Estudos comprovam que morar perto da natureza melhora a saúde física e mental

Contato regular com o verde tem efeito a longo prazo. É possível usufruir desses benefícios mesmo vivendo em centros urbanos, basta frequentar clubes e parques

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Vilhena Soares - Correio Braziliense Publicação:31/01/2014 15:15Atualização:31/01/2014 09:57
“Eu quero uma casa no campo, onde eu possa compor muitos rocks rurais e tenha somente a certeza dos amigos do peito e nada mais.” O trecho de Casa no campo, canção famosa gravada por Elis Regina, é um exemplo da vontade comum entre muitas pessoas de fugir para perto da natureza como uma tentativa de encontrar mais felicidade e calma. Além de ser fonte de tranquilidade, o verde pode trazer mais saúde, indicam estudos recentes.

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Pesquisas divulgadas por cientistas ingleses e finlandeses mostram que pessoas que moram perto da natureza têm uma saúde melhor do que as moradoras de locais totalmente urbanos. Os estudiosos descobriram ainda que o contato regular com o verde tem efeito a longo prazo. Mesmo após uma mudança de endereço, os benefícios da experiência permanecem durante anos.

Isabel Cavalcanti, 34 anos, conseguiu alterar a rotina e aumentar a qualidade de vida há oito anos, quando se mudou de uma casa para um haras, no Distrito Federal. Ela trocou de endereço para ficar mais perto da família do marido e percebeu as mudanças em pouco tempo. “Encontrei novidades que mudaram o meu modo de viver. Antes, eu tinha uma vida mais sedentária, não realizava exercícios nem me preocupava muito com a minha alimentação. Hoje, caminho nas trilhas que temos aqui no haras e consigo fazer as refeições de casa com os legumes da horta que cultivamos aqui”, conta.

Parque Municipal de Belo Horizonte oferece aluguel de barcos; constatações de que estar em contato com a natureza faz bem à saúde reforçam a importância do ordenamento urbano (Tulio Santos/EM/D.A Press)
Parque Municipal de Belo Horizonte oferece aluguel de barcos; constatações de que estar em contato com a natureza faz bem à saúde reforçam a importância do ordenamento urbano
Isabel acredita que essas mudanças fizeram com que ela e sua família conseguissem viver com mais qualidade. “Meu filho nasceu aqui e foi criado solto, com muita liberdade, animais por perto como tucanos e araras. Para ele, é bem divertido e saudável e, para nós, também. Nosso estilo de viver mudou para melhor”, avalia.

Ian Alcock detectou resultados semelhantes ao avaliar mais de mil participantes em um estudo conduzido na Universidade de Exeter Medical School, no Reino Unido. Alcock e equipe focaram em dois grupos de pessoas: aquelas que foram viver em áreas urbanas mais verdes e as que se mudaram para as áreas urbanas menos verdes. A análise durou cinco anos e os pesquisadores descobriram que a ida para áreas mais verdes resultou em uma melhora imediata na saúde mental dos participantes, que foi mantida por pelo menos três anos depois da troca de endereço.

O estudo, divulgado na revista Environmental Science & Technology, também constatou o inverso: queda na saúde mental em pessoas que passaram a viver em ambientes com menor contato com a natureza. “Esses resultados são importantes para os planejadores urbanos que trabalham com a introdução de novos espaços verdes para vilas e cidades, o que sugere que eles poderiam fornecer benefícios a longo prazo para as comunidades locais”, analisa Alcock.

Do lado de casa
Os espaços verdes não precisam ser exclusivos ou distantes dos centros urbanos, segundo a pesquisa. Frequentar o parque perto de casa também rende benefícios à mente e ao corpo. O professor universitário Gabriel Cardoso é triatleta. Mora em Águas Claras, cidade do DF conhecida pelo grande número de construções e pelo trânsito pesado. Apesar das complicações que tiram o sossego, ele consegue escapar da bagunça todos os dias ao visitar o Parque de Águas Claras. “Venho para cá pela proximidade mesmo, bem em frente a minha casa. O espaço do parque é muito amplo e arborizado, o que me permite correr, pedalar, exercitar o meu hobbie em um ambiente bem agradável, bastante verde”, conta.

O professor Gabriel Cardoso usa o Parque de Águas Claras, perto de onde mora no Distrito Federal, para praticar triatlo: 'A praticidade é uma vantagem' (Carlos Moura/CB/D.A Press)
O professor Gabriel Cardoso usa o Parque de Águas Claras, perto de onde mora no Distrito Federal, para praticar triatlo: "A praticidade é uma vantagem"
Uma das vantagens de morar perto do parque, para Gabriel, é que ele pode adequar os treinamentos à rotina e, desse modo, praticar mais exercícios, reservando um período do tempo também para ficar perto da natureza. “Acredito que a proximidade me dá bastante estímulo, a praticidade é uma vantagem, o triatlo exige uma quantidade de treinos muito grande e muito fixa. Uso os intervalos que tenho, seja de manhã, seja à noite, e consigo também curtir um pouco a natureza, o que me faz muito bem”, completa.

