BH é a segunda cidade brasileira com maior número de mulheres inscritas em site de relacionamentos extraconjugais
Essas mulheres têm em média 33 anos, estão casadas há pelo menos 7 anos (52%), têm um filho (58%), além disso, elas (62%) tem renda média de R$ 5 mil por mês
Laura Valente - Estado de Minas
Publicação:29/07/2013 13:00Atualização: 29/02/2016 11:17
O casamento de quase uma década vai bem, obrigada, mas o sexo há muito deixou de ser o mesmo. Sempre ausente em viagens ou cansado, o marido de Fernanda (nome fictício), moradora de BH, formada em curso superior, 32 anos, mãe de dois filhos pequenos, não apresenta a mesma disposição de outros tempos para a cama. Angustiada com a situação, a mulher fez como uma colega de trabalho: inscreveu-se no site de relacionamentos AshleyMadison e encontrou um amante. Ela não cogita a separação e disse que apesar da culpa nos primeiros dias, atualmente mantém um relacionamento extraconjugal. Só este ano, esteve com “o outro” quatro vezes. Após os encontros, diz sentir alívio e alegria. Fernanda não é a única. Segundo dados da empresa especializada em promover relações sem compromisso, espécie de rede social em que pessoas comprometidas inscrevem-se em busca de companhia esporádica, a capital mineira só perde para o Rio de Janeiro quanto ao crescimento do número de mulheres cadastradas. Em Minas Gerais, já são 120 mil usuários, 45 mil só na capital, terceira no ranking nacional de inscritos, sendo 41% do sexo feminino. Nos 29 países em que o site atua, com 20 milhões de usuários cadastrados, os homens são maioria, 70%, contra 30% de mulheres.
De fato, elas não estão tão atrás dos maridos no quesito infidelidade, mas nem por isso falam abertamente sobre o assunto ou perdoariam o cônjuge flagrado na mesma situação. Polêmico, o assunto divide opiniões, mas é verdade que o mundo virtual facilitou em muito a vida de quem opta pela traição, fatia da população que cresce e deu ao site o faturamento de US$ 120 milhões só no ano passado.
Obviamente, um defensor ferrenho da causa infidelidade, Eduardo Borges, diretor geral do site no Brasil, relaciona o serviço prestado pelo AshleyMadison ao prazer incondicional. Para divulgá-lo, usa o slogan: “a vida é curta, tenha um caso”. E justifica a posição. “Oferecemos aos inscritos a possibilidade de suprir uma necessidade do casamento sem optar pelo divórcio. Geralmente, nossos clientes amam os parceiros e estão satisfeitos com os pilares do casamento como laços familiares e financeiros. No entanto, falta sexo. Você vai se divorciar só por causa disso?”. Geralmente criticado por grupos religiosos e incensado por quem diz ter “salvado o casamento” com a inscrição no site, Borges diz que tenta focar apenas o lado positivo do serviço, sem fazer julgamentos ou juízos de valor. “Trata-se de uma questão imoral para muitos? Respeitamos. Mas quando se inscreve no site, a pessoa opta pela traição, ela teve tempo para pensar a respeito, não agiu por impulso. E penso que não cabe às pessoas de for a daquela história julgar, dizer se estão corretas ou não.”
