Acidentes de trânsito, Aids e suicídio lideram as causas de morte entre pessoas com idade entre 10 e 19 anos

Juventude tem a depressão como principal fator incapacitante. Condições psicológicas e comportamentais bastante particulares dessa fase da vida influenciam nas características da doença

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Bruna Sensêve - Correio Braziliense Publicação:15/05/2014 11:00Atualização:15/05/2014 09:32
A depressão lidera o ranking da Organização Mundial da Saúde (OMS) das doenças e dos motivos para incapacidade entre adolescentes. O mal é predominante entre pessoas com idade entre 10 e 19 anos, na frente de questões normalmente em maior evidência nessa população, como a violência, a anemia e as infecções. Os acidentes de trânsito foram a principal causa de morte em 2012, com cerca de 330 casos diariamente. O número de suicídios também obteve destaque, listado como a terceira causa de óbitos entre aproximadamente 1,3 milhão de jovens mortos no mesmo ano. Mais letais que o atentado contra a própria vida, a infecção por HIV e o consequente desenvolvimento da Aids cresceram em todo o planeta e se tornaram a segunda principal causa de mortes.

Uma a cada seis pessoas no mundo é adolescente, o que corresponde a um universo de 1,2 bilhão de jovens entre 10 e 19 anos. A maioria é considerada saudável, reforçando o dado de que grande parte dos motivos que levaram essa população à morte é evitável ou tratável. A OMS estima que mais de 2 milhões de adolescentes vivem com o HIV e, ainda que o número total de óbitos relacionados à infecção tenha caído 30% desde o último pico, há oito anos, a mortalidade de jovens devido à síndrome da imunodeficiência adquirida está aumentando. O crescimento foi registrado principalmente na região africana e, segundo a instituição, pode refletir o fato de mais crianças terem sobrevivido à infecção durante a gestação, o parto e a amamentação até a adolescência.

Uma a cada seis pessoas no mundo é adolescente, o que corresponde a um universo de 1,2 bilhão de jovens entre 10 e 19 anos. A maioria é considerada saudável, reforçando o dado de que grande parte dos motivos que levaram essa população à morte é evitável ou tratável (Valf / EM / DA Press)
Uma a cada seis pessoas no mundo é adolescente, o que corresponde a um universo de 1,2 bilhão de jovens entre 10 e 19 anos. A maioria é considerada saudável, reforçando o dado de que grande parte dos motivos que levaram essa população à morte é evitável ou tratável
“Você tem um grupo de transmissão vertical que pode estar na segunda ou na terceira linha de medicamentos e, no continente africano, o acesso ao tratamento tende a ser mais difícil”, explica Marinella Della Negra, infectologista do Instituto Emílio Ribas, vinculado à Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo. Porém, nem todos mantêm o regime de tratamento ou recebem o cuidado e o apoio necessários para permanecer em bom estado de saúde. Apenas 10% dos homens e 15% das mulheres entre 15 e 24 anos estão conscientes de sua condição sorológica. “O uso de medicação por essa faixa etária é muito difícil. Eles não têm uma boa adesão. O adolescente está bem, não sente nada e acredita que nunca vai ficar doente”, diz Marinella.

Esse comportamento, que pode agravar a situação inicial da infecção, é observado em jovens também do Brasil. “O adolescente é um grupo diferente, que não pode ser comparado com nenhum outro. Ele fala que vai tomar o medicamento, mas toma por uma semana e depois para”, compara a infectologista.

Emoções abaladas por crise existencial ou depressão
As condições psicológicas e comportamentais bastante particulares dessa fase da vida também influenciam nas características da depressão. Por vezes, o jovem não consegue perceber de forma clara que as alterações em seu jeito de ser ou na forma com que está lidando com as coisas podem estar relacionadas a um estado depressivo. “Muitas vezes, o que se observa é um humor mais irritado, associado a um desinteresse pela vida e por aquilo que dava prazer e um aumento importante de pensamentos de morte”, observa o psiquiatra Miguel Boarati, coordenador do Ambulatório do Programa de Transtornos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. Ele afirma que o jovem também não pede ajuda de forma direta por não entender que se trata de uma doença e que existe tratamento adequado para ela.

Na depressão, não há melhora espontânea ou rápida desse estado de humor, sendo algo mais permanente e causador de sofrimento e disfuncionalidade. “Além disso, muitos dos comportamentos associados à depressão se confundem com a própria crise existencial do jovem, o que é algo normal e esperado.” Segundo Boarati, a incidência da doença está aumentando por diversos fatores: há mais notificações de casos e maior número de diagnósticos confirmados.

Entre as principais causas desse novo cenário, estão as mudanças na expectativa de vida, a falta de perspectiva de futuro, o aumento no uso de drogas e a violência. “Os dados são realmente preocupantes, mas não surpreendem quem está, na prática, atendendo essa população, pois a depressão, muitas vezes, está associada a outros problemas mentais mais graves – como dependência química ou transtorno de conduta –, onde aspectos emocionais ou alterações próprias da depressão não são investigados”, acrescenta Boarati.

Um dos principais riscos da depressão em adolescentes, no entanto, é o suicídio, e o principal motivo para o comportamento suicida é a depressão. “A interrelação entre essas duas condições é muito grande”, diz o psiquiatra, acrescentando que “o mais difícil é conseguir dar conta adequadamente dessa demanda, que exige, além do tratamento clínico com o uso de antidepressivos, a instituição de tratamento psicoterápico e a orientação familiar”. “São muitos profissionais envolvidos, com uma abordagem intensiva e, por vezes, longa. O custo privado é alto e não há acesso na rede pública", analisa.

O relatório divulgado ontem indica que metade de todas as doenças mentais na idade adulta parece começar por volta dos 14 anos, mas a grande maioria não é detectada ou tratada. A OMS chegou aos números depois de analisar dados fornecidos por 109 países. “O mundo não presta atenção suficiente na saúde dos adolescentes”, declarou a médica Flávia Bustreo, subdiretora geral para a saúde das mulheres e das crianças da entidade. “Esperamos que esse documento consiga dar mais atenção à saúde das pessoas que têm entre 10 e 19 anos e que sirva para desencadear uma ação acelerada sobre seus problemas.”

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