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Tratamento do câncer de mama é o que mais avança e se torna cada vez mais personalizado

Caracterização genético-molecular do tumor revolucionou o tratamento do câncer de mama. Drogas serão cada vez mais direcionadas, melhorando eficiência e reduzindo efeitos colaterais

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Carolina Cotta - Estado de Minas Publicação:22/10/2014 10:36Atualização:22/10/2014 10:46
O câncer de mama é o mais incidente entre as brasileiras, perdendo apenas para o câncer de pele não melanoma. Mas é também onde o tratamento mais avança. Além da modernização das drogas quimioterápicas e hormonais, mais eficientes e menos tóxicas, a chave para abordar a doença, hoje, é a oncologia personalizada, que considera a individualidade e a genética de cada caso, por meio da identificação do perfil genético-molecular do tumor. Foi o que permitiu o desenvolvimento das chamadas drogas “alvo-moleculares” ou “alvo-específicas”.

Segundo o oncologista André Murad, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), graças aos avanços da biologia molecular, especialmente com a utilização de exames como imuno-histoquímica, reação de polimerase em cadeia (PCR) e tecnologia de microarranjo, hoje é possível identificar o perfil molecular, as mutações gênicas e a assinatura genética dos tumores, classificando-os em subtipos moleculares e atribuindo a eles um correto índice prognóstico. Assim, pode-se recorrer às melhores opções terapêuticas, de forma individual.

A imuno-histoquímica, embora limitada por pesquisar poucos genes, é o mais comum. Segundo Leandro Ramos, oncologista da Oncomed BH, ele consegue dar informações importantes para a condução do tratamento: mostra se o tumor tem receptor hormonal positivo para estrógeno e progesterona, permitindo um tratamento hormonal; e se há mutação do HER-2, um importante marcador que pode dar positivo em 20% das mulheres, permitindo um tratamento imunológico. “As mulheres que têm essa proteína positiva têm o pior prognóstico, mas, com o advento da terapia-alvo, isso mudou”, comemora.

Gabriela Almeida procura reforçar as defesas do organismo comalimentaçãonaturaleas frutas sãoaliadas (BETO NOVAES/EM/D.A PRESS)
Gabriela Almeida procura reforçar as defesas do organismo comalimentaçãonaturaleas frutas sãoaliadas
Já o PCR e a tecnologia do microarranjo permitem estudar milhares de genes ao mesmo tempo. O microarranjo, por exemplo, disponível em poucos estados, mas não em Minas Gerais, identifica as mutações dos genes e já determina o medicamento que deve ser usado. “O exame de uma paciente com câncer de ovário, por exemplo, sugeriu a administração de dois medicamentos usados para tratar câncer de rim. Eu nunca imaginei que pudessem ser usados para ovário e funcionou. É essa a tendência para o tratamento do câncer: individualização”, acredita Murad.

E uma das possibilidades para um futuro próximo, que entre quatro e cinco anos pode chegar ao Brasil, é a biópsia líquida. Dois estudos demostraram que é possível extrair células tumorais do sangue periférico para estudar molecularmente os carcinomas, permitindo o monitoramento do câncer por meio de exames de sangue e, talvez, num futuro um pouco mais distante, a detecção muito precoce de tumores pequenos demais para serem percebidos por métodos de diagnóstico convencionais. A estratégia é baseada na análise de fragmentos de DNA que vazam dos tumores para a corrente sanguínea.

“Funciona como impressões digitais da doença, que os cientistas podem ler para extrair informações genéticas essenciais para a caracterização do tumor e a seleção do melhor tipo de tratamento”, explica Murad. E sem a necessidade de biopsiar a paciente novamente. “A biópsia líquida é o pulo do gato. Com uma simples pulsão, como em um exame de sangue comum, consegue-se retirar uma amostra dessas células para fazer o perfil”, explica. Além de fornecer o prognóstico, o mais importante é que, durante o tratamento, o paciente continuará fazendo o exame para calcular a carga tumoral.

