AVC: médicos alertam para a importância da rápida identificação e atendimento para salvar vidas ou amenizar sequelas
No Dia Mundial de Combate ao Acidente Vascular Cerebral (AVC) um alerta: apenas 1 em cada 10 brasileiros conhece os sintomas e é capaz de identificá-los
Paula Takahashi
Publicação:29/10/2014 13:30Atualização: 29/10/2014 13:44
Apesar de figurar entre as doenças vasculares, primeira causa de morte no Brasil, o Acidente Vascular Cerebral (AVC), popularmente chamado de derrame, é um completo desconhecido da população. Faz pelo menos 100 mil vítimas fatais todos os anos no país, mas apenas 1 em cada 10 brasileiros conhece os sintomas e é capaz de identificá-los. Mais alarmante ainda é o fato de a eficiência do tratamento estar limitada a apenas quatro horas e trinta minutos, contadas a partir dos primeiros sinais, uma janela terapêutica curta para uma enfermidade que os pacientes ignoram e que até os médicos têm dificuldades em diagnosticar.
No Dia Mundial de Combate ao AVC, comemorado hoje, o grande desafio é dar à doença a visibilidade e importância que merece, considerando ainda o forte impacto socioeconômico que gera, por ser uma das principais causas de incapacidade em adultos. “Estima-se que 25% dos pacientes ficam curados. Outros 25% saem com incapacidades importantes, como dificuldade para andar e comer. Mais 25% terminam completamente dependentes e o restante acaba morrendo. São percentuais que comprovam um custo social muito grande”, pondera Octavio Marques Pontes Neto, neurologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP e presidente da ONG Rede Brasil AVC.
PREVENÇÃO
Uma das principais armas contra a doença é a prevenção. Controlar a pressão arterial, a fibrilação arterial, diabetes, colesterol, doença de Chagas e evitar o tabagismo e sedentarismo são apenas algumas das recomendações. Fernando Carvalho Neuenschwander, cardiologista e coordenador do Serviço de Emergência Cardiovascular do Hospital Vera Cruz, alerta que um terço dos AVCs é proveniente das arritmias. “Mas, hoje, somente 25% dos pacientes que têm a fibrilação arterial são tratados de forma adequada”, alerta. Segundo Octavio, medidas preventivas como as citadas podem reduzir em até 80% as chances de a pessoa ter AVC. “Os demais fatores de risco seriam genética e idade”, detalha.
Para as mulheres, as orientações se estendem ao uso de anticoncepcionais e reposição hormonal depois da menopausa. Ambos têm sido relacionados a um aumento de risco para doenças cardiovasculares em geral, incluindo o AVC. A auxiliar de departamento pessoal Izabela Matos, de 25 anos, soube disso tarde demais. Aos 24 anos, ela teve AVC e só depois foi informada de que carregava uma falha genética que a impediria de tomar qualquer hormônio. “Essa falha me coloca no grupo com probabilidade de ter problemas vasculares. O AVC talvez pudesse ter sido evitado com teste de coagulação do sangue”, conta.
Em fase de recuperação das sequelas, ela conta que é preciso ouvir o corpo. “Comecei a sentir um formigamento na mão esquerda e no braço e uma fraqueza muscular que me impedia de segurar as coisas”, lembra. Por acreditar que se tratava apenas de cansaço, resolveu ir ao médico apenas seis horas depois de os primeiros sinais surgirem. O cardiologista Fernando Neuenschwander lembra, que como ocorreu com Izabela, a doença pode se manifestar de maneira sutil, repentinamente e muitas vezes é confundida com um mal-estar. “Com isso, perde-se tempo”, reconhece. A orientação é que, identificados os primeiros sintomas, a pessoa seja encaminhada rapidamente para um hospital que, de preferência, tenha uma unidade especializada em atendimento a pacientes com AVC.
Janela terapêutica Isso porque a luta contra o tempo é inglória para as vítimas da doença. “Apenas 3% a 4% dos casos chegam dentro da janela terapêutica de 4h30”, reconhece Romeu Sant’Anna, coordenador do serviço de neurologia e da Unidade de AVC do Hospital Risoleta Neves, uma das únicas alternativas públicas de atendimento especializado à doença em Minas Gerais.
Dentro desse intervalo, é aplicado um trombolítico para desfazer o coágulo e normalizar o fluxo sanguíneo. Se ministrado dentro das 4h30, aumentam em 30% as chances de evitar as sequelas. “Na primeira hora, a cada duas pessoas, uma melhora e não tem complicações. Mas de 3h a 4h30, essa proporção já cai para 1 caso de melhora acentuada para 14 pacientes”, explica Octavio. Fechada a janela terapêutica, o trombolítico tem seus benefícios reduzidos e os riscos elevados. “Pode, por exemplo, transformar um AVC isquêmico em hemorrágico”, observa Octavio. A partir daí, outras alternativas terapêuticas podem ser usadas, como o cateterismo.
