Olho na balança
Uma em cada três crianças entre 5 e 10 anos está acima do peso no Distrito Federal, unidade da federação que lidera esse preocupante ranking. Saiba como fazer seu filho comer melhor
Essa alimentação exagerada, à base de lanches rápidos, é composta por carboidratos de altos índices glicêmicos. A nutricionista Lara Garcia explica que estes viram açúcar na corrente sanguínea com mais facilidade e que, por isso, a dieta para as crianças nem sempre é hipocalórica, mas baseada em alimentos com baixo índice glicêmico. “Não é comum fazer restrição calórica para crianças, porque quase sempre compromete o crescimento.”
Alguns podem pensar que é fácil perceber se a criança está obesa, mas esse diagnóstico não é algo tão simples. A nutricionista conta que os pais raramente notam. “Muitas vezes o pai adia o início do tratamento por achar que é um sobrepeso temporário, mas que, com o crescimento, isso vai se diluir, o que nem sempre ocorre”, alerta. Por ser uma classificação numérica, é complicado para um leigo conseguir fazer essa avaliação.
Para saber se a criança está num estágio de obesidade, os nutricionistas fazem cálculos precisos antes de dar o diagnóstico. É feita uma conta avaliando-se o peso em relação à altura. Calcula-se também o Índice de Massa Corpórea (IMC) infantil. Complementando a avaliação, há exames de composição corporal. Contudo, os pais podem ficar atentos a alguns sinais. De acordo com Lara, a obesidade geralmente vem acompanhada de deficits nutricionais. “Uma criança obesa tem reserva baixa de vitaminas, é mais cansada, indisposta para brincar”, explica. A profissional ainda ressalta que essas deficiências nutricionais acompanham a obesidade, mas nem sempre o sobrepeso.
Dependendo da fase da infância em que isso acontece, por exemplo, na transição para a adolescência, o risco de a criança se tornar um adulto obeso aumenta. Isso porque ocorre um aumento no número de células de gordura, que nessa fase acontece em maior intensidade. “Hoje, sabemos que alguns tipos de câncer têm relação direta com a gordura corporal, mas as doenças crônicas, como diabetes, hipertensão e síndrome metabólica, são os principais problemas de saúde que podem ser apresentados”, complementa.
Outro ponto interessante, de acordo com a profissional, é que já foi comprovado que, até 8 anos de idade, os pequenos não conseguem diferenciar a publicidade do programa que estão assistindo e até os 12 anos não têm entendimento do caráter persuasivo da propaganda. A criança acredita que, consumindo o produto, estará dentro do universo do programa do qual gosta e acaba consumindo algo quando às vezes nem gosta do sabor. Como explica outra pesquisadora, Camila Leão, é a questão de querer se enquadrar ao que as outras estão fazendo. “Se já tem esse poder persuasivo nos adultos, imagine nas crianças.”
Um dia, no começo do ano passado, a servidora pública Silvana levou um susto ao não conseguir reconhecer seu filho, Lucas, que tinha 10 anos na época. A silhueta que ela viu a distância, quando foi buscá-lo na escola, não parecia ser a dele. O menino estava passando por uma fase de sobrepeso. Ele já não gostava de usar sunga, só tinha roupas largas e estava ficando incomodado com o próprio corpo. Foi então que ela e o marido resolveram procurar ajuda profissional, antes que o caso evoluísse para uma obesidade.
Lucas joga futebol com os amigos e pratica tae kwon do. Seu problema nunca foi o sedentarismo. Junto à nova alimentação, os esportes foram mantidos e o menino tratou de prestar atenção e seguir o direcionamento da nutricionista, por isso não chegou a reclamar das mudanças, que não foram drásticas. Há dois anos, o menino estava com 42 kg. Hoje, com 12 anos, mantém o mesmo número, mas está com o peso certo para sua idade e altura. Contudo, como todo adolescente, ainda dá suas escapadas. Em casa come direito, mas na cantina da escola reinam a pizza e o pão de queijo. “Levar lanche de casa não rola”, denuncia Silvana.
