Pesquisa mostra que pets são como filhos de estimação para muitas mulheres

Estudo norte-americano indica que o cérebro de mulheres é ativado de forma semelhante diante de fotografias de suas crianças e de seus cães

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Paloma Oliveto - Correio Brazilienze Publicação:05/11/2014 10:29Atualização:05/11/2014 10:37
Interagir com pets pode ser benéfico para o bem-estar físico, social e emocional dos humanos (Valdo Virgo/CB/D.A Press)
Interagir com pets pode ser benéfico para o bem-estar físico, social e emocional dos humanos
Eles já não são mais simples donos de cachorros. Hoje, muitos proprietários de animais de estimação preferem chamar seus xodós de “filhos”. E não é só uma questão semântica: os pets ganham guarda-roupa próprio, dormem na cama dos “pais”, ganham presente no Dia das Crianças — enfim, ocupam um espaço privilegiado na família. Curiosa com essa relação construída com os bichos domésticos, uma equipe de pesquisadores do Hospital Geral de Massachussetts, nos Estados Unidos, decidiu investigar se, além do coração, o cérebro reconhece os cachorros como filhos de verdade.

“Os animais domésticos ocupam um lugar especial no coração e nas vidas de muitas pessoas, e há evidências convincentes de estudos clínicos e laboratoriais de que interagir com pets pode ser benéfico para o bem-estar físico, social e emocional dos humanos”, defende Lori Palley, pesquisadora do Centro de Medicina Comparativa do hospital e coautora do estudo. Ela lembra que a domesticação dos cães começou entre 18 mil e 32 mil anos atrás, e que a prática de dispensar cuidados paternais a eles é um comportamento comum em diferentes culturas, que provavelmente emergiu da necessidade evolutiva de tê-los como companheiros fiéis.

De acordo com Palley, aproximadamente dois terços dos lares americanos têm animais de estimação, e mais de US$ 50 bilhões são gastos anualmente com eles. No Brasil, há um cachorro para cada seis habitantes, e dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística indicam que, nos últimos quatro anos, aumentou 17,6% a população de cães e gatos domésticos no país. “Na mídia, os proprietários já são chamados de ‘pais de pets’ e metade deles considera que seus animais são tão parte da família quanto qualquer outro integrante da casa”, afirma Palley, citando uma pesquisa de 2009.

A médica revela que muitos estudos anteriores constataram que níveis de neuro-hormônios, como a oxitocina, envolvidos no processo de ligação emotiva e vínculo materno, aumentam depois da interação com os pets. “Novas tecnologias de imagem estão nos ajudando a começar a entender as bases neurobiológicas dessa relação, o que é bastante animador”, afirma.

Coincidências

Para comparar os padrões de atividade cerebral envolvidos na relação humanos-pet e aqueles suscitados pela interação mãe-filho, o estudo recrutou um grupo de mulheres com pelo menos um filho de 2 a 10 anos e um cachorro que havia entrado para a família mais de dois anos antes do estudo. A pesquisa foi dividida em duas sessões. Na primeira, as participantes receberam os cientistas em casa e completaram diversos questionários, incluindo perguntas sobre sua relação tanto com os filhos quanto com os cães. Os pets e as crianças foram fotografados na casa das voluntárias.

''O Hulk é um filho para nós, superprotegido e muito amado. Ele, com toda certeza, é um membro da minha família'' - Ana Paula Breder (Arquivo Pessoal)
''O Hulk é um filho para nós, superprotegido e muito amado. Ele, com toda certeza, é um membro da minha família'' - Ana Paula Breder
Na segunda fase, as participantes foram até o Centro de Imagens Biomédicas do Hospital Geral de Massachussetts, onde se submeteram ao exame de ressonância magnética funcional. Esse teste não invasivo indica os níveis de ativação de determinadas estruturas cerebrais, detectando alterações no fluxo sanguíneo e nas taxas de oxigenação. Os cientistas mostraram uma sequência de fotografias enquanto as mulheres faziam o exame. As imagens incluíam os filhos das voluntárias e seus cachorros, alternados com retratos de crianças desconhecidas e cães pertencentes a outras pessoas. No fim, cada participante completou algumas tarefas, incluindo um teste de reconhecimento de imagem, para confirmar se ela havia prestado atenção às fotos apresentadas durante o escaneamento. As mulheres também deram notas para diversas imagens mostradas durante a sessão em relação ao nível de prazer que essas fotos haviam despertado.

