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Super-heróis, princesas e palhaços ajudam crianças na luta contra o câncer

A cura do câncer infantil se aproxima dos 80% na maioria dos tumores. Um estudo mostra que crianças que fazem quimioterapia brincando têm os efeitos colaterais do medicamento reduzidos em 38%

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Valéria Mendes - Saúde Plena Publicação:10/06/2013 08:00Atualização:10/06/2013 10:19
'É consenso que o tratamento precisa entrar no mundo da criança, seja ele qual for, mas principalmente o oncológico que tem muito sofrimento', afirma a oncologista pediátrica Fernanda Tibúrcio (A.C.Camargo Cancer Center/Divulgação)
"É consenso que o tratamento precisa entrar no mundo da criança, seja ele qual for, mas principalmente o oncológico que tem muito sofrimento", afirma a oncologista pediátrica Fernanda Tibúrcio
A quarta-feira chegou dando boas-vindas ao feriado prolongado de Corpus Christi. Para crianças e adolescentes em tratamento contra câncer de um hospital em São Paulo, o A.C.Camargo Cancer Center, a data trouxe uma nova arma contra a doença: os super-heróis. A enfermeira oncológica Amanda Alves conta que chegou ao trabalho e ouviu de um dos pacientes: “Tia, eu quero a caixinha do Batman”. Ela arriscou: “vocês já estão sabendo?”. O sim veio em coro. Com a internet, fica mesmo difícil manter uma ideia em segredo. A mãe de uma das crianças já tinha assistido ao vídeo que divulgava a ação em uma rede social. “Tenho que limpar primeiro a embalagem”, a profissional avisou já cercada por meninos e meninas que queriam pegar as caixinhas de seus super-heróis favoritos. Dentro do invólucro, a superfórmula: uma quimioterapia combinada com o simbolismo dos personagens que formam a Liga da Justiça.

A cura do câncer infantil se aproxima dos 80% na maioria dos tumores. “Mas o caminho é longo para chegar a esse número”, pondera a oncologista pediátrica Fernanda Tibúrcio. Por isso, apesar da estatística promissora, profissionais e instituições de saúde querem encontrar saídas criativas para que meninos e meninas aprendam a lidar de forma positiva com as difíceis fases do tratamento. Isabela, de 8 anos, é filha da arquiteta Simone da Silva Lima. A menina tem leucemia e precisou deixar em Manaus seu pai e seu irmão de 14 anos, além da própria casa, escola e amigos. Desde 29 de novembro do ano passado, as duas estão em São Paulo. O tratamento começou no dia seguinte e a previsão de duração é de 2 anos. “Foi preciso alugar um apartamento”, conta a mãe. “O hospital já tinha um trabalho voltado para as crianças. Elas não perdem o ano letivo, frequentam as aulas em uma escola que funciona aqui dentro”, informou a mãe por telefone. A nova Mulher Maravilha – personagem que Isabela escolheu – está mais sociável e animada, segundo a mãe. “Eles foram em busca de uma alternativa para as crianças se sentirem mais corajosas para vencer o dia a dia da quimio”, diz Simone. O início do projeto coincidiu com o começo da queda de cabelo da pequena heroína. “Ela está muito confiante, aceitou bem e não teve problema algum em perder os fios”, relata a mãe.

Profissionais e instituições de saúde querem encontrar saídas criativas para que meninos e meninas aprendam a lidar de forma positiva com as difíceis fases do tratamento (A.C.Camargo Cancer Center/Divulgação)
Profissionais e instituições de saúde querem encontrar saídas criativas para que meninos e meninas aprendam a lidar de forma positiva com as difíceis fases do tratamento
Otimismo, uma palavrinha mágica que pode fazer muita diferença. “Quanto mais bom-humor e fé, a resposta é muito melhor. Pacientes que se entregam, dificilmente respondem ao tratamento”, observa a enfermeira Amanda Alves. O balanço anual publicado pelos Doutores da Alegria em 2010 mostra que 85,4% das crianças apresentaram evidências clínicas de melhora. A publicação avaliou a influência da atuação dos palhaços na maneira como a criança lida com a experiência da internação/tratamento segundo os profissionais da saúde. Para se ter uma ideia, 96,3% delas ficam mais à vontade com o ambiente hospitalar. Elas também ficam mais ativas e falantes, de acordo com o levantamento: 95,4%. Setenta e sete por cento das crianças avaliadas passaram a se alimentar melhor e 74,3% passaram a aceitar melhor exames e procedimentos médicos. O estudo completo você encontra aqui. Amanda concorda: “eles acreditam na superfórmula, ficam mais dispostos e espertos”.