Evolução no tratamento
Os vários anos de descaso em relação ao AVC são uma das principais justificativas para que ele ainda figure no topo da lista de letalidade no país, enquanto nos Estados Unidos já está na quarta colocação entre as que mais matam. “Isso vem mudando de seis anos para cá”, reconhece Octavio Marques Pontes Neto, neurologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP e presidente da ONG Rede Brasil AVC. Os dois grandes marcos na evolução do tratamento vieram em 2012, com a publicação de duas importantes portarias do Ministério da Saúde. “Uma delas estabeleceu protocolo para tratamento trombolítico, e a outra fixou a linha de cuidados para pacientes com AVC e criou ainda a remuneração de hospitais da rede pública que atendem pacientes com a doença”, detalha.
Apesar da implantação dos protocolos caminhar lentamente, o Ministério da Saúde prevê repasse de R$ 435 milhões para os 33 serviços hospitalares habilitados a prestar atendimento de urgência para AVC no Brasil. Em Belo Horizonte, Risoleta Neves e Odilon Behrens seriam as principais alternativas públicas e Vera Cruz, particular. “Os hospitais de referência diferem dos demais por possuir equipes com protocolos bem definidos para atendimento de pacientes em fase aguda. Disponibilizam ainda as melhores terapias além de equipes com profissionais de diversas áreas médicas e não médicas, como terapeuta, nutricionista e psicólogo”, detalha Romeu Sant’Anna, coordenador do serviço de neurologia e da Unidade de AVC do Risoleta Neves, que atualmente conta com 18 leitos dedicados à doença.
REABILITAÇÃO
Fundadora da Associação Mineira do AVC, Sandra Issida Gonçalves, de 52 anos, ainda quer ir além dos avanços na área hospitalar. “Temos um projeto de montar um centro de reabilitação do AVC com equipamentos que possam estimular a mente dos pacientes, como bicicletas com estímulos elétricos. O espaço também contaria com uma equipe de profissionais multidisplinar”, detalha. Há intenção também de reinserir essas pessoas na vida social e no mercado de trabalho. “Temos projetos que deram certo no exterior e estamos colocando o nosso no papel. Estamos prestes a conseguir o título de utilidade pública estadual e, a partir daí, poderemos pleitear verba do estado para implantação do projeto”, adianta.
Izabela Matos foi vítima de AVC com apenas 24 anos: não sabia que tinha um problema genético incompatível com o uso de anticoncepcionais
No Dia Mundial de Combate ao AVC, comemorado hoje, o grande desafio é dar à doença a visibilidade e importância que merece, considerando ainda o forte impacto socioeconômico que gera, por ser uma das principais causas de incapacidade em adultos. “Estima-se que 25% dos pacientes ficam curados. Outros 25% saem com incapacidades importantes, como dificuldade para andar e comer. Mais 25% terminam completamente dependentes e o restante acaba morrendo. São percentuais que comprovam um custo social muito grande”, pondera Octavio Marques Pontes Neto, neurologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP e presidente da ONG Rede Brasil AVC.
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As consequências devastadoras podem ser causadas pela interrupção do fluxo de sangue nas artérias do sistema nervoso central, normalmente provocada por um coágulo. Chamado de AVC isquêmico, essa versão é a mais comum e diagnosticada em 85% dos casos. A outra possibilidade é o AVC hemorrágico, situação mais rara e mais grave, em que ocorre a ruptura de uma artéria ou vaso sanguíneo.- Estudo vincula estresse, ataque cardíaco e AVCs
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PREVENÇÃO
Uma das principais armas contra a doença é a prevenção. Controlar a pressão arterial, a fibrilação arterial, diabetes, colesterol, doença de Chagas e evitar o tabagismo e sedentarismo são apenas algumas das recomendações. Fernando Carvalho Neuenschwander, cardiologista e coordenador do Serviço de Emergência Cardiovascular do Hospital Vera Cruz, alerta que um terço dos AVCs é proveniente das arritmias. “Mas, hoje, somente 25% dos pacientes que têm a fibrilação arterial são tratados de forma adequada”, alerta. Segundo Octavio, medidas preventivas como as citadas podem reduzir em até 80% as chances de a pessoa ter AVC. “Os demais fatores de risco seriam genética e idade”, detalha.
