Entidades médicas propõem ao CFM novos critérios para indicar cirurgia bariátrica a pacientes com diabetes
Proposta inclui novo escore de risco metabólico (ERM) e não apenas no índice de massa corpórea (IMC) aos critérios de indicação da cirurgia
Carolina Cotta - Estado de Minas
Publicação:10/11/2015 14:30Atualização: 10/11/2015 12:17
Segundo Ricardo Cohen, coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e atual presidente do conselho consultivo e fiscal da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, o ERM considera diversos fatores de risco para a saúde do paciente e permite uma avaliação do quadro clínico geral para determinar critérios de elegibilidade e priorização para realização da cirurgia metabólica. “Evidências clínicas indicam a necessidade de adoção de outros parâmetros, além do IMC, que levam em conta detalhes técnicos, acesso, perfis de paciente e resultados“, explica.
O novo escore de risco metabólico, ao considerar esses fatores, prevê a avaliação do quadro clínico geral do paciente para determinar critérios de elegibilidade e priorização para realização de cirurgia metabólica. A mudança permitirá classificar o paciente de acordo com os riscos relacionados às doenças e não restringe apenas ao cálculo de índice de massa corpórea (IMC). De acordo com o cirurgião bariátrico Leonardo Salles de Almeida, hoje, podem ser operados pacientes com obesidade mórbida, ou seja, com IMC superior a 40, ou pacientes com IMC superior a 35 que tenham comorbidades passíveis de melhorar com a operação.
“Se os novos critérios forem aprovados, o IMC passa a ser secundário, levando-se em consideração mais os benefícios clínicos que o procedimento vai trazer aos pacientes do que simplesmente um número de IMC. Na prática, os pacientes que tiverem IMC maior que 30 e indicação de seu endocrinologista para a realização da cirurgia poderão ter acesso ao procedimento. Outros critérios são diabetes há pelo menos cinco anos, idade mínima de 30 anos e hemoglobina glicosilada acima de 8”, cita o cirurgião, titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.
Segundo Cohen, a nova proposta é importante porque a utilização isolada do IMC discrimina sexo, idade, grau de aptidão física e etnia dos pacientes portadores de síndrome metabólica, obesidade e/ou diabetes tipo 2. “O critério atual não leva em consideração riscos cardiovasculares ou a quantidade e distribuição de gordura corpórea, fator que agrava a doença. O IMC isoladamente não prevê se qualquer tratamento terá sucesso ou não. Com o ERM, ao contrário, é possível ampliar a indicação da cirurgia metabólica e permitir que mais pacientes tenham o controle da doença, evitando danos comuns associados à evolução da doença.”
Para Luiz Turatti, presidente eleito da Sociedade Brasileira de Diabetes, trata-se de uma tentativa de mudança. “Sabemos que o critério do IMC, que ainda norteia as indicações cirúrgicas, é falho em uma série de aspectos. Há necessidade de aprimoramento de muitas ferramentas que podem agregar conhecimento, até chegarmos a uma conclusão melhor. E esse escore precisa ser revisto de tempos em tempos, para que outras comorbidades graves possam ser contempladas”, explicou o endocrinologista, que reforça a importância de o diabetes ser abordado, inicialmente, sempre do ponto de vista clínico. “A cirurgia metabólica é opção para um perfil específico de diabéticos. A indicação deve vir do endocrinologista e não do cirurgião”, alerta.
AVANÇOS
As indicações para as cirurgias metabólicas, livres das restrições do IMC como único parâmetro para indicação, têm sido ampliadas no mundo. A Nice, agência reguladora das práticas médicas britânicas, por exemplo, há mais de meses modificou seus critérios de indicação de tratamento cirúrgico para diabéticos sem controle clínico adequado, reduzindo o IMC para 30. A indicação da cirurgia metabólica em pacientes não obesos mórbidos, isto é, com IMC menor que 35, como opção terapêutica para controlar o diabetes tipo 2 foi comprovada com pesquisa realizada em 2012 pelo Instituto de Educação e Ciências em Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (Iecs), que demonstrou o controle da doença em 88% dos pacientes e com expressiva melhora em 11% com seguimento a longo prazo. Agora, Cohen quer avaliar os benefícios do tratamento cirúrgico em comparação ao melhor tratamento clínico para doenças microvasculares decorrentes do diabetes tipo 2, como as retinianas, renais e neuropatias. A investigação inclui pacientes com história de diabetes há 15 anos ou menos, e com Índice de Massa Corpórea (IMC) entre 30kg/m2 e 35kg/m2.
