Um lugar de sons e sonhos
A Escola de Música de Brasília já formou diversos talentos em meio século de história. Agora, prepara-se para implantar cursos superiores
Tayane de Souza Nery Almeida é uma das alunas que teve a sorte e a competência de ingressar na EMB. Apaixonou-se pelo som do violoncelo e, desde o início do ano passado, debruça-se sobre o instrumento. “Para mim, aqui é uma oportunidade. Tem gente que não tem condição de pagar uma escola, e a EMB é uma chance para essas pessoas entrarem no mundo da música”, diz. Apesar de reconhecer a dificuldade apresentada pelo violoncelo, Tayane não se arrepende da opção. “É um instrumento bonito. Ele tem um som muito lindo”, comenta ela, que sonha em tocar bem e ser admirada pelo público. Talvez até se exibir na Orquestra Sinfônica de Berlim.
Ao lado dela, um rapaz fricciona o violoncelo com paixão. Roale Romel Francisco de Araújo Pereira relata que optou pelo instrumento após ser contemplado em sorteio e aprovado em uma prova de teste. “Eu sinto muito o violoncelo, é o que mais se assemelha à voz humana. Pretendo seguir carreira”, comenta. Ele vê a EMB como um acesso público e de qualidade para o ensino de música em Brasília. Antes de aderir ao violoncelo, Roale foi musicalizado no trombone, no trompete e no piano.
Morador de Sobradinho, Marcos Souza Teixeira encara toda semana uma jornada de dois ônibus até chegar à EMB para a aula de violino. Segundo ele, a música lhe ensina a viver melhor. “Aprendo a ter concentração, a relaxar, além de ser uma forma de me divertir”, afirma. Ele considera o violino um desafio, mas se empolga com o som “bonito”. “Quero terminar meu curso básico, ir para o intermediário e, quem sabe, seguir a carreira de músico e, um dia, tocar numa orquestra.” A irmã dele, Ana Beatriz Souza Teixeira, está há quase um ano nas aulas de piano erudito. “Foi um dos primeiros instrumentos com que tive contato, além de ser o básico para a carreira de músico”, conta ela.
Iuri de Arruda Gules fez um roteiro pouco comum: da guitarra ao cavaquinho. Ele optou pelo cavaco porque pretendia entrar no Clube do Choro. “Eu achei que seria fácil, mas é outro instrumento. Tive de aprender do zero, apesar de algumas notas se repetirem”, diz. Já são cinco anos dedilhando as cordas, três anos passados no Clube do Choro. “O ensino é bom e o sistema funciona bem, mas faltam investimentos do governo.”
Uma nova fase de expansão
No começo da década de 1960, logo após a criação da capital, existiam dois polos musicais: um em Taguatinga, sob a batuta de Levino Ferreira de Alcântara, hoje com 92 anos, e outro no Centro Educacional Caseb, na Asa Sul. “O maestro Levino participou da organização desses movimentos e conseguiu que a EMB fosse oficializada como instituição autônoma, em 1971. Ele colocou um professor de música e um pianista em cada uma das escolas públicas de Brasília, à época”, conta o diretor Ataide de Mattos. Uma façanha que, nos dias de hoje, seria impossível – a capital soma 652 instituições da rede pública. Com a musicalização das escolas, Levino conseguiu reforçar o embrião da EMB.
O destaque à vocalização deu origem ao Madrigal de Brasília. A parte instrumental foi fomentada por músicos de outros estados. Com o curso de verão, vieram profissionais do exterior e do Rio de Janeiro. Estava formada a primeira leva de professores. A estrutura curricular contemplava o curso Crescendo com a Música, o pré-profissionalizante e o profissionalizante; além do Cultura Musical, à noite. Depois de duas sedes provisórias, a EMB assentou-se definitivamente na 602 Sul, em 1974.
Do foco inicial na música vocal e na produção sinfônica, a instituição enfrentou uma expansão sem precedentes desde 1985. Foi também na década de 1980 que a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional surgiu a partir de professores e alunos da EMB e da Universidade de Brasília (UnB). Além da música erudita, desenvolveu música popular, contemporânea e eletroacústica. Criou núcleos de musicalização e musicologia para deficientes visuais; e de música e tecnologia, com cursos de musicografia digital, gravação e iluminação cênica. “O trabalho do maestro Levino rendeu frutos. Nós crescemos muito, para dentro, e não cabemos mais nesta escola, tanto pedagógica quanto artisticamente”, comemora Mattos. A EMB se prepara para uma descentralização: vai implantar dois cursos superiores, de licenciatura em instrumento musical e de licenciatura em musicalização.
Hoje, a EMB oferece musicalização infantil, juvenil e adulta; iniciação instrumental; e cursos técnicos. São mais de 20 instrumentos, oferecidos em pelo menos oito grandes núcleos de estudos: orquestras, coro e bandas; musicografia braille; canto; música antiga; música popular; sopros; cordas dedilhadas; e cordas friccionadas.