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Desde 2011, com a Lei de Acesso à Informação, o sigilo deveria ser uma exceção na administração pública. O que falta, então, para que o país seja totalmente transparente?

Dominique Lima - Redação Publicação:23/10/2013 18:52Atualização:23/10/2013 19:16

Manifestação pelo fim do voto secreto no Congresso Nacional: a luta pela transparência também deve atingir o Executivo ( Iano Andrade/CB/D.A Press)
Manifestação pelo fim do voto secreto no Congresso Nacional: a luta pela transparência também deve atingir o Executivo
 

Ao sair às ruas, os brasileiros não exigiram apenas a melhoria dos serviços públicos, mas lembraram a importância de maior transparência do governo. O movimento é parte integrante de uma nova relação entre Estado e sociedade. Além desse ativismo do cidadão, a criação de marcos legais importantes para o acesso à informação na última década trouxe novo fôlego para práticas de transparência. Mas o Brasil ainda tem longo caminho pela frente, se comparado ao resto do mundo. Toda a dinâmica do país deve mudar, segundo especialistas, para que tanto cidadãos quanto agentes públicos entendam que a informação pública pertence ao povo brasileiro.


“A transparência é o maior inimigo da corrupção”, resume Gil Castello Branco, do Contas Abertas, uma entidade da sociedade civil sem fins lucrativos que acompanha e divulga informações sobre a execução dos recursos públicos da União. O conceito de transparência, que figura na Constituição de 1988 sob o princípio da publicidade na administração pública, significa na prática o dever de o governo dispor de todas as informações necessárias para que o cidadão entenda os pormenores do funcionamento e os gastos da máquina pública.


Secretário de Transparência e Prevenção da Corrupção da Controladoria Geral da União, Sérgio Seabra:  'A Lei de Acesso à Informação 'empodera' o cidadão' (CGU/ Divulgação)
Secretário de Transparência e Prevenção
da Corrupção da Controladoria Geral da
União, Sérgio Seabra: "A Lei de
Acesso à Informação 'empodera' o cidadão"
Para tanto, não se faz necessário apenas publicar, mas, sim, tornar inteligíveis os dados que o Estado produz. No Brasil, o governo editou lei que impõe a todos os entes da Federação a publicação na internet de suas contas públicas. Essa é a Lei Complementar nº 131, de 2009, uma emenda à norma conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2000. A União e o Senado lançaram o Portal da Transparência e o Siga Brasil. Esses canais publicam as informações sobre execução orçamentária e são decorrentes do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), base de dados unificada das contas públicas. Por meio deles, qualquer cidadão ou organização civil pode acessar planos e orçamentos públicos.


Tais sistemas são importantes para a consolidação da transparência, mas sozinhos não garantem o controle social. A cultura precisa mudar. É aí que entram elementos como a instituição de normas legais, os programas de capacitação de servidores públicos e as organizações civis de controle social e educação de eleitores. Em prol da transparência, o país conta com a Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor em 2012. No texto da LAI, como ficou conhecida, explicita-se a mudança da cultura de segredo para a cultura de acesso. O sigilo passa a ser a exceção. A lei estabelece oito cenários em que o segredo é permitido, casos que envolvam segurança nacional e direitos como intimidade, honra, ampla defesa, contraditório. O prazo máximo previsto para a manutenção de qualquer segredo é de 25 anos. “A Lei de Acesso à Informação ‘empodera’ o cidadão.

 

Assim, é mais fácil exercer seus direitos, entender as decisões, prepara-se para um espaço de participação social e melhorar a qualidade de sua vida política”, define o secretário de Transparência e Prevenção da Corrupção da Controladoria Geral da União (CGU), Sérgio Seabra. Segundo ele, a LAI aumentou o número de informações publicadas pelos órgãos. É possível, por exemplo, acompanhar o número de documentos classificados dos órgãos. Mas falta regulamentação em 15 estados e 87% dos municípios.

Secretário de Transparência e Controle, Mauro Noleto: 'É fundamental capacitar os cidadãos para conhecer seus direitos' (GDF/Divulgação)
Secretário de Transparência e Controle, Mauro Noleto: "É fundamental capacitar os cidadãos para conhecer seus direitos"

A lei resguarda ainda o direito do cidadão quanto ao acesso à informação não publicada. Qualquer pessoa pode requerer informações da administração direta e indireta. O órgão tem prazo para encaminhar ou negar o pedido. Caso seja negado, o cidadão pode recorrer. Para garantir o processo exigido pela lei, foi criado o sistema de Serviços de Informação ao Cidadão (SICs). “Além de o acesso ser gratuito, o cidadão pode fazer seus requerimentos com facilidade, sem necessidade de conhecimentos sofisticados”, explica Seabra.