Regina Navarro Lins, psicanalista e autora de O livro do as amor, da pré-história à Renascença (Editora Best Seller), não discorda do sexo fora de um casamento. Para começo de conversa, ela acha o termo traição inadequado. “Fidelidade não tem a ver com sexualidade e traição é uma palavra pejorativa, prefiro chamar de relação extraconjugal. Mesmo porque já existem casais que não dão importância a isso portanto não existe uma traição”, avalia. Ela conta que a imposição da fidelidade feminina vem de cinco mil anos atrás, quando a propriedade privada surgiu na história da humanidade. Daí, o homem passou a controlar a mulher com medo de a herança cair nas mãos de um filho bastardo, enquanto elas temiam uma gravidez indesejada. Mas a chegada dos anos 1960, o surgimento da pílula e de todos os movimentos de contracultura, feminista, hippie e gay, a revolução sexual em si, trouxeram mudanças de paradigmas. “Hoje, elas tem tantas opções quanto os homens. Porque variar é bom, e a vontade de variar é mais que natural”, acredita. Ainda segundo Regina, a questão da fidelidade não é tão importante. “Acho uma bobagem o tal pacto de exclusividade, as pessoas serem obcecadas por isso, a questão ser tão cobrada. Ninguém devia preocupar-se com a vida privada do parceiro. A pergunta que devem-se fazer é: sinto-me amada? Desejada? Respondendo sim para as duas, tanto faz se um ou outro transa por fora ou não”
A psicanalista acredita ainda que a máxima “quem ama não transa com mais ninguém” é mentirosa e que o assunto relação extraconjugal não deve ser tema de confessionário. “Não tem que contar, da mesma forma que não é legal ficar controlando o outro, mexendo em celular de marido ou mulher. A vida privada não diz respeito a ninguém, por que a questão da fidelidade é cultural e o amor é uma construção social. A cultura de um povo modifica-se, cada hora é de um jeito, as mudanças de comportamento estão em curso: há cada vez mais pessoas refletindo sobre valores e crenças equivocados que geram sofrimento”. Questionada sobre o pensamento dos pacientes em relação a tal posição, Regina é taxativa. “As pessoas que me conhecem já sabem da minha posição e, mesmo que não vivam assim, têm vontade de evoluir, se livrar do moralismo, dos preconceitos.”
"Acho que a sensação de culpa ocorreu quando me cadastrei no site, fiquei alguns dias sem usá-lo, sentindo medo por ter feito. Mas depois que comecei a conversar com outros homens, percebi que eles estavam em uma situação muito igual à minha, e comecei a sentir um alívio. E a alegria veio quando encontrei esse homem, que é extremamente gostoso de cama!" - Fernanda (nome fictício), casada, 32 anos, moradora de BH
Perfil das mulheres cadastradas
Segundo o site Ashley Madison: têm em média 33 anos, estão casadas há pelo menos 7 anos (52%), têm um filho (58%), além disso, elas (62%) tem renda média de R$ 5 mil por mês.
No mapa nacional da infidelidade feminina: a cidade do Rio de Janeiro fica em primeiro lugar no ranking, com um crescimento de 103% no número de usuárias cadastradas; Belo Horizonte é a segunda, com crescimento de 101%, seguida por Brasília (96%), Curitiba (91%) e São Paulo (89%).
1) Savassi
2) Sion
3) São Luis
4) Gutierrez
5) Centro
1) Fugir da monotonia do casamento
2) Falta de sexo
3) Problemas com o parceiro
O outro lado da moeda
Do mesmo modo que há defensores da causa, existem os críticos. A psicanalista Izabel Haddad relaciona o serviço do site a um produto de consumo. “O endereço virtual não faz mais do que oferecer a possibilidade de uma traição agenciada, como se isso fosse um produto a ser consumido, com diretos e deveres do consumidor.” Ela cita alguns “selos de garantia” oferecidos pelo AshleyMadison, como serviço “seguro e confiável, em que você só encontrará pessoas que pensam como você”. É rebate: “ é uma proposta no mínimo muito questionável, pois torna algo que de certo ponto de vista é um tabu na nossa sociedade em um comportamento comum, banal.”
Izabel acredita que o site de relacionamentos extraconjugais encoraja as mulheres a buscar um outro relacionamento para se somar ao que elas já têm, o que não seria uma saída para todas as mulheres, tampouco a melhor delas. “Se essa procura tem aumentado tanto, acredito que seja mais por uma dificuldade de lidar coma a própria sexualidade do que a prova de que as mulheres estão evoluindo. É estranho pensar que algo tão controverso quanto a traição possa ser tratado de uma forma tão despretensiosa, como se não fosse sempre um tema que gera no mínimo um desconforto para todos que estão envolvidos na situação.”
Para debater a questão, Izabel pergunta: “De acordo com a proposta do site, a traição não estaria se tornando hoje mais um tipo de modismo a ser cumprido? Ter direito, e, curiosamente, o dever de trair quando as coisas não vão bem no relacionamento se tornou praticamente uma imposição ou um ritual social, segundo as recomendações do site. Não me parece uma escolha produzida por um desejo, mas sim por uma procura desesperada de encontrar uma completude utópica.”