BARIÁTRICA X METABÓLICA
A cirurgia bariátrica trata apenas o peso do paciente, enquanto na cirurgia metabólica a proposta envolve o tratamento de uma síndrome metabólica que pode ser diabetes tipo 2, hipertensão arterial, dislipidemia. Segundo Leonardo Salles de Almeida, desde 2007, com o Diabetes Surgery Summit, primeira conferência internacional a reconhecer a cirurgia bariátrica como tratamento para diabetes tipo 2, ocorre essa discussão. “Antes, achávamos que o paciente tinha melhora do diabetes pelo emagrecimento, mas depois constatamos que, na realidade, ele tinha o controle da doença muito antes de emagrecer. Assim, começaram as pesquisas das alterações metabólicas envolvidas nesse controle”, explica.
Aos 51 anos, a empresária Silvana Silva Bastos de Souza se prepara para a cirurgia bariátrica. Com 104 quilos e IMC de 43, tem indicação para a técnica, mas só vai se submeter ao procedimento para tentar controlar o diabetes. “Ia colocar o balão, mas, como minha glicose está ficando muito alta e já me sinto bem cansada, optei pela cirurgia”, conta Silvana, que fará uma gastroplastia videolaparoscópica. “Minha mãe faleceu das complicações do diabetes. Tive meu diagnóstico há dois anos, depois de um longo período em que venho ganhando peso, sem nunca mais ter conseguido voltar ao peso ideal.”
A empresária Silvana Bastos vai se submeter ao procedimento para tentar controlar os índices de açúcar no sangue
Saiba mais...
Por novas perspectivas de tratamento, acaba de ser entregue ao Conselho Federal de Medicina proposta de modificação dos critérios de cirurgia para o diabetes tipo 2, com base em um escore de risco metabólico (ERM) e não apenas no índice de massa corpórea (IMC). O documento foi elaborado em parceria pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, Sociedade Brasileira de Diabetes, Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva e Colégio Brasileiro de Cirurgiões.- Cochilos muito longos e a sonolência durante o dia são fator de risco para diabetes, diz estudo
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Segundo Ricardo Cohen, coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e atual presidente do conselho consultivo e fiscal da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, o ERM considera diversos fatores de risco para a saúde do paciente e permite uma avaliação do quadro clínico geral para determinar critérios de elegibilidade e priorização para realização da cirurgia metabólica. “Evidências clínicas indicam a necessidade de adoção de outros parâmetros, além do IMC, que levam em conta detalhes técnicos, acesso, perfis de paciente e resultados“, explica.
O novo escore de risco metabólico, ao considerar esses fatores, prevê a avaliação do quadro clínico geral do paciente para determinar critérios de elegibilidade e priorização para realização de cirurgia metabólica. A mudança permitirá classificar o paciente de acordo com os riscos relacionados às doenças e não restringe apenas ao cálculo de índice de massa corpórea (IMC). De acordo com o cirurgião bariátrico Leonardo Salles de Almeida, hoje, podem ser operados pacientes com obesidade mórbida, ou seja, com IMC superior a 40, ou pacientes com IMC superior a 35 que tenham comorbidades passíveis de melhorar com a operação.
“Se os novos critérios forem aprovados, o IMC passa a ser secundário, levando-se em consideração mais os benefícios clínicos que o procedimento vai trazer aos pacientes do que simplesmente um número de IMC. Na prática, os pacientes que tiverem IMC maior que 30 e indicação de seu endocrinologista para a realização da cirurgia poderão ter acesso ao procedimento. Outros critérios são diabetes há pelo menos cinco anos, idade mínima de 30 anos e hemoglobina glicosilada acima de 8”, cita o cirurgião, titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica.
Segundo Cohen, a nova proposta é importante porque a utilização isolada do IMC discrimina sexo, idade, grau de aptidão física e etnia dos pacientes portadores de síndrome metabólica, obesidade e/ou diabetes tipo 2. “O critério atual não leva em consideração riscos cardiovasculares ou a quantidade e distribuição de gordura corpórea, fator que agrava a doença. O IMC isoladamente não prevê se qualquer tratamento terá sucesso ou não. Com o ERM, ao contrário, é possível ampliar a indicação da cirurgia metabólica e permitir que mais pacientes tenham o controle da doença, evitando danos comuns associados à evolução da doença.”