A nutricionista que acompanhou o caso de Lucas foi Marcella Lamounier. Para a profissional, o trabalho de reeducação alimentar com crianças não é muito complicado, porque ainda estão em processo de formação, o que inclui preferências e aversões a determinados alimentos. Mas algumas são mais resistentes, porque há outras questões influenciando na alimentação, como ambiente, família e contexto psicológico.
Para fazer a transição alimentar para o saudável, não se pode tornar o processo um sofrimento. “Cortar definitivamente as guloseimas ou evitar a pizza de domingo, por exemplo, não ajudará em nada.” É a quantidade e a frequência que devem ser controladas, não apenas proibidas. Outro ponto é não obrigar a criança a comer aquilo de que ela não gosta. “Se a criança não gosta de alface, mas come outras verduras, ótimo! Adultos têm suas preferências e com as crianças não é diferente.”
Pensando na alimentação saudável de crianças e adolescentes, a Lei nº 5.146/2013, sancionada em agosto deste ano, estipulou às cantinas de escolas públicas e privadas a adequação dos cardápios oferecidos aos alunos. Com a norma, refrigerantes, biscoitos recheados, frituras, balas e chocolate saem do menu e dão lugar a pelo menos uma opção de fruta da estação e a salgados apenas assados. A medida pode ser uma ação para ajudar a combater os números da obesidade infantil no Distrito Federal. De acordo com levantamento realizado pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SVAN) apresentado em 2012, uma em cada três crianças de 5 a 10 anos estão acima do peso. Isso faz do DF a unidade da Federação no primeiro lugar do ranking nacional.
“A orientação sobre a alimentação saudável começa em casa, mas a escola tem papel importante”, explica a nutricionista Sandra Lima, responsável pela cantina e pelas refeições do período integral da escola Ciman. A instituição, antes mesmo de a lei ser sancionada, não disponibiliza para a venda refrigerantes e frituras. Mas agora também adaptará o restante do seu cardápio. Para Sandra, essa não vai ser uma tarefa fácil. Alguns alunos já se mostraram contrários à novidade. “Ficam brincando dizendo que vão fazer tráfico de doces”, conta. “Mas a educação nutricional é gradativa. Com palestras e medidas de conscientização para alunos e pais, vai dar tudo certo.”
Para as crianças que ficam no período integral na escola, Sandra explica que o cardápio é elaborado mensalmente, levando em conta intolerâncias à lactose e ao glúten. Há também preocupação para que os alimentos não sejam muito calóricos e industrializados. As preferências dos alunos são consideradas, mas em sua versão saudável, como o bolo de banana sem glúten e sem ovo, que faz sucesso com a criançada. As frutas entram como sobremesa e, uma vez por semana, é oferecido aos estudantes um doce, como musse ou paçoca. “Isso para evitar que eles achem que o proibido é mais gostoso.”
Como evitar a obesidade infantil
Frutas e verduras devem estar disponíveis e sempre se devem oferecer frutas como sobremesas, sucos naturais sem açúcar nos lanches, verduras cruas e cozidas no almoço e jantar e água durante todo o dia.
Diversificar os alimentos ajuda a não criar uma rotina alimentar monótona. Nesse momento
entra a criatividade dos pais ou responsáveis, sempre tentando novas receitas culinárias para atrair a criança.
Em casa, deve-se fazer dos doces, salgadinhos prontos, refrigerantes e outras guloseimas uma exceção, e não a regra. Esses produtos são riquíssimos em açúcar, sódio e gordura, aumentando ainda mais os riscos de ganho de peso.
A qualidade dos alimentos também conta. Evitar carnes e acompanhamentos fritos, doces e sorvetes como sobremesas, sucos industrializados e molhos para salada já ajuda a diminuir as calorias de uma refeição.
Alimentação aliada a uma atividade física regular na infância também é uma dica importante para evitar o ganho de peso excessivo da criança.