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Bebês turbinados

Nos primeiros meses, eles já estão matriculados nas academias. Fazem exercícios, têm aulas de psicomotricidade e até aprendem a engatinhar. Estimular o desenvolvimento dos pequenos é saudável, mas etapas não devem ser queimadas

Sibele Negromonte - Publicação:09/01/2013 16:26Atualização:09/01/2013 18:41

Aos 5 meses, Gabriel frequenta academia uma vez por semana: aula com músicas, brinquedos e objetos do cotidiano (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press
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Aos 5 meses, Gabriel frequenta academia uma vez por semana: aula com músicas, brinquedos e objetos do cotidiano
 

Gabriel tem apenas 5 meses, mas já pode ser considerado um veterano quando o assunto é malhação. Uma vez por semana, ele vai a uma academia especializada em bebês para se exercitar. Lá, com a ajuda da mãe e de uma professora de educação física, participa atentamente de uma aula pra lá de lúdica.

Com músicas, brinquedos, objetos do seu cotidiano, aparelhos específicos e, claro, muito carinho, ele é estimulado a desenvolver mente e corpo de forma saudável. E integrada: o emocional, o físico e o cognitivo. Gabriel é novo demais para isso? Na turminha dele, há alunos que começaram os estímulos ainda mais cedo, apenas seis semanas depois do nascimento.

Janaina, com o filho Martinho: até o sono melhorou depois 
do início das aulas (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press
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Janaina, com o filho Martinho: até o sono
melhorou depois do início das aulas
“Os primeiros cinco anos de vida, e especialmente o primeiro, são fundamentais para as conexões neurais se desenvolverem. Se a criança não for bem estimulada nessa fase, pode apresentar problemas de fala, equilíbrio, coordenação motora e até no processo de aprendizado da leitura”, explica a psicóloga Mariana Salim.

Há pouco mais de três meses, ela abriu em Brasília a primeira franquia na América do Sul da rede australiana KindyRoo, espécie de academia voltada para bebês e crianças de até 5 anos. Mariana morou 12 anos na Austrália, onde teve a primeira filha. “Não sabia ao certo como agir com um bebê, acabei procurando uma KindRoo – há mais de 100 espalhadas pelo país – e me encantei com o método”, explica.

“Muitas vezes, a mãe olha para o filho e não sabe o que fazer com ele. A maioria chega aqui querendo aprender simplesmente a brincar”, ressalta Leilah Gondim, a professora de educação física responsável por ministrar as aulas de psicomotricidade.

As atividades ocorrem em circuito, com aparelhos construídos especificamente para ajudar no desenvolvimento motor e cognitivo do bebê. Mas sem se esquecer, é claro, do lado lúdico. Brincadeiras de rua são resgatadas, músicas entoadas e o afeto entre mãe e filho é priorizado. “No fim das contas, o que fazemos nada mais é do que preparar o bebê para a idade escolar, garantir que ele chegue lá com todas as habilidades necessárias para o aprendizado”, completa Mariana Salim.

Ela justifica que alguns movimentos desenvolvidos ainda nessa primeira infância vão ajudar no futuro. Ao engatinhar, a visão que o bebê tem de um objeto à sua frente, exemplifica, é a mesma que ele terá da carteira para o quadro-negro. Já as batidas ritmadas de uma música serão úteis nas aulas de aritmética. “Não queremos queimar etapas, mas apenas dar a oportunidade à criança de crescer de forma saudável.”

A mãe de Gabriel, a servidora pública Zara Mundim Diniz, garante ter notado um grande avanço no desenvolvimento do filho desde que começou a frequentar as aulas, há dois meses. “Ele passou a prestar mais atenção nos objetos ao redor e fortaleceu o tônus muscular. Sem contar que dorme mais tranquilo depois que faz a aula”, diz Zara, que procura reproduzir em casa alguns dos exercícios. Ela ainda vê outra vantagem: a troca de experiência com outras mães.

A filha de Thaís, Marina, participa de um circuito de atividades: 
'Ela também ficou mais tranquila' (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
A filha de Thaís, Marina, participa de um
circuito de atividades: "Ela também ficou
mais tranquila"
Assim como Gabriel, os pequenos Martinho, de 6 meses, e Marina, de 5 meses, começaram a se exercitar desde cedo. Eles são companheiros de aula de psicomotricidade na Boobambu. Todas as quartas pela manhã se encontram para, com a ajuda das mães e da professora de educação física Silvia Lobato, subir rampas, escalar rolos, atravessar túneis e vencer tantos outros obstáculos.

