Casos de diabetes 2 no mundo são 25% maiores do que o estimado

Pesquisa mostra ainda que, sem dados oficiais precisos, estratégias de prevenção e tratamento estão comprometidas

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Paloma Oliveto - Correio Brazilienze Publicação:22/07/2016 11:00Atualização:18/07/2016 18:31
A epidemia de diabetes 2 que ameaça a saúde da população global pode ser bem maior que o imaginado. Um artigo assinado por alguns dos mais respeitados epidemiologistas e diabetologistas do mundo sugere que o número real de pacientes é 520 milhões, e não 415 milhões, como o estimado pela Federação Internacional de Diabetes (IDF, sigla em inglês). Paul Zimmet, pesquisador da Universidade de Monash, na Austrália, e principal autor do trabalho, publicado na revista Nature Reviews, destaca ainda que padrões diferentes de diagnóstico e subnotificação da mortalidade atrelada à doença metabólica pintam um quadro pouco fidedigno dos impactos provocados por ela.

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No artigo, cientistas da equipe de Zimmet ressaltaram que diversos estudos têm confirmado aumentos expressivos da prevalência do diabetes ao longo do tempo. Ainda assim, “até uma década atrás, (...) muitas agências de saúde internacionais e governos nacionais deram pouca prioridade ao aumento da frequência da doença”, escreveram. “Dados confiáveis são necessários por muitas razões, além de apenas aumentar e manter a atenção sobre o diabetes mellitus. Eles são muito importantes para identificar grupos ou populações que podem precisar de cuidados específicos ou especiais relacionados à doença e ajudar a definir prioridades”, sustenta o pesquisador.

“Uma vez que temos o quadro correto da doença, conseguimos empregar medidas preventivas mais efetivas e gastar dinheiro no ponto certo”, concorda a endocrinologista Bianca de Almeida Pititto, coordenadora de epidemiologia da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). Ela lembra que, enquanto alguns países têm bancos de dados padronizados, outros sequer fazem o registro dos casos. Para estimar a prevalência do diabetes em locais assim, como a República do Malawi, mais pobre nação africana, a IDF utiliza como referência os números da África do Sul, de Moçambique e de Botswana, uma estratégia criticada por Zimmet.

No Brasil, os dados utilizados pelo Ministério da Saúde vêm da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). Na pesquisa mais recente, 8% dos adultos com mais de 18 anos responderam “sim” à pergunta “Algum médico já lhe disse que o senhor tem diabetes?” — no DF, o percentual foi de 6,7%. A SBD trabalha com as estimativas da IDF, a quem é filiada, e aponta que 6,9% dos brasileiros (13 milhões de pessoas) são acometidos pela enfermidade metabólica.

LACUNAS BRASILEIRAS
O problema do Vigitel, segundo especialistas, é que ele trabalha com autorreferenciamento, se a pessoa não souber ou não quiser dizer que tem o problema, ele não entrará para a estatística. “Os estudos mostram que quase 50% dos pacientes de diabetes não sabem”, destaca a endocrinologista Eliziane
Brandão Leite, vice-presidente da SBD/regional DF e médica da clínica Diabetes Brasília.

Isso foi constatado, por exemplo, no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa Brasil), que incluiu 15.105 funcionários de universidades públicas de seis cidades brasileiras com idades entre 35 e 74 anos. Exames indicaram a prevalência de diabetes de 19%. Desses pacientes, metade não sabia da condição — mesmo índice constatado em um censo realizado em 1988 no qual médicos e técnicos percorreram todas as regiões brasileiras fazendo testes de glicemia na população. “É impactante pensar que, mesmo para pessoas que trabalham dentro de universidades, onde se imagina haver maior acesso à informação e à saúde, o percentual de diagnóstico de diabetes previamente não conhecido está em torno de 50%”, observa Bianca de Almeida Pititto.

FALTA PADRÃO Outro problema destacado no artigo é a falta de padronização no diagnóstico. Três exames são os mais usados: glicemia de jejum, tolerância à glicose e hemoglobina glicada. Contudo, não há consenso global sobre os critérios. Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que o paciente tem a doença quando a glicemia de jejum está acima de 110mg/dL, a Sociedade Brasileira de Diabetes, a Associação Americana de Diabetes, a Federação Internacional de Diabetes e a Associação Europeia para Estudo de Diabetes diagnosticam o distúrbio quando o valor é superior a 100mg/dL. Quanto ao teste de hemoglobina glicada, há consenso: quando maior ou igual a 6,5%.

Para a endocrinologista Hermelinda Cordeiro Pedrosa, representante do Departamento de Assessoria de Relações Governamentais da SBD e presidente eleita da entidade para o biênio 2018/2019, a falta de padronização nos valores faz com que indivíduos que já deveriam estar em tratamento acabem desassistidos. “A Associação Americana de Diabetes não mudou o ponto de corte para 100mg/dL à toa”, ressalta. De acordo com a médica, a alteração ocorreu depois que um grande estudo epidemiológico sobre retinopatia diabética (acometimento da visão em decorrência da doença) mostrou que os casos surgiam a partir desse valor.

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