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Em nova casa

Neste mês, Rogério Schietti deixa o Ministério Público para integrar a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Escolhido pela presidente Dilma em junho, será o primeiro ministro da corte com a trajetória profissional totalmente construída na capital

Ana Maria Campos - Publicação:13/08/2013 17:16Atualização:13/08/2013 17:36

Rogério Schietti vai herdar 10 mil processos da área penal do STJ: 'Sei do desafio, mas todas as noites deito minha cabeça no travesseiro e durmo em paz' (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Rogério Schietti vai herdar
10 mil processos da área penal
do STJ: "Sei do desafio, mas
todas as noites deito minha cabeça
no travesseiro e durmo em
paz"
Era um dia de decisão. “Qualquer que seja a definição, a presidente vai resolver hoje”, disse um interlocutor ao procurador Rogério Schietti Machado Cruz. Dilma Rousseff tinha despacho com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e escolheria naquela terça-feira, 11 de junho, a indicação para três vagas no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Uma delas pertencia ao chamado quinto constitucional e seria preenchida por um integrante do Ministério Público.


Schietti aguardava havia 100 dias por um veredicto do Palácio do Planalto. No páreo pelo gabinete aberto com a aposentadoria do ex-presidente do STJ César Asfor Rocha, dois outros candidatos com potencial: o procurador Mauro Henrique Renner, do Rio Grande do Sul, e o subprocurador-geral da República Francisco Xavier Pinheiro Filho. Era uma disputa difícil. Um ano antes, ele havia tentado uma vaga. Mas não entrou, por um voto, na lista tríplice eleita pelo pleno do STJ. Assim, não chegara à reta final da definição, quando a presidente da República seleciona um nome entre três escolhidos pelo STJ.


Dessa vez, a chance era de ouro. O nome dele chegou à Presidência como o primeiro colocado, com 24 dos 29 votos possíveis. Por isso, a expectativa era grande. Schietti esperou o dia todo. Para aplacar a ansiedade, o procurador foi para a cozinha. Bebericando um vinho com a mulher, a promotora de Justiça Danielle Martins Silva, preparou um risoto especial: lichia, maracujá e gorgonzola. A gastronomia é uma de suas especialidades, especialmente para relaxar.


O advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas aponta as razões que levaram à escolha de Schietti para a vaga: 'É equilibrado, ponderado e tem uma cultura jurídica na área penal muito forte' (Carlos Silva/Esp. CB/D.A Press)
O advogado Luiz Carlos Sigmaringa
Seixas aponta as razões que
levaram à escolha de Schietti para
a vaga: "É equilibrado, ponderado
e tem uma cultura jurídica na área
penal muito forte"
Na residência no Lago Norte, o casal construiu um espaço para receber os amigos. “Cozinhar, para mim, é uma diversão e alivia a tensão”, conta Schietti. O ambiente gourmet é um dos cantos preferidos da casa. Perde apenas para a biblioteca, com muitos livros de direito e vários de história, outra paixão.


Naquela terça-feira de junho, véspera do dia dos namorados, Schietti e Danielle aproveitavam o momento a sós. O bebê do casal, Lorenzo, de 1 ano, já dormia quando o telefone tocou. José Eduardo Cardozo comunicava que Schietti seria ministro do STJ. Prevaleceu o perfil técnico, sem máculas e respeitado pelo conhecimento em direito processual penal. O novo juiz estourou um champanhe. “Foi uma emoção enorme.”
Aos 51 anos, ele vai ajudar a formar a jurisprudência penal do país, na 6ª Turma do STJ, dedicada a ações penais. A posse está marcada para 29 de agosto. Herdará 10 mil processos relacionados a recursos contra decisões penais ou habeas corpus.


“Rogério Schietti é preparado e tem qualidades importantes para um juiz. É equilibrado, ponderado e tem uma cultura jurídica na área penal muito forte”, elogia o advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas. “Ficou como primeiro colocado na lista do STJ porque tem o respeito dos ministros em razãode sua formação penal”, diz.


Além da admiração de Sigmaringa, Schietti desfruta também de um padrinho importante, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sepúlveda Pertence, que, como ele, tem sólida formação em processo penal e virou juiz depois de passar pelo Ministério Público. Pertence foi um aliado de Schietti também em 2004, quando ele se tornou procurador-geral de Justiça do DF, nomeado pelo então presidente Lula. Derrotava, assim, um adversário interno, o promotor de Justiça Leonardo Bandarra, que, dois anos depois, o sucedeu e, mais tarde, virou alvo da Operação Caixa de Pandora.


