Paciência é a chave para equilibrar casamentos em que os noivos são muito jovens

Interferência de pais e sogros e também o medo de não viver determinadas experiências podem afetar o equilíbrio dos relacionamentos

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Revista do CB - Correio Braziliense Publicação:24/07/2014 08:31Atualização:24/07/2014 08:49
“Querer viver coisas que não foram vividas no momento apropriado é algo que preocupa casais jovens”, opina a psicóloga Lorena Noronha. Pais e sogros também podem desequilibrar o relacionamento. “Muitas vezes, são os pais que dão o suporte, seja financeiro, seja emocional, então eles tendem a se sentir mais no direito de interferir”, justifica a especialista.

Encontrar uma forma de limitar essa influência é o principal desafio dos novinhos. Uma pessoa que já tenha tido outros relacionamentos durante a adolescência e decide se casar mais tarde, de modo geral, já cortou a intervenção dos pais. “Os limites continuam delimitados quando essa pessoa vai ter a própria casa”, completa Noronha. Ter a ilusão de que o casamento resolverá as brigas do namoro também é um erro comum na juventude. O problema é que o casamento funciona como uma lente de aumento, potencializando tudo: cumplicidade, ciúmes, intimidade. “Se os dois são amigos, ficam mais amigos. Se brigam, vão brigar ainda mais.”

Osmar Carvalho e Neuzi Correia: 40 anos de casados, problemas no início (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Osmar Carvalho e Neuzi Correia: 40 anos de casados, problemas no início
Neuzi Correia de Carvalho e Osmar Borges de Carvalho sabem muito bem a intensidade que o casamento traz ao relacionamento. No dia 13 de julho, os dois completaram 40 anos de casados. Ainda hoje, porém, os olhos dele marejam quando o assunto é a esposa. “Não me pergunta muito detalhe, senão vou acabar chorando”, pediu ele à reportagem. Os dois se casaram ainda moços: ele com 25 anos, ela com 18. “Começamos a namorar quando ela tinha 16, então, ainda não dava para se casar”, relembra. “Ela não foi minha primeira namorada, mas foi a primeira paixão para valer.”

No começo, o dinheiro era curto. Osmar, embora já servidor público do Senado Federal, ainda não ganhava o suficiente para garantir uma vida confortável e Neuzi era (e ainda é) dona de casa. Somado ao parco orçamento, entrava na conta a imaturidade do casal em lidar com dinheiro. “Antes do casamento, disse a ela que eu era um cara simples, que tinha vindo do interior da Bahia e que tinha um emprego que seria bom para nós no futuro”, relembra Osmar. “Foi muito difícil administrar o dinheiro, porque antes eu trabalhava na roça — nem salário tinha.” Algumas “faltas de juízo” até chegaram a irritar a mulher, mas os dois persistiram. “Muitos perdem casamento por conta de dinheiro. Não foi nosso caso.”

Osmar define a mulher como sendo o esteio da casa. Mesmo nova e sem experiência com relacionamentos, ele conta que ela, desde o começo, era quem colocava ordem no lar. “Ela teve muita paciência, segurou a barra. Se não fosse ela, teríamos nos separado.” Passada a questão financeira, vieram os problemas decorrentes da vida a dois. Novamente, a paciência de ambos foi o segredo para manter o casamento. “As palavras têm poder. Ela nunca expressou nenhuma palavra de maldição com relação a minha pessoa e sempre me defendeu, custasse o que custasse.”

Para Neuzi, ter se casado tão jovem ajudou o casal a manter a inocência. “Casamos sem maldade. Mesmo quando um aprontava, a gente conversava e se resolvia. Acho que, quando a pessoa tem mais idade, acaba ficando cautelosa, com o pé atrás e se fecha.” Manter um casamento não é fácil, mas algumas atitudes ajudam, segundo o casal. Anote aí: parar de apontar os erros do parceiro, ter cuidado com as palavras e saber que os dois têm defeitos são os ingredientes principais de uma vida conjugal equilibrada. Para Neuzi, ir à forra de atitudes indesejadas do parceiro é o caminho mais curto para a separação. “No casamento, não existe competição”, ensina.

Kevin Franklin e Thatiane Cristina: dois anos e meio separaram o namoro do noivado (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Kevin Franklin e Thatiane Cristina: dois anos e meio separaram o namoro do noivado
O caminho é difícil, porém, não é impossível. Disso, todos os casais estão cientes. Mas onde eles mais erram? Para Osmar, a falta de paciência é o principal pecado dos recém-casados. “Temos duas orelhas e uma boca, justamente para ouvir mais do que falar”, completa. Saber lidar com as mudanças também entra na lista dos segredos do sucesso. “Aquela pessoa, que era linda e maravilhosa quando você a conheceu, tem que continuar assim aos seus olhos”, compara Osmar. “Se a vida está difícil, segure firme, vá com seu parceiro até a última barreira. É aí que vem a bonança.”

