Vacinação de rotina em população de 9 a 16 anos pode reduzir casos de dengue em 50% em cinco anos
Estudo de professor da Uerj constata que vacinação de rotina nessa faixa etária poderia levar o Brasil a atingir meta da OMS em 2020
Carolina Cotta - Estado de Minas
Publicação:06/04/2016 09:57Atualização: 06/04/2016 10:05
A implantação de um programa de vacinação de rotina em crianças de 9 a 16 anos seria capaz de reduzir em 50% os casos de dengue em um período de cinco anos. O dado é de um estudo publicado esta semana no Jornal Brasileiro de Economia da Saúde, no qual foi avaliado o potencial de impacto da vacinação contra dengue no Brasil. Essa mesma proposta teria 99% de probabilidade de alcançar a meta da Organização Mundial de Saúde (OMS) para 2020, que é reduzir 50% da mortalidade e 25% da morbidade por dengue, doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti.
Os dados podem ajudar o Ministério da Saúde na definição de uma estratégia de vacinação, já que não existe a possibilidade de vacinar toda a população em função do custo e da indicação de bula da vacina, que registrou maior eficácia entre os 9 e 45 anos, além da própria capacidade máxima de produção da Sanofi Pasteur, de 100 milhões de doses por ano. O esquema de vacinação inclui três doses do medicamento contra os quatro sorotipos do vírus da dengue. E os benefícios são pelo resto da vida.
DEZ ESTRATÉGIAS
O estudo avaliou 10 estratégias, incluindo a não vacinação. A mais conservadora, vacinando apenas crianças de 9 e 10 anos, reduziria o número de casos em até 22% em cinco anos. Uma mais ampla, vacinando dos 9 aos 40 anos, alcançaria redução de até 81% em cinco anos, e de até 92% em 10 anos. Contudo, Denizar, que é doutor em saúde coletiva, ressalta que ainda se desconhece o custo final da vacina, o que pode influenciar em todo esse planejamento. “A adoção de um programa de vacinação tem grande impacto financeiro. Foi considerando os benefícios para a população e esse impacto que chegamos à indicação do grupo de 9 a 16 anos, no qual há um equilíbrio.”
Segundo ele, para adotar qualquer tecnologia de saúde é preciso recorrer a modelos probabilísticos. O estudo ajudará no processo decisório: se vamos vacinar, quem será vacinado e qual o resultado esperado. “À medida que aumentamos as faixas etárias, reduzimos o número de casos. O ideal era um programa para imunizar dos 9 aos 40 anos, mas é provável que o governo não consiga. Por isso é preciso estimar o benefício da incorporação da vacina em relação ao número de mortes, morbidade e hospitalizações e decidir com base na melhor relação custo/benefício.”
Essa relação mais equilibrada, para o estudo, estaria entre 9 e 16 anos. Nessa estratégia, seria possível reduzir 50% dos casos de dengue, 139 mil hospitalizações e evitar 1.125 mortes. Além disso, a população não vacinada pode contar com a chamada imunidade coletiva. “Mesmo quem não recebe a vacina se beneficia, porque com a imunização a replicação do vírus cai”, explica o médico. Mas essa mesma imunidade coletiva seria muito tímida apenas com a vacinação na rede particular. “O alcance da vacinação privada seria muito baixo. Queremos beneficiar a saúde pública. A vacinação é uma estratégia de relevância que, junto com o combate ao vetor, o mosquito, pode impactar no controle efetivo da dengue”, defende.
O assunto ganha relevância às vésperas da possível disponibilização da única vacina para dengue. Aprovada em 28 de dezembro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Dengvaxia pode começar a ser comercializada ainda neste primeiro semestre no Brasil. Segundo a Sanofi Pasteur, laboratório responsável pelo desenvolvimento da vacina, já há 500 mil doses no seu centro de distribuição. Em princípio, as doses contra a dengue só estarão disponíveis na rede particular.
No início do ano, o ministro da Saúde, Marcelo Castro, afirmou que a vacina é cara e que o fato de precisar de três doses para alcançar a efetividade esperada dificulta o acompanhamento do processo de imunização para um contingente tão grande da população. Há ainda a expectativa em relação à vacina desenvolvida pelo Instituto Butantã, que acaba de entrar na última fase de estudos antes de ser submetida aos órgãos competentes.
PARECER Sobre a vacina da Sanofi, ela depende de parecer da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed), órgão interministerial do governo federal que regula os preços de medicamentos no país. Reunião da câmara realizada no dia 1º deste mês não colocou na pauta o produto.
