Sociedade de Pediatria 'choca' com imagens de campanha sobre aleitamento materno e é alvo de críticas

A média de aleitamento materno exclusivo no Brasil é de 54 dias frente a uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de seis meses

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Valéria Mendes - Saúde Plena Publicação:17/09/2015 16:19Atualização:21/09/2015 16:34
'Seu filho é o que você come' é o slogan da campanha (Divulgação / Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul )
"Seu filho é o que você come" é o slogan da campanha
Não existe leite fraco ou ruim. É essa a verdade que especialistas em aleitamento materno – sejam brasileiros ou ao redor do mundo – repetem incessantemente para que a mensagem chegue ao maior número de mulheres possível. Uma campanha idealizada pela Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul, que deve ser lançada na próxima segunda-feira (21/09), no entanto, é acusada de confundir essa compreensão. As três imagens que já foram divulgadas para a imprensa com o slogan ‘Seu filho é o que você come’ mostram crianças mamando só que, no lugar do seio materno, aparecem alimentos ricos em gordura e açúcar como hambúrguer e refrigerante.

Pediatra do Comitê de de Nutrologia da entidade, Matias Epifanio afirma que diante de números que mostram a incidência de sobrepeso em crianças brasileiras (uma em cada quatro está acima do peso) e do consumo de refrigerantes por bebês com menos de um ano (quase 50%) evidenciam a necessidade de campanhas como esta.

É fato que uma alimentação saudável durante a gestação e o período de lactação traz benefícios para mãe e para o bebê. Mas também é fato que a média de aleitamento materno exclusivo no Brasil é de 54 dias frente a uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de seis meses. Nesses 360 e poucos dias um bebê não precisa de nada além do leite materno, nem água. “Toda mulher saudável, seja ela magra ou obesa, é capaz de produzir leite materno saudável, no sentido mais amplo da palavra. A nutrição materna deve sim ser adequada, mas em hipótese nenhuma a má nutrição materna deve ser considerada como fator para o desmame”, afirma a pediatra Silvia Gioielli.

E é justamente esse o ponto das críticas à campanha. As imagens invadiram as redes sociais foram classificadas como ‘chocantes’ ou ‘pertubadoras’ e o assunto chegou até à mídia internacional.

Para Silvia Gioielli, “o grande equívoco desta campanha é chamar atenção para uma questão tão importante como alimentação saudável, mas deixar subentendido que a alimentação incorreta levaria à produção de um leite materno inadequado, ruim ou perigoso para o bebê, induzindo assim, à falsa ideia que a formula é mais balanceada e, portanto, mais adequada. Não é por que a mãe come um hambúrguer que o bebê vai mamar hambúrguer”.

 (Divulgação / Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul )


A especialista explica que o que pode causar doenças para o bebê, no futuro, é justamente a falta de aleitamento materno. “Mesmo que a mãe tenha uma dieta inadequada, seja ela com excesso ou falta de calorias, mesmo que seja uma dieta mais rica em gorduras, o leite materno será produzido de forma adequada para o bebê. Se for um leite mais gordo, a tendência é que o bebê se sinta mais saciado e mame em horários mais espaçados. Mesmo que o bebê esteja acima do percentil 90 na curva de crescimento - desde que em aleitamento materno sem complementação com fórmula -, não há motivo para preocupação”, afirma. Segundo Silvia, o mais comum é que o peso se reequilibre com a introdução da alimentação complementar e com a maior atividade da criança como engatinhar e andar. “O leite materno é fator protetor contra a obesidade não um fator predisponente. Mesmo que a mãe seja obesa”, reforça.

A Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul diz que a campanha não quer desestimular o aleitamento materno. “Ao contrário, queremos incentivar o aleitamento materno e que a mãe tenha uma alimentação saudável. A mãe precisa ter consciência que a falta de alguns alimentos pode fazer com que a criança tenha problemas no futuro. Estudos já mostraram que até o rendimento escolar pode ser afetado com a falta de nutrientes”, destaca Matias Epifanio.

