Vitiligo está muito ligado a questões emocionais
Pesquisa feita na PUC-PR relaciona o gene DDR1 ao surgimento das manchas
Celina Aquino
Publicação:26/12/2013 13:00Atualização: 26/12/2013 12:04
O vitiligo é uma doença autoimune que promove a destruição pelo próprio organismo dos melanócitos, células responsáveis pela produção do pigmento melanina. O processo pode ser bem repentino, assim como ocorreu com Maria Antonieta. "O choque emocional pode estar ligado ao vitiligo, mas não é a sua causa. O estresse desencadeia a doença em pessoas com predisposição genética", esclarece o dermatologista Caio de Castro, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e chefe do ambulatório de vitiligo da Santa Casa de Curitiba. Ele é o coordenador da pesquisa que apontou o gene DDR1 como um dos ligados à adesão dos melanócitos à pele. Castro acredita que a descoberta vai contribuir para o desenvolvimento de remédios voltados para a doença que ele considera ser órfã, já que ainda não existe um tratamento elaborado especificamente para ela.
As manchas podem aparecer em qualquer lugar do corpo, mas Castro informa que elas são mais comuns em áreas de atrito. Por isso, o vitiligo se manifesta com mais frequência nas mãos e no rosto. Os pelos podem ficar brancos e é comum no início da doença a queixa de coceira. A sensibilidade na pele permanece inalterada. "Algumas pessoas podem ter diminuição de audição e inflamação nos olhos quando a doença ataca os melanócitos dos ouvidos e dos olhos, o que é raríssimo. O vitiligo doi mais na alma", diz o dermatologista paranense.
O medo dos pacientes é de que as manchas se espalhem. Não há como garantir o resultado, mas de qualquer maneira é importante iniciar o tratamento o mais rápido possível. O ideal é procurar acompanhamento médico com menos de cinco anos porque ainda há melanócitos vivos. A meta é estimular as células produtoras de melanina do entorno (tanto as que estão na pele quanto as que pigmentam os pelos) a migrar para a mancha. Logo, as áreas com pelo respondem melhor ao tratamento. Pelo mesmo motivo, quem tem tendência a desenvolver a doença não deve fazer depilação a laser. Os pelos podem ser úteis caso um dia seja necessário estimular a pigmentação da pele.
FOTOTERAPIA
Além de usar medicamentos tópicos e orais, os pacientes podem ser submetidos ao tratamento fototerápico com radiação ultravioleta. A cabine é indicada para casos em que mais de 30% do corpo está tomado pela doença. Já com laser ou lâmpada os raios são direcionados para cada mancha separadamente. Apesar de a fototerapia apresentar bons resultados, o pesquisador da PUC-PR Caio de Castro destaca o inconveniente de haver um limite de exposição, já que a técnica pode aumentar o risco de câncer. Para os raios UVA, são 200 sessões, enquanto o máximo para a radiação UVB ainda não está estabelecido.
O dermatologista também lamenta que o tratamento esteja disponível apenas nos grandes centros, o que dificulta a vida de pacientes do interior, que precisam faltar ao trabalho e gastar dinheiro com o deslocamento para ir ao médico. O médico defende que o ideal seria um remédio para tomar em casa. A boa notícia é que o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibilizou há pouco tempo o tratamento para vitiligo, que não é barato. Trinta sessões de fototerapia podem custar de R$ 1 mil a R$ 2 mil.
"O arsenal de tratamento é muito pequeno, por isso precisamos de mais pesquisa. Há um laboratório no Brasil desenvolvendo novos medicamentos, mas nada tão animador", revela o dermatologista, adiantando que o próximo medicamento para vitiligo, uma injeção que estimula a pigmentação, pensada originalmente para porfiria (outra doença de pele), é uma invenção de pesquisadores australianos e deve chegar ao Brasil em três anos. Nos Estados Unidos, está em teste um análogo de hormônio que poderá ser usado para aumentar a produção de melanina.
DEPOIMENTOS
Maria do Socorro Dourado de Souza, 71 anos, aposentada
"Estava no shopping quando minha filha viu uma mancha na minha pálpebra. Tinha voltado da praia, então achei que pudesse ser uma micose. Meu marido estava em estado terminal e à medida que ele foi piorando, foram aparecendo pequenas manchas no meu rosto. Elas não me incomodavam, para mim era insignificante. No meu aniversário de 70 anos, fiquei tensa com a casa cheia. Quando todo mundo foi embora, percebi que meu rosto estava todo manchado e havia marcas também nas mãos e nas pernas. Iniciei o tratamento, mas toda a melhora foi por água abaixo porque minha filha ficou hospitalizada e meu prédio foi assaltado na mesma época. O que me atrapalha é a vergonha. Fico escondendo as mãos, mas tenho esperança de que vou ficar livre disso um dia. Nunca devemos desistir."