Especiais
Para a enfermeira, o enfrentamento de uma doença para a criança é confuso. “Eles não entendem muito o que está acontecendo. Internam, mas não sabem o que está se passando”, diz a enfermeira. A diretora de Oncologia Pediátrica do A.C.Camargo Cancer Center, Cecília Lima da Costa acredita que o atendimento tem que ser diferenciado e cuidadoso. “A preocupação maior, não é simplesmente curar, é garantir o menor impacto negativo nas crianças com o tratamento prolongado e doloroso”, explica.

Segundo ela, usar o universo da criança e do adolescente dentro do hospital é uma tentativa de humanizar o atendimento. “A iniciativa dos super-heróis é deixar o hospital mais agradável. Queremos usar o lúdico para enfrentar o tratamento. Quando um adulto está doente ele tira forças de onde? Na fé, na religião. O mundo da criança é o mundo da imaginação, da fantasia”, completa.

O balanço anual publicado pelos Doutores da Alegria em 2010 mostra que 85,4% das crianças apresentaram evidências clínicas de melhora. A publicação avaliou a influência da atuação dos palhaços na maneira como a criança lida com a experiência da internação/tratamento segundo os profissionais da saúde (Moises Silva/EM/D.A Press)
O balanço anual publicado pelos Doutores da Alegria em 2010 mostra que 85,4% das crianças apresentaram evidências clínicas de melhora. A publicação avaliou a influência da atuação dos palhaços na maneira como a criança lida com a experiência da internação/tratamento segundo os profissionais da saúde
Fernanda Tibúrcio cita um estudo que diz que a criança que faz quimioterapia brincando tem redução de 38% nos efeitos colaterais da medicação, como por exemplo, vômitos. “É consenso que o tratamento precisa entrar no mundo da criança, seja ele qual for, mas principalmente o oncológico que tem muito sofrimento”, diz. A especialista observa, entretanto, que é preciso respeitar os limites da doença: “a criança pode não dar conta de brincar, mas consegue ouvir histórias”. Outra regra é não mentir. “O profissional tem que adequar a mensagem para o que a criança dá conta de ouvir. Nunca se deve mentir que não vai ter dor”, indica. É importante também que os profissionais da saúde se atentem para chamar a criança e o acompanhante dela sempre pelo nome. “Temos que ter o mesmo respeito por esse paciente que com o adulto”, afirma a médica.

“A imaginação é própria da faixa etária e precisa ser alimentada”, afirma. Por isso, o tratamento tem que se encaixar no mundo da infância. Segundo Fernanda Tibúrcio, todos os grandes centros especializados em câncer possuem brinquedoteca e oferecem atividades lúdicas. “A criança fica parada em um leito por seis, oito horas. O tempo passa mais rápido se o ambiente é diferenciado e o atendimento adequado”, acredita.

As capas dos frascos são fáceis de manusear e esterilizar e seguem todos os padrões hospitalares (A.C.Camargo Cancer Center/Divulgação)
As capas dos frascos são fáceis de manusear e esterilizar e seguem todos os padrões hospitalares
A ação
O projeto do A.C.Camargo Cancer Center começou há 6 meses. “Há um mês, adesivamos as paredes e portas para criar o ambiente da Sala da Justiça. As caixinhas com as superfórmulas começaram a ser distribuídas há duas semanas”, explica a diretora da Oncologia Pediátrica. Também faz parte da ideia a criação e produção de uma série especial de desenhos animados e gibis, onde os próprios heróis vivem uma história semelhante à da criança com câncer e se recuperam através dessa superfórmula. As revistas estão na fase de impressão.

O A.C.Camargo Cancer Center tem o título de instituição filantrópica e, no ano passado, 60,2% dos atendimentos foram pelo Sistema Único de Saúde. O mínimo exigido é 60%.

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