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Comportamento | redes sociais »

Cupido às avessas

São cada vez mais frequentes os relatos de casais que se desentendem por causa do Facebook e demais redes sociais. Especialistas explicam por que isso acontece e dão dicas de como evitar que o excesso de exposição na internet prejudique um relacionamento

Diego Amorim - Redação Publicação:24/01/2013 15:18Atualização:24/01/2013 15:51

 

Flagrar batom na cueca é coisa de um passado muito distante para a chamada geração Y. Duvidar daquelas horas extras de trabalho do marido ou da mulher em plena sexta-feira ou se sentir ameaçado pelo tradicional happy hour com a turma da firma, também. A desconfiança capaz de colocar tudo a perder agora nasce em verbos como compartilhar, retuitar, curtir e cutucar. Na era da comunicação instantânea e virtual, as redes sociais elevaram o tom das discussões entre os casais e as tornaram mais frequentes: viraram o centro das tais "DRs".

Internautas viraram espiões dos próprios parceiros. Há quem gaste tempo rastreando os passos online do outro e reunindo indícios a serem colocados à mesa na primeira oportunidade. Qualquer clique pode render pedidos de explicação, intermináveis brigas e, em casos não tão raros, até acabar com o relacionamento. Fotos, vídeos, comentários e troca de mensagens no universo paralelo da internet têm abalado muitos romances. O Facebook, queridinho dos brasileiros, tornou-se o principal vilão.

Cutucada do ex, curtição no texto da amiga de infância, marcação em fotos ou simples alterações no perfil servem, para os mais sensíveis ao mundo virtual, como pretexto para insinuações. Já não são poucos os que optam por compartilhar a senha de acesso à rede social e mesmo criar uma página em conjunto, onde ambos expõem a rotina do casal, como em um reality show. Se o namoro termina, a mesma ferramenta passa a ser usada para jogos de ciúme, indiretas e alfinetadas.

O sociólogo e professor da UnB Marcelo Barra: 'As meias verdades caíram por terra. 
A transparência que a internet proporciona aumenta o nível das cobranças' (Minervino Junior/ Encontro/ DA Press)
O sociólogo e professor da UnB Marcelo
Barra: "As meias verdades caíram por terra.
A transparência que a internet
proporciona aumenta o nível das cobranças"
A internet impôs uma nova maneira de lidar com os relacionamentos, na opinião do sociólogo e professor da Universidade de Brasília (UnB) Marcelo Barra. “A rede mudou hábitos, conceitos e comportamentos: não há muita escapatória”, diz. Nunca antes as relações foram tão expostas, o que, avalia ele, aumenta a importância do diálogo para a sobrevivência das histórias de amor. “O jeitinho e as meias verdades caíram por terra. A transparência que a internet proporciona aumenta o nível das cobranças”, completa.

Num espaço em que as pessoas tendem a se apresentar sempre bonitas, atraentes e felizes, flertes virtuais tornaram as traições mais possíveis e, ao mesmo tempo, mais fáceis de serem descobertas, ainda na percepção do sociólogo da UnB. Segundo pesquisas divulgadas na própria internet, um em cada três processos de divórcio na Inglaterra já listam episódios ocorridos nas redes sociais como prova de infidelidade. Desconectar-se, embora pareça improvável, tem sido a estratégia de muitos para evitar intrigas.

Pode ser precipitado associar, mas Brasília é hoje uma das cidades mais “conectadas” do país. E foi aqui que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou a maior taxa de divórcios em 2011 (4,8 para mil habitantes de 15 anos ou mais de idade, enquanto a média no Brasil é de 2,6 divórcios).
O casal Ana Karinna e Marcus Vinicius Ferreira troca mensagens, fotos e celebra os meses de namoro: diferentemente de milhares de outros, eles convivem sadiamente com o mundo conectado (Raimundo Sampaio / Encontro / DA Press)
O casal Ana Karinna e Marcus Vinicius Ferreira troca mensagens, fotos e celebra os meses de namoro: diferentemente de milhares de outros, eles convivem sadiamente com o mundo conectado

Jogadas na rede, as fotos do namorado andaram incomodando Camila Fonseca (nome fictício), uma servidora pública de 25 anos que prefere não ser identificada. “O pessoal curtia, comentava toda hora”, justifica. Em nome da boa convivência, ele (um modelo brasiliense) decidiu cancelar a conta do Facebook, estabelecendo o cessar-fogo. “Não é uma questão somente de maturidade ou imaturidade. A exposição acaba afetando as relações”, analisa Fabienne Soares, psicóloga especialista em terapia comportamental.

