Dificuldade para pegar no sono na infância pode ter explicação biológica ou emocional
Especialistas dão dicas de como identificar a causa e encontrar a solução
Ailim Cabral - Revista do CB
Publicação:18/03/2016 14:00Atualização: 18/03/2016 15:12
Chegou a hora de dormir, e o sono ainda não apareceu. Crianças também são vítimas da insônia, que pode ter efeitos tão, ou mais sérios, do que os observados no adultos. No caso dos pequenos, as causas podem variar e ter origens biológicas, mas, na maior parte dos casos, segundo o neuropediatra do Hospital Santa Lúcia e presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria do DF, Christian Muller, o problema é consequência de fatores comportamentais.
Para as disfunções biológicas, tratamentos, medicamentos e até mesmo cirurgias podem apresentar a solução. O diagnóstico é fechado e geralmente já é apresentado com a solução. No entanto, na insônia infantil comportamental, a “cura” nem sempre é tão imediata ou simples.
De acordo com Christian, o local onde a criança dorme — se no próprio quarto ou na cama dos pais —, a iluminação do ambiente, as atividades noturnas e a rotina familiar no momento de ir para a cama são os primeiros aspectos a serem analisados quando a dificuldade para dormir não apresenta uma causa orgânica. “Chamamos esse conjunto de fatores de higiene do sono e ela é fundamental para que a criança durma bem”, explica.
Considerando esse conceito, a terapeuta e professora de psicologia da Universidade Católica de Brasília, Letícia Faria, também ressalta a importância do ritual para dormir. “Muitas vezes, é uma rotina que não favorece o sono. A criança se acostuma e passa a postergar o momento de dormir”, afirma. A especialista acrescenta que os pais devem observar se a insônia começou após ou durante algum evento significativo na vida da criança — como mudança de escola, de casa, alterações na rotina familiar, separação dos pais, por exemplo —, que podem ser fatores de estresse ou ansiedade.
Entre os hábitos que podem dificultar o adormecer das crianças estão o uso de dispositivos eletrônicos após as 19h e as brincadeiras agitadas, que exigem movimentação intensa da criança. “Os dispositivos, como celulares e tablets, por exemplo, interferem na liberação de melatonina, substância que gera o sono”, afirma Christian.
Os especialistas chamam a atenção ainda para duas maneiras nas quais a insônia se apresenta. Existem as crianças que demoram a adormecer. Há ainda aquelas que adormecem, mas não têm um sono de qualidade e acordam cansadas. “É o sono superficial, que não é repousante”, completa o neuropediatra.
A pequena Evelin Sofia dos Santos Silva, 6 anos, sofria duplamente. Além de demorar a dormir, acordava de hora em hora. O problema começou aos 2 anos e os pais de Evelin, a empresária Nayara Jasmyriam Santos Veiga, 3 anos, e o policial militar Igor Araújo da Silva, 34, passaram por seis especialistas até receberem o diagnóstico de insônia comportamental. Com a dificuldade em cair no sono, vinham a irritabilidade e o estresse da menina. Evelin roía as unhas e chorava muito durante o dia e a noite, sintomas comuns na insônia infantil, bem como queda no rendimento escolar, diminuição na imunidade, dores de cabeça, desatenção e diminuição da liberação dos hormônios do crescimento.
Como consequência de noites maldormidas, toda a família apresentava sinais de cansaço. “Refletia muito na gente e precisei fazer acompanhamento médico também. Cheguei a ter enxaqueca por 33 dias seguidos”, lembra Nayara. No caso de Evelin, que em geral tinha uma higiene do sono positiva, o tratamento incluiu medicamentos e o uso de colchão magnético infravermelho. “Tínhamos uma rotina bem tranquila para o horário de dormir, não ligávamos a TV, dávamos banho nela para acalmá-la.”, conta Nayara. “Além disso, o médico alertou que não era saudável dormir com ela. Ficava com ela até pegar no sono e depois ia para meu quarto”, conta Nayara.
