Contato com o ar poluído pode levar à obesidade e ao diabetes, diz estudo
O efeito foi detectado em testes com ratos e não sofreu interferência de dietas
Paloma Oliveto - Correio Brazilienze
Publicação:09/03/2016 15:00
Nem sempre a culpa da obesidade está dentro do prato. Essa epidemia — que afeta 13% dos adultos com mais de 18 anos e, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), vem crescendo de forma alarmante entre as crianças — pode estar ligada a outro mal do século: a poluição. Um estudo recente conduzido por pesquisadores da China detectou forte associação entre a exposição a partículas poluentes e o risco de aumento de peso.
Nos testes, os cientistas expuseram grupos de camundongos fêmeas e gestantes a dois tipos de ambiente: em um deles, o ar circulante era o mesmo respirado nas ruas de Pequim, a 10ª cidade mais poluída do mundo, segundo a OMS; no outro, filtros absorviam as partículas poluentes. Para ter certeza da influência dos agentes tóxicos sobre a obesidade, os animais receberam rigorosamente o mesmo tipo de alimentação.
Não foi preciso esperar muito para observar os efeitos da poluição sobre o peso dos animais. Em 19 dias, além de mais pesadas, as fêmeas expostas ao ar de Pequim apresentavam taxas de colesterol e triglicérides mais altas que a do grupo de controle. Além disso, os exames de resistência à insulina, um precursor de diabetes, estavam elevados.
As crias das cobaias também sofreram os efeitos da poluição sobre o metabolismo. Com três semanas de vida, pesavam um pouco mais que as outras. Contudo, aos 2 meses de idade, apresentavam sobrepeso, mesmo comendo ração idêntica. “Esse é um claro sinal do efeito duradouro da poluição sobre as partículas ambientais”, observa Zhang, principal autor do estudo, que foi publicado no Faseb, o jornal da Federação das Sociedades Americanas de Biologia Experimental.
O biólogo explica que, ao analisar tecidos e órgãos internos das cobaias, observou-se um aumento de inflamações, processo que está associado a diversas doenças, da obesidade ao câncer. O organismo dos animais expostos à poluição também apresentava mais estresse oxidativo sistêmico, acúmulo de gordura nos vasos sanguíneos e lesões nos pulmões e brônquios. “As partículas poluentes que estão na atmosfera desencadearam mudanças no metabolismo, elevando os depósitos de gordura e desregulando o funcionamento do sistema endócrino do corpo como um todo, mesmo sob um regime alimentar balanceado. Isso é muito preocupante, porque estamos enfrentando uma grave crise de sobrepeso e obesidade no mundo ao mesmo tempo que nossas cidades estão extremamente poluídas”, diz o cientista.
Poluentes comuns
Andrew G.Rundle, professor de epidemiologia da Faculdade de Saúde Publica Mailman de Colúmbia, afirma que, devido às emissões de fumaça e gases tóxicos de fábricas, carros e outras atividades urbanas, o ar está repleto do que chama de obesógenos, produtos químicos capazes de alterar o sistema endócrino de homens e animais. O pesquisador, que não está envolvido no trabalho publicado no Faseb, diz que nem todos são conhecidos, mas alguns, como os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs), um poluente bastante comum, sabidamente provocam esses distúrbios.
Rundle conduziu um estudo nos Estados Unidos com gestantes de Nova York expostas a altas concentrações de químicos como os HPAs na atmosfera. Constatou que, comparadas a mulheres que viviam em ambientes menos contaminados, elas tinham duas vezes mais risco de dar à luz crianças que, aos 7 anos, já estavam obesas. Os HPAs são produto da queima de carvão, da emissão de diesel e gasolina e de outras substâncias orgânicas, como o tabaco. “A obesidade é uma doença complexa, com múltiplos fatores de risco. Não é só o resultado de escolhas individuais como dieta e exercício”, afirma.
O cientista lembra que, no caso das pessoas sem recursos para comprar alimentos saudáveis ou sem tempo de se exercitar, a exposição pré-natal a poluentes agrava ainda mais o problema. Na pesquisa que fez em Nova York, 702 gestantes não fumantes foram recrutadas no Hospital Presbiteriano e no Hospital do Harlem. As mulheres tinham entre 18 e 35 anos, se autodeclaravam negras ou dominicanas e viviam em regiões como o norte de Manhattan ou o sul do Bronx, onde predominam famílias de baixa renda.
No terceiro trimestre de gestação, ao longo de dois dias, elas usaram um dispositivo que recolhia amostras do ar. À noite, o equipamento foi colocado ao lado da cama. Aos 5 anos, os filhos das mulheres que estiveram mais expostas a níveis altos de PAHs durante a gravidez tiveram 1,79 mais probabilidade de estarem obesos. Aos 7 anos, o risco era 2,26 vezes maior. Segundo Rundle, eles não estavam apenas com maior índice de massa corporal (IMC), que também considera o peso dos ossos e músculos, mas eram mais pesados devido ao percentual de gordura elevado.
Em nota, Robin Whyatt, também pesquisador de Columbia que participou do estudo, afirmou que os resultados vão ao encontro dos experimentos realizados com animais, evidenciando uma forte associação entre poluição atmosférica e obesidade. Whyatt esclareceu que o grupo vai começar a procurar outros possíveis obesógenos no ar e investigar meios de reduzir o risco associado a eles.
