Genética é capaz de prever resposta de paciente a tratamento do câncer de mama
A descoberta feita por um grupo internacional de cientistas pode tornar o atendimento mais individualizado
Bruna Sensêve - Correio Braziliense
Publicação:15/06/2013 10:00
Um grupo internacional de cientistas acredita ter identificado marcadores genéticos capazes de prever como será a resposta da paciente ao tratamento de prevenção ao câncer de mama. Mulheres com risco entre 20% e 40%, definido pelo histórico familiar, pelo resultado de biópsias ou pelas características de densidade do tecido mamário, têm atualmente a opção de passar pelo tratamento de prevenção contra a doença feito com tamoxifeno ou raloxifeno. Essas medicações, no entanto, têm uma efetividade reduzida (50% de diminuição do risco) e não garantem resultados em todas as pacientes.
Após uma série de análises genéticas, a equipe liderada por James Ingle, professor de oncologia na Clínica Mayo, em Rochester, nos Estados Unidos, concluiu que variações genéticas encontradas nos genes ZNF423 e CTSO serão capazes de determinar quais são as pacientes mais suscetíveis ao tratamento com esses moduladores e quais correm graves riscos de saúde quando se submetem à terapia.
Os dados, publicados hoje na edição da revista científica da Associação Americana para Pesquisa do Câncer, a Cancer Discovery, representam um importante passo em direção à personalização da terapia preventiva contra o câncer de mama. “As recentes orientações da Força Tarefa Americana para Serviços de Prevenção enfatizam que a terapia moduladora com tamoxifeno e raloxifeno pode diminuir o risco de uma mulher desenvolver o câncer de mama, mas cerca de 50 mulheres têm que ser expostas aos efeitos do tratamento e aos efeitos colaterais para evitar um único caso de câncer de mama”, detalha Ingle.
Essa aceleração da duplicação no osso é benéfica para a paciente, faz com que ela fique mais jovem e tenha menos perda de cálcio, diminuindo as chances de osteoporose. Essa explosão de proliferação celular já não é tão favorável para o útero. “Nesse caso, ela estimula o órgão e pode levar ao desenvolvimento do câncer de útero”, compara Freitas Júnior. São esses riscos que fazem a prescrição do tratamento preventivo ser muito detalhada e motivam a busca pelas pacientes que terão o maior benefício com ele.
Novos detalhes
Ingle e seus colegas da Clínica Mayo, que contaram com a ajuda de pesquisadores do Projeto Nacional Cirúrgico Adjuvante de cólon e mama (NSABP, em inglês) e do Centro Riken de Medicina Genômica, em Tóquio, no Japão, realizaram um estudo de associação do genoma envolvendo 592 pacientes que desenvolveram câncer de mama durante o tratamento de cinco anos com Serms e 1.171 mulheres sem a doença que se submeteram à mesma terapia. Essa análise detalhada mostrou que variações de um tipo de mutação genética conhecida como polimorfismo de nucleotídeo único (SNPs, em inglês) nos genes ZNF423 e CTSO são decisivas para determinar o sucesso da prevenção. No caso, as pacientes que possuíam a variação mais comum do ZNF423 e a menos comum do CTSO combinadas obtiveram a condição mais favorável para o sucesso do tratamento. A situação oposta, porém, também trouxe o resultado mais adverso ao tratamento, sem redução do risco e com possíveis efeitos colaterais à paciente.
“Nossas descobertas são importantes porque, pela primeira vez, detectamos fatores genéticos que poderiam ser usados para selecionar as mulheres às quais devem ser oferecidos os medicamentos para a prevenção. Também de importância substancial é o fato de termos descoberto mais informações sobre como o tamoxifeno e o raloxifeno trabalham para prevenir o câncer de mama”, descreve Ingle. Esse também é o ponto principal das descobertas para o oncogeneticista Cláudio Casali, professor de medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. “Primeiro, será possível definir de forma individualizada quem vai se beneficiar e quem não vai se beneficiar desse tipo de abordagem e, então, o médico tomará uma decisão.”
Casali ressalta, no entanto, que há uma necessidade de validação do estudo, já que, no Brasil, ainda não é conhecida a frequência dessa variação genética. Segundo o artigo, nos Estados Unidos, ela alcança mais de 40% da população. “É bem frequente na população americana, mas, aqui, nossa população é diferente e precisamos saber isso antes de começarmos a assumir um teste genético para tratar todo mundo.”
