Qualquer objeto para criança é brinquedo; tecnologia não favorece desenvolvimento
Feiras de troca são opções para crianças experimentarem outra maneira de adquirir um novo brinquedo
Valéria Mendes - Saúde Plena
Publicação:01/10/2013 09:00Atualização: 01/10/2013 14:12
“De vez em quando não quero trocar meus brinquedos velhos. Teve um dia que eu já tinha doado todos os que eu queria, não achava o que tirar e acabei tendo que doar minha maquiagem”. Beatriz tem 8 anos e na casa dela a regra é: para cada brinquedo novo que entra, um tem que sair. A garotinha lida com tranquilidade com isso e a mãe, a relações públicas Juliana Dias, conta que desde pequena já fazia questão de transmitir à filha os conceitos de utilidade, excesso, caro e barato. Foi no aniversário de 1 ano da menina que a mãe percebeu a quantidade de objetos - entre roupas, acessórios e brinquedos - que a filha nunca usara ou usaria. “Eu fiquei muito assustada, sou uma assalariada e à medida que ela foi crescendo deixei claro que só compramos o que for útil. Temos que ir adaptando nossos argumentos junto com o crescimento deles. Hoje a Bia sabe que ela tem um limite para guardar os brinquedos. Começa a não caber no armário, separamos o que não ela não usa e doamos”, relata.
Mesmo assim, Beatriz fala como se toda a casa dela estivesse ocupada de brinquedos e livros. “Eu tenho mais ou menos uma livraria aqui em casa”, orgulha-se. Entusiasmada, diz que suas histórias preferidas são as de terror. “Você conhece ‘João, Maria e a bruxa?’ É muito legal”, recomenda ao afirmar que esse é seu livro preferido. A menina também enfatiza que tem muitas bonecas. Alice, que ela descreve como “branquinha, pequena, de cabelo pretinho, batom vermelho e que adora vestido roxo” é a sua favorita. “Mas você não enjoa de seus brinquedos?”, provoco a garotinha que me esclarece prontamente a questão:“Alice é minha filhinha, quando eu canso de brincar com ela, finjo que levei ela pra escola e brinco com outra coisa”.
A proximidade do Dia das Crianças – e o excesso de estímulos de compra que acompanha a data – convida auma reflexão sobre o consumismo na infância: e se neste ano a comemoração for diferente? E se ao invés de comprar um brinquedo novo, levar o filho ou filha à uma feira de trocas? Ou trocar o presente por um passeio divertido? Quem sabe, até, pais, mães e filhos não podem construir juntos o novo brinquedo da criança?
Depoimentos de especialistas, pais, mães e lideranças de movimentos que lutam pela regulação da publicidade infantil no Brasil mostram que apesar de ser uma tarefa difícil, muita gente está tentando fazer diferente.
Qualquer objeto é brinquedo
Doutora em educação e professora do programa de pós-graduação em Educação da PUC Minas, Magali dos Reis explica que a competição pelo brinquedo “mais legal” ou “mais caro” é uma característica ocidental e urbana. “Crianças que têm acesso a bens de consumo começam a ter esse desejo despertado entre 4 e 5 anos. Nessa fase, elas já conseguem diferenciar aqueles que são mais chamativos dos mais simples. A partir dos 6, já percebem quais brinquedos são mais tecnológicos e avançados que outros”, explica. Segundo a especialista, como as crianças se imitam muito e buscam referências entre seus pares, a vontade de ter o brinquedo igual a de um colega de escola, por exemplo, é inevitável. “Por volta dos 6 anos, elas vão se organizando em grupos que compartilham um gosto por um brinquedo específico. Criam-se uns clubinhos de meninas que colecionam barbies ou de garotos que gostam do Ben 10”, exemplifica.
Entre os mais pequenos, entre 2 e 4 anos, a principal característica é o desinteresse rápido pelos objetos. “Eles abandonam, mas retornam a ele”, afirma a educadora. O que independe da idade é a capacidade de a criança transformar qualquer objeto em brinquedo. Outra realidade é a habilidade de meninos e meninas em transformar a função e o sentido do brinquedo. “Isso nada tem a ver com a qualidade ou preço”, resume.
Novidade em casa sem gastar dinheiro
O Instituto Alana é responsável pela mobilização nacional por um Dia das Crianças diferente. Em Belo Horizonte, a II Feira de Troca e Doação de Brinquedos acontecerá no Parque das Mangabeiras, sábado, 5 de outubro, entre 13h e 17h, e é uma oportunidade para as famílias vivenciarem uma experiência que mistura desprendimento, paciência, respeito, coragem, compartilhamento e aprendizado para os pequenos e grandes.
“Iniciativas como a do Instituto Alana nos dão a chance de construir com nossos filhos uma alternativa ao consumismo desenfreado e tentar reverter hábitos de consumo enraizados dentro nós mesmos. Depois que me tornei pai e comecei a pensar no consumo como o grande ponto a ser tratado no combate à poluição ambiental, já enfrentei alguns dilemas, como é o caso do Dia das Crianças: sei que se trata de uma construção do mercado, mas não me sinto bem em não dar nada. Por que isso? Porque fui criado nesse contexto, como tantos da minha geração, e mudar leva tempo”. O depoimento é do professor de Direito Ambiental do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix e editor do blog Aldeia Comum, Alexandre Magrineli dos Reis. Ele é pai deuma menina de 2 anos. Neste ano, sua filha vai estrear na Feira da Troca de Brinquedos em BH e ele se sente desafiado: “Não vou dizer que isso vai ser fácil, mas é uma obrigação que cada mãe e pai devem assumir em prol do futuro de seus filhos”.
