às autoridades de regulação nos EUA e o órgão decidirá se esse reagente pode ser rotulado como uma droga. Acreditamos que a FDA pode decidir sobre isso em algum momento do próximo ano”, diz Jean Bennett, um dos autores da pesquisa.
Para o oftalmologista Luis Fernando Rabelo Barros, se o procedimento for liberado, tem o potencial de entrar na lista das grandes intervenções em prol de pessoas com deficiência visual. “Já tivemos outras alternativas criadas para essas pessoas viverem melhor, como o braile. Agora, temos uma esperança maior ainda na conquista dessa independência”, completa.