Amor sem fronteiras »

Casais driblam dificuldades da relação a distância

Não é fácil, mas os casais apostam na sinceridade e traçam juntos planos para o futuro

Diminuir Fonte Aumentar Fonte Imprimir Corrigir Notícia Enviar
Correio Braziliense Publicação:14/08/2013 09:00Atualização:14/08/2013 09:03
O estudante Sedrick mostra uma foto dele com a namorada, a uruguaia Daniela: 'Tem de ser tudo muito planejado para que dê certo' (	Breno Fortes/CB/D.A Press)
O estudante Sedrick mostra uma foto dele com a namorada, a uruguaia Daniela: "Tem de ser tudo muito planejado para que dê certo"
“Como se não fosse tão longe Brasília de Belém do Pará.” Na letra de Léo e Bia, Oswaldo Montenegro canta a história de um casal que ignora a distância entre as duas capitais em nome do amor. Na vida real, as cidades podem ser outras, e as distâncias, até maiores, mas histórias como a de Léo e Bia não são poucas. “As pessoas estão sempre em busca do amor, de interações amorosas e nem sempre o parceiro com quem vão construir esses laços está perto”, afirma o psicólogo especialista em dificuldades dos relacionamentos amorosos Thiago de Almeida.

“Cuidar de amor exige mestria”, diz o compositor em um dos últimos versos da canção. Para os relacionamentos a distância, a máxima se torna ainda mais verdadeira, já que estar longe exige muita confiança e intimidade, para que a união possa durar. O fato de os namoro desse tipo precisarem de doses maiores de confiança e compreensão colabora para que o casal esteja preparado para quando chegar o momento de ficar, de fato, juntos. “Essas características ‘a mais’ são favoráveis para relacionamentos a longo prazo. Então, de certa forma, o casal já vai treinando em uma época em que tudo é trocado muito facilmente”, afirma a pós-doutora em psicologia e professora da Universidade Federal do Paraná Lidia Weber.

A distância, porém, também pode contribuir para que a relação se torne, aos poucos, mais fria. Sem contato físico e proximidade, alguns casais correm o risco de ver o relacionamento se desfazer caso não exista esforço das duas partes, alerta o terapeuta de casais e famílias Luiz Carlos Osorio. “Pode acontecer um esvaziamento progressivo do relacionamento”, afirma.

Como se não fossem tão longe os 2.845km que separam Brasília de Tala (Uruguai), o universitário Sedrick Lima, 20 anos, começou a namorar a uruguaia Daniela Espiga, 19, há sete meses. Eles se conheceram em junho de 2012 em um bate-papo aleatório por vídeo na internet (daqueles em que se pode trocar a câmera se a pessoa que aparece na tela não agrada). O papo fluiu tanto que o contato acabou migrando para outros meios, como o Skype e o Facebook (leia mais abaixo).

Depois de longas conversas diárias, Sedrick viajou para o Uruguai no fim de 2012, e os dois se viram pessoalmente pela primeira vez. Lá, o universitário conheceu também a família de Daniela e a pediu em namoro. A vontade de transformar a amizade virtual em uma relação mais forte surgiu naturalmente. “Foi como em um relacionamento convencional: primeiro é preciso conhecer a pessoa, ter uma convivência prévia, mesmo que virtual, para depois começar o namoro”, explica Sedrick.

Para um namoro a distância dar certo é preciso muita dedicação e vontade, acredita o universitário. “Não é nada fácil. O sentimento tem de ser muito grande”, afirma. A confiança, segundo o jovem, é fundamental. E estar longe pode ser tanto vantagem quanto desvantagem. “Não se vive tão colado e se tem mais liberdade. Isso colabora. Mas, ao mesmo tempo, não estamos perto da pessoa quando queremos”, conta. O plano do casal é viver junto no Brasil quando o universitário tiver a estabilidade de um emprego. “Tem de ser tudo muito planejado para que dê certo”, pondera.

Leandro durante conversa com Luiza: 'Sei que um dia estaremos juntos' (Carlos Moura/CB/D.A Press)
Leandro durante conversa com Luiza: "Sei que um dia estaremos juntos"
Longo prazo
Planejamento é fundamental para que o relacionamento se sustente, avalia Luiz Carlos Osório: “Dificilmente, ele persistirá se o casal não conseguir, a longo prazo, planejar o futuro de forma que um esteja incluído nos projetos do outro”. De Recife, o biólogo Leandro Agra, 29 anos, deixou a capital pernambucana em abril de 2013 para fazer doutorado na Universidade de Brasília (UnB). Lá, ficou a noiva Luiza Padilha, 26, estudante de direito. O namoro entre os dois começou cerca de um mês antes de Leandro se mudar e se tornou, mesmo a distância, um noivado. Leandro conta que a decisão de manter o relacionamento, apesar da troca de cidade, aconteceu de forma natural. “Ela sempre deu força para que eu viesse fazer o doutorado em Brasília, e isso é, além de tudo, um dos aspectos que me agradam nela”, afirma.

A última vez que se encontraram pessoalmente foi no Dia dos Namorados, quando Leandro viajou a Recife. A saudade é a grande dificuldade do casal. O biólogo conta que, em alguns dias, a vontade de estar perto da noiva bate mais forte. “Dá tristeza, vontade de chorar. Não é só a saudade carnal, física. É sentir falta mesmo de estar com a pessoa, de tê-la perto”, diz. Para aplacar a saudade, as conversas entre os dois são diárias, por meio da internet ou do telefone. “A tecnologia facilita, porque você pode ver a pessoa, estar em contato com ela sempre”, afirma.