Os resultados revelaram semelhanças e diferenças na forma como importantes regiões cerebrais reagem à imagem de um filho e de um cão. Áreas previamente associadas a funções como emoção, recompensa, afiliação, processamento visual e interação social tiveram aumento de atividade quando as participantes viram tanto as crianças quanto seus pets. Porém, uma região implicada na formação do vínculo mãe-filho se ativou apenas em resposta à imagem da criança. Já o giro fusiforme, envolvido no reconhecimento facial e em outras funções de processamento visual, teve uma resposta mais expressiva quando as mulheres viam a foto de seus cachorros.

''Todo dia, ouço alguma crítica: 'Deixa de ser boba, é só um cachorro, não é gente'. Eu falo: 'Para mim, é um filho peludo de quatro patas'' - Erika Mercier, sobre o west terrier Drake  (Arquivo Pessoal)
''Todo dia, ouço alguma crítica: 'Deixa de ser boba, é só um cachorro, não é gente'. Eu falo: 'Para mim, é um filho peludo de quatro patas'' - Erika Mercier, sobre o west terrier Drake
“Embora seja um pequeno estudo que pode não se aplicar a outras pessoas, o resultado sugere que há um circuito cerebral comum importante para a criação e a manutenção de ligação emocional, ativado quando as mães veem imagens tanto de suas crianças quanto de seus cachorros”, conta o psiquiatra Luke Stoeckel, coautor do trabalho. Os pesquisadores observam que mais estudos são necessários para replicar a descoberta, principalmente aumentando a amostra e incluindo outras populações, como mulheres sem filhos e homens. “Combinar estudos de ressonância com testes adicionais de comportamento e psicologia também nos ajudará a obter evidências que suportem o que observamos”, acredita Lori Palley.

Amor incondicional
Na casa da comerciante Ana Paula Breder, 29 anos, o pug Hulk, 8 meses, é o caçulinha da família. O cão foi presente do marido de Ana, que estava muito triste com a perda de Yuri, um yorkshire que morreu de leishmaniose no início do ano. “Eu estava muito triste e só chorando. Foi muito difícil, pois não queria mais um cãozinho, até que esse gordinho ganhou meu coração e o dos meus filhos”, conta. Bagunceiro e sempre aprontando, Hulk faz a alegria das crianças da casa, Matheus, 5 anos, e João Lucas, 1. “O Hulk é um filho para nós, superprotegido e muito amado. Ele, com toda certeza, é um membro da minha família”, diz Ana Paula.

Para a estudante de fisioterapia Erika Mercier, 41 anos, o west terrier Drake, 9, é como um filho. Tanto que ela não considera sacrificante fazer coisas como passar o réveillon debaixo da cama com o cãozinho, que tem medo de fogos, deixar de ir a algumas festas para ficar com ele, oferecer água filtrada e frutas cortadas… “Todo dia, ouço alguma crítica: ‘Deixa de ser boba, é só um cachorro, não é gente’. Eu falo: ‘Para mim, é um filho peludo de quatro patas’”, conta.

A comerciante Ana Paula também sofre críticas pelo fato de o pug Hulk conviver diretamente com os “irmãos”, principalmente com o bebê. “Dizem que ele vai passar doenças, mas nem ligo, pois meus filhos o amam e são correspondidos. Ele tem acesso total aos meus filhos: eles brincam, dormem e fazem tudo juntos. Com toda certeza, o Hulk está no meu coração. Ele trouxe a luz e a alegria que faltavam. Nós não saberíamos viver sem ele hoje. É um amor incondicional ao gordinho”, derrete-se a “mãe” coruja, que até uma conta no Instagram fez para o pug.

“Para famílias com filhos pequenos, os pets podem ser parte de um sistema de suporte social e fornecer oportunidades para educar as crianças”, observa a veterinária Lynette A. Hart, pesquisadora da Universidade da Califórnia em Davis e autora de diversos livros sobre a relação entre humanos e animais domésticos. Depois de mais de quatro décadas de investigações nessa área, ela constatou que, ao contrário do que dizem os estereótipos, pessoas sozinhas e solitárias não são as que mais adotam os pets nem as que relatam maior vínculo afetivo com os bichos. “Pode parecer paradoxal, mas isso é mais comum em famílias com filhos. Há uma forte relação entre ter animais com a coesão, o vínculo emocional e o respeito mútuo familiares. Ter uma relação próxima com seu pet pode ser um indicador da saúde das relações da família”, afirma.

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