O pediatra Christian explica que o hábito é prejudicial e pode ser um dos fatores causadores da insônia. “A criança se acostuma a adormecer ao lado da mãe ou do pai. Quando acorda no meio da noite, não consegue voltar a dormir sozinha, pois não tem esse costume”, completa. Foram cerca de três anos de tratamento com o colchão, natação durante o dia, acompanhamento psicológico e medicamentos para dormir. Hoje, Evelin tem um sono mais saudável, ainda que leve tempo para adormecer.
Pesquisas comprovam
A importância da higiene do sono ou da rotina pré-sono foi comprovada em um estudo realizado pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). A psicóloga Renatha El Rafihi Ferreira propôs uma intervenção comportamental com aconselhamento parental para avaliar os efeitos dos comportamentos e hábitos noturnos da família no sono da criança.
O estudo selecionou 62 crianças entre 1 e 5 anos, todas elas com dificuldade para adormecer. Antes do estudo, foram descartadas causas biológicas para a insônia. O grupo foi dividido em dois, o grupo controle e as crianças testadas. Os testes consistiam em estimular a rotina pré-sono da criança com atividades calmas e tranquilas, 30 minutos antes da hora de dormir. A intervenção incluía também a proibição de alimentos com cafeína no período noturno. Os pais foram orientados a levar a criança para a cama e se afastar, permitindo que eles dormissem sozinhos.
O resultado foi avaliado por meio de pulseiras de actigrafia, aparelhos que calculam a atividade noturna. Os resultados mostraram que as crianças que passaram pelos testes apresentaram melhora no sono, dormindo mais rápido e acordando menos vezes durante a noite.
Fonte: Site do Instituto de Psicologia da USP
O que evitar na hora de dormir:
Entre os hábitos que podem dificultar o adormecer das crianças estão o uso de dispositivos eletrônicos após as 19h e as brincadeiras agitadas, que exigem movimentação intensa da crianças
Saiba mais...
Nos casos justificados organicamente, a insônia infantil pode ser reflexo de quadros obstrutivos, como a adenoide, por exemplo. Segundo Christian, a criança não consegue respirar direito, tem dificuldades para dormir e manter o sono durante a noite. O mesmo acontece quando ela apresenta sintomas alérgicos, como a rinite. Existem também as alterações neurológicas benignas, que são mais raras, como os casos de sonambulismo e de pesadelos crônicos, por exemplo.Para as disfunções biológicas, tratamentos, medicamentos e até mesmo cirurgias podem apresentar a solução. O diagnóstico é fechado e geralmente já é apresentado com a solução. No entanto, na insônia infantil comportamental, a “cura” nem sempre é tão imediata ou simples.
De acordo com Christian, o local onde a criança dorme — se no próprio quarto ou na cama dos pais —, a iluminação do ambiente, as atividades noturnas e a rotina familiar no momento de ir para a cama são os primeiros aspectos a serem analisados quando a dificuldade para dormir não apresenta uma causa orgânica. “Chamamos esse conjunto de fatores de higiene do sono e ela é fundamental para que a criança durma bem”, explica.
Considerando esse conceito, a terapeuta e professora de psicologia da Universidade Católica de Brasília, Letícia Faria, também ressalta a importância do ritual para dormir. “Muitas vezes, é uma rotina que não favorece o sono. A criança se acostuma e passa a postergar o momento de dormir”, afirma. A especialista acrescenta que os pais devem observar se a insônia começou após ou durante algum evento significativo na vida da criança — como mudança de escola, de casa, alterações na rotina familiar, separação dos pais, por exemplo —, que podem ser fatores de estresse ou ansiedade.
Entre os hábitos que podem dificultar o adormecer das crianças estão o uso de dispositivos eletrônicos após as 19h e as brincadeiras agitadas, que exigem movimentação intensa da criança. “Os dispositivos, como celulares e tablets, por exemplo, interferem na liberação de melatonina, substância que gera o sono”, afirma Christian.
Os especialistas chamam a atenção ainda para duas maneiras nas quais a insônia se apresenta. Existem as crianças que demoram a adormecer. Há ainda aquelas que adormecem, mas não têm um sono de qualidade e acordam cansadas. “É o sono superficial, que não é repousante”, completa o neuropediatra.