Nos divãs – e também fora deles –, homens e mulheres, independentemente da idade, queixam-se de angústias nascidas na internet. Os desabafos e pedidos de conselho no consultório de Fabienne geralmente envolvem incoerências entre os mundos real e virtual. “É muito comum a pessoa se chatear porque a outra não conversa com fulano no dia a dia, mas troca mensagens com ele na internet”, exemplifica a terapeuta.

As atitudes online – está mais do que provado – têm o poder de desencadear crises amorosas, mas Fabienne faz questão de deixar claro: “Vai depender da dinâmica do casal. Os valores vividos fora da internet são simplesmente transferidos para as redes”. Ao mencionar o intenso sofrimento de uma paciente ao saber que o ex a excluiu do Facebook após o fim do namoro, ela acrescenta que a influência das redes nos relacionamentos também leva em conta o peso atribuído por cada um a esse universo.

Juntos há cerca de um ano, os estudantes Ana Karinna Amoras e Marcus Vinicius Ferreira dizem conviver sadiamente com o mundo conectado. “O Facebook nunca nos fez mal”, conta ela. Pelas páginas da rede social, eles trocam mensagens, fotos e celebram os meses de namoro. Cada um tem a própria senha, mas por vezes o computador do outro fica ao alcance, logado no Facebook. “A gente se conhece bem e tem muita confiança, isso faz a diferença”, comenta ele.

Muitas vezes, porém, as trocas públicas de carinho escondem bastidores tensos. “Se algum amigo meu conversava comigo, ele brigava. E olha que eu não dava abertura para as pessoas ficarem tendo intimidade”, lembra a estudante Bianca Sampaio, que terminou o namoro recentemente. “As pessoas precisam ter noção do impacto que as redes sociais exercem na vida delas e se preparar para assumir as consequências do que fazem virtualmente”, instiga a analista de mídias sociais Bruna Marques.

Diz o especialista


“Os casais estão criando um novo contrato social e colocando a individualidade em risco ao cederem senhas e compartilharem perfis. As desconfianças virtuais, por sua vez, podem fazer sentido. As redes sociais são uma praça pública: se você der muito mole, fica sujeito a todo tipo de situação. Se não quer isso, não esteja ali.

Enfim, é tudo muito novo, estamos todos ainda aprendendo a conviver com os relacionamentos conectados. Não tivemos tempo de nos preparar para esta realidade. Mas o que se percebe, em muitos casos, são casais perdendo tempo com paranoias, usando a internet para lavar roupa suja, fazer ciúmes, provocar intrigas. Nisso, se esquecem da vida real, da relação em si, e acabam se concentrando mais nos ciúmes online do que nos carinhos offline”.

Fonte: Gil Giardelli, professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM)
e da Fundação Instituto de Administração (FIA-USP). É considerado um dos principais
estudiosos da era digital, e autor do livro Você É o Que Você Compartilha (Editora Gente).

Dicas de etiqueta virtual


 Evite comentários ou postagens dúbias, comprometedoras, que possam despertar ciúme ou insegurança
no outro.


 Deixe claro para os desavisados que você tem um compromisso sério e não está disponível para novas investidas amorosas.


 Apagar fotos e comentários antigos, principalmente os de relacionamentos anteriores, é uma ótima saída para evitar discussões desnecessárias.


 Mantenha sempre o diálogo para minimizar interpretações equivocadas
ou atritos a partir de informações até mesmo inventadas por gente que queira atrapalhar a relação.


 Livre-se da paranoia de tentar percorrer todos os passos virtuais do outro. A confiança continua sendo a base de todo relacionamento.


 Busque manter o mínimo de privacidade do casal, sem expor demais a relação, inclusive por motivos de segurança.


 Se necessário, estabeleça limites ou mesmo regras que os dois possam seguir no mundo virtual, a fim de manter a relação saudável.


 Caso optem em fazer uma página em comum, lembre-se que empresas, por exemplo, utilizam as redes sociais em processos de seleção e isso pode interferir na avaliação.

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