Pesquisadores finlandeses também reuniram provas de que um período de tempo pequeno por dia passado próximo a áreas verdes pode trazer resultados positivos. O trabalho foi feito pela equipe do Departamento de Saúde Ambiental e da Unidade de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde e Bem-Estar e publicado recentemente no Journal of Environmental. Os cientistas realizaram um experimento com 77 participantes que foram levados, após o expedientes, para três espaços com paisagens diferentes na cidade de Helsinque, na Finlândia.

As áreas visitas foram o centro da cidade, um parque urbano e uma floresta urbana. Os pesquisadores perceberam mudanças positivas quando os participantes iam aos locais em que tinham mais contato com a natureza. “Nossos resultados mostram que o grande parque urbano e a floresta urbana resultaram em quase a mesma influência positiva, mas, no resultado final, os efeitos positivos foram maiores nas visitas à floresta”, complementa Liisa Tyrväinena, uma das líderes do estudo.

Os cientistas acreditam que o trabalho mostra que passar um tempo próximo à natureza, mesmo que pequeno, pode fazer bem para o humor das pessoas. “As descobertas sugerem que até mesmo visitas de curto prazo para áreas naturais tem efeitos positivos em relação ao alívio do estresse”, detalha Tyrväinena no trabalho.

Segundo Denise de Lima Oliveira Vilas Boas, vice-presidente da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental, que muitas pesquisas na área de psicologia ambiental têm surgido com o foco em melhorias na saúde proporcionadas pela natureza. Os resultados seguem a linha das constatações feitas pelos estudiosos do Reino Unido e da Finlândia. “Esse é um ponto de pesquisa interessante. Ficar mais perto do meio ambiente pode fazer com que a pessoa se sinta mais motivada a praticar esportes, como correr, e esse é o primeiro passo para que se tenha mais qualidade de vida”, destaca.

 (Soraia Piva / EM / DA Press)
Espaços valorizados

As constatações de que estar em contato com a natureza faz bem à saúde reforçam a importância do ordenamento urbano. Elas têm se tornado cada vez mais um critério de peso na escolha dos endereços. “Os espaços mais verdes, áreas com parques e água próximos, têm tido um valor até mais alto no mercado. Não só pela possibilidade de poder caminhar em um lugar mais agradável, mas também para se afastar das poluições, como a sonora e a visual”, explica Yeda Garcia, arquiteta e urbanista.


Segundo Garcia, há também uma tendência de adaptação de estratégias de moradia para criar espaços em que seja possível o contato com o verde. “Nós estamos em um momento em que os espaços construídos estão adotando o jardim vertical, uma alternativa para quem não tem espaço para construir uma área horizontal. Em Paris, esse jardim já é comum e funciona como uma forma de chamar a atenção para a questão ambiental.”

A arquiteta também acredita que a luta dos moradores por espaços mais verdes nas áreas urbanas  deve crescer com o tempo. “Brasília é famosa por isso. Creio que os moradores não vão querer que mude e, quem sabe, possam até reivindicar o aumento desses espaços”, aposta. A Organização das Nações Unidas (ONU) recomenda que uma cidade pelo menos 12 metros quadrados de área verde por habitante.

A psicóloga comportamental Denise de Lima Oliveira Vilas Boas também acredita que mudanças estão surgindo na reorganização de espaços para que as pessoas possam aproveitar as áreas verdes mesmo morando em cidades. “Ter uma praça ou um parque perto de onde você mora com certeza pode dar um incentivo maior para sair de casa. Hoje, já vemos esses espaços se adaptarem, condomínios que criam áreas em conjunto, como parquinhos e piscinas. Ou seja, você vive em um apartamento, mas pode ter esses recursos por perto”, diz.

Exemplo goiano. BH fica em 3º lugar
Em uma pesquisa divulgada em 2012, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que, entre as 5 cidades brasileiras com mais de 1 milhão de habitantes, Goiânia é a mais arborizadas, com 89,5% de áreas com árvores no entorno das casas. Campinas e Belo Horizonte ocupam o segundo e o terceiro lugares no ranking, com 88,4% e 83%, respectivamente. Segundo o IBGE, com exceção da capital de Goiás, as cidades com esse perfil estão concentradas nas regiões Sul e Sudeste. Nas regiões Norte e Nordeste, estão as casas com menos espaço verde: Belém (22,4%) e Manaus (25,1%) têm os menores percentuais. Brasília ocupara a 12ª posição do ranking, com 37,2%.

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