Artur Christofaro Alves, 9 anos, estudante
"Na aula de educação física, a professora me perguntou que mancha era aquela debaixo do olho. Ela já tinha tido vitiligo e ligou para a minha mãe. Disse que era bom tratar o mais rápido possível. Fiquei desesperado com medo de ser uma doença grave. Quase todo primeiro dia de aula meus colegas perguntam o que é. Ficam com medo de ser contagioso. Não gosto de ter a mancha, mas não me sinto diferente dos outros. Para quem descobre que tem vitiligo, eu diria que não precisa se preocupar. Se cuidar muito bem, não vai acontecer nada de ruim. Tem só que lembrar de se expor menos ao sol."
Forte influência emocional
"Não adianta nada medicar sem olhar para o lado emocional. No consultório, aplico técnicas integrativas como a hipnose, que promove o relaxamento muscular profundo e facilita o acesso ao inconsciente. O trabalho é para retirar o elemento emocional que está contribuindo para o vitiligo. Pode ser que isso contribua para a repigmentação, pode ser que não. Muitos fatores influenciam", ressalta o médico. Azambuja entende que o paciente precisa ter persistência, disciplina e crença. Levar uma vida mais saudável também contribui para o tratamento. "O estresse é a maior causa de adoecimento. É fundamental que a pessoa aprenda uma respiração natural e mantenha a musculatura relaxada para viver bem, senão vai estar o tempo todo afetando o sistema imunológico."
Roberto Doglia Azambuja - dermatologista
O QUE SE SABE SOBRE A DOENÇA
» A prevalência é de 0,5% na população mundial. Na Índia, o número chega a 1%. Suspeita-se que tenha relação com o alto consumo de curry, tempero que aumenta o processo inflamatório da doença.
» A idade média de início é 24 anos, mas a doença pode acometer pessoas de qualquer idade. Há
casos, inclusive, em que ela aparece nos primeiros
dias de vida.
» Em pacientes com vitiligo, a tendência é maior de envelhecimento da pele e queimadura, por isso é recomendado evitar exposição ao sol. A doença não tem relação com câncer de pele.
» É uma doença bem antiga. Até na Bíblia ela está citada, em hebraico, com o nome tzaraat.
» É perfeitamente possível ver um paciente com vitiligo ser curado, mas não há como o médico garantir que as manchas vão desaparecer com o tratamento.
» Não passa necessariamente de pai para filhos. Quando retorna à mesma família, a doença com influência genética costuma pular gerações.
» Não é uma doença contagiosa.
Saiba mais...
Dizem que a última rainha da França não conseguiu esconder o desespero no fim da vida. Maria Antonieta acordou com manchas brancas espalhadas pelo corpo no dia em que seria guilhotinada em praça pública. Era vitiligo. Ainda são desconhecidas as causas da doença que afeta a pigmentação da pele, mas sabe-se que há um importante componente psicológico. "É evidente a influência do emocional. A maioria dos pacientes são estressados e ansiosos, alguns sofreram traumas. Impressiona ver que as manchas podem aparecer da noite para o dia", comenta o dermatologista de Brasília Roberto Doglia Azambuja, que lida com o vitiligo há 37 anos. Recentemente, pesquisadores brasileiros descobriram um dos genes que está associado ao surgimentos das manchas.O vitiligo é uma doença autoimune que promove a destruição pelo próprio organismo dos melanócitos, células responsáveis pela produção do pigmento melanina. O processo pode ser bem repentino, assim como ocorreu com Maria Antonieta. "O choque emocional pode estar ligado ao vitiligo, mas não é a sua causa. O estresse desencadeia a doença em pessoas com predisposição genética", esclarece o dermatologista Caio de Castro, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e chefe do ambulatório de vitiligo da Santa Casa de Curitiba. Ele é o coordenador da pesquisa que apontou o gene DDR1 como um dos ligados à adesão dos melanócitos à pele. Castro acredita que a descoberta vai contribuir para o desenvolvimento de remédios voltados para a doença que ele considera ser órfã, já que ainda não existe um tratamento elaborado especificamente para ela.
As manchas podem aparecer em qualquer lugar do corpo, mas elas são mais comuns em áreas de atrito
O medo dos pacientes é de que as manchas se espalhem. Não há como garantir o resultado, mas de qualquer maneira é importante iniciar o tratamento o mais rápido possível. O ideal é procurar acompanhamento médico com menos de cinco anos porque ainda há melanócitos vivos. A meta é estimular as células produtoras de melanina do entorno (tanto as que estão na pele quanto as que pigmentam os pelos) a migrar para a mancha. Logo, as áreas com pelo respondem melhor ao tratamento. Pelo mesmo motivo, quem tem tendência a desenvolver a doença não deve fazer depilação a laser. Os pelos podem ser úteis caso um dia seja necessário estimular a pigmentação da pele.
