Gostinho de viagem
Escolher o destino pelo cardápio já é um hábito para apreciadores da boa mesa. Eles não se importam em vencer longas distâncias para conhecer de perto regiões produtoras ou locais de referência de determinadas iguarias
Sentir o sabor da cozinha de uma região pode ser a melhor forma de entender e conhecer uma cultura. As comidas típicas geralmente são reflexos da história e dos costumes da população local. Essa consciência já está arraigada na cabeça de um grupo de pessoas que faz o chamado turismo gastronômico. Em vez de conhecer apenas monumentos e pontos tradicionais dos países, os turistas optam por incluir no roteiro restaurantes, fábricas de alimentos e vinícolas.
O chef italiano Antonello Monardo foi um dos pioneiros em montar grupos para destinos gastronômicos. Proprietário de um restaurante e de uma escola de italiano, ele conta que clientes e amigos sempre pediam dicas sobre o que fazer ou onde comer quando iam à Itália. “Alguns pediam para ir comigo para eu apresentar o país a eles.” Até que um dia Antonello resolveu juntar um grupo de amigos interessados em conhecer o seu país. A primeira viagem foi para o Norte da Itália, em maio de 2011. A partir de então, são duas viagens por ano, uma no outono e outra na primavera. Sempre para a Itália, mas para regiões diferentes. “Até agora não repetimos nenhuma vez o destino. Já estamos na sexta excursão e a procura cresce a cada ano”, comemora.
Também chef, o dinamarquês Simon Lau é outro que, desde 2008, reúne grupos para levar à sua terra natal. A ideia surgiu de uma necessidade. “Queria visitar minha família, mas as passagens eram muito caras. Então, pensei em levar conhecidos e clientes interessados em conhecer o Norte da Europa para pagar o custo da minha passagem”, lembra. No próximo roteiro, neste mês, passará por Dinamarca, Suécia e Noruega. Está incluso um jantar no restaurante Noma, em Oslo, que já foi considerado pela revista inglesa Restaurant o melhor do mundo. “Vamos a quatro restaurantes topo de linha, porém também comemos comida caseira. Eu os levo a casas de família para sentirem o gosto do que as pessoas comem no dia a dia. A viagem de 10 dias é um mergulho na cultura nórdica”, exalta.
A advogada Hermínia Maranhão conheceu o turismo gastronômico em 2010, quando foi para a Itália com Antonello. Foi a primeira de muitas viagens gastronômicas. Depois disso, esteve no Peru, em 2012. Dos 20 melhores restaurantes peruanos, ela conheceu 10. “Foi sensacional. Também conhecemos o chef Gastón Acurio, que ajudou a difundir a culinária peruana, que hoje está em evidência no mundo inteiro”, relata.
O interesse de Hermínia pela gastronomia é recente. Quando chegou a Brasília, só existiam cinco restaurantes de ponta. “Há 40 anos, praticamente não havia restaurante bom no DF, mas isso nunca me incomodou”, avalia. Aos poucos, a paixão pela gastronomia tomou corpo: “De uns anos para cá, criei interesse nisso e me apaixonei, fiz até o curso de gastronomia e hoje sou formada”, ressalta a gourmet, que não tem a pretensão de virar chef, apenas de cozinhar para os amigos. Junto ao grupo que foi à Itália, Hermínia formou a Confraria da Anarquia.
Não são apenas histórias de amizade que surgem nessas viagens. Os servidores públicos Affonso Feijó e Sybele Queiroz apaixonaram-se durante uma viagem. “Fomos nos conhecendo, descobrimos interesses em comum e acabamos nos envolvendo. Quer forma melhor de se apaixonar do que em um país romântico como a Itália?”, indaga Affonso. Sybele já havia ido à Emilha-Romagna em 2010 e decidiu ir para a Toscana, região central italiana, em 2011, quando conheceu Affonso. “Uma região é mais bonita que a outra. Adorei as duas viagens, mas acho que preferi a Toscana, pois foi lá que conheci meu marido”, diz.
O coordenador de gastronomia do Instituto de Ensino Superior de Brasília, Sebastian Parasole, também é um guia com olhos voltados para a gastronomia. Mantém com dois sócios a empresa Melhor Gourmet, que organiza pacotes de viagem. “Como somos professores, temos a educação no sangue. O conceito número um é educar”, conta. Em julho, está programada uma excursão para a Argentina. Cursos de harmonização de vinhos, carne argentina, chocolate, tortas modernas e massas e molhos estão no pacote, além de passeios por Buenos Aires e alguns restaurantes já selecionados.
Outros destinos estão programados para este ano, como a Espanha, com direito a curso no estreladíssimo Celler de Can Roca, e os Estados Unidos, mais precisamente Nova York, onde os turistas poderão ir aos restaurantes de bicicleta.
O chef de cozinha André Biroli também já passou pela experiência de viajar para aprender mais sobre gastronomia. Na Argentina, fez cursos sobre a gastronomia da região e harmonização. Hoje, ele também é auxiliar de cozinha de um restaurante de Brasília, e diz que os cursos o ajudam no trabalho e fizeram com que seu currículo ficasse mais valoroso. “Adorei a viagem. Aprendi muita coisa e me diverti bastante”, conta. E ele garante que não é necessário entender de culinária para fazer uma excursão desse tipo. “Havia pessoas que não eram formadas em gastronomia e estavam lá. Indico o passeio para qualquer um”, exalta.