Autora de O livro da traição feminina (Matriz Editora), a jornalista Lílian Viveiros lembra que também as novelas já veem abordando o tema com mais frequência. “Nsão sou a dona da verdade para dizer o que é certo ou errado. Por isso não levanto bandeiras, mas me incomoda as pessoas não avaliarem o quanto uma traição machuca o traído. Será que é mesmo preciso procurar uma nova razão de viver com outra pessoa?”, questiona.
Ainda na opinião de Lílian, a traição seduz pela promessa de novas sensações, mas é preciso distinguir realidade e ideal. “Por um momento, esse affair (ou pulada de cerca) vai dar um frescor novo à vida. É novidade, ansiedade, desconhecido. Isso tudo mexe com a adrenalina. Pode ser que se transforme em um verdadeiro amor ou passatempo, cada caso é um caso. Mas quando você se compromete a dividir sua vida com alguém, tem que ter em mente que esse relacionamento vai passar por altos e baixos. Não dá para satisfazer suas necessidades o tempo todo”, lembra.
Motivos variados
Eduardo Borges defende ainda a ideia de que a traição sempre existiu e que o site apenas promove uma maneira “segura” para o cônjuge infiel pular a cerca. “ Nosso diferencial é que as pessoas inscritas já sabem o que querem do outro, deixam suas intenções explícitas. Além do mais, oferecemos discrição. A intenção é que uma pessoa casada não saia com alguém das relações pessoais, como um colega de trabalho”. Ainda de acordo com pesquisas realizadas pelo AshleyMadison, enquanto a principal razão para a traição masculina é sexo, as mulheres são motivadas a procurar o site por vingança, em busca de afeto, carinho e conversa, também pelo sexo ou por algum problema com o parceiro. “Para a maioria dos inscritos, falta alguma coisa no casamento. E acredito que a busca pelo serviço tende a aumentar, já que o usuário não é exposto, inclusive em caso de Justiça: temos um mecanismo que deleta tudo a respeito de um cadastro em caso de necessidade, automaticamente. Ainda assim, indicamos que a pessoa não use o e-mail pessoal para acessar o site, mas, sim, um fake ou o e-mail coorporativo”, ensina.
Aliás, a chance de um caso extraconjugal ser descoberto não agrada a ninguém. Fernanda, por exemplo, diz pensar que o marido a abandonaria frente a um flagrante e usa a expressão “bate na boca, menina!”, quando questionada sobre a possibilidade. Ela diz ainda ter dúvidas se perdoaria o marido se ele fosse o infiel. No entanto, acredita que o caso extraconjugal que vem mantendo deu um up no casamento. “Acho que melhorou a angústia que eu tinha por não fazer sexo com meu marido. Vejo que ele se esforça bastante para ser um bom companheiro e pai, mas nosso tesão um pelo o outro não é tão grande como antigamente. Fazemos sexo às vezes, mas nada especial. Acho que essa terceira pessoa completou a relação.”
Do lado masculino, a motivação não é diferente. Segundo um perfil do site com o qual a reportagem conversou, homem de 42 anos, casado há 15, com dois filhos, morador de BH, o principal motivo para se inscrever no AshleyMadison foi a “vontade de conhecer pessoas fora do meu relacionamento do dia- a- dia”. Quanto à preferência por mulheres casadas, ele justifica. “Elas têm os mesmos objetivos que eu, e os mesmos problemas cotidianos. São mais discretas e não podem comentar sobre o relacionamento. Nunca saí com solteiras, mas acredito que elas precisam de mais tempo e atenção”.