Para as mulheres, as orientações se estendem ao uso de anticoncepcionais e reposição hormonal depois da menopausa. Ambos têm sido relacionados a um aumento de risco para doenças cardiovasculares em geral, incluindo o AVC. A auxiliar de departamento pessoal Izabela Matos, de 25 anos, soube disso tarde demais. Aos 24 anos, ela teve AVC e só depois foi informada de que carregava uma falha genética que a impediria de tomar qualquer hormônio. “Essa falha me coloca no grupo com probabilidade de ter problemas vasculares. O AVC talvez pudesse ter sido evitado com teste de coagulação do sangue”, conta.
Em fase de recuperação das sequelas, ela conta que é preciso ouvir o corpo. “Comecei a sentir um formigamento na mão esquerda e no braço e uma fraqueza muscular que me impedia de segurar as coisas”, lembra. Por acreditar que se tratava apenas de cansaço, resolveu ir ao médico apenas seis horas depois de os primeiros sinais surgirem. O cardiologista Fernando Neuenschwander lembra, que como ocorreu com Izabela, a doença pode se manifestar de maneira sutil, repentinamente e muitas vezes é confundida com um mal-estar. “Com isso, perde-se tempo”, reconhece. A orientação é que, identificados os primeiros sintomas, a pessoa seja encaminhada rapidamente para um hospital que, de preferência, tenha uma unidade especializada em atendimento a pacientes com AVC.
Janela terapêutica Isso porque a luta contra o tempo é inglória para as vítimas da doença. “Apenas 3% a 4% dos casos chegam dentro da janela terapêutica de 4h30”, reconhece Romeu Sant’Anna, coordenador do serviço de neurologia e da Unidade de AVC do Hospital Risoleta Neves, uma das únicas alternativas públicas de atendimento especializado à doença em Minas Gerais.
Dentro desse intervalo, é aplicado um trombolítico para desfazer o coágulo e normalizar o fluxo sanguíneo. Se ministrado dentro das 4h30, aumentam em 30% as chances de evitar as sequelas. “Na primeira hora, a cada duas pessoas, uma melhora e não tem complicações. Mas de 3h a 4h30, essa proporção já cai para 1 caso de melhora acentuada para 14 pacientes”, explica Octavio. Fechada a janela terapêutica, o trombolítico tem seus benefícios reduzidos e os riscos elevados. “Pode, por exemplo, transformar um AVC isquêmico em hemorrágico”, observa Octavio. A partir daí, outras alternativas terapêuticas podem ser usadas, como o cateterismo.
Evolução no tratamento
Os vários anos de descaso em relação ao AVC são uma das principais justificativas para que ele ainda figure no topo da lista de letalidade no país, enquanto nos Estados Unidos já está na quarta colocação entre as que mais matam. “Isso vem mudando de seis anos para cá”, reconhece Octavio Marques Pontes Neto, neurologista e professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP e presidente da ONG Rede Brasil AVC. Os dois grandes marcos na evolução do tratamento vieram em 2012, com a publicação de duas importantes portarias do Ministério da Saúde. “Uma delas estabeleceu protocolo para tratamento trombolítico, e a outra fixou a linha de cuidados para pacientes com AVC e criou ainda a remuneração de hospitais da rede pública que atendem pacientes com a doença”, detalha.
Apesar da implantação dos protocolos caminhar lentamente, o Ministério da Saúde prevê repasse de R$ 435 milhões para os 33 serviços hospitalares habilitados a prestar atendimento de urgência para AVC no Brasil. Em Belo Horizonte, Risoleta Neves e Odilon Behrens seriam as principais alternativas públicas e Vera Cruz, particular. “Os hospitais de referência diferem dos demais por possuir equipes com protocolos bem definidos para atendimento de pacientes em fase aguda. Disponibilizam ainda as melhores terapias além de equipes com profissionais de diversas áreas médicas e não médicas, como terapeuta, nutricionista e psicólogo”, detalha Romeu Sant’Anna, coordenador do serviço de neurologia e da Unidade de AVC do Risoleta Neves, que atualmente conta com 18 leitos dedicados à doença.
REABILITAÇÃO
Fundadora da Associação Mineira do AVC, Sandra Issida Gonçalves, de 52 anos, ainda quer ir além dos avanços na área hospitalar. “Temos um projeto de montar um centro de reabilitação do AVC com equipamentos que possam estimular a mente dos pacientes, como bicicletas com estímulos elétricos. O espaço também contaria com uma equipe de profissionais multidisplinar”, detalha. Há intenção também de reinserir essas pessoas na vida social e no mercado de trabalho. “Temos projetos que deram certo no exterior e estamos colocando o nosso no papel. Estamos prestes a conseguir o título de utilidade pública estadual e, a partir daí, poderemos pleitear verba do estado para implantação do projeto”, adianta.