Contracepção: ciência está perto de colocar no mercado a pílula do homem

Composto desenvolvido por pesquisadores americanos cessa a produção de espermatozoides em ratos, abrindo caminho para um anticoncepcional masculino

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Vilhena Soares - Correio Braziliense Publicação:24/03/2016 15:00Atualização:24/03/2016 14:44
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Um dos maiores desafios para a indústria farmacêutica é o anticoncepcional masculino, há anos buscado sem sucesso por diferentes grupos de pesquisa. Durante a 251ª Reunião da Sociedade Americana de Química, que ocorre em San Diego, na Califórnia, especialistas afirmaram que nunca se esteve tão perto de uma pílula do homem. Segundo eles, uma nova molécula cessou a produção de espermatozoides em ratos de maneira mais durável e com menos efeitos colaterais que qualquer outro método já testado. Embora o estudo ainda deva passar por muitas fases, o feito foi celebrado pelos autores do trabalho.

A dificuldade de criar um anticoncepcional para homens se deve aos muitos critérios que devem ser contemplados. Além de seguro, o produto deve ser ingerido de forma fácil, não provocar efeitos adversos e ser reversível, ou seja, o paciente deve recobrar a fertilidade depois que interromper o uso. A indústria, contudo, não desiste da empreitada por considerar que uma pílula desse tipo é uma demanda de muitos casais, especialmente aqueles nos quais as mulheres não podem usar contraceptivos.

Até hoje, diferentes compostos foram experimentados para esse fim, incluindo a testosterona. “Em certas doses, ela causa infertilidade. Mas não funciona para até 20% dos homens e pode causar efeitos colaterais, incluindo ganho de peso e uma diminuição do colesterol”, conta, em um comunicado à imprensa, Jillian Kyzer, coautora do trabalho e pesquisadora da Universidade de Minnesota.

Continuidade

O novo estudo se baseou em um anterior realizado pela empresa americana Bristol-Myers Squibb, que revelou uma molécula que afetava o receptor do ácido retinoico — substância necessária para a produção dos espermatozoides — dos testículos. Embora parecesse promissor, o projeto falhou quando os testes mostraram que a droga afetava receptores de ácido retinoico em outras partes do corpo, provocando efeitos indesejáveis.

Liderada por Gunda Georg, a equipe de Minnesota continuou investigando essa abordagem até chegar a um composto chamado BMS-189532. “Fomos capazes de melhorar a solubilidade do composto e criar um derivado mais estável”, disse Georg ao Correio. Após injetar a droga nos testículos de ratos, os pesquisadores observaram um efeito mais durador e com menos danos colaterais.

Georg reconhece que ainda não atingiu a meta perseguida, mas garante que o feito coloca seu grupo no caminho certo. “É nosso objetivo desenvolver compostos eficazes que não tenham efeitos colaterais. Nós ainda não conseguimos, mas nossa pesquisa atual deve ajudar no desenvolvimento de um composto eficaz”, afirmou. Outro problema é que a ingestão oral por parte dos animais não gerou o mesmo resultado, algo a ser alterado. “Ninguém quer se injetar com uma agulha, uma vez por dia ou uma vez por semana, durante grande parte da vida”, destacou a cientista.

Ajustes necessários

Eduardo Bertero, chefe do Departamento de Andrologia da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) considera o estudo interessante, mas lembra que fatores como o uso oral e a durabilidade são de extrema importância. “Essa nova molécula mostrou uma boa atividade contra a formação dos espermatozoides, mas não teve sucesso no uso oral. Isso pode ter ocorrido porque o BMS-189532 não conseguiu se manter na corrente sanguínea por muito tempo, e o fígado pode tê-la processado muito rápido. Esse obstáculo pode ser alterado, quem sabe acrescentando outra molécula ao medicamento, que impeça isso”, avaliou o especialista.

Para Diogo Mendes, urologista do Hospital Santa Luzia em Brasília, mais pesquisas serão necessárias para que a molécula vire um medicamento disponível nas farmácias. “Todo anticoncepcional precisa ser reversível, essa é uma das características que esse estudo precisa analisar. O efeito dessa droga também precisa ser visto em mais animais, o que permitirá um ajuste de problemas, como os efeitos colaterais”, disse.

Mendes, contudo, acredita que a pílula do homem se tornará realidade. “Temos muita pesquisa e um grande investimento sendo feito, já que quem tiver a patente desse remédio por 20 anos, provavelmente, vai ter um grande retorno. Existem grandes possibilidades futuras, mas precisar quanto tempo será necessário é difícil”, destaca.

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