Epidemia afeta 13% dos adultos com mais de 18 anos
Saiba mais...
Os autores do trabalho alertam que, como o ar das cidades está cada vez mais contaminado, pode-se esperar um cenário ainda mais grave que o projetado pela OMS, que prevê 2,2 milhões de adultos com sobrepeso e mais de 700 milhões de obesos em 2015. Embora o estudo tenha sido feito com animais de laboratório, Junfeng Zhang, professor de saúde ambiental da Universidade de Duke que realizou o trabalho em Pequim, acredita que os resultados possam ser estendidos a humanos.- Pesquisa comprova que obesidade passa pelo sêmen do pai a filhos e filhas
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Nos testes, os cientistas expuseram grupos de camundongos fêmeas e gestantes a dois tipos de ambiente: em um deles, o ar circulante era o mesmo respirado nas ruas de Pequim, a 10ª cidade mais poluída do mundo, segundo a OMS; no outro, filtros absorviam as partículas poluentes. Para ter certeza da influência dos agentes tóxicos sobre a obesidade, os animais receberam rigorosamente o mesmo tipo de alimentação.
Não foi preciso esperar muito para observar os efeitos da poluição sobre o peso dos animais. Em 19 dias, além de mais pesadas, as fêmeas expostas ao ar de Pequim apresentavam taxas de colesterol e triglicérides mais altas que a do grupo de controle. Além disso, os exames de resistência à insulina, um precursor de diabetes, estavam elevados.
As crias das cobaias também sofreram os efeitos da poluição sobre o metabolismo. Com três semanas de vida, pesavam um pouco mais que as outras. Contudo, aos 2 meses de idade, apresentavam sobrepeso, mesmo comendo ração idêntica. “Esse é um claro sinal do efeito duradouro da poluição sobre as partículas ambientais”, observa Zhang, principal autor do estudo, que foi publicado no Faseb, o jornal da Federação das Sociedades Americanas de Biologia Experimental.
O biólogo explica que, ao analisar tecidos e órgãos internos das cobaias, observou-se um aumento de inflamações, processo que está associado a diversas doenças, da obesidade ao câncer. O organismo dos animais expostos à poluição também apresentava mais estresse oxidativo sistêmico, acúmulo de gordura nos vasos sanguíneos e lesões nos pulmões e brônquios. “As partículas poluentes que estão na atmosfera desencadearam mudanças no metabolismo, elevando os depósitos de gordura e desregulando o funcionamento do sistema endócrino do corpo como um todo, mesmo sob um regime alimentar balanceado. Isso é muito preocupante, porque estamos enfrentando uma grave crise de sobrepeso e obesidade no mundo ao mesmo tempo que nossas cidades estão extremamente poluídas”, diz o cientista.
Poluentes comuns
Andrew G.Rundle, professor de epidemiologia da Faculdade de Saúde Publica Mailman de Colúmbia, afirma que, devido às emissões de fumaça e gases tóxicos de fábricas, carros e outras atividades urbanas, o ar está repleto do que chama de obesógenos, produtos químicos capazes de alterar o sistema endócrino de homens e animais. O pesquisador, que não está envolvido no trabalho publicado no Faseb, diz que nem todos são conhecidos, mas alguns, como os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAPs), um poluente bastante comum, sabidamente provocam esses distúrbios.
Rundle conduziu um estudo nos Estados Unidos com gestantes de Nova York expostas a altas concentrações de químicos como os HPAs na atmosfera. Constatou que, comparadas a mulheres que viviam em ambientes menos contaminados, elas tinham duas vezes mais risco de dar à luz crianças que, aos 7 anos, já estavam obesas. Os HPAs são produto da queima de carvão, da emissão de diesel e gasolina e de outras substâncias orgânicas, como o tabaco. “A obesidade é uma doença complexa, com múltiplos fatores de risco. Não é só o resultado de escolhas individuais como dieta e exercício”, afirma.
O cientista lembra que, no caso das pessoas sem recursos para comprar alimentos saudáveis ou sem tempo de se exercitar, a exposição pré-natal a poluentes agrava ainda mais o problema. Na pesquisa que fez em Nova York, 702 gestantes não fumantes foram recrutadas no Hospital Presbiteriano e no Hospital do Harlem. As mulheres tinham entre 18 e 35 anos, se autodeclaravam negras ou dominicanas e viviam em regiões como o norte de Manhattan ou o sul do Bronx, onde predominam famílias de baixa renda.
No terceiro trimestre de gestação, ao longo de dois dias, elas usaram um dispositivo que recolhia amostras do ar. À noite, o equipamento foi colocado ao lado da cama. Aos 5 anos, os filhos das mulheres que estiveram mais expostas a níveis altos de PAHs durante a gravidez tiveram 1,79 mais probabilidade de estarem obesos. Aos 7 anos, o risco era 2,26 vezes maior. Segundo Rundle, eles não estavam apenas com maior índice de massa corporal (IMC), que também considera o peso dos ossos e músculos, mas eram mais pesados devido ao percentual de gordura elevado.
Em nota, Robin Whyatt, também pesquisador de Columbia que participou do estudo, afirmou que os resultados vão ao encontro dos experimentos realizados com animais, evidenciando uma forte associação entre poluição atmosférica e obesidade. Whyatt esclareceu que o grupo vai começar a procurar outros possíveis obesógenos no ar e investigar meios de reduzir o risco associado a eles.