Os dois já têm planos para ficar, de fato, juntos. Luiza, que está concluindo o curso de direito, vai prestar concursos em regiões próximas da capital federal e, quando passar, virá morar com o noivo. Leandro acredita que, se existe realmente a vontade de manter o relacionamento, a distância pode ser superada. “Ela é a pessoa que quero ter ao meu lado, com quem vou construir minha família. Não importa se agora estamos distantes, porque sei que um dia estaremos juntos”, afirma.

Mais forte
As dificuldades enfrentadas podem também ser um fator que contribua para que o namoro se torne mais forte, por aumentar no casal o desejo e a vontade de permanecer juntos. “É o que chamamos de efeito Romeu e Julieta. A dificuldade pode aumentar ainda mais o desejo de manter a relação e aproximar o casal, que luta para ficar junto”, diz Lidia Weber.

Um estudo da Universidade da cidade de Hong Kong em parceria com a Universidade Cornell, publicado na edição de junho do periódico Journal of Communication, constatou que os relacionamentos a distância proporcionam a criação de laços mais intensos e profundos do que relações em que casais estão geograficamente perto. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores pediram a 63 casais, metade deles em relacionamentos a distância, que escrevessem um diário sobre a interação com os parceiros.

Contudo, além da saudade, o ciúme pode ser um dos principais entraves para que a relação a distância se consolide. Entender, de longe, que o outro tem uma vida que vai além do relacionamento, em alguns casos, é mais complicado. Thiago de Almeida alerta para essa dificuldade que relacionamentos entre pessoas mais jovens e imaturas, sobretudo, costumam ter. “Pode haver a sensação de negligência e abandono. Uma competição pela atenção do parceiro com amigos, familiares”, explica Almeida, que é autor do livro Amor, ciúme e infidelidade — Como essas questões afetam sua vida.

É preciso tomar cuidado com falsas primeiras impressões que conhecer a distância pode provocar. Como em toda relação, entender, realmente, as características da pessoa requer um conhecimento mais aprofundado. “Quando se começa um relacionamento a distância, é preciso ter atenção com as ‘maquiagens’, é importante procurar ser o mais transparente possível”, alerta o psicoterapeuta Dirceu Moreira.

Como agir
Confira as dicas de Lidia Weber, pós-doutora em psicologia e professora da Universidade Federal do Paraná, para quem pensa em manter ou já mantém um relacionamento a distância:

  • Só vale a pena se a situação for temporária e permitir planejamento

  • Os dois precisam ter uma dose não muito grande de ciúme para que ambos também tenham vida própria e consigam sair com amigos, por exemplo, sem ter a sensação de traição

  • Nos contatos, devem procurar manter a intimidade e a cumplicidade, contando histórias do dia a dia e fazendo planos

  • Quando se encontrarem, não adianta ficar o tempo todo em casa. Por mais que haja esse desejo, é preciso que um conheça o outro em situações sociais, com amigos e a família

  • Nada de ficar bravo se telefonou e não encontrou o parceiro naquele momento em casa. Cada um tem de ter vida individual também

  • É mais fácil manter a relação se o casal se conheceu pessoalmente antes e, depois, veio a separação geográfica

Stefany mora no DF, e o namorado, Mauricio, no Espírito Santo: 'A tecnologia facilitou bastante' (Carlos Vieira/CB/D.A Press)
Stefany mora no DF, e o namorado, Mauricio, no Espírito Santo: "A tecnologia facilitou bastante"
Com a ajuda da tecnologia
As inovações tecnológicas e a facilidade do acesso a elas colaboram para que a sensação de estar distante se torne menor. Ligações por vídeo pela internet, promoções de operadoras que possibilitam longas chamadas a um custo baixo, por exemplo, tornam mais simples o contato entre o casal, mesmo que de maneira não convencional. “A tecnologia atual, sem dúvida, facilita o relacionamento a distância”, diz a psicóloga Lidia Weber. Além disso, para a especialista, o uso recorrente das conversas por texto escrito pode favorecer uma comunicação mais atenta e íntima. “O casal pode falar de coisas íntimas com mais facilidade através da tela do computador. Esse é um efeito desinibidor que a internet cria.”

A universitária Stefany Ovidio, 20 anos, conheceu o namorado em 2011. Ela estudava no câmpus de Sinop da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) quando o também estudante Mauricio Herrera, 21, de Cariacica (Espírito Santo), fez uma viagem para a cidade. Depois das primeiras conversas, os dois passaram a manter contato pela internet e por telefone. “Temos muitas afinidades. Conversávamos muito, pássavamos horas falando, contando tudo um para o outro”, lembra Stefany. A relação entre os dois ficou mais forte até se tornar, de fato, um namoro.

A jovem deixou o curso em Mato Grosso do Sul para estudar em uma universidade do Distrito Federal. Os dois só voltaram a se ver pessoalmente em agosto de 2012, depois de alguns desencontros. Segundo Stefany, a tecnologia foi fundamental para que o relacionamento entre ela e Mauricio pudesse se manter bem. Os dois se falam todos os dias. “Se não fosse a tecnologia, não daria certo. Ela facilitou bastante, conversamos por webcam ou pelo telefone com as promoções de chamadas ilimitadas”, diz.

Uma das principais dificuldades para eles é o custo financeiro de se manter um namoro a distância. Viagens e mesmo o contato por meio da tecnologia podem pesar no orçamento. “Às vezes, tudo o que um casal gasta em meses, nós gastamos em uma viagem”, conta a universitária. Os dois pensam em se mudar para a mesma cidade e se casar, mas só quando concluírem a formação educacional. “Vamos decidir onde poderíamos ter mais oportunidades e nos casarmos, tudo certinho”, explica Stefany.

COMENTÁRIOS

Os comentários são de responsabilidade exclusiva dos autores.