Publicitária, mestre em políticas públicas, autora do blog Viciados em colo, co-fundadora do Movimento Infância Livre de Consumismo, Mariana Sá é mãe de Alice, 8 anos, e Arthur, de 3. Moradora de Salvador, ela acredita que as atrações infantis e as oficinas podem atrair para as feiras de troca de brinquedos famílias que nunca pensaram sobre o consumismo na infância. Para ela, é uma oportunidade imperdível. “A criança lida com o valor não monetário das coisas, isso é uma vivência como mãe que nenhum texto verbal vai proporcionar. Para o adulto, isso é chocante, mas aquele que se permitir deixar a criança negociar, terá um ganho muito grande”, afirma.
Outras cidades brasileiras também estão mobilizadas. Veja a programação:
Além de negociar, a feira de trocas é uma oportunidade para que meninos e meninas desenvolvam as habilidades de paciência, compreensão e respeito, desapego e por que não dizer, coragem. O valor do brinquedo não é o que norteia o "negócio", mas sim, o interesse da criança. Clique na imagem para ampliá-la
Na casa de Beatriz, de 8 anos, a regra é: para cada brinquedo novo que entra, um tem que sair
A proximidade do Dia das Crianças – e o excesso de estímulos de compra que acompanha a data – convida auma reflexão sobre o consumismo na infância: e se neste ano a comemoração for diferente? E se ao invés de comprar um brinquedo novo, levar o filho ou filha à uma feira de trocas? Ou trocar o presente por um passeio divertido? Quem sabe, até, pais, mães e filhos não podem construir juntos o novo brinquedo da criança?
Depoimentos de especialistas, pais, mães e lideranças de movimentos que lutam pela regulação da publicidade infantil no Brasil mostram que apesar de ser uma tarefa difícil, muita gente está tentando fazer diferente.
Leia a reportagem completa:
Famílias contam como conseguem frear o ritmo de consumo das crianças
Em sua segunda edição, Feira de Troca de Brinquedos em BH espera receber novas famílias
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Qualquer objeto é brinquedo
Doutora em educação e professora do programa de pós-graduação em Educação da PUC Minas, Magali dos Reis explica que a competição pelo brinquedo “mais legal” ou “mais caro” é uma característica ocidental e urbana. “Crianças que têm acesso a bens de consumo começam a ter esse desejo despertado entre 4 e 5 anos. Nessa fase, elas já conseguem diferenciar aqueles que são mais chamativos dos mais simples. A partir dos 6, já percebem quais brinquedos são mais tecnológicos e avançados que outros”, explica. Segundo a especialista, como as crianças se imitam muito e buscam referências entre seus pares, a vontade de ter o brinquedo igual a de um colega de escola, por exemplo, é inevitável. “Por volta dos 6 anos, elas vão se organizando em grupos que compartilham um gosto por um brinquedo específico. Criam-se uns clubinhos de meninas que colecionam barbies ou de garotos que gostam do Ben 10”, exemplifica.
Entre os mais pequenos, entre 2 e 4 anos, a principal característica é o desinteresse rápido pelos objetos. “Eles abandonam, mas retornam a ele”, afirma a educadora. O que independe da idade é a capacidade de a criança transformar qualquer objeto em brinquedo. Outra realidade é a habilidade de meninos e meninas em transformar a função e o sentido do brinquedo. “Isso nada tem a ver com a qualidade ou preço”, resume.
Doutora em educação e professora do programa de pós-graduação em Educação da PUC Minas, Magali dos Reis explica que a competição pelo brinquedo "mais legal" ou "mais caro" é uma característica ocidental e urbana
O Instituto Alana é responsável pela mobilização nacional por um Dia das Crianças diferente. Em Belo Horizonte, a II Feira de Troca e Doação de Brinquedos acontecerá no Parque das Mangabeiras, sábado, 5 de outubro, entre 13h e 17h, e é uma oportunidade para as famílias vivenciarem uma experiência que mistura desprendimento, paciência, respeito, coragem, compartilhamento e aprendizado para os pequenos e grandes.
“Iniciativas como a do Instituto Alana nos dão a chance de construir com nossos filhos uma alternativa ao consumismo desenfreado e tentar reverter hábitos de consumo enraizados dentro nós mesmos. Depois que me tornei pai e comecei a pensar no consumo como o grande ponto a ser tratado no combate à poluição ambiental, já enfrentei alguns dilemas, como é o caso do Dia das Crianças: sei que se trata de uma construção do mercado, mas não me sinto bem em não dar nada. Por que isso? Porque fui criado nesse contexto, como tantos da minha geração, e mudar leva tempo”. O depoimento é do professor de Direito Ambiental do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix e editor do blog Aldeia Comum, Alexandre Magrineli dos Reis. Ele é pai deuma menina de 2 anos. Neste ano, sua filha vai estrear na Feira da Troca de Brinquedos em BH e ele se sente desafiado: “Não vou dizer que isso vai ser fácil, mas é uma obrigação que cada mãe e pai devem assumir em prol do futuro de seus filhos”.
Publicitária, mestre em políticas públicas, autora do blog Viciados em colo, co-fundadora do Movimento Infância Livre de Consumismo, Mariana Sá é mãe de Alice, 8 anos, e Arthur, de 3. Moradora de Salvador, ela acredita que as atrações infantis e as oficinas podem atrair para as feiras de troca de brinquedos famílias que nunca pensaram sobre o consumismo na infância. Para ela, é uma oportunidade imperdível. “A criança lida com o valor não monetário das coisas, isso é uma vivência como mãe que nenhum texto verbal vai proporcionar. Para o adulto, isso é chocante, mas aquele que se permitir deixar a criança negociar, terá um ganho muito grande”, afirma.
Outras cidades brasileiras também estão mobilizadas. Veja a programação: