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Médicos consideram novas regras para reprodução assistida no Brasil avanço mundial

A divergência está na decisão do Conselho Federal de Medicina de proibir mulheres com mais de 50 anos de serem mães

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Luciane Evans Publicação:10/05/2013 09:31Atualização:10/05/2013 09:56
Depois de 10 tentativas frustadas para engravidar, Márcia Pimenta, que mora em Israel, fez tratamento em BH. Aos 42 anos, está grávida do primeiro filho, David, e critica a limitação da idade: 'Não acho justo com quem tem esse sonho de maternidade' (Cristina Horta/EM/DA Press)
Depois de 10 tentativas frustadas para engravidar, Márcia Pimenta, que mora em Israel, fez tratamento em BH. Aos 42 anos, está grávida do primeiro filho, David, e critica a limitação da idade: "Não acho justo com quem tem esse sonho de maternidade"
Embora a nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre a reprodução assistida receba ressalvas, as mudanças são vistas pelos médicos como decisão de vanguarda do país. Desde ontem, as técnicas de fertilização in vitro e a inseminação artificial no Brasil têm novos critérios de regulamentação. Pela primeira vez, o texto cita a palavra homoafetivo, ao liberar o método para homossexuais e solteiros; permite o descarte de embriões após cinco anos; e abre a possibilidade de parentes de até quarto grau serem doadoras do útero para a gestação. Para os especialistas é sinal claro de avanço e respeito às mudanças que estão ocorrendo no mundo, porém, eles sugerem que, em vez de o CFM proibir mulheres com mais de 50 anos de serem mães, deveria apenas recomendar o limite etário, abrindo exceções para aquelas que não apresentam riscos de saúde.


Há um ano, a classe médica discute as alterações publicadas ontem no Diário Oficial da União e, portanto, já em vigor em todo o país. Os médicos que não as cumprirem podem ser alvo de processo ético, em que punições são advertência, suspensão e cassação do registro. De acordo com o coordenador da Câmara Técnica e diretor do CFM, José Hiram Gallo, essa é a terceira vez que as regras são revistas pela entidade e a revisão acompanha os avanços da sociedade. “Nada foi feito por achismo”, garante. Uma maiores mudanças se refere ao descarte dos embriões. “Muitos casais abandonam os embriões nas clínicas. Muitas delas têm contâiners lotados há mais de 20 anos e não podiam descartá-los. Os casais se separaram, não conseguimos localizá-los e os embriões ficam congelados”, diz Rodrigo Ribeiro, diretor da Cegonha Medicina Reprodutiva, do Instituto da Saúde da Mulher, em BH.

A partir de agora, a clínica só deverá manter os embriões congelados – ou “criopreservados”– por cinco anos. Depois disso, eles poderão ser descartados ou doados para pesquisas científicas. “Esse é um dos grandes avanços da nossa resolução”, aposta Gallo. Para o diretor do Instituto Brasileiro de Reprodução Assistida (Ibra), Bruno Scheffer, as decisões são muito avançadas. Há seis meses, um casal de homens o procurou para ter um filho. “Tive que pedir ao CFM uma autorização, que não foi dada. No antigo texto, homens que queriam filhos não eram citados.” Agora, a relação homoafetiva é explicitada nos artigos. Além disso, o útero de substituição teve seu leque ampliado: tias e primas entraram na lista de parentes que poderão “emprestar” o órgão para a gestação.

DOAÇÃO

Outra mudança que mereceu destaque, segundo os especialistas, foi a doação compartilhada. Segundo Gallo, muitas vezes uma mulher procura a inseminação e precisa de óvulos para o tratamento e há outra que tem os óvulos mas não tem dinheiro para pagar a indução da ovulação. “Sem se conhecerem, elas poderão agora se ajudar. Aquela que não ovula vai poder receber um óvulo daquela que tem facilidade em ovular, desde que pague a esta a indução da ovulação, o que seria em torno de R$ 4 mil. Lembrando que em hipótese alguma o procedimento poderá ter caráter comercial e lucrativo”, esclarece.

A grande polêmica é o limite de idade para ser mãe por meio da reprodução assistida. “Atualmente, a mulher está mais precoce em seu ciclo menstrual, há meninas menstruando aos 10 anos. E, dessa forma, elas entram na menopausa cada vez mais cedo”, comenta José Hiram Gallo. Segundo ele, a gravidez depois dos 40 já é de alto risco, com possibilidade de a paciente desenvolver diabetes, eclâmpisa entre outros problemas. “A menopausa tem vindo dos 42 aos 48 anos, por isso, estipulamos a maternidade até os 50”, explica.

Maternidade tardia
Otimista com as novas regras e aplaudindo as decisões do conselho, Selmo Geber, da Clínica Origen e ex-diretor da Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida, sugere ao CFM recomendar o limite de idade. “Uma moça de 55, que encontrou o príncipe encantado aos 51, poderia fazer a inseminação até a semana passada. Agora, não mais. Se ela não tem nenhum problema de saúde não aumenta o risco. Ela deva estar bem clinicamente.” Foi assim com E.M.S, de 54 anos. Depois de muitas tentativas frustradas, ela engravidou de gêmeos. “Tentei aos 47 anos, mas o bebê não resistiu e morreu com nove semanas. Perdi duas vezes quando tentei de forma natural”, conta. Hoje, com três meses e meio de gestação, ela acha absurda a decisão do CFM. “Se depender do meu estado de saúde, dos meus hábitos e da minha mente, sou uma pessoa jovem. Fiz todos os exames possíveis, sou acompanhada por um cardiologista e estou bem. É a realização de um sonho que os médicos não podem tirar da gente.” Reconhecendo que a maternidade tardia está cada vez mais frequente entre as mulheres do século 21, José Gallo afirma que cada caso poderá ser analisado pela entidade. Mas, mesmo assim, Márcia Pimenta não concorda com a decisão. Depois de 10 tentativas frustadas para engravidar, ela, que mora em Israel, tentou em BH e conseguiu. Aos 42 anos, está grávida do primeiro filho, David. “O Brasil está muito avançado nessa área. Proibir alguém com mais de 50 anos de realizar esse sonho é muito duro. É muito dolorido querer ser mãe e não poder.”