O promotor Sérgio Bruno Cabral Fernandes, coordenador do Núcleo de Combate às Organizações Criminosas, elogia: 'Rogério sempre foi uma referência' (Ed Alves/CB/D.A Press)
O promotor Sérgio Bruno Cabral
Fernandes, coordenador do Núcleo
de Combate às Organizações Criminosas,
elogia: "Rogério sempre foi uma
referência"
Schietti chegou ao comando do Ministério Público com a promessa de não concorrer à reeleição. Acreditava que, sem a intenção de ser reconduzido, trabalharia com isenção. Em dois anos à frente do MP local, pegou pedreira. Na área de direitos humanos, assinou o primeiro pedido para intervenc%u0327a%u0303o do governo federal com vistas ao cumprimento do Estatuto da Crianc%u0327a e do Adolescente nas medidas socioeducativas para adolescentes infratores. Foi autor de representac%u0327ões contra jui%u0301zes envolvidos em suspeitas de corrupc%u0327a%u0303o e defendeu afastamento de dois desembargadores do Tribunal de Justiça do DF.


Na gestão de Schietti, as denúncias da Pandora começaram a ser desvendadas, com a criação de uma comissão que investigou o esquema liderado pelo delegado Durval Barbosa, que, mais tarde, tornou-se delator. Na área de saúde, outra comissão de promotores investigou irregularidades com pagamentos a hospitais particulares, que hoje resultam em condenações.


“Como promotor, Rogério sempre foi uma referência e tem qualidades fundamentais que farão dele um grande juiz: independência, coragem e respeito com a coisa pública. Além disso, ele é desassombrado com o poder”, avalia o promotor Sérgio Bruno Cabral Fernandes, coordenador do Núcleo de Combate às Organizações Criminosas (Ncoc), um dos responsáveis pela Operação Caixa de Pandora.


Entre os melhores amigos, está o procurador José Firmo, mentor da guinada profissional de Schietti. “Um dia, ele entrou na minha sala e disse: ‘Por que você não concorre a uma vaga no STJ?’. Eu disse que não tinha a menor chance. Mas, aos poucos, Firmo foi me convencendo”, conta Schietti. Uma das aliadas foi a atual procuradora-geral de Justiça do DF, Eunice Carvalhido, que chegou a ser cotada para um assento no Supremo Tribunal Federal (STF) e tem bom trânsito nos tribunais superiores.


Chefe de gabinete na época em que Schietti era procurador-geral, o promotor Carlos Alberto Cantarutti destaca: 'Ele tem luz própria, é tranquilo e toma decisões de forma equilibrada' (Carlos Silva/Esp. CB/D.A Press)
Chefe de gabinete na época em que
Schietti era procurador-geral, o
promotor Carlos Alberto Cantarutti destaca:
"Ele tem luz própria, é tranquilo e
toma decisões de forma equilibrada"
Schietti é apontado como um sujeito simples. “Ele tem luz própria, é tranquilo, sabe trabalhar em equipe e toma decisões de forma equilibrada”, conta o promotor Carlos Alberto Cantarutti, chefe de gabinete de Schietti nos tempos de procurador-geral.
Rogério Schietti é um típico cidadão que cresceu e formou sua trajetória profissional no DF, primeiro com essa característica a se sentar no plenário do STJ. Mineiro de Juiz de Fora, chegou à capital aos 4 anos e se considera um brasiliense. Viveu a infância pelas quadras da Asa Sul, foi estagiário do Banco do Brasil, estudou direito no Uniceub, teve três filhos na cidade. Além do pequeno Lorenzo, orgulha-se do filho fotógrafo, Vítor, de 27 anos, e da filha, Larissa, de 20 anos, estudante de letras, do primeiro casamento.


Apaixonado por velocidade, tinha em casa, até pouco tempo, uma Honda Shadow. A admiração por motos começou ainda na adolescência. O sonho de todo motociclista foi realizado em 2008, quando Schietti, numa Harley Davidson, e um grupo de 35 aficionados percorreram oito estados de Chicago a Los Angeles durante 15 dias, debaixo de chuva e calor escaldante na lendária Rota 66. “Na moto, Rogério pode viver um lado dele que é muito forte, o amor pela liberdade”, conta a mulher Danielle.


Há nove anos, ela se tornou promotora de Justiça. Obstinada, Danielle estudava para ser juíza. O professor Rogério Schietti foi a inspiração para o concurso no Ministério Público do DF. “Admirava o jeito humano do Rogério de aplicar o direito penal”, diz Danielle.

Com a mulher, também promotora, Danielle Martins, Rogério Schietti cultiva 
um de seus hobbies: a gastronomia (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Com a mulher, também promotora, Danielle Martins, Rogério Schietti cultiva um de seus hobbies: a gastronomia

Quando a notícia de que a presidente Dilma decidira nomear Schietti se espalhou, o telefone dele não parou mais naquela terça-feira de junho. Eram torpedos, ligações de pessoas próximas e autoridades desejando felicitações. No dia seguinte, Schietti recebeu os amigos em volta da piscina e do fogão.


Hoje, acredita que tudo na vida dele o levou indiretamente a se tornar magistrado. “Estou vivendo o melhor momento da minha vida, com serenidade. Sei do desafio que terei no STJ, mas todas as noites deito minha cabeça no travesseiro e durmo em paz”, afirma.

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