Ele afirma que nem sempre as conversas terminam em cama, mas diz ter saído com 20 mulheres desde que fez o cadastro, em outubro do ano passado. “Mas relacionamento mesmo só com quatro”, confessa. Questionado se existe o temor de ser flagrado pela mulher ou o marido de uma amante, ou de apaixonar-se pelo caso extra, ele é sucinto, diz apenas não. E pretende manter-se cadastrado. “É a forma mais natural de encontrar pessoas que tëm as mesmas necessidades”. Um conselho para quem pensa em entrar para o clube? “Cautela, converse bastante antes e marque o primeiro encontro em um lugar público”. Vale lembrar que o cadastro feminino no AshleyMadison é gratuito, enquanto os homens pagam. A cota mais em conta custa R$ 49 e dá direito a conversar com 20 mulheres. Créditos para as compras de flores, ursinhos de pelúcia e colares de pérolas virtuais para presentear as “amigas” são cobrados à parte.
Grande desafio
Há culpados? Cada caso é um caso, como apontam os especialistas, mas tratando-se de casais, ambos costumam responder pelos rumos do relacionamento. “No meu ponto de vista, a traição acontece por um descuido de ambas as partes. Não existe santinho ou malvado. A situação os levou a isso. A traição vem de uma sequência de insatisfações e necessidades não atendidas ou comunicadas ao parceiro”, conclui Lílian. Já Izabel recorre a Freud para avaliar a situação. “Toda parceria conjugal ou extraconjugal trará questões e faltas como todo bom relacionamento. Como diria Freud, a relação amorosa é umas das fontes de maior sofrimento para o ser humano. O que podemos fazer em relação a isso? Descobrir os próprios desejos e quais são suas questões para além de seu parceiro, marido ou amante. Primeiramente, é preciso pensar que o marido ou mulher são fruto de uma escolha pessoal e, sendo assim, é melhor que você se questione por que escolheu esse homem do qual se queixa tanto. Uma escolha pode ser mudada, contanto que você também transforme algo em você e não só troque de parceiro a cada insatisfação ou decepção gerada pelo relacionamento.”
A psicanalista vai além, e diz acreditar que o grande desafio do nosso tempo é concluir que não podemos ter tudo, mesmo que nos seja oferecido uma gama de objetos para suturar nossas faltas e nossas insatisfações. “A parceria amorosa é sempre um desafio para ambos os sexos, e permanecer com um parceiro por muito tempo é um exercício difícil de fazer hoje em dia. Não há como escapar das dificuldades, mesmo que você tenha a opção de se inscrever em sites especializados em agenciar traições que lhe ofereçam todas as garantias para trazer um amante perfeito em dez dias ou seu dinheiro de volta”, afirma.
Monogamia x poligamia
Ambas as situações de fato existem, mas Izabel Haddad (foto) não acredita que a poligamia faça parte da natureza humana, nem que a monogamia não seja natural do homem. “Como psicanalista, questiono a ideia de que há algo de uma natureza imutável que nos determina. Ser monogâmico ou poligâmico é uma escolha e não faz parte de uma determinação simplesmente genética ou natural. Lógico que existem culturas em que a poligamia é um bem. Na cultura árabe, por exemplo ter várias mulheres é um status para o homem, assim como ter dinheiro, sucesso e fama na nossa cultura. Mesmo aqui, no Nordeste de nosso país, a poligamia é algo destituído de julgamento moralizante. Alguns homens têm famílias com várias mulheres e isso não é um problema.”
No entanto, ela avalia como uma ilusão pensar que uma relação fora do casamento vá solucionar os problemas. “Muitas vezes, uma traição pode aumentar a angústia e o sentimento de frustração, porque com o tempo as diferenças também aparecem, reafirmando que toda relação tem suas faltas. Algumas mulheres muitas vezes não buscam o encontro consigo mesmas, nem direcionam seu desejo para outros objetos, para outros lugares. Acreditam simploriamente que podem suturar a falta de olhar, de carinho do parceiro com a presença de outro homem. Continuam na mesma posição, pois insistem em precisar de um homem, dois homens ou vários deles para ser feliz”, analisa.
A jornalista Lílian Viveiros pensa que vale a pena tentar outras propostas ou mesmo terminar a relação no lugar de optar pela infidelidade. “Acredito que quando se assume um relacionamento no qual ambos optam pela monogomia, vale a pena seguir a regra. Antes de um terceiro entrar na história, vale tentar conversa, diálogo, mudança de atitude. Melhor colocar um ponto final numa história fadada ao fracasso do que incluir um amante. Garanto que as mágoas serão bem menores.”
