Seguro, mas com reservas
Aprovado pelas autoridades para fins de emagrecimento, o orlistate, princípio ativo do Xenical, é alvo de alerta: pesquisadores advertem para a perda de absorção dos ácidos graxos, essenciais para o bom funcionamento do organismo
Com as restrições adotadas pela vigilância sanitária brasileira para a venda de inibidores de apetites, o orlistate – presente também no medicamento Lipiblok, além do Xenical – tornou-se a primeira opção para quem deseja emagrecer. Mas os pesquisadores da Unicamp sustentam que, a longo prazo, pode levar a uma síndrome caracterizada pela deficiência de gordura no metabolismo do corpo humano e/ou surgimento de doenças. Eles detectaram ainda uma pequena redução de cálcio, essencial para o fortalecimento dos ossos, no organismo das 20 pessoas que participaram do estudo. Thiago Inácio Barros Lopes e Anita Jocelyne Marsaioli também constataram um paradoxo: o medicamento indicado para combater a obesidade produz uma modesta perda de peso.
A empresária Cristina* tomou o remédio por dois anos e não conseguiu emagrecer. “Em minha opinião, o produto só funciona se a pessoa aliar o uso a uma dieta de baixa caloria e atividades físicas intensas. Só o remédio e a dieta não emagrecem”, afirma. Aos 40 anos, ela luta contra o excesso de peso desde a adolescência, mas sua experiência com a substância não foi bem-sucedida. “Um fracasso. Não emagreci. Porém, sentia a gordura do meu corpo se esvair. Não apenas nas fezes, como diz a bula. A gordura era eliminada até pela urina”, conta.
O orlistate age no sistema digestivo impedindo que a gordura consumida seja absorvida pelo organismo e traga ganho de peso. Ela foi descoberta na década de 1990 e bloqueia a absorção de até 30% das gorduras ingeridas por meio da inibição da enzima lipase, responsável pela digestão de gorduras. O estudo dos pesquisadores mostrou que a alteração no perfil lipídico de ácidos graxos, criada pelo orlistate, é similar à que ocorre com a dieta de restrição, na qual o nível de gordura diminui. Apesar disso, Thiago assinala que esse problema pode ser resolvido com a suplementação de nutrientes e com medidas para conter a redução do nível de cálcio.
Outro estudo, promovido por cientistas da Universidade de Rhode Island, nos Estados Unidos, mostrou que o medicamento é um inibidor potente da carboxilesterase-2, uma enzima importante na desintoxicação normal do fígado, rim e do aparelho gastrointestinal. “Quando a atividade dessa enzima diminui nesses órgãos, ou a toxicidade aumenta, a eficácia de algumas drogas é alterada”, defende Bingfang Yan, professor responsável pela pesquisa. A substância é conhecida por metabolizar uma grande variedade de medicamentos, incluindo a aspirina e os remédios contra câncer. Yan garante que alertou o FDA, o órgão norte-americano responsável pela aprovação de medicamentos, sobre os resultados, os quais ele considera alarmantes.
Independentemente dos prós e contras, a empresária Vanessa Struckl, de 32 anos, tenta driblar a obesidade usando o orlistate. “Busco um tratamento com menos efeitos colaterais. Em 2011, usei inibidores de apetite, passei muito mal e consegui emagrecer 30 kg. Hoje, estou com os 30 kg. Não quero repetir o que passei antes”, diz.
Vanessa já descobriu que o remédio não age sozinho. Em novembro e dezembro, ela não seguiu ao pé da letra a proposta de reeducação alimentar. Não emagreceu. Em janeiro, diminuiu a quantidade de comida e passou a frequentar a academia. Emagreceu 4 kg. “Não estou tendo efeitos colaterais. Apenas sinto um pouco de enjoo quando vejo comida”, afirma. Por conselho da endocrinologista, ela toma apenas um comprimido ao dia, na hora do jantar.