FOTOTERAPIA
Além de usar medicamentos tópicos e orais, os pacientes podem ser submetidos ao tratamento fototerápico com radiação ultravioleta. A cabine é indicada para casos em que mais de 30% do corpo está tomado pela doença. Já com laser ou lâmpada os raios são direcionados para cada mancha separadamente. Apesar de a fototerapia apresentar bons resultados, o pesquisador da PUC-PR Caio de Castro destaca o inconveniente de haver um limite de exposição, já que a técnica pode aumentar o risco de câncer. Para os raios UVA, são 200 sessões, enquanto o máximo para a radiação UVB ainda não está estabelecido.
O dermatologista também lamenta que o tratamento esteja disponível apenas nos grandes centros, o que dificulta a vida de pacientes do interior, que precisam faltar ao trabalho e gastar dinheiro com o deslocamento para ir ao médico. O médico defende que o ideal seria um remédio para tomar em casa. A boa notícia é que o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibilizou há pouco tempo o tratamento para vitiligo, que não é barato. Trinta sessões de fototerapia podem custar de R$ 1 mil a R$ 2 mil.
"O arsenal de tratamento é muito pequeno, por isso precisamos de mais pesquisa. Há um laboratório no Brasil desenvolvendo novos medicamentos, mas nada tão animador", revela o dermatologista, adiantando que o próximo medicamento para vitiligo, uma injeção que estimula a pigmentação, pensada originalmente para porfiria (outra doença de pele), é uma invenção de pesquisadores australianos e deve chegar ao Brasil em três anos. Nos Estados Unidos, está em teste um análogo de hormônio que poderá ser usado para aumentar a produção de melanina.
DEPOIMENTOS
Maria do Socorro Dourado de Souza, 71 anos, aposentada
"Estava no shopping quando minha filha viu uma mancha na minha pálpebra. Tinha voltado da praia, então achei que pudesse ser uma micose. Meu marido estava em estado terminal e à medida que ele foi piorando, foram aparecendo pequenas manchas no meu rosto. Elas não me incomodavam, para mim era insignificante. No meu aniversário de 70 anos, fiquei tensa com a casa cheia. Quando todo mundo foi embora, percebi que meu rosto estava todo manchado e havia marcas também nas mãos e nas pernas. Iniciei o tratamento, mas toda a melhora foi por água abaixo porque minha filha ficou hospitalizada e meu prédio foi assaltado na mesma época. O que me atrapalha é a vergonha. Fico escondendo as mãos, mas tenho esperança de que vou ficar livre disso um dia. Nunca devemos desistir."
Artur Christofaro Alves, 9 anos, estudante
"Na aula de educação física, a professora me perguntou que mancha era aquela debaixo do olho. Ela já tinha tido vitiligo e ligou para a minha mãe. Disse que era bom tratar o mais rápido possível. Fiquei desesperado com medo de ser uma doença grave. Quase todo primeiro dia de aula meus colegas perguntam o que é. Ficam com medo de ser contagioso. Não gosto de ter a mancha, mas não me sinto diferente dos outros. Para quem descobre que tem vitiligo, eu diria que não precisa se preocupar. Se cuidar muito bem, não vai acontecer nada de ruim. Tem só que lembrar de se expor menos ao sol."
Forte influência emocional
"Não adianta nada medicar sem olhar para o lado emocional. No consultório, aplico técnicas integrativas como a hipnose, que promove o relaxamento muscular profundo e facilita o acesso ao inconsciente. O trabalho é para retirar o elemento emocional que está contribuindo para o vitiligo. Pode ser que isso contribua para a repigmentação, pode ser que não. Muitos fatores influenciam", ressalta o médico. Azambuja entende que o paciente precisa ter persistência, disciplina e crença. Levar uma vida mais saudável também contribui para o tratamento. "O estresse é a maior causa de adoecimento. É fundamental que a pessoa aprenda uma respiração natural e mantenha a musculatura relaxada para viver bem, senão vai estar o tempo todo afetando o sistema imunológico."
Roberto Doglia Azambuja - dermatologista
O QUE SE SABE SOBRE A DOENÇA
» A prevalência é de 0,5% na população mundial. Na Índia, o número chega a 1%. Suspeita-se que tenha relação com o alto consumo de curry, tempero que aumenta o processo inflamatório da doença.
» A idade média de início é 24 anos, mas a doença pode acometer pessoas de qualquer idade. Há
casos, inclusive, em que ela aparece nos primeiros
dias de vida.
» Em pacientes com vitiligo, a tendência é maior de envelhecimento da pele e queimadura, por isso é recomendado evitar exposição ao sol. A doença não tem relação com câncer de pele.
» É uma doença bem antiga. Até na Bíblia ela está citada, em hebraico, com o nome tzaraat.
» É perfeitamente possível ver um paciente com vitiligo ser curado, mas não há como o médico garantir que as manchas vão desaparecer com o tratamento.
» Não passa necessariamente de pai para filhos. Quando retorna à mesma família, a doença com influência genética costuma pular gerações.
» Não é uma doença contagiosa.