Três perguntas para...
João Pedro Junqueira, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana


Como eram as regras para a medicina reprodutiva, antes da mudança? E qual a opinião do sr.?
A primeira resolução do Conselho Federal de Medicina sobre reprodução humana é de 1992. Houve alteração em alguns itens em 2000, outra em 2010, e a anunciada quarta-feira. Nossa legislação é supermoderna perante o mundo. As mudanças já estavam previstas no esqueleto da proposta de 92, o que coloca o Brasil numa posição de vanguarda e modernidade frente a questões atuais. Estamos assistindo a alterações no conceito de família, muitas mulheres solteiras querem filhos enfim, é uma adequação à nossa realidade.

Quais serão os principais benefícios da nova resolução?
Ela deixa as regras mais claras para os médicos e isso é muito bom. Ter um limite, para não termos absurdos como os recém-divulgados, como uma paciente na Índia que engravidou aos 70 anos e uma romena, aos 63. O CFM não fez isso para agradar os profissionais da reprodução humana, mas pensando nas necessidades dos pacientes. A medicina reprodutiva é uma área da ciência que suscita muitas questões éticas e acredito que essa regulamentação vá proporcionar mais segurança para os próprios médicos.

E sobre o limite de 50 anos, o que o sr. achou?
Fixar a idade de 50 anos deveria ser uma recomendação apenas. Isso porque a medicina é uma ciência de individualizar as coisas, cada caso é um caso. Em 2004, tivemos na clínica Pró-Criar um caso de uma avó de 53 anos que gerou o bebê para a nora e o filho. Ela teve o parto aos 54, sem um nada de problema. Então, é algo que deveria ser mais bem discutido, pois uma mulher de 32 anos, diabética, pode fazer a fertilização in vitro, mas uma de 51, sem qualquer doença, não poderá. Um estudo apresentado nos Estados Unidos mostra que metade das pacientes esperando doação de óvulo tem mais de 50 anos.

NOVAS REGRAS:

A nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) foi publicada ontem no Diário Oficial da União e já está em vigor. Veja as principais mudanças:

Limite para engravidar
Como era: não havia idade máxima para se submeter ao procedimento.
Como ficou: a partir de agora, a idade máxima para se submeter à inseminação artificial é 50 anos. Esse limite foi escolhido por causa do risco obstétrico, já que depois dessa idade aumentam os casos de hipertensão na gravidez, diabetes e partos prematuros.

Doação de óvulos compartilhada
Como era: não era mencionada na resolução antiga.
Como ficou: a mulher que não consegue produzir óvulos ajuda financeiramente uma mulher capaz de ovular, mas com dificuldades de engravidar. A primeira ajuda a segunda a pagar pelo tratamento, em torno de R$ 4 mil. Em troca, a primeira recebe a doação de um óvulo. A doadora de óvulos não pode ter mais de 35 anos – para garantir que o óvulo é saudável. Todo o tratamento custa em média de R$ 15 mil a R$ 20 mil.

Doação de espermatozoides
Como era: não havia limite de para a doação de espermatozoides para a reprodução assistida.
Como ficou: pensando na qualidade dos espermatozoides, somente homens com menos de 50 anos poderão doar para bancos de esperma.

Homossexuais e solteiros
Como era: o texto dizia que qualquer pessoa podia usar a técnica, o que permitia diferentes interpretações, como, inclusive, a exclusão dos casais de homens em relações homoafetivas.
Como ficou: casais homoafetivos e solteiros são citados na resolução como elegíveis para a inseminação.

Doadoras de útero
Como era: pela resolução antiga, somente parente de até segundo grau – mãe ou irmã – poderia gerar em seu útero um embrião fecundado com óvulo de outra mulher.
Como ficou: com o novo texto, parentes de até quarto grau – tias
e primas – também podem emprestar o útero para esse fim.

* Nas duas resoluções o CFM não aceita o uso comercial da prática.


Descarte de embriões
Como era: quando é feita uma fertilização in vitro, os médicos normalmente geram um número de embriões superior ao que vai ser inseminado na paciente. Pelo texto antigo, as clínicas não poderiam descartar os embriões fecundados.
Como ficou: a clínica só deverá manter os embriões congelados por cinco anos. Depois disso, eles poderão ser descartados ou doados para estudos científicos. A escolha será feita na contratação do serviço.

Seleção genética
Como era: a técnica não era abordada pelas normas antigas.
Como ficou: permite expressamente a seleção genética de embriões para que o bebê não tenha doença hereditária que algum filho do casal tenha demonstrado. É permitido o transplante de células desse bebê para o irmão mais velho. Segue vetada a escolha do sexo do bebê em laboratório, exceto quando a seleção for feita com o intuito de evitar doenças ligadas a esse sexo.

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