Casa para quem casa
Buscar a autonomia financeira antes de subir ao altar também é uma dica valiosa. Ter dinheiro suficiente para não depender mais da família evita discussões e os famosos “pitacos” que quem está bancando a coisa toda pode se sentir tentado a dar. “É como diz o ditado: ‘quem dá dinheiro, dá palpite’”, completa a psicóloga e terapeuta de casais Marisa de Abreu. Se você é jovem e casado, não se desespere: tenha em mente que a vida financeira tende a melhorar com o tempo.

Para a psicóloga Lorena Noronha, saber quando é a hora certa de se comprometer depende muito mais da maturidade do próprio relacionamento do que da idade do casal. “Casamento não é uma cerimônia ou um papel que se assina”, compara. “É um status relacional, uma intimidade entre duas pessoas que sentem vontade de dividir a vida juntos.” Se a falta de dinheiro no começo da vida conjugal é um problema, uma conta bancária mais gorda também pode ser fonte de atritos. Segundo Noronha, é comum casais jovens procurarem a terapia de casal justamente quando começam a ter mais independência financeira. “Um dos dois acaba querendo mais independência de modo geral, e, às vezes, essa liberdade não inclui o parceiro ou os filhos.”

Com mais dinheiro no bolso, a vontade de ter roupas melhores, de sair para locais diferentes e/ou só com os amigos pode abalar o relacionamento. “Muitas vezes, o casamento ia muito bem, até um deles entrar na faculdade e querer ir a festas”, exemplifica Lorena Noronha. Outro ponto em que os mais jovens costumam escorregar, segundo a psicóloga, é não saber lidar com o fato de que a maioria dos amigos ainda estão solteiros — logo, não têm a mesma rotina dos casados. Resultado: quem quer sair sozinho se sente preso, enquanto quem quer ficar em casa se sente deixado de lado. Os efeitos colaterais são estresse, ciúme, insegurança e sensação de prisão.

Para driblar as intempéries futuras, uma alternativa é cultivar a cumplicidade desde o primeiro momento de relacionamento. Pelo menos, é a estratégia usada pelo casal Kevin Franklin Carvalho, 21 anos, e Thatiane Cristina de Gusmão da Silva Carvalho, 25. Os dois se conheceram há cinco anos, em uma festa a fantasia. À época, os dois faziam parte de uma ONG evangélica, que organizou uma viagem de 10 dias a Itaperuna (RJ) para implantar uma filial. “Quando voltamos de viagem, vimos que estava acontecendo algo mais”, resume a autônoma.

'Não queria dor de cabeça, queria me envolver logo com alguém sério', declara Thatiane   (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
'Não queria dor de cabeça, queria me envolver logo com alguém sério', declara Thatiane
Uma amiga em comum deu um empurrãozinho e, um mês após essa viagem, os dois estavam namorando. O relacionamento seguiu a toda velocidade: dois anos e meio separaram o namoro do noivado, decidido em fevereiro de 2013. “Não queria dor de cabeça, queria me envolver logo com alguém sério”, declara Thatiane. Os preparativos tiveram que acompanhar a velocidade do casal. O problema era o dinheiro: enquanto Kevin ainda era um estagiário com apenas três dígitos no contracheque, Thatiane não trabalhava. O patrocínio dos pais também estava vetado.

A alternativa foi empreender: surgia a Casando com Bombom, uma miniempresa especializada em chocolates personalizados. Todo o dinheiro arrecadado com a venda das guloseimas foi destinado ao casório. “Íamos entregar os chocolates na casa das pessoas, então, era comum dar meia-noite e ainda estarmos trabalhando”, conta Kevin. Além de cortar drasticamente supérfluos, como idas ao cinema ou ao restaurante, o casal apoiou-se em um rígido controle de gastos: desde fevereiro de 2013, quando noivaram, 70% do já curto salário de Kevin ia para a “poupança-casamento”.

O lema dos preparativos era: multiplicar dinheiro. Para isso, além da empresa de chocolates, os dois fizeram bazar e trocaram o chá de panela por chá dos noivos, em que o casal recebe dinheiro no lugar de presentes. “Todo mundo adorou, porque muita gente tem dificuldade em escolher coisas para casa”, completa Thatiane. No fim de toda essa odisseia financeira, os dois conseguiram juntar R$ 20 mil e se casaram em abril deste ano. “Ganhamos muita coisa também, como o vestido de noiva e o terno”, pondera Thatiane. Os utensílios domésticos também entraram na lista de presentes. “Nosso plano era se casar e não ter dívidas — e conseguimos isso”, comemora.

Hoje, os recém-casados ainda estão se habituando a contas e tarefas domésticas. A empresa está parada, Kevin é bancário e Thatiane continua na ONG. “Muitos disseram que eu ia acabar com a minha vida ao me casar cedo, que eu tinha que aproveitar antes”, diz Kevin. “Mas sempre pensei: o que posso aproveitar solteiro que não posso aproveitar casado? Tenho certeza de que ela é a pessoa certa, por que não casar?”. Para ela, o que contou como momento decisivo, além do exemplo dos próprios pais, foi o preparo emocional. “Tudo foi muito bem esclarecido, nada ficou nas entrelinhas. Quando nos casamos, sabíamos o que iríamos enfrentar.”

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