A capital dos corpos monumentais
Brasilienses investem cada vez mais no estilo de vida que combina malhação pesada e alimentação equilibrada. O resultado é a autoestima valorizada e bem-estar
Se a arquitetura e o urbanismo de Brasília denunciam projeto grandioso, a hipérbole também está nos glúteos, bíceps, peitorais e coxas que por aqui circulam. Enquanto o Rio de Janeiro não esconde DNA do culto ao corpo, a capital federal tem parques e lago, que encorajam a seminudez quase tanto quanto as areias fluminenses. Mas não é só essa a explicação para que musas e musos brasilienses não poupem esforços nem dinheiro para trincar a barriga. “Meu cliente médio é aquele cara ou aquela menina que era nerd, gordinho ou magrinho na infância, sofreu bullying, estudou bastante, passou em um bom concurso e hoje tem um dinheiro sobrando para investir em quê? Autoestima”, conta o especialista em nutrição esportiva Clayon Camargo.
Quando o assunto é saúde e beleza – e a mistura das duas coisas –, a advogada Camila Magalhães, que trabalha na Embaixada dos Estados Unidos, também não faz conta: “Gasto, sem dúvida, um quarto do meu salário em consultas, alimentos recomendados pelo nutricionista, academia, suplementação. E acho um investimento razoável, porque me traz qualidade de vida, me sinto mais confortável quando saio para me divertir, meu humor melhora”.
Hoje feliz da vida com 62 kg e 12% de gordura, Camila consegue rir do tempo em que vivia no efeito sanfona, deprimida, pulando da dieta da lua para a da sopa. “Já cheguei a pesar 82 kg, entrei nessas maluquices alimentares e fui a 52. Mas, depois, engordava tudo de novo. Hoje, percebo que o investimento certeiro, primeiro, é no bem-estar. ”
Esse cliente que busca a estética pela estética é perigoso, segundo o especialista, porque assume de maneira acrítica qualquer tipo de intervenção perigosa. “Processos no conselho regional são comuns contra profissionais de nutrição que fazem essas indicações”, comenta Maria Fernanda Castioni, professora de nutrição da Universidade Católica de Brasília.
Enxergar os exageros é o desafio, segundo Kokay: “Já cheguei a ter 3% de gordura corporal. Sentia-me fraco, a estafa mental era constante e a minha imunidade ficou muito baixa. Malhava sem acompanhamento e minhas metas estavam além do que eu, realmente, conseguia suportar”. Ele conta que já passou mal várias vezes na academia, por ter alimentação extremamente restrita e tentar sobrecarregar os pesos dos equipamentos. “Também já fiz modulação hormonal, mas foi há muito tempo”, admite.
Quando a estética fala mais alto, o problema é grave, na avaliação do endocrinologista Marco Antonio Vívolo, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia. “Eu jamais orientaria hipertrofia à custa de anabolizantes. Além do ganho muscular em excesso, há risco de lesões e de desenvolvimento de tumores”, alerta. Ele destaca que a suplementação calórica e proteica, indicada por nutricionistas, não tem esses riscos: “Esses produtos não são obrigatoriamente hormonais e permitem que a pessoa tenha mais facilidade na hipertrofia”.
Embora entre os bombados seja comum o ditado “quem cresce só com água é planta”, alcançar bons resultados é possível na base da disciplina. “Me adaptei à dieta, nem lembro mais o gosto de arroz ou do refrigerante”, conta o servidor público Marcelo Novaes. Em um ano, ele foi de 107 kg para 74. “Nem acredito quando conto que meu percentual de gordura hoje é de 7%”. Dieta rigorosa e atividade física mudaram a vida de Novaes. “Nunca fui um cara dado a esportes, sempre fui meio gordinho. Nunca fui tão forte, nem tive um condicionamento físico tão bom.”
É clichê nos consultórios usar a palavra investimento para gastos nada modestos com os tratamentos e suplementação importada. Mas, para a brasiliense Denise Rocha, ex-assessora parlamentar, atual modelo, o termo não funcionou só como eufemismo. Malhadora compulsiva desde os 13 anos, a advogada viu a vida virar do avesso quando um vídeo íntimo vazou na internet e ela se tornou o “Furacão da CPI”. Deprimida, perdeu 11 kg e, quando veio generosa proposta para posar nua, entendeu que os anos dispensados na esteira e no leg press valeriam para alguma coisa: “O estalo foi: estou desempregada, preciso pagar as contas, por que não?”.
A modelo brasiliense Bianca Anchieta ficou famosa no Facebook quando uma foto que mostrava bem o corpão chegou a 10 mil curtidas em um dia. Depois de virar a musa do clipe do funk Ela é top (aquele da “foto na espelho para postar no Facebook”), o discurso de nova celebridade começa a se afinar: “Como a foto me valorizou bastante, comecei a me cobrar mais e percebi que o pessoal que me seguia no Instagram gostava dessa linha mais fitness, saúde mesmo”.
Enquanto ela se esbalda em sobremesas como mousse de proteína, uma rede de academias hoje patrocina o trabalho da jovem de 19 anos. Detalhes da dieta e dos treinos continuam lá, mas as fotos mais curtidas são as que continuam “valorizando bastante” o tônus muscular da moça.