Nessa turma, muitos bebês chegam sem sequer se sentar. Saem praticamente engatinhando. E avançam para a turma seguinte, dos bebês mais velhos, em que vão aprender a andar e correr. Tudo na companhia das mães. Só a partir dos 2 anos seguem um caminho mais independente.

Cada conquista de Martinho e Marina é comemorada de perto por suas mães, a bancária Janaína Veras e a professora Thaís Carolino, respectivamente. “Tento manter a mesma rotina em casa”, conta Janaína. Para ela, Martinho passou a dormir melhor depois dos estímulos. Thaís também ressalta que Marina ficou mais tranquila.

Pioneira em Brasília no estímulo de bebês, a Boobambu oferece atividades direcionadas até o sexto ano de vida. “Nosso objetivo é dar autonomia à criança e promover o seu desenvolvimento pleno”, justifica Silvia Lobato. Professora de educação física especializada em bebês, ela associou-se à irmã para abrir a academia e usou sua experiência para montar as atividades, que funcionam sempre de forma cíclica. “Os bebês precisam de repetição e estímulo. Por isso, cada objeto colocado nessa sala tem uma razão de estar aqui.”

Ana Sofia na aula de artes:  
'O convívio com outras crianças 
tem feito muito bem a ela', 
atesta a mãe, Adriana (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Ana Sofia na aula de artes:
"O convívio com outras crianças
tem feito muito bem a ela",
atesta a mãe, Adriana
Tudo é muito colorido, em tons sempre contrastantes, e a música está presente em todas as atividades. Assim, todos os sentidos são trabalhados. Para os mais novinhos, Silvia dá uma dica valiosa: colocar, sempre que possível, o bebê de bruços. Isso ajuda a fortalecer os músculos das costas e a firmar a cabeça. E é uma preparação para o engatinhar. “Se o bebê não se sentir muito confortável nessa posição, deite-se ao lado dele, brinque com ele, olhe nos seus olhos. O importante é insistir.”

Conforto é o que não falta para a pequena Ana Sofia, de 1 ano e 1 mês. Todas as semanas, ela participa de uma aula na qual o olfato, o paladar e, sobretudo, o tato são estimulados ao máximo. Nas turminhas de arte, o lema é se lambuzar com tinta, cola, papel... tudo comestível, claro, para não haver risco de intoxicação.

Desde os 7 meses, Ana Sofia participa dos estímulos direcionados e, para a mãe, a empresária Adriana Oliveira, o avanço é notável. E não só motor e cognitivo. “O convívio com outras crianças tem feito muito bem a ela. Antes, ela vivia grudada em mim. Aos poucos, ela vem ganhando mais segurança e independência.”

Ana Sofia frequenta ainda aulas de música, psicomotricidade e natação.Tudo isso faz parte do programa para bebês da academia Unique, que oferece atividades de segunda a sábado. As turmas são divididas de acordo com a faixa etária e, no caso das aulas de psicomotricidade para os bebês mais velhos, a partir de 1 ano e 3 meses, é incluída uma atividade de estímulo à inteligência.

Cartões com nomes e fotos de frutas, animais, meios de transportes e outros grupos de objetos do cotidiano dos pequenos são mostrados de maneira rápida e ritmada às crianças, sempre no início e no fim da aula. É o chamado Método Doman, que ajuda na memorização por meio da visualização. Alguns acreditam que o método, criado por Glenn Doman, é capaz de alfabetizar a criança desde os primeiros meses de vida. Um exagero? Estímulo demais para seres tão pequenos?

O professor de educação física com pós-graduação em desenvolvimento infantil Fernando Rodrigues, coordenador do programa de bebês da Unique, acredita que é preciso haver discernimento e saber dosar as atividades. “Devemos seguir o ritmo do bebê”, ensina.

Quanto aos resultados, Fernando é cauteloso, mas otimista. “Ainda não há uma geração de adultos que passou por todos esses estímulos, mas acredito muito no trabalho desenvolvido.” Com o programa, montado de acordo com a teoria de Piaget da construção do conhecimento, o bebê passa a ter noção de espaço, aprende a sentar, se arrastar, engatinhar, segundo Fernando. As aulas de música trabalham a audição, o ritmo; as de arte, o tato, o olfato, o paladar.