No escuro
A falta de informações mais individualizadas faz com que a prevenção contra o câncer de mama seja feita atualmente praticamente no escuro. A paciente diagnosticada com uma mutação de alto risco, como nos genes BRCA-1 e BRCA-2, precisa decidir entre três opções de tratamento preventivo. Primeiramente, ela pode acompanhar de perto o desenvolvimento ou não da doença com exames de imagem da mama a cada seis meses. “Nessa opção, o único objetivo é fazer o diagnóstico precoce, é detectar tumores benignos e malignos pequenos.”
A segunda possibilidade é a prevenção primária, escolha feita pela atriz americana Angelina Jolie. Trata-se de uma cirurgia de retirada do tecido mamário, em que a redução do risco é diretamente proporcional à quantidade de tecido retirado. Nesse caso, o mais indicado é retirar no mínimo de 90% a 95% do seio. “A terceira opção é interferir na transformação da célula normal na célula maligna, bloqueando os receptores que são comuns a ambas. A célula da mama normal os tem e eles são preservados pelo tumor. Você consegue interferir na formação delas fazendo o bloqueio com o tamoxifeno e o raloxifeno”, explica Casali. Ele alerta que, quanto maior o risco, maior tende a ser a intervenção preventiva.
Mudanças nos padrões
Os pesquisadores selecionaram as participantes a partir das 33 mil inscritas nos ensaios de prevenção contra o câncer de mama conhecidos como NSABP P-1 e P-2. Esses são estudos de câncer de mama que levaram ao estabelecimento da união da mastectomia com a radiação, em vez da mastectomia radical, como intervenção padrão para o câncer de mama. Também foram os primeiros a demonstrar que o tratamento contra a doença realizada em adição à terapia primária, principal ou inicial, pode alterar a história natural do câncer de mama, aumentando as taxas de sobrevivência, além de serem os primeiros a demonstrar, em grande escala, os efeitos preventivos da droga tamoxifeno no câncer de mama.
"Será possível definir de forma individualizada quem vai se beneficiar e quem não vai se beneficiar desse tipo de abordagem e, então, o médico tomará uma decisão” - Cláudio Casali, oncogeneticista
Após uma série de análises genéticas, a equipe liderada por James Ingle, professor de oncologia na Clínica Mayo, em Rochester, nos Estados Unidos, concluiu que variações genéticas encontradas nos genes ZNF423 e CTSO serão capazes de determinar quais são as pacientes mais suscetíveis ao tratamento com esses moduladores e quais correm graves riscos de saúde quando se submetem à terapia.
Os dados, publicados hoje na edição da revista científica da Associação Americana para Pesquisa do Câncer, a Cancer Discovery, representam um importante passo em direção à personalização da terapia preventiva contra o câncer de mama. “As recentes orientações da Força Tarefa Americana para Serviços de Prevenção enfatizam que a terapia moduladora com tamoxifeno e raloxifeno pode diminuir o risco de uma mulher desenvolver o câncer de mama, mas cerca de 50 mulheres têm que ser expostas aos efeitos do tratamento e aos efeitos colaterais para evitar um único caso de câncer de mama”, detalha Ingle.
Saiba mais...
Ao mesmo tempo, a paciente fica exposta a outros riscos, como trombose, embolia pulmonar, trombose de veias profundas e até mesmo o desenvolvimento de câncer no útero. Isso acontece porque, em algumas células do corpo humano, há receptores dos hormônios femininos, como o estrogênio. Os principais órgãos com essa característica seriam as mamas, o útero, o coração e os ossos. Em alguns desses locais, o tamoxifeno e o raloxifeno, que são moduladores seletivos dos receptores de estrogênio (Serms, em inglês), agem para promover a divisão celular; e, em outros, o processo é inverso: a desaceleração do processo de proliferação celular. “Na mama, esses moduladores seletivos diminuem a duplicação da célula mamária. No osso, eles aceleram essa duplicação”, explica o diretor da Escola Brasileira de Mastologia da Sociedade Brasileira de Mastologia, Ruffo de Freitas Júnior.- Descoberta da origem do câncer de mama traz mais chance de driblar a doença
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Essa aceleração da duplicação no osso é benéfica para a paciente, faz com que ela fique mais jovem e tenha menos perda de cálcio, diminuindo as chances de osteoporose. Essa explosão de proliferação celular já não é tão favorável para o útero. “Nesse caso, ela estimula o órgão e pode levar ao desenvolvimento do câncer de útero”, compara Freitas Júnior. São esses riscos que fazem a prescrição do tratamento preventivo ser muito detalhada e motivam a busca pelas pacientes que terão o maior benefício com ele.