Silvia Gioielli salienta que as únicas situações em que o aleitamento materno é contraindicado e o uso de fórmulas é obrigatório é quando a mãe tem alguma doença infectocontagiosa transmissível através do leite materno. “Caso de HIV positivo ou quando a mãe faz uso de medicamentos específicos como os usados em quimioterapia. Salvo esses casos, a fórmula láctea não trará os mesmos benefícios que leite materno, nem para o bebê, tampouco para a mãe”, diz.

A amamentação ainda não é consolidada no Brasil como prática de promoção de saúde e prevenção de doenças. Assim, ainda precisa ser alvo de muito incentivo. Para Silvia, ainda vigoram na cultura muitas falsas razões para o desmame precoce como a disseminação do uso da mamadeira e chupetas, mitos como a ideia de leite fraco e queda dos seios, propaganda indiscriminada de substitutos do leite materno e a dificuldade em cumprir as leis que protegem as mães trabalhadoras que amamentam.

 (Divulgação / Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul )


Médica do Comitê de Nutrologia Sociedade de Pediatria do RS, Berenice Lempek afirma que a amamentação é um período importante para estimular o paladar das crianças. “A maioria dos recém-nascidos aceitam bem o leite materno porque ele apresenta sabor e aroma semelhantes ao do líquido amniótico. Os bebês já nascem com preferência ao paladar doce e rejeição ao azedo. Isto é uma característica nata que pode sofrer mudanças de acordo com a alimentação oferecida”, detalha. Ela afirma ainda que crianças que receberam fórmulas infantis apresentam maior dificuldade na introdução alimentar já que foram expostas por um longo período a uma dieta exatamente igual ao longo dos dias. “Este é um dos motivos pelos quais o aleitamento materno é tão importante para os pequenos”, observa.

Silvia Gioielli diz ainda que o leite materno é o único alimento capaz de prevenir obesidade, diabetes e alergias inclusive na vida adulta. “O leite materno é benéfico em qualquer idade, mas principalmente até os 2 anos de vida. Isso por que até essa fase a imunidade do bebê ainda não está totalmente estabelecida”, completa.

Veja o que a ciência já comprovou sobre os benefícios da amamentação:

- Mortalidade infantil: o aleitamento materno pode evitar 13% das mortes em crianças menores de 5 anos em todo o mundo.
- Evita diarreia: crianças não amamentadas têm um risco três vezes maior de desidratarem e de morrerem por diarreia quando comparadas com as amamentadas
- Evita infecção respiratória: a proteção é maior quando a amamentação é exclusiva nos primeiros seis meses
- Diminui os riscos de alergia: a amamentação exclusiva nos primeiros meses de vida diminui o risco de alergia à proteína do leite de vaca, de dermatite atópica e de outros tipos de alergias, incluindo asma e sibilos recorrentes
- Diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes: o aleitamento materno apresenta benefícios em longo prazo
- Reduz a chance de obesidade: indivíduos amamentados tiveram uma chance 22% menor de vir a apresentar sobrepeso/obesidade
- Melhor nutrição: o leite materno contém todos os nutrientes essenciais
para o crescimento e o desenvolvimento das crianças
- Efeito positivo na inteligência: crianças amamentadas apresentam vantagem
nesse aspecto quando comparadas com as não amamentadas
- Melhor desenvolvimento da cavidade bucal: o exercício que a criança faz para retirar o leite da mama é fundamental para o alinhamento correto dos dentes e uma boa oclusão dentária
- Proteção contra câncer de mama: Estima-se que o risco de contrair a doença diminua 4,3% a cada 12 meses de duração de amamentação.
- Evita nova gravidez: A amamentação é um excelente método anticoncepcional nos primeiros seis meses após o parto com 98% de eficácia
- Promoção do vínculo afetivo entre mãe e filho: a amamentação é uma forma muito especial de comunicação entre a mãe e o bebê e uma oportunidade de a criança aprender muito cedo a se comunicar com afeto e confiança.
- Melhor qualidade de vida: crianças amamentadas adoecem menos

(FONTE: Ministério da Saúde)


E você, o que achou da campanha?

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