Para Luiz Turatti, presidente eleito da Sociedade Brasileira de Diabetes, trata-se de uma tentativa de mudança. “Sabemos que o critério do IMC, que ainda norteia as indicações cirúrgicas, é falho em uma série de aspectos. Há necessidade de aprimoramento de muitas ferramentas que podem agregar conhecimento, até chegarmos a uma conclusão melhor. E esse escore precisa ser revisto de tempos em tempos, para que outras comorbidades graves possam ser contempladas”, explicou o endocrinologista, que reforça a importância de o diabetes ser abordado, inicialmente, sempre do ponto de vista clínico. “A cirurgia metabólica é opção para um perfil específico de diabéticos. A indicação deve vir do endocrinologista e não do cirurgião”, alerta.
"Na prática, os pacientes que tiverem IMC maior que 30 e indicação de seu endocrinologista
para a realização da cirurgia poderão ter acesso ao procedimento", Leonardo Salles, cirurgião bariátrico
AVANÇOS
As indicações para as cirurgias metabólicas, livres das restrições do IMC como único parâmetro para indicação, têm sido ampliadas no mundo. A Nice, agência reguladora das práticas médicas britânicas, por exemplo, há mais de meses modificou seus critérios de indicação de tratamento cirúrgico para diabéticos sem controle clínico adequado, reduzindo o IMC para 30. A indicação da cirurgia metabólica em pacientes não obesos mórbidos, isto é, com IMC menor que 35, como opção terapêutica para controlar o diabetes tipo 2 foi comprovada com pesquisa realizada em 2012 pelo Instituto de Educação e Ciências em Saúde do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (Iecs), que demonstrou o controle da doença em 88% dos pacientes e com expressiva melhora em 11% com seguimento a longo prazo. Agora, Cohen quer avaliar os benefícios do tratamento cirúrgico em comparação ao melhor tratamento clínico para doenças microvasculares decorrentes do diabetes tipo 2, como as retinianas, renais e neuropatias. A investigação inclui pacientes com história de diabetes há 15 anos ou menos, e com Índice de Massa Corpórea (IMC) entre 30kg/m2 e 35kg/m2.
BARIÁTRICA X METABÓLICA
A cirurgia bariátrica trata apenas o peso do paciente, enquanto na cirurgia metabólica a proposta envolve o tratamento de uma síndrome metabólica que pode ser diabetes tipo 2, hipertensão arterial, dislipidemia. Segundo Leonardo Salles de Almeida, desde 2007, com o Diabetes Surgery Summit, primeira conferência internacional a reconhecer a cirurgia bariátrica como tratamento para diabetes tipo 2, ocorre essa discussão. “Antes, achávamos que o paciente tinha melhora do diabetes pelo emagrecimento, mas depois constatamos que, na realidade, ele tinha o controle da doença muito antes de emagrecer. Assim, começaram as pesquisas das alterações metabólicas envolvidas nesse controle”, explica.
Aos 51 anos, a empresária Silvana Silva Bastos de Souza se prepara para a cirurgia bariátrica. Com 104 quilos e IMC de 43, tem indicação para a técnica, mas só vai se submeter ao procedimento para tentar controlar o diabetes. “Ia colocar o balão, mas, como minha glicose está ficando muito alta e já me sinto bem cansada, optei pela cirurgia”, conta Silvana, que fará uma gastroplastia videolaparoscópica. “Minha mãe faleceu das complicações do diabetes. Tive meu diagnóstico há dois anos, depois de um longo período em que venho ganhando peso, sem nunca mais ter conseguido voltar ao peso ideal.”
CONTROLE
As cirurgias metabólicas envolvem principalmente a modificação do caminho dos alimentos pelo tubo digestório. Evitando-se a passagem da comida pela porção inicial do intestino, existe imediata diminuição da resistência dos tecidos à ação da insulina, independentemente da perda de peso, configurando a chamada ação antidiabética direta dos procedimentos. Além disso, existe aumento de secreção de hormônios intestinais que regulam a fome, a saciedade e também melhora a secreção de insulina pelo pâncreas. Essa somatória entre menor ingestão de alimentos e aumento da saciedade leva ao emagrecimento, que é importante a longo prazo também para o controle do diabetes e de eventuais outras doenças associadas, como a hipertensão e a apneia do sono.
As cirurgias metabólicas envolvem principalmente a modificação do caminho dos alimentos pelo tubo digestório. Evitando-se a passagem da comida pela porção inicial do intestino, existe imediata diminuição da resistência dos tecidos à ação da insulina, independentemente da perda de peso, configurando a chamada ação antidiabética direta dos procedimentos. Além disso, existe aumento de secreção de hormônios intestinais que regulam a fome, a saciedade e também melhora a secreção de insulina pelo pâncreas. Essa somatória entre menor ingestão de alimentos e aumento da saciedade leva ao emagrecimento, que é importante a longo prazo também para o controle do diabetes e de eventuais outras doenças associadas, como a hipertensão e a apneia do sono.