A LAI exige que todos os entes federativos, União, estados, DF e municípios e todos seus poderes se adequem às exigências. No Distrito Federal, o governo conta, desde 2011, com a Secretaria de Transparência e Controle (STC) e lançou o portal da Transparência do DF, bem como um portal exclusivo para os gastos com obras relacionadas à Copa do Mundo de 2014. Também regulamentou a LAI, com a Lei Distrital de Acesso à Informação. Mas as medidas não são ainda suficientes.


É necessário que os cidadãos entendam o valor de seu papel no controle e exerçam ativamente seus direitos de fiscalizar e questionar. “Hoje, o cidadão não se interessa pela coisa pública porque não acredita nela e não vê perspectivas de melhora. Mas, quando não se envolve, ele dá espaço para Estado agir como quiser e reforçar a descrença do povo”, explica Alexandre Gomes, sócio em empresa de TI que desenvolve softwares de opengov, que são programas para interpretação e abertura de dados estatais. Gomes participa da Transparência Hacker, uma comunidade multidisciplinar de discussão sobre processos de desenvolvimento em prol da transparência pública que conta com o Monitor Legislativo, um projeto que pretende mapear e monitorar o processo de tramitação legislativa.

'A transparência é o maior inimigo da corrupção', resume Gil Castello Branco: ele criou a entidade Contas Abertas, que fiscaliza gastos públicos (Thiago Rodrigues/Esp. CB/D.A)
"A transparência é o maior inimigo da corrupção", resume Gil Castello Branco: ele criou a entidade Contas Abertas, que fiscaliza gastos públicos

“É fundamental capacitar os cidadãos para conhecer seus direitos e as formas de acesso à informação disponíveis. Capacitações para conselheiros de políticas públicas e lideranças da sociedade civil são estratégias que o GDF colocará em prática ainda neste semestre. Contudo, esse deve ser um trabalho feito também pela sociedade civil”, diz o secretário de Transparência e Controle, Mauro Noleto.

 

MANTENHA-SE INFORMADO

 

 Portal da Transparência – Disponibiliza dados detalhados sobre a execução orçamentária e financeira do governo federal, com atualização diária de dados sobre despesas: www.portaltransparencia.gov.br/


 Portal da Transparência do Distrito Federal – Informações sobre gastos públicos do governo
do DF: www.transparencia.df.gov.br/


 Siga Brasil - sistema de informações sobre orçamento público, que publica dados
inseridos no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) e outras bases de dados sobre planos e orçamentos públicos dos três poderes: www12.senado.gov.br/orcamento/sigabrasil


 SIC e e-SIC - sistema de Serviços de Informação ao Cidadão (SICs) por meio do qual é possível dirigir solicitações de informações aos órgãos do governo federal, acompanhar o andamento
dos pedidos e até mesmo entrar com recursos. Acesso visitando o órgão público pessoalmente
ou usando o e-SIC a partir do site de cada entidade estatal


 Contas Abertas - entidade da sociedade civil que acompanha e divulga informações sobre execução
dos recursos públicos da União: www.contasabertas.com.br


 Transparência Hacker - comunidade multidisciplinar de discussão sobre processos de desenvolvimento em prol da transparência pública: thacker.com.br

 

LEGISLAÇÃO SOBRE TRANSPARÊNCIA

 

 Constituição da República de 1988: a publicidade está entre os princípios expressos pela CF/88, aos quais deve obedecer a administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios


 Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), a Lei Complementar nº 101/2000: a LRF estabelece parâmetros de gastos públicos para toda a Federação. Ao exigir que todo aumento de gasto precisa vir de uma fonte de financiamento correlata, essa lei se tornou importante instrumento da transparência nos gastos públicos


 Lei complementar nº 131/2009:
única emenda à LRF, a lei inclui a obrigação para cada ente federativo de publicar informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público. Todo o país deveria ter se adequado às exigências até maio deste ano. Muitos municípios, no entanto, ainda não dispõem de portal para acesso às contas públicas. Quando têm, seu conteúdo, usabilidade e atualização e dados são insuficientes para o controle social 

 

Lei de Acesso à Informação, 12.527/2011: publicada em novembro de 2011 e em vigor desde 18
de maio de 2012, a LAI dispõe sobre as regras de acesso à informação, com foco principal na transparência passiva, aquela em que o cidadão procura o Estado para obter informações. Entre as principais inovações, está impor o acesso como regra e o segredo como exceção e a desobrigação de justificativa para o pedido por informação. Necessita de regulamentação complementar, que ainda
não existe em 15 estados e 87% dos municípios do país.

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