O último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde – que é um compilado de todos os dados de estados e municípios, referentes à semana 8 de 2016 e que compreende o período de 3 de janeiro a 27 de fevereiro –, indicava 396.582 casos de dengue no país, bem superior ao mesmo período de 2015, que registrou 259.827 casos. Como os dados são de janeiro a fevereiro, estão defasados. No ano passado, o Brasil teve 2,35 milhões de notificações para dengue, representando um custo enorme para o sistema de saúde.
Doença tem alto impacto financeiro e social
Segundo Denizar Vianna, o custo anual do Brasil com a dengue é de cerca de R$ 1,2 bilhão, considerando gastos hospitalares, ambulatoriais e de perda de produtividade. O controle do Aedes e campanhas não estão incluídos. Em 2013, estima-se que o Brasil gastou R$ 5,76 bilhões. Para o pediatra e infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBim), a vacina chega, principalmente, para o uso na saúde individual. “A princípio, não teremos um programa público de vacinação contra a dengue, então não há uma expectativa de grande impacto. E mesmo que o governo resolva adotá-lo, não há vacina para todo mundo. Se forem vacinar, devem eleger cerca de 10% da população de 9 a 45 anos, para a qual a vacina foi indicada”, diz Kfouri, que acredita que o produto do Butantã demore de três a cinco anos.
De acordo com Sheila Homsani, diretora médica da Sanofi Pasteur, com planejamento é possível atender mais gente. Produzir a vacina dura 18 meses. Se o Brasil adotasse a estratégia sugerida pelos pesquisadores da Uerj, concentrando-se na faixa de 9 aos 16 anos, que representa 18% da população brasileira, seriam cerca de 36 milhões de pessoas imunizadas. Como são necessárias três doses, isso já consumiria a capacidade de produção atual. “Não sabemos ainda se o governo vai implementar e para quem, mas somos capazes de produzir”, diz.
Em 2012, metade da população mundial já estava sob o risco da dengue, por viver em regiões endêmicas. A incidência de casos aumentou 30 vezes em 50 anos. Dados da OMS, de 2004 a 2010, revelavam o Brasil como o país mais endêmico do mundo. Nova análise publicada no New England Journal of Medicine, em 24 de março, apontou as Filipinas com maior incidência de casos de dengue entre os 10 países endêmicos que participaram dos estudos clínicos de eficácia da vacina. O primeiro programa de vacinação pública contra a dengue começou esta semana naquele país, que deve vacinar este ano um milhão de crianças.
Estudos da vacina da dengue começaram há 20 anos. Resultados mostram uma eficácia de 65,5% contra os quatro sorotipos do vírus. Em relação
A Dengvaxia, vacina contra a dengue, pode começar a ser comercializada ainda neste primeiro semestre no Brasil
Saiba mais...
O estudo “Estimativa do impacto potencial com a vacinação contra dengue nos desfechos clínicos no Brasil” foi conduzido pelo professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Denizar Vianna Araújo, coordenador do Centro de Excelência em Avaliação Econômica e Análise de Decisão da ProVac Network, grupo de estudos econômicos e financeiros da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Usando um modelo de impacto que representa as características conhecidas da dinâmica de transmissão da dengue, ele mediu a probabilidade de sucesso da vacinação em várias faixas etárias da população brasileira.- Aumento nos números de dengue podem incluir infecção por zika ou chikungunya
- Brasil registra 200 casos de dengue por hora
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Os dados podem ajudar o Ministério da Saúde na definição de uma estratégia de vacinação, já que não existe a possibilidade de vacinar toda a população em função do custo e da indicação de bula da vacina, que registrou maior eficácia entre os 9 e 45 anos, além da própria capacidade máxima de produção da Sanofi Pasteur, de 100 milhões de doses por ano. O esquema de vacinação inclui três doses do medicamento contra os quatro sorotipos do vírus da dengue. E os benefícios são pelo resto da vida.
DEZ ESTRATÉGIAS
O estudo avaliou 10 estratégias, incluindo a não vacinação. A mais conservadora, vacinando apenas crianças de 9 e 10 anos, reduziria o número de casos em até 22% em cinco anos. Uma mais ampla, vacinando dos 9 aos 40 anos, alcançaria redução de até 81% em cinco anos, e de até 92% em 10 anos. Contudo, Denizar, que é doutor em saúde coletiva, ressalta que ainda se desconhece o custo final da vacina, o que pode influenciar em todo esse planejamento. “A adoção de um programa de vacinação tem grande impacto financeiro. Foi considerando os benefícios para a população e esse impacto que chegamos à indicação do grupo de 9 a 16 anos, no qual há um equilíbrio.”
Segundo ele, para adotar qualquer tecnologia de saúde é preciso recorrer a modelos probabilísticos. O estudo ajudará no processo decisório: se vamos vacinar, quem será vacinado e qual o resultado esperado. “À medida que aumentamos as faixas etárias, reduzimos o número de casos. O ideal era um programa para imunizar dos 9 aos 40 anos, mas é provável que o governo não consiga. Por isso é preciso estimar o benefício da incorporação da vacina em relação ao número de mortes, morbidade e hospitalizações e decidir com base na melhor relação custo/benefício.”