EVOLUÇÃO
O câncer ocorre quando a célula tumoral sofre mutação nos genes responsáveis pelo controle da multiplicação celular e há, então, a produção de proteínas que estimulam seu crescimento e sua multiplicação desordenada. A forma como será abordado depende de uma combinação de fatores. Segundo o oncologista Leandro Ramos, aqueles tumores muito precoces, por exemplo, podem requerer apenas cirurgia, mas se a doença estiver mais avançada, pode demandar quimioterapia, radioterapia, hormonioterapia ou imunoterapia.

Os medicamentos de tecnologia alvo-molecular têm atuação mais direcionada, pois identificam os genes doentes e suas proteínas e agem apenas sobre eles, enquanto a quimioterapia convencional ataca células tumorais e as saudáveis também. O trastuzumabe foi a primeira droga alvo-molecular a ser lançada e já está disponível na rede pública brasileira. Outra medicação com perfil semelhante é o pertuzumabe, recomendado em associação ao trastuzumabe, para aumentar sua eficiência. Essas drogas são usualmente empregadas em conjunto com agentes quimioterápicos.

Maior sobrevida
O trastuzumabe emtansine (TDM-1), novo medicamento para o tratamento do câncer de mama metastático do tipo HER2-positivo, conseguiu prolongar a sobrevida e retardar a evolução da doença nessas pacientes sem causar os efeitos colaterais típicos da quimioterapia. Formado pela combinação do anticorpo monoclonal, Trastuzumabe e pelo quimioterápico Emtansine, o medicamento consegue uma ação mais específica, atuando apenas nas células cancerígenas. Problemas como baixa de glóbulos brancos, vômitos, queda de cabelo e diarreia são minimizados. A droga já está disponível no Brasil.

Conscientização
Com a série “Luta de todos”, que termina hoje e foi iniciada no dia 1º, o Estado de Minas abordou os vários aspectos do câncer de mama, do diagnóstico ao tratamento. A primeira matéria, publicada no início do Outubro Rosa, campanha mundial de conscientização sobre o problema, abordou a responsabilidade das pacientes no diagnóstico precoce, com o autoexame das mamas. Na segunda reportagem da série, a importância fundamental da mamografia e as realizações do Movimento Mamaamiga, e a terceira mostrou as técnicas de reconstrução mamária, fundamental na recuperação da autoestima feminina.

Do susto à mudança de hábitos
Aos 32 anos, a relações-públicas Gabriela Almeida foi diagnosticada com câncer de mama ductal invasivo. Fez uma cirurgia conservadora, tirando apenas um quadrante da mama, e o esvaziamento axilar. Mas o tratamento oncológico foi o momento mais dramático do tratamento. Foram quatro sessões da chamada “químio vermelha”, que em 15 dias fizeram seu cabelo cair.

Depois, mais 12 sessões da químio branca, menos agressiva, e 25 de radioterapia. Hoje, Gabriela segue o tratamento com o medicamento Tamoxifeno: está curada, fazendo controle trimestral. A descoberta do câncer aconteceu dois meses antes do seu casamento.

“Descobri em junho, fiz a cirurgia em julho e casei em agosto. Não tive lua de mel, pois tinha que fazer a químio.” Além disso, o pai do seu filho, de 7 anos, também tinha sido diagnosticado com câncer. “Meu filho não tem noção da doença. Quando ele me viu careca, foi um baque. Ele se preocupou das pessoas rirem de mim e me pedia para não sair daquele jeito”, lembra Gabriela, que adotou as perucas no início, mas depois assumiu a careca. Lenço, nunca. A doença mudou, completamente, seus hábitos. Após ler o livro Anti-câncer: prevenir e vencer usando nossas defesas naturais (Editora Fontanar), passou a comer cinco frutas por dia e cortou qualquer alimento industrializado. “Fiquei neurada com saúde, meu bem maior. Não vejo como uma dieta: entre um refri e minha vida, claro que fico com a segunda opção.”

PERFIL DE CÂNCER DE MAMA NO BRASIL

Incidência do tumor triplo negativo (mais agressivo)

14% Sudeste
20,3% Nordeste
17,4% Centro-Oeste

Incidência do tumor tipo luminal

30,8% Sul
28,8% Sudeste
24,1% Nordeste
25,3% Norte
25,9% Centro-Oeste

Fonte: Sociedade Brasileira de Mastologia

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