Outra “dica” é olhar para si mesma, no lugar de apenas apontar os defeitos do outro. “Diria que algo vai muito mal com a autoestima ou com a imagem que a mulher faz de si mesma quando pensa que iniciar um relacionamento extraconjugal ou procurar um site especializado em traições possa trazer algo de produtivo ou apaziguador para suas insatisfações. Veja bem, não digo que traições não aconteçam, acredito que acontecem muito, mas de forma contingente, casual e não forjada ou como uma saída predeterminada”, cutuca Izabel.
Em Minas Gerais, já são 120 mil usuários, 45 mil só na capital, terceira no ranking nacional de inscritos, sendo 41% do sexo feminino. Nos 29 países em que o site atua, com 20 milhões de usuários cadastrados, os homens são maioria, 70%, contra 30% de mulheres
De fato, elas não estão tão atrás dos maridos no quesito infidelidade, mas nem por isso falam abertamente sobre o assunto ou perdoariam o cônjuge flagrado na mesma situação. Polêmico, o assunto divide opiniões, mas é verdade que o mundo virtual facilitou em muito a vida de quem opta pela traição, fatia da população que cresce e deu ao site o faturamento de US$ 120 milhões só no ano passado.
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Obviamente, um defensor ferrenho da causa infidelidade, Eduardo Borges, diretor geral do site no Brasil, relaciona o serviço prestado pelo AshleyMadison ao prazer incondicional. Para divulgá-lo, usa o slogan: “a vida é curta, tenha um caso”. E justifica a posição. “Oferecemos aos inscritos a possibilidade de suprir uma necessidade do casamento sem optar pelo divórcio. Geralmente, nossos clientes amam os parceiros e estão satisfeitos com os pilares do casamento como laços familiares e financeiros. No entanto, falta sexo. Você vai se divorciar só por causa disso?”. Geralmente criticado por grupos religiosos e incensado por quem diz ter “salvado o casamento” com a inscrição no site, Borges diz que tenta focar apenas o lado positivo do serviço, sem fazer julgamentos ou juízos de valor. “Trata-se de uma questão imoral para muitos? Respeitamos. Mas quando se inscreve no site, a pessoa opta pela traição, ela teve tempo para pensar a respeito, não agiu por impulso. E penso que não cabe às pessoas de for a daquela história julgar, dizer se estão corretas ou não.”
Regina Navarro Lins, psicanalista e autora de O livro do as amor, da pré-história à Renascença (Editora Best Seller), não discorda do sexo fora de um casamento. Para começo de conversa, ela acha o termo traição inadequado. “Fidelidade não tem a ver com sexualidade e traição é uma palavra pejorativa, prefiro chamar de relação extraconjugal. Mesmo porque já existem casais que não dão importância a isso portanto não existe uma traição”, avalia. Ela conta que a imposição da fidelidade feminina vem de cinco mil anos atrás, quando a propriedade privada surgiu na história da humanidade. Daí, o homem passou a controlar a mulher com medo de a herança cair nas mãos de um filho bastardo, enquanto elas temiam uma gravidez indesejada. Mas a chegada dos anos 1960, o surgimento da pílula e de todos os movimentos de contracultura, feminista, hippie e gay, a revolução sexual em si, trouxeram mudanças de paradigmas. “Hoje, elas tem tantas opções quanto os homens. Porque variar é bom, e a vontade de variar é mais que natural”, acredita. Ainda segundo Regina, a questão da fidelidade não é tão importante. “Acho uma bobagem o tal pacto de exclusividade, as pessoas serem obcecadas por isso, a questão ser tão cobrada. Ninguém devia preocupar-se com a vida privada do parceiro. A pergunta que devem-se fazer é: sinto-me amada? Desejada? Respondendo sim para as duas, tanto faz se um ou outro transa por fora ou não”
A psicanalista acredita ainda que a máxima “quem ama não transa com mais ninguém” é mentirosa e que o assunto relação extraconjugal não deve ser tema de confessionário. “Não tem que contar, da mesma forma que não é legal ficar controlando o outro, mexendo em celular de marido ou mulher. A vida privada não diz respeito a ninguém, por que a questão da fidelidade é cultural e o amor é uma construção social. A cultura de um povo modifica-se, cada hora é de um jeito, as mudanças de comportamento estão em curso: há cada vez mais pessoas refletindo sobre valores e crenças equivocados que geram sofrimento”. Questionada sobre o pensamento dos pacientes em relação a tal posição, Regina é taxativa. “As pessoas que me conhecem já sabem da minha posição e, mesmo que não vivam assim, têm vontade de evoluir, se livrar do moralismo, dos preconceitos.”