Novos detalhes
Ingle e seus colegas da Clínica Mayo, que contaram com a ajuda de pesquisadores do Projeto Nacional Cirúrgico Adjuvante de cólon e mama (NSABP, em inglês) e do Centro Riken de Medicina Genômica, em Tóquio, no Japão, realizaram um estudo de associação do genoma envolvendo 592 pacientes que desenvolveram câncer de mama durante o tratamento de cinco anos com Serms e 1.171 mulheres sem a doença que se submeteram à mesma terapia. Essa análise detalhada mostrou que variações de um tipo de mutação genética conhecida como polimorfismo de nucleotídeo único (SNPs, em inglês) nos genes ZNF423 e CTSO são decisivas para determinar o sucesso da prevenção. No caso, as pacientes que possuíam a variação mais comum do ZNF423 e a menos comum do CTSO combinadas obtiveram a condição mais favorável para o sucesso do tratamento. A situação oposta, porém, também trouxe o resultado mais adverso ao tratamento, sem redução do risco e com possíveis efeitos colaterais à paciente.
“Nossas descobertas são importantes porque, pela primeira vez, detectamos fatores genéticos que poderiam ser usados para selecionar as mulheres às quais devem ser oferecidos os medicamentos para a prevenção. Também de importância substancial é o fato de termos descoberto mais informações sobre como o tamoxifeno e o raloxifeno trabalham para prevenir o câncer de mama”, descreve Ingle. Esse também é o ponto principal das descobertas para o oncogeneticista Cláudio Casali, professor de medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. “Primeiro, será possível definir de forma individualizada quem vai se beneficiar e quem não vai se beneficiar desse tipo de abordagem e, então, o médico tomará uma decisão.”
Casali ressalta, no entanto, que há uma necessidade de validação do estudo, já que, no Brasil, ainda não é conhecida a frequência dessa variação genética. Segundo o artigo, nos Estados Unidos, ela alcança mais de 40% da população. “É bem frequente na população americana, mas, aqui, nossa população é diferente e precisamos saber isso antes de começarmos a assumir um teste genético para tratar todo mundo.”
No escuro
A falta de informações mais individualizadas faz com que a prevenção contra o câncer de mama seja feita atualmente praticamente no escuro. A paciente diagnosticada com uma mutação de alto risco, como nos genes BRCA-1 e BRCA-2, precisa decidir entre três opções de tratamento preventivo. Primeiramente, ela pode acompanhar de perto o desenvolvimento ou não da doença com exames de imagem da mama a cada seis meses. “Nessa opção, o único objetivo é fazer o diagnóstico precoce, é detectar tumores benignos e malignos pequenos.”
A segunda possibilidade é a prevenção primária, escolha feita pela atriz americana Angelina Jolie. Trata-se de uma cirurgia de retirada do tecido mamário, em que a redução do risco é diretamente proporcional à quantidade de tecido retirado. Nesse caso, o mais indicado é retirar no mínimo de 90% a 95% do seio. “A terceira opção é interferir na transformação da célula normal na célula maligna, bloqueando os receptores que são comuns a ambas. A célula da mama normal os tem e eles são preservados pelo tumor. Você consegue interferir na formação delas fazendo o bloqueio com o tamoxifeno e o raloxifeno”, explica Casali. Ele alerta que, quanto maior o risco, maior tende a ser a intervenção preventiva.
Mudanças nos padrões
Os pesquisadores selecionaram as participantes a partir das 33 mil inscritas nos ensaios de prevenção contra o câncer de mama conhecidos como NSABP P-1 e P-2. Esses são estudos de câncer de mama que levaram ao estabelecimento da união da mastectomia com a radiação, em vez da mastectomia radical, como intervenção padrão para o câncer de mama. Também foram os primeiros a demonstrar que o tratamento contra a doença realizada em adição à terapia primária, principal ou inicial, pode alterar a história natural do câncer de mama, aumentando as taxas de sobrevivência, além de serem os primeiros a demonstrar, em grande escala, os efeitos preventivos da droga tamoxifeno no câncer de mama.
"Será possível definir de forma individualizada quem vai se beneficiar e quem não vai se beneficiar desse tipo de abordagem e, então, o médico tomará uma decisão” - Cláudio Casali, oncogeneticista