Evelin Sofia tinha problemas para dormir desde os 2 anos. A mãe, Nayara, sofria também as consequências
A pequena Evelin Sofia dos Santos Silva, 6 anos, sofria duplamente. Além de demorar a dormir, acordava de hora em hora. O problema começou aos 2 anos e os pais de Evelin, a empresária Nayara Jasmyriam Santos Veiga, 3 anos, e o policial militar Igor Araújo da Silva, 34, passaram por seis especialistas até receberem o diagnóstico de insônia comportamental. Com a dificuldade em cair no sono, vinham a irritabilidade e o estresse da menina. Evelin roía as unhas e chorava muito durante o dia e a noite, sintomas comuns na insônia infantil, bem como queda no rendimento escolar, diminuição na imunidade, dores de cabeça, desatenção e diminuição da liberação dos hormônios do crescimento.
Como consequência de noites maldormidas, toda a família apresentava sinais de cansaço. “Refletia muito na gente e precisei fazer acompanhamento médico também. Cheguei a ter enxaqueca por 33 dias seguidos”, lembra Nayara. No caso de Evelin, que em geral tinha uma higiene do sono positiva, o tratamento incluiu medicamentos e o uso de colchão magnético infravermelho. “Tínhamos uma rotina bem tranquila para o horário de dormir, não ligávamos a TV, dávamos banho nela para acalmá-la.”, conta Nayara. “Além disso, o médico alertou que não era saudável dormir com ela. Ficava com ela até pegar no sono e depois ia para meu quarto”, conta Nayara.
O pediatra Christian explica que o hábito é prejudicial e pode ser um dos fatores causadores da insônia. “A criança se acostuma a adormecer ao lado da mãe ou do pai. Quando acorda no meio da noite, não consegue voltar a dormir sozinha, pois não tem esse costume”, completa. Foram cerca de três anos de tratamento com o colchão, natação durante o dia, acompanhamento psicológico e medicamentos para dormir. Hoje, Evelin tem um sono mais saudável, ainda que leve tempo para adormecer.
Pesquisas comprovam
A importância da higiene do sono ou da rotina pré-sono foi comprovada em um estudo realizado pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). A psicóloga Renatha El Rafihi Ferreira propôs uma intervenção comportamental com aconselhamento parental para avaliar os efeitos dos comportamentos e hábitos noturnos da família no sono da criança.
O estudo selecionou 62 crianças entre 1 e 5 anos, todas elas com dificuldade para adormecer. Antes do estudo, foram descartadas causas biológicas para a insônia. O grupo foi dividido em dois, o grupo controle e as crianças testadas. Os testes consistiam em estimular a rotina pré-sono da criança com atividades calmas e tranquilas, 30 minutos antes da hora de dormir. A intervenção incluía também a proibição de alimentos com cafeína no período noturno. Os pais foram orientados a levar a criança para a cama e se afastar, permitindo que eles dormissem sozinhos.
O resultado foi avaliado por meio de pulseiras de actigrafia, aparelhos que calculam a atividade noturna. Os resultados mostraram que as crianças que passaram pelos testes apresentaram melhora no sono, dormindo mais rápido e acordando menos vezes durante a noite.
Fonte: Site do Instituto de Psicologia da USP
O que evitar na hora de dormir:
- Uso de dispositivos eletrônicos;
- Atividade física intensa;
- Brincadeiras agitadas;
- Alimentos com cafeína.
Como se preparar:
- Ter rotina estabelecida;
- A criança deve se habituar a dormir sozinha e no próprio quarto;
- O quarto deve estar escuro e a televisão, desligada;
- Os pais devem aproveitar o momento para ler para os filhos, ter conversas tranquilas e para fazer orações, a depender da orientação religiosa da família;
- A família deve evitar discussões e assuntos conflituosos no período noturno.
- Apesar de a insônia comportamental ser mais comum em crianças, é sempre recomendado procurar o médico. Se necessário, o pediatra fará o encaminhamento para neuropediatras e pneumopediatras.