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Estudo mostra como homens e mulheres avaliam a própria condição bucal

A maioria, 67%, considera boa ou muito boa, mas especialistas criticam o excesso de extrações de dente e ressaltam a influência de fatores econômicos e sociais nos cuidados orais

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Isabela de Oliveira - Correio Braziliense Publicação:30/03/2016 15:00Atualização:30/03/2016 15:21
As mulheres, de forma geral, são mais cuidadosas. Mas os resultados, nem sempre melhores. Elas compõem o maior percentual (13,3%) de indivíduos sem nenhum dente (11%) (SXC.hu)
As mulheres, de forma geral, são mais cuidadosas. Mas os resultados, nem sempre melhores. Elas compõem o maior percentual (13,3%) de indivíduos sem nenhum dente (11%)
Se os motivos para se alegrar são poucos, as condições para sorrir são ainda piores: além dos percalços de uma situação socioeconômica ruim, a porção mais vulnerável de brasileiros tem boca carente de dentes, próteses e cuidados básicos. Estudo recentemente publicado na Revista Ciência & Saúde Coletiva mostra como o país percebe o próprio sorriso: homens, idosos, negros, pardos, indivíduos sem instrução e com nível fundamental incompleto, residentes na área rural e na Região Nordeste são os que menos consideram a própria saúde bucal como boa ou muito boa. Formam também o grupo com indicadores de higiene bucal mais inadequados, apontam pesquisadores da Secretaria de Vigilância em Saúde, ligada ao Ministério da Saúde, e da Universidade de Adelaide, na Austrália.

Ao contrário de pesquisas epidemiológicas, em que consultas clínicas e exames verificam o estado dos participantes, esse estudo observou como as pessoas percebem a própria saúde bucal. Os autores utilizaram dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2013, que contou, pela primeira vez, com um bloco dedicado ao tema. Respondida por mais de 60 mil pessoas, ela oferece um panorama de indicadores que podem ser monitorados ao longo do tempo. A condição da boca foi avaliada como boa ou muito boa por 67,4% das pessoas.

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As mulheres, de forma geral, são mais cuidadosas. Mas os resultados, nem sempre melhores. Elas compõem o maior percentual (13,3%) de indivíduos sem nenhum dente (11%). Dos que perderam 13 ou mais dentes (23%), também são maioria (26,3%). O fenômeno não é exclusivo do Brasil, segundo Marco Aurélio Peres, coautor do estudo e diretor do Centro de Pesquisa Australiano de Saúde Oral Populacional, da Universidade de Adelaide. Não há consenso sobre as causas, mas pode-se especular que elas vão ao dentista com regularidade. “Intervenções mais frequentes podem levar à perda dos tecidos dos dentes e a extrações. É um processo lento, que ocorre ao longo da vida”, diz.

Leia também: Falta de um único dente pode trazer riscos à saúde geral do organismo

Peres sublinha que, em quase todas as sociedades, as mulheres estão em condição socioeconômica inferior. “A interação entre esses dois fatores, basicamente sociais, políticos e culturais, hipoteticamente, resultam no quadro. Por isso desigualdades sociais em saúde estão na raiz das causas das doenças e dos agravos”, esclarece o pesquisador.

Implantodontista, periodontista e protesista, Jefferson Setti acrescenta outra explicação: na gestação, surgem mais problemas odontológicos, como cáries e placas bacterianas. “Parte disso resulta dos cuidados inadequados, pois a mulher passa mal e vomita, mas nem sempre se atenta à limpeza oral e aos cuidados adequados. Elas sofrem mais na menopausa também. Alterações nos níveis de vitamina D influenciam a descalcificação dos dentes, por exemplo”, detalha o diretor da Acom Odontologia, em Brasília.

Guilherme Máximo Xavier, professor de saúde coletiva em odontologia e vigilância em saúde da Universidade Católica de Brasília (UCB), completa que, além dos enjoos, a gestante apresenta alterações hormonais que a deixam mais propensa a infecções e inflamações, aumentando as chances de gengivites e periodontites. “Há risco de os agravos, que podem realmente resultar em extrações, induzir problemas na gestação, se não forem tratados. Estudos mostram que mães com má saúde bucal podem ter filhos abaixo do peso ou prematuros”, esclarece.