Essa relação mais equilibrada, para o estudo, estaria entre 9 e 16 anos. Nessa estratégia, seria possível reduzir 50% dos casos de dengue, 139 mil hospitalizações e evitar 1.125 mortes. Além disso, a população não vacinada pode contar com a chamada imunidade coletiva. “Mesmo quem não recebe a vacina se beneficia, porque com a imunização a replicação do vírus cai”, explica o médico. Mas essa mesma imunidade coletiva seria muito tímida apenas com a vacinação na rede particular. “O alcance da vacinação privada seria muito baixo. Queremos beneficiar a saúde pública. A vacinação é uma estratégia de relevância que, junto com o combate ao vetor, o mosquito, pode impactar no controle efetivo da dengue”, defende.
O assunto ganha relevância às vésperas da possível disponibilização da única vacina para dengue. Aprovada em 28 de dezembro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Dengvaxia pode começar a ser comercializada ainda neste primeiro semestre no Brasil. Segundo a Sanofi Pasteur, laboratório responsável pelo desenvolvimento da vacina, já há 500 mil doses no seu centro de distribuição. Em princípio, as doses contra a dengue só estarão disponíveis na rede particular.
No início do ano, o ministro da Saúde, Marcelo Castro, afirmou que a vacina é cara e que o fato de precisar de três doses para alcançar a efetividade esperada dificulta o acompanhamento do processo de imunização para um contingente tão grande da população. Há ainda a expectativa em relação à vacina desenvolvida pelo Instituto Butantã, que acaba de entrar na última fase de estudos antes de ser submetida aos órgãos competentes.
PARECER Sobre a vacina da Sanofi, ela depende de parecer da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed), órgão interministerial do governo federal que regula os preços de medicamentos no país. Reunião da câmara realizada no dia 1º deste mês não colocou na pauta o produto.
O último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde – que é um compilado de todos os dados de estados e municípios, referentes à semana 8 de 2016 e que compreende o período de 3 de janeiro a 27 de fevereiro –, indicava 396.582 casos de dengue no país, bem superior ao mesmo período de 2015, que registrou 259.827 casos. Como os dados são de janeiro a fevereiro, estão defasados. No ano passado, o Brasil teve 2,35 milhões de notificações para dengue, representando um custo enorme para o sistema de saúde.
Doença tem alto impacto financeiro e social
Segundo Denizar Vianna, o custo anual do Brasil com a dengue é de cerca de R$ 1,2 bilhão, considerando gastos hospitalares, ambulatoriais e de perda de produtividade. O controle do Aedes e campanhas não estão incluídos. Em 2013, estima-se que o Brasil gastou R$ 5,76 bilhões. Para o pediatra e infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBim), a vacina chega, principalmente, para o uso na saúde individual. “A princípio, não teremos um programa público de vacinação contra a dengue, então não há uma expectativa de grande impacto. E mesmo que o governo resolva adotá-lo, não há vacina para todo mundo. Se forem vacinar, devem eleger cerca de 10% da população de 9 a 45 anos, para a qual a vacina foi indicada”, diz Kfouri, que acredita que o produto do Butantã demore de três a cinco anos.
De acordo com Sheila Homsani, diretora médica da Sanofi Pasteur, com planejamento é possível atender mais gente. Produzir a vacina dura 18 meses. Se o Brasil adotasse a estratégia sugerida pelos pesquisadores da Uerj, concentrando-se na faixa de 9 aos 16 anos, que representa 18% da população brasileira, seriam cerca de 36 milhões de pessoas imunizadas. Como são necessárias três doses, isso já consumiria a capacidade de produção atual. “Não sabemos ainda se o governo vai implementar e para quem, mas somos capazes de produzir”, diz.
Em 2012, metade da população mundial já estava sob o risco da dengue, por viver em regiões endêmicas. A incidência de casos aumentou 30 vezes em 50 anos. Dados da OMS, de 2004 a 2010, revelavam o Brasil como o país mais endêmico do mundo. Nova análise publicada no New England Journal of Medicine, em 24 de março, apontou as Filipinas com maior incidência de casos de dengue entre os 10 países endêmicos que participaram dos estudos clínicos de eficácia da vacina. O primeiro programa de vacinação pública contra a dengue começou esta semana naquele país, que deve vacinar este ano um milhão de crianças.
Estudos da vacina da dengue começaram há 20 anos. Resultados mostram uma eficácia de 65,5% contra os quatro sorotipos do vírus. Em relação