"Acho que a sensação de culpa ocorreu quando me cadastrei no site, fiquei alguns dias sem usá-lo, sentindo medo por ter feito. Mas depois que comecei a conversar com outros homens, percebi que eles estavam em uma situação muito igual à minha, e comecei a sentir um alívio. E a alegria veio quando encontrei esse homem, que é extremamente gostoso de cama!" - Fernanda (nome fictício), casada, 32 anos, moradora de BH
Perfil das mulheres cadastradas
Segundo o site Ashley Madison: têm em média 33 anos, estão casadas há pelo menos 7 anos (52%), têm um filho (58%), além disso, elas (62%) tem renda média de R$ 5 mil por mês.
- Em todo o mundo, o site conta com 5 milhões de mulheres cadastradas
- Na versão brasileira, já são quase 400 mil usuárias
No mapa nacional da infidelidade feminina: a cidade do Rio de Janeiro fica em primeiro lugar no ranking, com um crescimento de 103% no número de usuárias cadastradas; Belo Horizonte é a segunda, com crescimento de 101%, seguida por Brasília (96%), Curitiba (91%) e São Paulo (89%).
- Em BH, os seguintes bairros lideram o mapa da infidelidade feminina:
1) Savassi
2) Sion
3) São Luis
4) Gutierrez
5) Centro
- Motivos que levam a mulher a procurar o site
1) Fugir da monotonia do casamento
2) Falta de sexo
3) Problemas com o parceiro
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Do mesmo modo que há defensores da causa, existem os críticos. A psicanalista Izabel Haddad relaciona o serviço do site a um produto de consumo. “O endereço virtual não faz mais do que oferecer a possibilidade de uma traição agenciada, como se isso fosse um produto a ser consumido, com diretos e deveres do consumidor.” Ela cita alguns “selos de garantia” oferecidos pelo AshleyMadison, como serviço “seguro e confiável, em que você só encontrará pessoas que pensam como você”. É rebate: “ é uma proposta no mínimo muito questionável, pois torna algo que de certo ponto de vista é um tabu na nossa sociedade em um comportamento comum, banal.”
Izabel acredita que o site de relacionamentos extraconjugais encoraja as mulheres a buscar um outro relacionamento para se somar ao que elas já têm, o que não seria uma saída para todas as mulheres, tampouco a melhor delas. “Se essa procura tem aumentado tanto, acredito que seja mais por uma dificuldade de lidar coma a própria sexualidade do que a prova de que as mulheres estão evoluindo. É estranho pensar que algo tão controverso quanto a traição possa ser tratado de uma forma tão despretensiosa, como se não fosse sempre um tema que gera no mínimo um desconforto para todos que estão envolvidos na situação.”
Para debater a questão, Izabel pergunta: “De acordo com a proposta do site, a traição não estaria se tornando hoje mais um tipo de modismo a ser cumprido? Ter direito, e, curiosamente, o dever de trair quando as coisas não vão bem no relacionamento se tornou praticamente uma imposição ou um ritual social, segundo as recomendações do site. Não me parece uma escolha produzida por um desejo, mas sim por uma procura desesperada de encontrar uma completude utópica.”
Autora de O livro da traição feminina (Matriz Editora), a jornalista Lílian Viveiros lembra que também as novelas já veem abordando o tema com mais frequência. “Nsão sou a dona da verdade para dizer o que é certo ou errado. Por isso não levanto bandeiras, mas me incomoda as pessoas não avaliarem o quanto uma traição machuca o traído. Será que é mesmo preciso procurar uma nova razão de viver com outra pessoa?”, questiona.