Outro importante fator para a estimulação das crianças é o contato físico. Rafaela, de 8 meses, estreou nas piscinas recentemente. Acompanhada da mãe, a empresária Amanda Climaco Biill, divertiu-se na primeira aula de natação. “Ela ficou tranquila na água. Tenho certeza que dormirá muito melhor”, aposta Amanda, que procurou a academia por conselho do pediatra. “É importante para o desenvolvimento e, principalmente, a socialização dela.”
Colocar o bebê de bruços fortalece a musculatura das costas: também ajuda a engatinhar
 (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press
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Colocar o bebê de bruços fortalece a musculatura das costas: também ajuda a engatinhar

O contato de mãe e filho também é um fator a ser considerado, acredita o professor de educação física Fernando Rodrigues. Tanto que, na Unique, eles baixaram uma regra em que só mãe, pai ou outro parente próximo podem entrar na piscina com o bebê. “Esse contato físico, esse afeto é fundamental para a criança”, justifica.

O pediatra Dioclécio Campos Júnior não só acredita no poder do afeto como vê nele a chave para o desenvolvimento infantil. “Toda criança tem direito ao colo”, defende. Para ele, o bebê deve ser estimulado desde a vida intrauterina. “A partir do sexto mês de gestação, o bebê está com o sistema auditivo formado. A voz da mãe já é um estímulo.” O aleitamento materno, ressalta o professor da Universidade de Brasília (UnB), também oferece toda a estimulação necessária nesses primeiros dias de vida. “O aconchego do lar e a família são essenciais nesse processo. A criança precisa de afeto para se desenvolver plenamente.”

Dioclécio explica que, principalmente até os 6 anos, o cérebro responde aos estímulos sensoriais como um todo: a audição e a fala, por meio de conversas, cantorias e leitura; a visão, com cores e luzes; o paladar e o olfato, com a amamentação; o tato, com o contato físico da mãe e do pai. Para o pediatra, os primeiros meses de vida são fundamentais para a formação do cérebro do indivíduo. “A capacidade de aprendizado nessa fase é enorme. Estudos apontam que o cérebro está duas vezes mais ativo do que no ensino fundamental, por exemplo.

Os estímulos são pré-requisitos para que a criança possa assimilar o processo de alfabetização de forma plena.” O pediatra defende que o mais importante nisso tudo é que a atmosfera ao redor do bebê seja de afeto. “E não é preciso academia para isso. Nada melhor do que o lar”.

Na companhia deles

Ao mesmo tempo que os bebês devem ser estimulados, as mães sentem a necessidade de voltar a ter uma vida social. O CineMaterna surgiu justamente para suprir essa necessidade. Criado há quatro anos em São Paulo, virou uma organização não governamental que promove sessões especiais dos filmes em cartaz nas grandes redes. Presente em Brasília desde abril de 2010, chega a reunir, por sessão, uma média de 40 bebês, com seus parentes.
Tatiana, com o pequeno Gael: 'Sentimos falta dessa vida social' (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Tatiana, com o pequeno Gael: "Sentimos falta dessa vida social"

Os filmes são para os adultos, mas as salas estão preparadas para receber os bebês: o som é mais baixo, o ar-condicionado, não muito gelado, e é mantido um pouco de iluminação. Sem falar que um trocador de fraldas e um tapete emborrachado são montados em frente à tela. Em Brasília, as sessões ocorrem todas as terças, às 14h, nos shoppings Iguatemi e Casa Park, alternadamente.

Para a servidora pública Tatiana Paiva, é uma ótima oportunidade para sair de casa – e sem precisar se separar do pequeno Gael, de 3 meses. “Nesses primeiros meses do bebê, a gente fica meio alheia a tudo, mas sentimos falta de uma vida social.”

Outra iniciativa para tirar as mães de casa sem que elas precisem se desgrudar dos bebês é o projeto Sambaby, criado no ano passado em Brasília. Regadas à boa música, as matinês são preparadas para receber pais e filhos. “É uma forma de os pais retomarem sua vida social em companhia dos filhos”, justifica Iza Garcia, idealizadora do Sambaby. Há uma brinquedoteca, mas sem monitores. “Queremos que eles brinquem juntos.” O ambiente conta ainda com fraldário, banheiro infantil, estacionamento de carrinhos e menu infantil. A programação de 2013 estará em breve disponível no site www.sambaby.com.br.
Uma sessão do CineMaterna chega a reunir 40 bebês: ambiente preparado para crianças e suas mães (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Uma sessão do CineMaterna chega a reunir 40 bebês: ambiente preparado para crianças e suas mães

E já imaginou contar com a “ajuda” do próprio bebê para fazer ginástica? Essa é a proposta do Canguru Gin, que usa o carrinho do neném como acessório de malhação. Andressa Mariz trouxe a novidade dos Estados Unidos. As aulas ocorrem no Parque da Cidade, pela manhã. No Canguru Gin, as mães correm empurrando o carrinho e executam alguns exercícios com a ajuda dele. Mais informações no site www.cangurugin.com.br.

