Prática de tomar remédios para dormir pode comprometer a capacidade de aprendizagem e se tornar um vício
Pesquisa indica que, no espaço, mais da metade dos astronautas adota estratégia. Solução pode ser perigosa para a saúde
A Nasa determina que os astronautas tenham pelo menos oito horas e meia de sono. Entretanto, a pesquisa liderada por Laura Barger, do Brigham and Women's Hospital (EUA), revelou que não é isso que acontece. O estudo investigou 101 astronautas que somaram mais de 4 mil noites de sono na Terra e 4,2 mil no espaço. De acordo com os resultados, membros da tripulação em voo espacial — que fazem viagens intermitentes — dormem em média 5,9 horas. Os que passam temporadas na Estação Espacial Internacional (ISS), seis horas. Apenas 12% dos episódios de sono nas missões intermitentes e 24% na ISS duraram sete horas ou mais. Em casa, por outro lado, o primeiro e o segundo grupos registraram, respectivamente, 42% e 50% de noites com no mínimo sete horas de descanso.
Barger também constatou o uso generalizado de medicamentos para dormir, em especial os produzidos a partir das substâncias zolpidem e zaleplon. Três a cada quatro membros da tripulação da ISS e 78% dos astronautas em missão intermitente, em algum momento, lançaram mão desse recurso. De forma geral, as substâncias hipnóticas foram usadas em mais de metade (52%) das noites em missões espaciais. O uso rotineiro desses medicamentos é particularmente preocupante porque a FDA — uma espécie de Anvisa norte-americana — adverte que ingestão dessas pílulas impede o envolvimento em ocupações perigosas.
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Segundo Zanin, o zolpidem é menos agressivo ao corpo. Mesmo assim, estudos relatam que algumas pessoas podem ficar dependentes dele. “Não é tão comum, como ocorre com outros remédios, mas isso não significa que a pessoa conseguiria responder a um alerta após ter tomado uma substância para dormir. Os ratinhos, pelo menos, ficaram completamente sedados”, adverte. O Instituto Brasileiro do Sono estima que cerca de 51 milhões de brasileiros com mais de 18 anos têm dificuldades para dormir e pelo menos 1,5 milhão só dorme com auxílio de medicamentos.
Karina Zanin, pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo
Ligação com o suicídio
Um estudo publicado recentemente pelo Journal of American Medicine Association demonstra que adultos mais velhos que sofrem de distúrbios do sono são mais propensos a morrer por suicídio. O alerta serve principalmente para os profissionais de saúde, já que os distúrbios do sono, além de altamente tratáveis, são menos estigmatizantes do que outros fatores que indicam risco de tirar a própria vida.
Pesquisadores da Universidade de Stanford (EUA) estudaram 420 pessoas com idade média de 75 anos por 10 anos. Eles descobriram que aquelas que não tinham o sono “restaurador” — capaz de promover o descansando cerebral — tinham 1,4 vez mais chance de morte por suicídio. O mais curioso é que essas pessoas não sofriam de doenças psiquiátricas.
Thiago Blanco, psiquiatra do Hospital de Base do DF e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo, pondera que, embora esse risco aumentado seja pequeno, ele é significativo. “O que chama atenção é que não existiu associação com o humor”, diz o médico. Blanco ressalta a importância de diferenciar a ansiedade normal de distúrbios do sono que se sinalizam mais sérios, como a depressão e a esquizofrenia.
“A ansiedade é um processo normal de reações orgânicas. O problema é quando isso causa muitos prejuízos. Nos casos leves, técnicas de relaxamento e recursos não medicamentosos, como alimentos e chás, ajudam. Às vezes, produtos naturais também. Mas isso não quer dizer que dispensem cautela, pois também geram malefícios, dependendo da forma como são usados.” (IO)
“A insônia pura é mais difícil de diagnosticar. Geralmente, acontece em decorrência de alguma coisa, como depressão, transtorno de ansiedade e até menopausa. As mulheres são as que mais sofrem com ela. A vida que a gente leva, com certeza, influencia nesse problema. As pessoas têm mais acesso à informação, dormem tarde, são agitadas e ainda deitam vendo televisão ou mexendo no celular. O organismo não entende que é hora de dormir. É preciso tentar outras alternativas antes do remédio, como a higiene do sono, que basicamente é preparar-se para o descanso. Por mais seguros que sejam, medicamentos como o zolpidem também podem gerar vícios. É raro, mas acontece.”
Karina Zanin, biomédica pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)