Ainda na opinião de Lílian, a traição seduz pela promessa de novas sensações, mas é preciso distinguir realidade e ideal. “Por um momento, esse affair (ou pulada de cerca) vai dar um frescor novo à vida. É novidade, ansiedade, desconhecido. Isso tudo mexe com a adrenalina. Pode ser que se transforme em um verdadeiro amor ou passatempo, cada caso é um caso. Mas quando você se compromete a dividir sua vida com alguém, tem que ter em mente que esse relacionamento vai passar por altos e baixos. Não dá para satisfazer suas necessidades o tempo todo”, lembra.
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Eduardo Borges defende ainda a ideia de que a traição sempre existiu e que o site apenas promove uma maneira “segura” para o cônjuge infiel pular a cerca. “ Nosso diferencial é que as pessoas inscritas já sabem o que querem do outro, deixam suas intenções explícitas. Além do mais, oferecemos discrição. A intenção é que uma pessoa casada não saia com alguém das relações pessoais, como um colega de trabalho”. Ainda de acordo com pesquisas realizadas pelo AshleyMadison, enquanto a principal razão para a traição masculina é sexo, as mulheres são motivadas a procurar o site por vingança, em busca de afeto, carinho e conversa, também pelo sexo ou por algum problema com o parceiro. “Para a maioria dos inscritos, falta alguma coisa no casamento. E acredito que a busca pelo serviço tende a aumentar, já que o usuário não é exposto, inclusive em caso de Justiça: temos um mecanismo que deleta tudo a respeito de um cadastro em caso de necessidade, automaticamente. Ainda assim, indicamos que a pessoa não use o e-mail pessoal para acessar o site, mas, sim, um fake ou o e-mail coorporativo”, ensina.
Aliás, a chance de um caso extraconjugal ser descoberto não agrada a ninguém. Fernanda, por exemplo, diz pensar que o marido a abandonaria frente a um flagrante e usa a expressão “bate na boca, menina!”, quando questionada sobre a possibilidade. Ela diz ainda ter dúvidas se perdoaria o marido se ele fosse o infiel. No entanto, acredita que o caso extraconjugal que vem mantendo deu um up no casamento. “Acho que melhorou a angústia que eu tinha por não fazer sexo com meu marido. Vejo que ele se esforça bastante para ser um bom companheiro e pai, mas nosso tesão um pelo o outro não é tão grande como antigamente. Fazemos sexo às vezes, mas nada especial. Acho que essa terceira pessoa completou a relação.”
Do lado masculino, a motivação não é diferente. Segundo um perfil do site com o qual a reportagem conversou, homem de 42 anos, casado há 15, com dois filhos, morador de BH, o principal motivo para se inscrever no AshleyMadison foi a “vontade de conhecer pessoas fora do meu relacionamento do dia- a- dia”. Quanto à preferência por mulheres casadas, ele justifica. “Elas têm os mesmos objetivos que eu, e os mesmos problemas cotidianos. São mais discretas e não podem comentar sobre o relacionamento. Nunca saí com solteiras, mas acredito que elas precisam de mais tempo e atenção”.
Ele afirma que nem sempre as conversas terminam em cama, mas diz ter saído com 20 mulheres desde que fez o cadastro, em outubro do ano passado. “Mas relacionamento mesmo só com quatro”, confessa. Questionado se existe o temor de ser flagrado pela mulher ou o marido de uma amante, ou de apaixonar-se pelo caso extra, ele é sucinto, diz apenas não. E pretende manter-se cadastrado. “É a forma mais natural de encontrar pessoas que tëm as mesmas necessidades”. Um conselho para quem pensa em entrar para o clube? “Cautela, converse bastante antes e marque o primeiro encontro em um lugar público”. Vale lembrar que o cadastro feminino no AshleyMadison é gratuito, enquanto os homens pagam. A cota mais em conta custa R$ 49 e dá direito a conversar com 20 mulheres. Créditos para as compras de flores, ursinhos de pelúcia e colares de pérolas virtuais para presentear as “amigas” são cobrados à parte.