Xavier acredita que a realidade das brasileiras pode ser influenciada pelo programa Estratégia Saúde da Família, do Sistema Único de Saúde (SUS). “Não é comum, mas, quando há presença de dentista na equipe mínima, há marcação de consultas odontológicas de pré-natal. Talvez, as brasileiras apresentem melhores indicadores — e, de quebra, menos dentes — por estarem inseridas nessa lógica de atendimento pré-natal. É um fator que pode levar às extrações necessárias. Homens, por outro lado, buscam atendimento só quando sentem dor”, diz. O especialista também reforça a necessidade de os profissionais adotarem uma nova abordagem com relação aos dentes, os preservando. “Apesar de ter a maior quantidade de dentistas do mundo, vivemos no país de desdentados. Parte disso se deve à formação universitária curativista, e não prevencionista dos profissionais da área.”

Prótese
Sem os dentes naturais, brasileiros e brasileiras recorrem cada vez mais a próteses: 33,3% dos adultos dizem utilizá-las, sendo a maioria mulheres (37,9%), idosos (68,6%), pessoas sem instrução ou com nível fundamental incompleto (47,8%) e residentes nas regiões Sul (38,6%) e Sudeste (33,8%). A lógica é que o acesso às dentaduras é maior nas regiões economicamente desenvolvidas, onde populações que mais sofrem com a perda de dentes têm mais acesso a elas. Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Médica, Odontológica e Hospitalar (Abimo), cerca de 800 mil implantes e 2,4 milhões de componentes de próteses dentárias são colocados por ano no país.

Para Marco Aurélio Peres, o estudo reforça como as condições de educação, renda e trabalho influenciam a melhoria da saúde. Se por um lado a Austrália tem a maior cobertura de água fluoretada, com cerca de 92% da população beneficiada pela medida, o Brasil tem o SUS, que é uma grande conquista. Na Austrália, a assistência odontológica é universal apenas para crianças e adolescentes. Além disso, o cientista considera ímpar a participação popular brasileira.

“Temos conferências específicas para tratar do tema com participação de profissionais, gestores e da população. Também conseguimos avanços importantes no acesso e no uso do flúor na água e na pasta de dentes e dos serviços de saúde de atenção primária e especialidades no âmbito do SUS. Conquistas impensáveis quando me formei 30 anos atrás. Nas últimas décadas, verificamos a educação sobre a cárie dentária em crianças e adolescentes e a redução importante das perdas dentárias parciais e totais em jovens e adultos”, comemora.


Higiene e educação
“Vivemos em uma sociedade em que o pensamento de que perder dentes é normal. Porém, com higiene bucal, escovação e uso de fio dental, o idoso pode envelhecer com todos os dentes e uma boca saudável. Dentes só se perdem por doença, sendo a cárie e a doença periodontal as maiores responsáveis. Precisamos instruir os profissionais como cidadãos, para melhorar a saúde bucal do país, que é responsabilidade do Estado, das entidades e dos órgãos civis, da família, da escola e da universidade. Costumo dizer que todas as pessoas ‘são da saúde’, mas nem todas se profissionalizaram nisso. Isso porque todo ser humano tem o poder de cuidar do outro. Informações importantes devem ser levadas aos cidadãos para que saibam se cuidar e cuidar do outro. Educação e saúde são indissociáveis.”

Guilherme Máximo Xavier, professor na Universidade Católica de Brasília (UCB)



Obturação em xeque
As obturações nem sempre são a melhor solução para um dente cariado. É o que defendem cientistas da Universidade de Sidney, na Austrália, em um artigo publicado, recentemente, na revista Community Dentistry and Oral Epidemiology. Eles apostam em um protocolo, baseado em “higiene preventiva”, para tratar as lesões iniciais. Em experimentos, a técnica reduziu em 30% a 50% a necessidade de obturação.

O tratamento tem quatro etapas: aplicação de alta concentração de flúor verniz no dente cariado, atenção à escovação em casa, restrição de lanches entre as refeições e de bebidas com adição de açúcar, e monitoramento de risco. Segundo Wendell Evans, integrante do estudo, nos últimos 50 anos, pesquisas têm mostrado que a cárie não progride rapidamente. Dura, em média, de quatro a oito anos até ela sair da parte externa do dente, o esmalte, e chegar à camada mais interna, a dentina.

É justamente esse período longo de degradação que viabiliza o tratamento proposto por eles. “Essa pesquisa sinaliza a necessidade de uma grande mudança na forma como a cárie dentária é gerida pelos dentistas”, ressalta Evans. “Nosso estudo mostra que uma abordagem preventiva tem grandes benefícios em comparação à prática corrente.”

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