Cartas na mesa
Tendência em outras capitais do país, Brasília se rende à prática do pôquer. Mais jogadores, campeonatos e abertura de clubes especializados são prova disso
Durante a realização da Copa das Confederações no Brasil, em junho, um anúncio invadiu a programação dos canais esportivos. Nele, Ronaldo, o maior ídolo do futebol brasileiro nos últimos 20 anos, voltava a fazer embaixadinhas. Dessa vez, porém, com algumas fichas equilibradas nos dedos da mão. “Agora eu sou pôquer”, dizia o craque, no complemento da publicidade do mais famoso site do jogo de cartas no mundo.
A ação promocional, semelhante à que fez o tenista Rafael Nadal para a mesma empresa, no ano passado, escancara o crescimento da popularidade do pôquer. Um jogo que já esteve ligado a um comportamento no mínimo controvertido hoje é trabalhado para se equiparar aos principais esportes do planeta.
Criada em 2009, mas reformulada neste ano, a Federação Brasiliense de Poker (Febrapoker) planeja o aumento do número de locais permitidos para a prática do Texas Hold’em, modalidade do jogo mais utilizada em torneios profissionais (saiba mais no quadro). Afederação planeja publicar em sua página na internet os critérios de filiação para clubes e jogadores.
Filiada à Confederação Brasileira de Texas Hold’em (CBTH), órgão reconhecido pelo Ministério do Esporte, a Febrapoker já colocou em ação uma série de medidas para popularizar o pôquer na capital, como aulas gratuitas para quem aprender as regras, uma biblioteca de obras sobre o jogo à disposição do público e a criação do Campeonato Brasiliense de Pôquer, em sua primeira edição em 2012.
Para obter a “legalização”, a CBTH agiu em conjunto com a Federação Internacional de Pôquer (IFP) e entidades similares de outros países. Com recursos próprios, elas financiaram uma série de estudos científicos em universidades norte-americanas e europeias que provaram que, no pôquer, a habilidade e a técnica superam o fator sorte. Em 2010, graças a esses laudos, a Associação Internacional de Esportes da Mente colocou o pôquer no mesmo patamar de atividades como xadrez, damas e bridge. “Nesse momento, o esporte ganhou substrato jurídico para existir no Brasil como atividade lícita”, explica Rogers, que é também advogado.
“Antes, jogávamos pensando que poderíamos ser presos. Até descobrirmos que existiam clubes funcionando abertamente no Rio de Janeiro e em São Paulo”, conta Rafael Rodrigues, um dos fundadores do BSB Clube, em Águas Claras, e da Associação Brasiliense de Esportes da Mente (Asbem), ambos abertos em 2011, que organizaram alguns dos primeiros torneios da cidade. Hoje, Rafael é vice-presidente da Febrapoker e organiza independentemente torneios com prêmios que chegam aos seis dígitos.
Quem mais se beneficia desse recente ambiente de abertura e legalidade são os jogadores, sejam eles amadores ou profissionais. A potiguar Carol Ventura elogia a nova visão sobre o jogo no país. “Pessoas com visibilidade nacional, como o próprio Ronaldo, estão abraçando o pôquer. Isso é importante para combater o preconceito, que ainda existe”, opina a integrante da seleção brasiliense no Campeonato Brasileiro de 2012, moradora de Brasília desde 2009, quando veio ser chefe de gabinete.
Quanto ao preconceito, Carol diz que ele ainda é um obstáculo a ser vencido e é difícil mudar a concepção da grande massa quando há falta de informação, “mas esse cenário está mudando, com a popularização do pôquer como um esporte mental de habilidade, negando-se a imagem errônea de ‘jogo de azar’ que muitos tinham antes”.
Também integrante da seleção brasiliense, Gustavo Lopes “Vascão” não se considera um profissional. Ao contrário de Carol Ventura, esse corretor de imóveis privilegia os torneios presenciais. “O mais legal do pôquer é que, nele, um amador pode jogar na mesma mesa de um profissional”, opina Gustavo, com a experiência de ter vencido torneios em Las Vegas e participado de eventos também na Europa.
Não há dados sobre o número de jogadores em Brasília, mas a CBTH, em conjunto com 18 federações estaduais, incluindo a Febrapoker, encomendou recentemente uma pesquisa ao Instituto Soma para mapear o perfil dos jogadores no Brasil, que deve lançar mais luz na prática do esporte no país.