Bebidas alcoólicas e excesso de proteína elevam perigosamente os níveis de ácido úrico
Quando alto demais no organismo, substância provoca inflamação nas articulações, gerando muita dor
Desencadeada pela elevação de ácido úrico no sangue, a gota tem um fator genético determinante, podendo ser passada de pai para filho. Bebidas alcoólicas em excesso e alimentação rica em proteína também podem aumentar os índices da substância, evoluindo para a inflamação das articulações. “O principal causador é a predisposição genética, aferida por meio do histórico familiar. Mas se a pessoa abusa do álcool, pode desenvolver a gota, mesmo com pouca predisposição para isso”, alerta o reumatologista e presidente da Sociedade Mineira de Reumatologia, Boris Cruz.
Ao contrário do que reza o conhecimento popular, qualquer bebida alcoólica pode desencadear a produção excessiva de ácido úrico no sangue e não apenas as fermentadas, como a cerveja. “Existe uma crença de que as versões destiladas podem ser consumidas, mas qualquer bebida alcoólica provoca alterações no metabolismo”, esclarece Boris. É no fígado que dois terços do ácido úrico é produzido. O restante é proveniente da degradação da purina, proteína encontrada principalmente em carnes brancas e vermelhas, vísceras e frutos do mar.
Parte desse ácido úrico é eliminado pelos rins, enquanto o restante permanece no sangue. Para superar os níveis considerados aceitáveis, é preciso produzir muito mais ácido úrico do que o organismo é capaz de eliminar ou ter alguma deficiência no processo de expulsão da substância do corpo por meio da urina. “Esse último caso atinge 90% dos pacientes”, calcula Geraldo Castelar.
Em excesso, o ácido úrico pode formar cristais que, com o passar do tempo, são depositados nas articulações, evoluindo para a gota. “Por ter uma temperatura local mais baixa, esse depósito de cristais ocorre principalmente nas extremidades do corpo, como no dedão do pé e na orelha”, explica Castelar. Traumas frequentes como batidas formam o cenário perfeito para que as primeiras crises ocorram justamente no dedão do pé. Com o tempo, podem atingir outras regiões, como cotovelo, tornozelo, joelho, calcanhar, ombros e mãos. Vale lembrar que não são todas as pessoas que têm a substância em nível elevado no organismo que desenvolverão a gota. O diagnóstico definitivo só é possível mediante a punção do líquido presente no local inflamado e verificação da presença dos cristais de ácido úrico.
HOMENS EM FOCO
A doença é predominantemente masculina, podendo se manifestar a partir dos 30 anos, sendo mais comum na faixa de 40 a 50 anos. “A mulher, principalmente durante a vida fértil, tem altos níveis de estrogênio, hormônio que aumenta a excreção renal de ácido úrico. Por isso a gota não é comum antes da menopausa”, explica Castelar. O sintoma mais comum é de inchaço na área atingida, seguido de uma forte dor. “É a forma de inflamação das articulações que provoca a dor mais intensa. Essa condição é utilizada, inclusive, como fator de diagnóstico”, reconhece o reumatologista e presidente da Sociedade Mineira de Reumatologia Boris Cruz.
Enquanto isso... dados são coletados
Foi lançado no final de 2013 levantamento para verificar como os profissionais estão tratando a gota no Brasil. “A partir dos resultados, vamos elaborar atividades de educação médica continuada”, afirma Geraldo Castelar, coordenador da Comissão de Gota da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR). Na maior parte dos casos, não é o reumatologista, mas sim o clínico geral, médico de saúde da família, cardiologista e até o ortopedista que identificam o problema. “No primeiro momento, queremos atualizar os conhecimentos dos próprios reumatologistas para depois reproduzir as informações para as demais especialidades médicas”, planeja Castelar. Também está em fase de pesquisa o percentual da população brasileira acometida pelas dores nas articulações causadas pelo excesso de ácido úrico no sangue. Nos Estados Unidos e Europa, estima-se que 1,5% da população adulta seja portadora de gota.
Com gota desde os 30 anos, o empresário Américo José Vivas de Sá, de 48, lembra que, durante as crises, não podia fazer qualquer movimento com o pé. “Não podia nem sequer ventar no local”, conta, na tentativa de descrever a intensidade do sofrimento. Com nível de ácido úrico quase duas vezes superior ao considerado normal, ele lembra que qualquer excesso era suficiente para desencadear as crises, que, ao longo do tempo, se tornaram mais intensas e frequentes. “Diante disso, resolvi eliminar as bebidas alcoólicas e reduzir o consumo de carne. Somente com o lançamento de um remédio é que as crises foram controladas definitivamente.”