Grande desafio
Há culpados? Cada caso é um caso, como apontam os especialistas, mas tratando-se de casais, ambos costumam responder pelos rumos do relacionamento. “No meu ponto de vista, a traição acontece por um descuido de ambas as partes. Não existe santinho ou malvado. A situação os levou a isso. A traição vem de uma sequência de insatisfações e necessidades não atendidas ou comunicadas ao parceiro”, conclui Lílian. Já Izabel recorre a Freud para avaliar a situação. “Toda parceria conjugal ou extraconjugal trará questões e faltas como todo bom relacionamento. Como diria Freud, a relação amorosa é umas das fontes de maior sofrimento para o ser humano. O que podemos fazer em relação a isso? Descobrir os próprios desejos e quais são suas questões para além de seu parceiro, marido ou amante. Primeiramente, é preciso pensar que o marido ou mulher são fruto de uma escolha pessoal e, sendo assim, é melhor que você se questione por que escolheu esse homem do qual se queixa tanto. Uma escolha pode ser mudada, contanto que você também transforme algo em você e não só troque de parceiro a cada insatisfação ou decepção gerada pelo relacionamento.”
A psicanalista vai além, e diz acreditar que o grande desafio do nosso tempo é concluir que não podemos ter tudo, mesmo que nos seja oferecido uma gama de objetos para suturar nossas faltas e nossas insatisfações. “A parceria amorosa é sempre um desafio para ambos os sexos, e permanecer com um parceiro por muito tempo é um exercício difícil de fazer hoje em dia. Não há como escapar das dificuldades, mesmo que você tenha a opção de se inscrever em sites especializados em agenciar traições que lhe ofereçam todas as garantias para trazer um amante perfeito em dez dias ou seu dinheiro de volta”, afirma.
Izabel Haddad avalia como uma ilusão pensar que uma relação fora do casamento é uma saída que proporcione felicidade para todos
Monogamia x poligamia
Ambas as situações de fato existem, mas Izabel Haddad (foto) não acredita que a poligamia faça parte da natureza humana, nem que a monogamia não seja natural do homem. “Como psicanalista, questiono a ideia de que há algo de uma natureza imutável que nos determina. Ser monogâmico ou poligâmico é uma escolha e não faz parte de uma determinação simplesmente genética ou natural. Lógico que existem culturas em que a poligamia é um bem. Na cultura árabe, por exemplo ter várias mulheres é um status para o homem, assim como ter dinheiro, sucesso e fama na nossa cultura. Mesmo aqui, no Nordeste de nosso país, a poligamia é algo destituído de julgamento moralizante. Alguns homens têm famílias com várias mulheres e isso não é um problema.”
No entanto, ela avalia como uma ilusão pensar que uma relação fora do casamento vá solucionar os problemas. “Muitas vezes, uma traição pode aumentar a angústia e o sentimento de frustração, porque com o tempo as diferenças também aparecem, reafirmando que toda relação tem suas faltas. Algumas mulheres muitas vezes não buscam o encontro consigo mesmas, nem direcionam seu desejo para outros objetos, para outros lugares. Acreditam simploriamente que podem suturar a falta de olhar, de carinho do parceiro com a presença de outro homem. Continuam na mesma posição, pois insistem em precisar de um homem, dois homens ou vários deles para ser feliz”, analisa.
A jornalista Lílian Viveiros pensa que vale a pena tentar outras propostas ou mesmo terminar a relação no lugar de optar pela infidelidade. “Acredito que quando se assume um relacionamento no qual ambos optam pela monogomia, vale a pena seguir a regra. Antes de um terceiro entrar na história, vale tentar conversa, diálogo, mudança de atitude. Melhor colocar um ponto final numa história fadada ao fracasso do que incluir um amante. Garanto que as mágoas serão bem menores.”
Outra “dica” é olhar para si mesma, no lugar de apenas apontar os defeitos do outro. “Diria que algo vai muito mal com a autoestima ou com a imagem que a mulher faz de si mesma quando pensa que iniciar um relacionamento extraconjugal ou procurar um site especializado em traições possa trazer algo de produtivo ou apaziguador para suas insatisfações. Veja bem, não digo que traições não aconteçam, acredito que acontecem muito, mas de forma contingente, casual e não forjada ou como uma saída predeterminada”, cutuca Izabel.