Uma dose de estímulo

É possível você mesmo estimular o bebê em casa desde o nascimento. Confira algumas dicas simples:

>Na hora do banho ou da troca de roupa, faça massagens no seu filho, acaricie
e converse com ele. Esses momentos devem ser prazerosos para você e para o seu filho.


>Quando o bebê estiver alimentado e sem sono, coloque-o de bruços e brinque com ele. A tendência é de que ele force a cabeça para trás e coloque as mãos no chão. Esses dois movimentos fortalecem a musculatura das costas e deixam a cabeça do bebê mais firme, além de ajudar numa etapa posterior: o engatinhar.

>Sente-se no chão e coloque o bebê com as costas coladas em sua barriga. Abrace-o por baixo dos bracinhos , suavemente, vá balançando-o rumo ao chão. Ele sentirá uma leve sensação e queda e, instintivamente, colocará as mãos no chão e levantará a cabeça ara se proteger.


>Faça o movimento contrário. Com o bebê de frente para você e a cabeça protegida por sua mão para não pender abruptamente para trás, traga-o com movimentos suaves, como se estivesse brincando de “Serra, serra, serrador”.

>Com uma fralda, esconda o rosto do bebê e depois tire, fazendo aquela brincadeira “cadê o bebê?”. A própria voz da mãe e do pai é um estímulo. Converse e cante sempre para o seu bebê.


>O simples ato de embalar o bebê ajuda no equilíbrio e no tônus. Carregue o seu bebê, sempre que possível, sentado em seus braços e de costas para você. Assim, ele pode observar tudo o que acontece ao seu redor.

>Evite deixar o bebê muito tempo em bebê-conforto. Dê liberdade a ele. Coloque-o em tapetes emborrachados para que ele se movimente livremente.

Iluminação especial durante ginástica para bebês: tudo serve de estímulo (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Iluminação especial durante ginástica para bebês: tudo serve de estímulo
 

O que dizem os especialistas

A fisioterapeuta Maria Beatriz Silva e Borges é a favor de estimular as crianças desde cedo, mas vê o excesso de atividades com certa preocupação. “Temos bebês hoje com agenda de adulto. Eles vão chegar aos 4, 5 anos já cansados. Se você quer que se o filho fale, então cante e converse com ele”, alfineta. Para a doutora em desenvolvimento infantil, se a criança não apresenta deficiência, ela terá um desenvolvimento natural, no seu ritmo. E aí, segundo ela, vai pesar também o fator genético.

Maria Beatriz acalma os pais ansiosos: “Se a criança ainda não está andando na idade em que normalmente isso acontece, pode ser porque o sapato esteja inadequado ou ela esteja ficando muito tempo no colo, por exemplo. É preciso paciência”. Mas dá dicas valiosas: “Procure deixar o bebê mais no chão, sobre um tapete emborrachado e firme. Evite também mantê-lo muito tempo em uma mesma posição, ponha-o de bruços, de barriga para cima, sentado”.

Professora da Pontifícia Universidade Católica, ela também é contra o uso excessivo de bebê-conforto. Mas é preciso respeitar o estado do bebê. “Se ele está sonolento, não adianta tentar estimulá-lo. Faça isso quando ele está alerta e apto a receber os estímulos.”

As aulas de natação favorecem o contato físico da criança com a família: Amanda e sua filha, Rafaela, aprovaram a experiência (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
As aulas de natação favorecem o contato físico da criança com a família: Amanda e sua filha, Rafaela, aprovaram a experiência

Você sabia?

>A natação foi a primeira atividade para estimular bebês introduzida no Brasil. Um dos brasileiros pioneiros a desenvolver esse trabalho, na década de 1970, foi o ex-nadador Roberto Pável. Logo, tornou-se a atividade mais popular para pais e filhos fazerem juntos.


>O nascimento dos filhos de Jean Piaget, em 1925 e 1931, ajudou o suíço a desenvolver a sua Teoria Psicogenética, na qual ele explica como o indivíduo, desde o nascimento, constrói o conhecimento. Durante mais de 30 anos, Piaget observou
o crescimento dos filhos.

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