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SAÚDE | DIETA »

Seguro, mas com reservas

Aprovado pelas autoridades para fins de emagrecimento, o orlistate, princípio ativo do Xenical, é alvo de alerta: pesquisadores advertem para a perda de absorção dos ácidos graxos, essenciais para o bom funcionamento do organismo

Maria Vitória - Redação Publicação:17/04/2013 14:45Atualização:17/04/2013 15:06

 (Fernando Lopes/CB/DA Press)
Famoso nos primeiros anos do século XXI e apontado como uma droga milagrosa, o Xenical ainda hoje é considerado seguro para fins de emagrecimento. Entretanto, após 12 anos no mercado, começa a ter seus efeitos questionados. Pesquisa de dois doutores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Thiago Inácio Barros Lopes e Anita Jocelyne Marsaioli, demonstra que o orlistate (nome do princípio ativo) prejudica a absorção dos ácidos graxos – as chamadas “gorduras boas”, encontradas em óleos vegetais e gorduras animais, que devem fazer parte da dieta alimentar de qualquer pessoa.


Com as restrições adotadas pela vigilância sanitária brasileira para a venda de inibidores de apetites, o orlistate – presente também no medicamento Lipiblok, além do Xenical – tornou-se a primeira opção para quem deseja emagrecer. Mas os pesquisadores da Unicamp sustentam que, a longo prazo, pode levar a uma síndrome caracterizada pela deficiência de gordura no metabolismo do corpo humano e/ou surgimento de doenças. Eles detectaram ainda uma pequena redução de cálcio, essencial para o fortalecimento dos ossos, no organismo das 20 pessoas que participaram do estudo. Thiago Inácio Barros Lopes e Anita Jocelyne Marsaioli também constataram um paradoxo: o medicamento indicado para combater a obesidade produz uma modesta perda de peso.


A empresária Cristina* tomou o remédio por dois anos e não conseguiu emagrecer. “Em minha opinião, o produto só funciona se a pessoa aliar o uso a uma dieta de baixa caloria e atividades físicas intensas. Só o remédio e a dieta não emagrecem”, afirma. Aos 40 anos, ela luta contra o excesso de peso desde a adolescência, mas sua experiência com a substância não foi bem-sucedida. “Um fracasso. Não emagreci. Porém, sentia a gordura do meu corpo se esvair. Não apenas nas fezes, como diz a bula. A gordura era eliminada até pela urina”, conta.


O orlistate age no sistema digestivo impedindo que a gordura consumida seja absorvida pelo organismo e traga ganho de peso. Ela foi descoberta na década de 1990 e bloqueia a absorção de até 30% das gorduras ingeridas por meio da inibição da enzima lipase, responsável pela digestão de gorduras. O estudo dos pesquisadores mostrou que a alteração no perfil lipídico de ácidos graxos, criada pelo orlistate, é similar à que ocorre com a dieta de restrição, na qual o nível de gordura diminui. Apesar disso, Thiago assinala que esse problema pode ser resolvido com a suplementação de nutrientes e com medidas para conter a redução do nível de cálcio.

O endocrinologista Neuton Dornelas afirma que o uso prolongado do Xenical interfere na absorção de outros medicamentos, mas vê vantagens na droga: ajuda no controle de doenças metabólicas (Minervino Júnior/Encontro/DA Press)
O endocrinologista Neuton Dornelas afirma que o uso prolongado do Xenical interfere na absorção de outros medicamentos, mas vê vantagens na droga: ajuda no controle de doenças metabólicas

A vantagem do orlistate, em relação a outros medicamentos, está em seu modo de atuação, que fica mais restrito ao sistema gastrointestinal, ao contrário, por exemplo, da sibutramina, que atua diretamente no sistema nervoso central. O endocrinologista Neuton Dornelas, do Hospital Anchieta, reconhece que o uso prolongado de remédios à base de orlistate pode interferir na absorção de outros medicamentos pelo organismo. Ainda assim, acredita que ele é eficaz no tratamento contra a obesidade: “O seu uso é útil também para ajudar no controle de outras doenças metabólicas como o excesso de colesterol e o diabetes”.


Outro estudo, promovido por cientistas da Universidade de Rhode Island, nos Estados Unidos, mostrou que o medicamento é um inibidor potente da carboxilesterase-2, uma enzima importante na desintoxicação normal do fígado, rim e do aparelho gastrointestinal. “Quando a atividade dessa enzima diminui nesses órgãos, ou a toxicidade aumenta, a eficácia de algumas drogas é alterada”, defende Bingfang Yan, professor responsável pela pesquisa. A substância é conhecida por metabolizar uma grande variedade de medicamentos, incluindo a aspirina e os remédios contra câncer. Yan garante que alertou o FDA, o órgão norte-americano responsável pela aprovação de medicamentos, sobre os resultados, os quais ele considera alarmantes.

A médica Reisla Nogueira Gontijo prescreveu o medicamento à base de orlistate 
para a paciente Vanessa Struckl: 'Benefícios superam riscos', acredita. (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
A médica Reisla Nogueira Gontijo prescreveu o medicamento à base de orlistate para a paciente Vanessa Struckl: "Benefícios superam riscos", acredita.

Ciente dos riscos, a médica endocrinologista Reisla Nogueira Gontijo só recomenda o uso do produto com acompanhamento médico. “O remédio tem tarja vermelha, o que indica necessidade de prescrição médica. Porém, qualquer pessoa pode comprar o remédio em uma farmácia sem apresentar receita médica”, afirma. Segundo Reisla, os benefícios do uso da medicação superam eventuais riscos, já que a perda de peso melhora os níveis de gordura no sangue e o controle do diabetes e da hipertensão arterial.


Independentemente dos prós e contras, a empresária Vanessa Struckl, de 32 anos, tenta driblar a obesidade usando o orlistate. “Busco um tratamento com menos efeitos colaterais. Em 2011, usei inibidores de apetite, passei muito mal e consegui emagrecer 30 kg. Hoje, estou com os 30 kg. Não quero repetir o que passei antes”, diz.
Vanessa já descobriu que o remédio não age sozinho. Em novembro e dezembro, ela não seguiu ao pé da letra a proposta de reeducação alimentar. Não emagreceu. Em janeiro, diminuiu a quantidade de comida e passou a frequentar a academia. Emagreceu 4 kg. “Não estou tendo efeitos colaterais. Apenas sinto um pouco de enjoo quando vejo comida”, afirma. Por conselho da endocrinologista, ela toma apenas um comprimido ao dia, na hora do jantar.

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